Boletim de Serviço Eletrônico em 25/10/2018
Timbre

Voto nº 20/2018/SEI/LM

Processo nº 53500.070758/2017-97

Interessado: Sercomtel S.A. - Telecomunicações

CONSELHEIRO

LEONARDO EULER DE MORAIS

ASSUNTO

Ratificação de dispensabilidade de bem imóvel localizado na Data de Terras nº 10, Quadra nº 4, Bairro Aeroporto, no Município de Londrina, Estado do Paraná, registrado sob a matrícula nº 3.555 junto ao 3º Ofício de Registro de Imóveis de Londrina, solicitada pela Sercomtel S.A. Telecomunicações.

EMENTA

bens reversíveis. SUPERINTENDÊNCIA DE CONTROLE DE OBRIGAÇÕES (SCO). MEDIDAS CAUTELARES. REQUERIMENTO DA CONCESSIONÁRIA. RATIFICAÇÃO DE DISPENSABILIDADE DE BEM IMÓVEL. ATESTO PELA ÁREA TÉCNICA. IMÓVEL DESOCUPADO E SEM VÍNCULO COM O SUPORTE OU PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES. RATIFICAÇÃO. 

A Interessada solicitou a esta Agência a ratificação de dispensabilidade de bem imóvel, não constante de Relação de Bens Reversíveis (RBR) em atendimento a determinação que lhe impôs obrigação de submissão prévia.

Imóvel desocupado, sem edificações, ausência de caracterização como suporte para a prestação do STFC.

A reversibilidade de um bem deve estar associada à sua efetiva imprescindibilidade para a prestação do serviço concedido. O ônus da reversibilidade não se presta a uma finalidade hipotética de maximização de acervo patrimonial.

Existência de precedentes judiciais com o entendimento de que o instituto da reversibilidade busca assegurar ao Poder Concedente exclusivamente a transferência dos bens aplicados na prestação do serviço. Bens que não são utilizados na prestação do serviço concedido, ainda que gerem rendas para a concessionária, não são atingidos pela reversão.

A maximização do estoque de bens reversíveis não implica viabilidade econômica da concessionária ou modicidade tarifária. A manutenção artificial de estoque elevado de bens reversíveis tem efeitos nocivos sobre a produtividade da concessionária, reduz os ganhos compartilhados com os usuários e pode impor perdas desnecessárias à União.

Ante a atestada não essencialidade à prestação do serviço público de telecomunicações bem como o uso ineficiente da propriedade, ratifica-se a dispensabilidade do bem.

REFERÊNCIAS

Informe nº 8/2018/SEI/COUN1/COUN/SCO (SEI 2299707);

Parecer nº 230/2018/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI 2621898);

Informe nº 31/2018/SEI/COUN1/COUN/SCO (SEI 2779949);

Matéria para Apreciação do Conselho Diretor (MACD) nº 533/2018 (SEI 2791815);

Análise nº 66/2018/SEI/OR (SEI 3002206).

RELATÓRIO

DOS FATOS

Trata-se de matéria relatada na 859ª Reunião do Conselho Diretor (RCD), realizada em 4/10/2018, pelo Conselheiro Otavio Rodrigues, ocasião na qual foi solicitada vista dos autos.

O histórico processual detalhado consta da Análise nº 66/2018/SEI/OR (SEI 3002206), apresentada em sede de relatoria, e à qual se faz referência.

Em linhas gerais, trata-se de pedido formulado a esta Agência pela Sercomtel Telecomunicações S.A. ("Sercomtel") para venda de terreno para atender Plano de Recuperação Financeira. A proposição do Relator foi pelo indeferimento da solicitação, conforme transcreve-se:

Voto por indeferir o pedido de ratificação da dispensabilidade, para a prestação do STFC em regime público, do imóvel localizado na Data de Terras nº 10, Quadra nº 4, Bairro Aeroporto, no Município de Londrina, Estado do Paraná, registrado sob a matrícula nº 3.555 junto ao 3º Ofício de Registro de Imóveis de Londrina.

Antes de passar às considerações sobre o caso concreto sob análise, registra-se que a linha de posicionamento adotada segue manifestação anterior acerca do instituto da reversibilidade nas concessões do STFC e do tratamento a ser dispensado a bens não reversíveis, expostas no âmbito do processo nº 53500.009630/2013-06, nos termos da Análise nº 3/2018/SEI/LM (SEI 2274830).

 

DAS CONSIDERAÇÕES POR PARTE DESTE CONSELHEIRO

I - Da natureza do requerimento apresentado

Preambularmente, faz-se necessário elucidar a natureza do requerimento apresentado pela Sercomtel, tendo em vista que o imóvel em questão não consta de qualquer de suas Relações de Bens Reversíveis (RBR).

Cumpre lembrar que o art. 101 da Lei nº 9.472/1997 - Lei Geral de Telecomunicações ("LGT") preceitua que a alienação, oneração ou substituição de bens reversíveis dependerá de prévia aprovação da Agência. Por óbvio que seja, resta dizer que quanto a "bens não reversíveis" manteve-se o Legislador silente. O Regulamento de Controle de Bens Reversíveis (RCBR), aprovado pela Res. nº 447/2006, seguiu a mesma lógica legal, prevendo em seu art. 15 a obrigatoriedade de anuência para desvinculação (da RBR), alienação, oneração ou substituição de bens reversíveis. Ali, no art. 3º, IV, foram eles definidos como equipamentos, infra-estrutura, logiciários ou qualquer outro bem, móvel ou imóvel, inclusive Bens de Massa, ou direito integrantes do patrimônio da Prestadora, de sua controladora, controlada ou coligada, indispensáveis à continuidade e atualidade da prestação do serviço no regime público. Exceto quanto à disciplina relativa a bens de terceiros que também sejam empregados pela prestadora sendo indispensáveis à continuidade e atualidade da prestação do serviço, não há no RCBR qualquer disposição que afete outros bens relacionados às concessionárias - por exemplo bens próprios que não se prestem à utilização no serviço concedido.

Contudo, a despeito da ausência de disposição regulamentar expressa sobre a gestão desses outros bens, foi expedido pelo Superintendente de Serviços Públicos (SPB), no âmbito do processo nº 53500.015522/2012, o Despacho Cautelar nº 7.721/2012/PBOAC/PBOA/SPB, de 21/12/2012, que determinou às concessionárias do Grupo Oi absterem-se de alienar e/ou onerar qualquer bem imóvel que integre seu patrimônio, bem como de suas controladoras, controladas e coligadas, sem a comprovação prévia, ratificada pela Agência, da dispensabilidade de tais bens para a continuidade do serviço de telecomunicações prestado em regime público.

A medida, de natureza relevante, extraordinária e cautelar, foi adotada a partir de sólida motivação, ancorada em uma sequência de eventos relacionados ao modo de controle de bens que vinha sendo adotado pelo Grupo Oi. Em síntese, a determinação cautelar impôs à Oi a submissão ao crivo prévio da Anatel para realização de qualquer operação de alienação e oneração em se tratando de todos seus imóveis (reversíveis ou não). Garantiu-se assim um maior enforcement às demais determinações cautelares até então impostas (relacionadas a outras ações necessárias para melhoria da gestão de bens reversíveis pelas concessionárias) e assegurou-se um aumento no espectro de avaliação da Agência, para que eventuais bens que não estivessem claramente caracterizados como reversíveis nas RBR não fossem alienados ou onerados indevidamente.

Em 28/12/2012, foi expedido o Ofício nº 81/2012-PBOAC/PBOA/SPB-Anatel, por meio do qual se informou a necessidade de a Sercomtel também obter, junto à Agência, a ratificação de dispensabilidade de bens imóveis para a prestação do STFC no regime público previamente a sua alienação ou oneração.

Tal medida, vigente à época da apresentação do requerimento ora sob exame, manteve-se por força de instrumentos subsequentes tais como o Despacho Decisório nº 27/2017/SEI/COUN1/COUN/SCO, de 26/5/2017, expedido pelo Superintendente de Controle de Obrigações (SCO) nos autos nº 53500.010686/2016-48, e mantido nos termos do Acórdão nº 690, de 28/12/2017 (SEI 2266382). Ampliou-se ainda a determinação de bens imóveis para a totalidade dos bens como decorrência do Acórdão nº 366, de 1º/9/2017 (SEI 1846303), proferido pelo Conselho Diretor no âmbito dos autos nº 53500.007234/2013-36, igualmente vigente.

Nesse contexto, vislumbra-se que a fundamentação imediata do pedido formulado pela Sercomtel vem a ser a determinação que lhe foi imposta, e cujo teor permanece vigente até o presente. Tal ponto merece realce para que bem se reconheçam as balizas a serem aplicadas no momento de decisão.

II - Da análise de reversibilidade do imóvel Data de Terras nº 10 - Londrina/PR

A primeira análise realizada pela área técnica, constante do Informe nº 8/2018/SEI/COUN1/COUN/SCO (SEI 2299707), amparou-se em fiscalização in loco realizada no endereço do bem imóvel, registrada no Relatório de Fiscalização nº 361/2017/GR03 (SEI 2044069). Dessa análise constam (i) considerações a respeito da ausência de relação do imóvel com a prestação do serviço concedido, assim como (ii) averiguação de propriedade do bem e (iii) registros fotográficos. Do referido Informe, realça-se os seguintes elementos:

o imóvel corresponde a terreno de 464,83 m² (quatrocentos e sessenta e quatro vírgula oitenta e três metros quadrados);

o imóvel encontrava-se sob propriedade da Sercomtel;

o imóvel encontra-se desocupado, sem qualquer edificação, não tendo sido encontrados quaisquer equipamentos de telecomunicações ou realização de qualquer atividade indispensável à continuidade do STFC (comprovação por registros fotográficos); e

o imóvel nunca foi incluído em RBR e tampouco foram nelas indicados bens móveis que nele estivessem alocados; não há qualquer estação licenciada no Sistema de Telecomunicações da Anatel (STEL) para o endereço.

Por tal razão, a área técnica propôs a ratificação da dispensabilidade do imóvel para a prestação do STFC.

A segunda análise da SCO, contida no Informe nº 31/2018/SEI/COUN1/COUN/SCO (SEI 2779949), apresentou comentários detalhados acerca dos itens do Parecer nº 230/2018/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI 2621898). Da referida análise, realço os seguintes elementos:

entendimento de que o instituto da reversibilidade possui como bem jurídico tutelado a continuidade do serviço concedido;

no ordenamento jurídico do setor de telecomunicações, o Legislador delegou ao Regulador opção pelo exercício da reversão e a definição de seu escopo;

por força das disposições do Contrato de Concessão e do RCBR,  a reversibilidade não atinge todo o patrimônio da concessionária, mas tão somente aqueles bens sem os quais o serviço não poderia ser prestado;

é de se pressupor que a evolução tecnológica diminuiu a necessidade de espaço físico para a prestação do STFC aos mesmos assinantes (ou, sobretudo, a um número cada vez menor - tendência atual); o que reduz a necessidade de área (imóveis) como suporte para atividades;

o local onde se situa o bem imóvel nunca foi utilizado com a finalidade que possa apontar para indícios de reversibilidade; e a ratificação de sua dispensabilidade não afetará a prestação do serviço com os atributos exigidos; e

Data de Terras nº 10 constitui um imóvel inaproveitado em sua integralidade, vazio, que gera despesas de manutenção e de impostos, não contribuindo para a atualidade do serviço, muito menos a preços módicos ao consumidor. Antagonicamente, onera a concessionária e a impede de aplicar os recursos direcionados à conservação do bem vazio ao que realmente é o foco da concessão.

Ao final, registra-se que as imagens do imóvel obtidas pela fiscalização são ilustrativas a respeito da ausência de qualquer relação com a prestação do serviço concedido. Seguem alguns exemplos dentre elas (Figura I):

Figura I - imóvel Data de Terras nº 10

 

Fonte: Relatório de Fiscalização nº 361/2017/GR03 - SEI 2044069

III - Do fundamento jurídico da reversão nas concessões do STFC, das ponderações de cunho econômico, da extensão da reversibilidade

O setor de telecomunicações brasileiro se assenta em bases jurídicas sólidas. Nessa perspectiva, é relevante repisar que o ordenamento setorial contempla a figura da reversão, mas não estabelece previamente sua incidência sobre todo o acervo de ativos das concessionárias, nem ao menos a impõe como medida a ser necessariamente adotada. A opção pela reversão e seu escopo foram delegados ao regulador. Nos termos da Exposição de Motivos nº 231, de 10/12/1996, do Ministério das Comunicações:

Em se tratando de serviço de interesse coletivo, cuja existência e continuidade a própria União se comprometa a assegurar, os bens que a ele estejam aplicados poderão (e não deverão) ser revertidos ao Poder concedente, para permitir a continuidade do serviço público. Mas nem sempre o princípio da continuidade do serviço público supõe a reversão dos bens que lhe estejam afetados. Quando os bens do concessionário não forem essenciais à sua prestação, quer por obsolescência tecnológica, quer pelo esgotamento de sua própria vida útil, a reversão não deverá ocorrer, não precisando, os bens, ser reintegrados ao patrimônio do poder concedente, ao término da concessão. A não ser, é claro, que por motivos devidamente justificados, reclame o interesse público tal reversão. Daí a facultatividade do instituto, que o Projeto agasalhou, ao deixar que o contrato defina quais são esses bens, visando evitar ônus financeiro desnecessário para o concedente (destaque nosso).

Com efeito, é evidente que ao instituto da reversibilidade foi atribuído pelo legislador democrático caráter de facultatividade. Nesse passo, a conformação da cláusula de reversão nos Contratos de Concessão do STFC é escolha do regulador, pautada por considerações de conveniência e oportunidade a serem fundamentadas em aspectos de natureza tecnológica e econômica. Nesse contexto, devem-se avaliar as vantagens da reversão como instituto voltado ao atendimento do princípio da continuidade em contraste com seus efeitos adversos, sendo esse o sentido da redação do art. 93, IX, da Lei nº 9.472/1997 (Lei Geral de Telecomunicações - LGT), que determina que o Contrato de Concessão deve indicar os bens reversíveis, se houver. Assim, repito em adesão à manifestação da SCO que a figura da reversão somente se justifica se estiver alinhada com o objetivo de continuidade da prestação do serviço, que constitui seu fundamento jurídico.

Não há espaço para erigir a valorização patrimonial da concessão como objetivo a ser buscado dentro do modelo regulatório do setor de telecomunicações por meio do instituto da reversão. O vínculo precípuo que se estabelece com a reversão é o da continuidade do serviço, não o de uma finalidade hipotética de maximização do acervo patrimonial a ser revertido à União ao término da concessão.

É preciso lembrar que jurídica e historicamente, a outorga de concessão para a exploração do STFC e a privatização das empresas componentes do Sistema TELEBRÁS foram eventos distintos. O contrato original de concessão (Res. nº 26/1998) foi celebrado a partir da previsão constante do art. 207 da LGT. No momento de assinatura do ajuste, as prestadoras de STFC então existentes concordaram em afetar à prestação do serviço em regime público, parcela de seu patrimônio preexistente - e bem assim de seus investimentos futuros - sujeitando-se à reversão desse capital. No caso específico das empresas do Sistema TELEBRÁS, tem-se um patrimônio inicial formado pelos recursos indicados no art. 5º da Lei nº 5.792/1972. Em conformidade com a situação descrita na Exposição de Motivos nº 231/1996, pouco mais de 20% do capital total da TELEBRÁS era detido pela União. Foi essa parcela do capital social da TELEBRÁS o objeto de alienação no processo de privatização dessas entidades (Edital nº 1/1998-MC/BNDES). Assim temos, concessão - outorgada mediante a assinatura do Contrato - e privatização - que ocorreu posteriormente e teve como objeto tão somente a parcela do Capital Social da TELEBRÁS detida pela União. Logo, não é cabível qualquer argumento que vincule a reversão a uma recuperação de patrimônio público alienado em 1998.

É no Contrato de Concessão que se deve buscar a disciplina a ser aplicada à reversão dos bens das concessionárias do STFC. Foi no momento de celebração desse ajuste que as então prestadoras do STFC manifestaram sua aquiescência ao regime jurídico ali estabelecido e concordaram em submeter à reversão parcela de seu patrimônio e de seus investimentos futuros, nos termos estabelecidos no Contrato. Perceba-se que as redações das Cláusulas 22.1 do Contrato de Concessão do STFC, aprovado pela Res. nº 552/2010, e 20.1 do Contrato aprovado pela Res. nº 678/2017 mostram-se de acordo com o adiantado entendimento a respeito de um critério de reversibilidade decorrente da indispensabilidade do bem para a prestação do serviço, pois limitam expressamente dessa forma sua incidência. 

A questão foi objeto de extenso debate nos autos nº 53500.025781/2011-31 (o conhecido "Caso Martiniano"1), no qual foi proferido o Despacho nº 2.262/2012-CD - com fundamento na posição defendida na Análise nº 131/2012-GCRZ, de 9/3/2012. O entendimento ali adotado acrescentava - ao requisito funcional - a importância econômica dos bens da concessionária para a sustentabilidade da concessão após seu termobem como para a preservação da modicidade tarifária.

Tal visão, rotulada "patrimonialista", aponta a incidência da reversibilidade não somente sobre os bens aplicados diretamente na exploração do serviço concedido, mas também sobre aqueles destinados à geração de outras receitas alternativas, inclusive as decorrentes da exploração de outros serviços pela concessionária, em regime privado. De qualquer forma, no que tange à "taxonomia", registro que classificar visões como "patrimonialistas" ou "funcionais" não parece ajudar na compreensão do tema. Ao contrário, na maioria das vezes é uma simplificação esquemática para que se possa, apressadamente, tomar partido sem a devida reflexão.

Vale notar que este Colegiado, em sua 842ª Reunião, realizada em 18/1/2018, deliberou pela revogação, de ofício das alíneas do referido Despacho que, respectivamente reconheciam a reversibilidade de bens imóveis administrativos e aprovavam diretrizes para  para a anuência de operações envolvendo a desvinculação, alienação ou substituição de bem integrante da Relação de Bens Reversíveis ou o emprego de bens de terceiros diretamente na prestação do serviço concedido nos termos da citada Análise nº 131/2012-GCRZ.

O tema da reversibilidade já foi intensamente debatido tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência dos Tribunais Superiores, em discussões que contribuem para o entendimento da questão. Nesse sentido, faz-se referência à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário nº 32.865, no qual - embora não se tratando diretamente do setor de telecomunicações, mas de transportes - se reconheceu que o patrimônio da concessionária nunca está totalmente abrangido pela reversão (ainda que eventualmente haja disposição expressa). Isto porque, por sua própria natureza, o instituto buscar assegurar ao Poder Concedente tão somente a transferência da propriedade dos bens efetivamente aplicados na fruição do serviço. Ou seja, demais ativos de propriedade, empregados em outras atividades, não podem ser objeto de reversão.

Tal entendimento aplica-se ao âmbito setorial também, e sobretudo, por força da legislação própria: a opção pela reversibilidade pressupõe a identificação dos bens indispensáveis à fruição do STFC, não se aplicando àqueles que não se revestem desse caráter de imprescindibilidade. Essa consideração é importante diante da constatação de que, pelo disposto nos arts. 86 e 207, §3º, da LGT, é facultada às concessionárias do STFC a exploração de outros serviços de telecomunicações. Logo, os ativos utilizados na exploração desses outros serviços - que não se revelem também indispensáveis à fruição do STFC - constituem patrimônio privado excluído da reversão e livremente disponível, por exemplo. Tal raciocínio mostra igualmente evidente para bens que sequer vêm sendo explorados, como o imóvel sob exame.

A decisão do STF no Recurso Extraordinário nº 65.646 também conforma outro precedente judicial digno de nota. Na oportunidade, foi albergada premissa de que os bens das concessionárias que não são utilizados na prestação do serviço concedido, ainda que gerem rendas para a concessionárianão são atingidos pela reversão, e somente podem ser transferidos ao domínio do Estado mediante a utilização da desapropriação ou mecanismo equivalente.

No mais, há precedente judicial relativo à decisão de Agravo Regimental no Recurso Especial nº 971.851-SC julgado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), relatado pelo Ministro Castro Meira no Processo nº 200472010054455 (número original), segundo o qual “bem desativado e fora de uso não é essencial à prestação de qualquer serviço e, portanto, não pode ser incluído no conceito de bem reversível, conclusão que não contradiz o disposto no art. 11 da Resolução 447/06”. Ressaltou-se que o referido processo, transitado em julgado, tratava de ação popular que questionava a validade de venda de imóvel realizada por concessionária do STFC que, segundo a autora, estaria vinculado ao contrato de concessão para prestação do STFC em regime público e, como bem reversível, não poderia ter sido vendido, por ser necessário à execução do serviço público concedido.

Cabe aqui igualmente fazer referência à decisão adotada por este Colegiado nos autos nº 53500.004493/2009-29, em sua 777ª RCD, realizada em 11/6/2015, tendo sido expedido o Acórdão nº 215/2015-CD, de 15/6/2015. Ali deliberou-se, por unanimidade, que o acompanhamento dos Contratos de Concessão do STFC se faça nos termos apresentados no Voto nº 85/2015-GCIF, de 5/6/2015. No âmbito do aludido Voto foram feitas as seguintes considerações que, a despeito de sua extensão, vale sua reprodução para melhor compreensão do tema:

4.2.155. Não se confunde, portanto, a tarifa módica com a tarifa razoável, que é aquela que não só cobre os custos do serviço como ainda propicia ao concessionário uma remuneração adequada de seu investimento. O autor esclarece ainda que modicidade e razoabilidade de tarifas podem ser objetivos conflitantes em determinados casos:

Fala-se em tarifa razoável para referir tarifas cujo valor pressuponha, no contexto da remuneração do concessionário, margens de retorno razoáveis, adequadas ao funcionamento do serviço público. Razoáveis serão as tarifas que importem não em margens de retorno excessivas ou irrisórias, mas fixadas em medida compatível com a realidade econômico-financeira do ajuste concessório, de acordo com parâmetros de economicidade e eficiência abstratamente concebidos.

Percebe-se então que a noção de razoabilidade da tarifa está voltada para dentro da concessão, sendo um conceito-referência para, na integração dos elementos implicados no sistema remuneratório da concessão, aferir-se a adequação da margem de retorno do concessionário, ao passo que modicidade da tarifa será aferida e calibrada relativamente ao usuário, sendo um aspecto que toca diretamente aos usuários do serviço. Assim, uma concessão pode pressupor margens de retorno adequadas a partir de tarifas que não atendam à modicidade, do mesmo modo que garantir tarifas módicas não assegura em todos os casos margens de retorno razoáveis. Caso a prática de tarifas módicas e razoáveis importe em retirar do projeto de concessão a condição de autossustentabilidade, devem-se buscar, como dito atrás, meios de subsidiar a prestação deficitária do serviço público.

4.2.156. É nesse ponto que ganham destaque as receitas alternativas, complementares e acessórias da concessão, que podem contribuir para a sustentabilidade econômica de um projeto que, privado dessas fontes adicionais de rendimentos, ou não seria sustentável ou redundaria em tarifas inacessíveis para a população. Essa interligação entre modicidade tarifária e receitas complementares é defendida expressamente por Vernalha Guimarães nos seguintes termos:

A complementação da receita remuneratória do concessionário por fontes alternativas tem o propósito de assegurar a modicidade tarifária, absorvendo em favor da redução no preço das tarifas todas as oportunidades lucrativas vinculadas à exploração do serviço público na concessão. Essas atividades lucrativas associadas à prestação de serviços públicos concedidos, embora não se confundam com o objeto propriamente da delegação (porquanto se configuram atividades econômicas destituídas das características do serviço público, não atraindo daí o seu regime específico), serão desempenhadas pelo concessionário (paralelamente à realização do serviço público e segundo outro regime de prestação) como um meio a ampliar suas receitas e subsidiar (mesmo que parcialmente) o custeio do serviço público concedido, alcançando-se a redução das tarifas cobradas dos usuários. A prescrição deve ser compreendida a partir do princípio da modicidade tarifária aplicável às concessões.

Em muitos casos, o lucro auferido por conta do desempenho desses negócios associados ao projeto da concessão configurará solução à execução autossustentável (sem o recurso a aportes do poder público) do serviço público. Assim, um projeto que envolva custos operacionais que ultrapassem a perspectiva de retorno financeiro oriundo da cobrança de tarifas módicas dependerá da complementação da receita do concessionário por fontes alternativas. Nesses casos, a adição de outras fontes de remuneração é condição de viabilidade econômico-financeira da concessão.

4.2.157. As receitas alternativas, portanto, permitiriam não só a cobrança de tarifas módicas, ainda que abaixo do respectivo custo, como também a própria supressão da tarifa, vez que, conforme admite Maria Sylvia Zanella Di Pietro, pode haver concessão remunerada tão somente por receitas decorrentes da exploração comercial do serviço, ainda que não provenientes diretamente do pagamento efetuado pelo usuário.

4.2.158. Hipótese de tal natureza, no entanto, somente será verificada caso haja uma escolha deliberada do Poder Concedente, a partir de considerações sobre a essencialidade do serviço e das políticas públicas que regem sua prestação. Como alerta Carlos Ari Sundfeld a partir da leitura do art. 175, parágrafo único, inciso III, da Constituição Federal, a política tarifária de cada serviço deve ser deduzida a partir das respectivas leis de regência, bem como dos contratos de concessão e demais regulamentos setoriais. É por essa razão que se torna imperioso o conhecimento da política tarifária estabelecida em lei para os serviços de telecomunicações, bem como o papel que o princípio da modicidade tarifária desempenha nesse subsistema normativo. Nesse processo, é preciso ter cautela na transposição de conceitos e doutrinas formulados para a concessão comum para o ordenamento setorial das telecomunicações.

4.2.159. A discussão acerca da incompatibilidade entre razoabilidade e modicidade de tarifas não é estranha à estruturação do modelo regulatório das telecomunicações. Conforme se verifica no seguinte excerto da Exposição de Motivos nº 231, de 10/12/1996, do Ministério das Comunicações, o enfretamento do tema foi necessário no momento em que se buscou idealizar uma solução para a universalização do acesso aos serviços de telecomunicações:

A ideia de universalização do acesso contempla duas situações genéricas:

• serviços de telecomunicações individuais, com níveis de qualidade aceitáveis, devem ser fornecidos, a tarifas comercialmente razoáveis, dentro de um prazo razoável, a qualquer pessoa ou organização que os requisitar [sem grifos no original];

• outras formas de acesso a serviços de telecomunicações devem ser fornecidas, em localizações geográficas convenientes, a tarifas acessíveis, àquelas pessoas que não tiverem condições econômicas de pagar tarifas comercialmente razoáveis por serviços individuais [sem grifos no original].

Na primeira dessas situações, as tarifas cobrem os custos operacionais e proporcionam retorno comercialmente atrativo ao capital investido, de modo que os provedores de serviço buscarão, normalmente, satisfazer a esses clientes como parte de sua estratégia de negócios. Ou seja, a competição na exploração dos serviços fará com que os consumidores economicamente atrativos sejam atendidos satisfatoriamente, tendo acesso a serviços que supram de forma adequada suas necessidades de telecomunicações.

Já a segunda situação diz respeito àqueles casos em que o custo de prover o acesso físico seja elevado (por exemplo, em localidades remotas do interior do País, nas áreas rurais, nas periferias das grandes cidades, em regiões escassamente povoadas) ou em que os clientes potenciais disponham de renda inferior à que seria necessária para criar uma oportunidade de investimento atrativa para algum provedor de serviço. Nesse caso, o acesso a serviços de telecomunicações poderá requerer algum tipo de subsídio, que deverá ser idealizado e distribuído de modo a não criar vantagens nem desvantagens para nenhum dos operadores e, ao mesmo tempo, possibilitar o atendimento a esse objetivo social ao menor custo.

Atender a essa segunda situação é o que comumente se chama de obrigação de serviço universal, e financiar essa obrigação é o terceiro ponto fundamental da regulação tratada nesse item [grifos no original].

4.2.160. O princípio da modicidade tarifária no setor de telecomunicações, portanto, coloca-se com especial evidência diante do objetivo de universalização do acesso aos serviços. No entanto, os esforços de concretização desse princípio devem respeitar outro pilar fundamental da reforma institucional do setor, qual seja, a competição. Nesse sentido, o financiamento das obrigações de universalização deve ser neutro do ponto de vista competitivo, ou, em outros termos, não deve criar vantagens nem desvantagens para nenhum dos operadores e, ao mesmo tempo, possibilitar o atendimento a esse objetivo social ao menor custo.

4.2.161. A própria Exposição de Motivos nº 231, de 10/12/1996, do Ministério das Comunicações, trata de identificar possíveis fontes de financiamento dos planos de universalização compatíveis com as demais premissas do modelo, especialmente a competição. Nesse esforço, os subsídios governamentais diretos e a criação de um fundo específico de financiamento da universalização são caracterizados como fontes viáveis e harmônicas com os pressupostos do modelo. Por sua vez, a prática de subsídios cruzados internos à concessionária é considerada incompatível com a competição. No entanto, é contemplada no projeto como solução temporária, consoante a seguinte argumentação:

Portanto, muito embora o princípio da livre concorrência seja incompatível com a prática de subsídio entre serviços de telecomunicação ou entre segmentos de usuários (por exemplo, rurais e urbanos), tal prática poderá ser autorizada pela regulamentação, desde que necessária à viabilização do cumprimento dos deveres de universalização e seja instituída por ato motivado, em que se explicitem sua natureza, os recursos envolvidos, e os serviços ou segmentos onerados e beneficiados.

4.2.162. A redação da LGT expressa os fundamentos da reforma institucional consignados na Exposição de Motivos nº 231, de 10/12/1996, do Ministério das Comunicações. Primeiramente, cabe destacar o art. 6º da Lei, que afirma que os serviços de telecomunicações serão organizados com base no princípio da livre, ampla e justa competição entre todas as prestadoras, devendo o Poder Público atuar para propiciá-la, bem como para corrigir os efeitos da competição imperfeita e reprimir as infrações da ordem econômica. Em decorrência desse princípio, são vedadas as condutas de prática de subsídios para redução artificial de preços e tarifas, bem como o subsídio entre modalidades de serviços, nos termos dos arts. 70, inciso I, e, 103, § 2º, da LGT. Verifica-se, em um primeiro momento, portanto, que a utilização de fontes alternativas de receitas para propiciar a prática de tarifas não autossustentáveis – vale dizer, subsidiadas – encontra obstáculo na própria lei de regência do setor, que veda a utilização de subsídios cruzados entre serviços ou entre segmentos de usuários para a redução artificial das tarifas por consistir prática contrária ao princípio da livre, ampla e justa competição.

4.2.163. É justamente por essa razão – a necessidade de construção e manutenção de um ambiente competitivo – que, como salienta Carlos Ari Sundfeld, a LGT faz menção a preços e tarifas razoáveis (arts. 2º, inciso I, e 89, inciso I) e não a tarifas módicas. A lógica concebida sob a égide da Lei nº 8.987, de 13/2/1995, que admite a prestação do serviço público parcial ou totalmente subsidiada por outras receitas, é compatível com a exploração em regime de exclusividade. No entanto, tarifas artificialmente baixas, insuficientes para a cobertura dos respectivos custos e remuneração do capital, são incompatíveis com um ambiente competitivo.

4.2.164. Isso não quer dizer que o modelo de regulação do setor de telecomunicações tenha sido omisso em relação à garantia do acesso aos serviços àquelas populações que, em função de sua localização geográfica ou condição socioeconômica, não tenham como arcar com tarifas comercialmente razoáveis. Com efeito, a LGT não deixou de prover uma solução para o conflito entre razoabilidade e modicidade de tarifas, que será equacionado no âmbito das obrigações de universalização. Essa solução, no entanto, há de ser necessariamente neutra em termos concorrenciais, consoante expresso no art. 80, § 1º, da citada Lei. Por essa razão, os mecanismos de financiamento dessas obrigações foram previstos na própria LGT, que contemplou tão somente de forma excepcional e temporária, a prática de subsídios entre modalidades de serviços, consoante a redação de seu art. 81, parágrafo único, inciso I.

4.2.165. Essa discussão revela, em primeiro lugar, que os esforços para garantir amplo acesso da sociedade aos serviços de telecomunicações devem ser compatibilizados com a criação e manutenção de um ambiente de livre, ampla e justa competição. Nesse contexto, sobressai a necessidade de preservar tarifas comercialmente razoáveis, que não sejam prejudiciais à entrada de novos concorrentes. A tarifa módica, portanto, deve ser admitida enquanto for compatível com um mercado competitivo. E a solução construída pelo legislador, aplicável apenas ao serviço prestado em regime público, ao qual se imputam obrigações de universalização, foi a instituição de um fundo – no caso, o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST) – para cobrir tão somente a parcela de custo que não puder ser recuperada com a exploração eficiente do serviço, nos termos do art. 81. Tal foi o mecanismo neutro à competição concebido e autorizado pela LGT.

4.2.166. Portanto, o princípio da modicidade tarifária, no subsistema normativo do setor de telecomunicações, deve ser ponderado com outros princípios igualmente relevantes, especialmente o da livre, ampla e justa competição. Essa ponderação é feita por meio das obrigações de universalização, que buscam igualmente garantir o acesso da população aos serviços de telecomunicações, mediante o uso de fonte de financiamento neutra do ponto de vista competitivo.

4.2.167. Por conseguinte, é vedada a utilização de receitas decorrentes da exploração de outros serviços de telecomunicações pela concessionária para promover a modicidade das tarifas do STFC. As tarifas do serviço concedido devem ser compatíveis com o regime de livre, ampla e justa competição, razão pela qual não podem ser subsidiadas, ainda que parcialmente, com receitas oriundas da exploração de outros serviços. Contabilizar as receitas de varejo auferidas pela concessionária com a oferta do SRTT/SCM no âmbito do equilíbrio econômico-financeiro do contrato significaria atribuir-lhes encargos equivalentes, na forma de reduções tarifárias do serviço concedido ou de obrigações adicionais que não poderiam ser integralmente suportadas pelas tarifas do STFC. Em qualquer hipótese, tais encargos não seriam sustentáveis em um regime puramente concorrencial, vez que dependentes de subsídio cruzado entre modalidades de serviço. Este mecanismo, que seria aceitável na exploração de um serviço público em regime de exclusividade, é incompatível com as premissas do modelo de regulação do setor de telecomunicações. A ampliação do acesso a serviços essenciais de telecomunicações ocorre, nos termos da LGT, por meio da imposição de obrigações de universalização, que possuem mecanismos próprios de financiamento, previstos em lei.

4.2.168. As receitas decorrentes da exploração de outros serviços de telecomunicações, portanto, não integram o conjunto de remunerações que a concessionária aufere em razão do contrato e, por conseguinte, não devem integrar o escopo da equação do equilíbrio econômico-financeiro. (destaques nossos)

Nesse sentido, a maximização do estoque de bens reversíveis não implica viabilidade econômica da concessionária, nem tampouco a modicidade tarifária.

As ponderações de cunho econômico da Análise nº 131/2012-GCRZ também devem ser reanalisadas porque a correlação entre estoque de ativos e modicidade tarifária é oposta àquela ali descrita. A variação líquida do capital imobilizado da concessionária, contabilizada a partir do balanço entre variações das contas de ativo total e alugueis, tem implicação direta sobre a modicidade tarifária do STFC, na medida em que são importantes insumos no cômputo do Fator X. O custo de capital é composto a partir do ativo total da concessionária e inclui todo seu acervo patrimonial. E as despesas operacionais incluem, obviamente, as rubricas de alugueis. Assim, ao contrário do exposto naquela Análise, a redução do capital empregado na concessão, em função da alienação de ativos, que não seja compensada pelo aumento dos alugueis – situação esperada quando uma concessionária decide alienar um bem próprio e substituí-lo por bens de terceiros – resulta em ganhos de produtividade. Mantido o nível de produção, o resultado esperado, por definição, favorece (e não atenta contra) a modicidade tarifária, devido ao compartilhamento de maiores ganhos de produtividade capturados pelo Fator X. O próprio modelo de price cap produz tal incentivo. Em regra, toda concessionária procurará um ponto ótimo – e não um mínimo – para seu ativo imobilizado, pois os ganhos de produtividade obtidos a partir dos fatores de produção disponíveis, ainda que compartilhados com os usuários, não deixam de por ela serem percebidos. Isto é dizer que impor diretrizes que visem à maximização do estoque de bens reversíveis representa um entrave à produtividade da prestadora com efeito nocivo sobre as tarifas. Tais afirmações podem ser verificadas em simulações de cenários contidas na Análise nº 5/2015-GCIF, apresentada nos autos do referido processo nº 53500.025781/2011-31.

No mais, a proposição por manter artificialmente elevado o estoque de bens reversíveis não prejudica apenas o usuário, mas pode impor perdas desnecessárias à União, tendo em vista eventuais pedidos de indenização contra o Estado, que provavelmente seriam levados à apreciação do Judiciário caso a interpretação sobre a reversibilidade resulte em expropriação de bem privado sem a justa e devida remuneração.

Percebe-se então ser incoerente a submissão à reversibilidade de bens cujas características transcendem as necessidades fundamentais da operação e atualização da prestação do STFC em regime público. Sobre essa relação, reforço que a manutenção desses ativos no acervo de bens reversíveis impõe um ônus extraordinário à concessionária, com efeitos indesejáveis sobre as tarifas, e um risco à União, que poderia, eventualmente, ser condenada a indenizá-la. 

Com isso, o desfecho que melhor associa as diretrizes legais e as expectativas de modernização, competição e modicidade das tarifas dos serviços prestados em regime público pode ser estabelecida por procedimentos baseados em critérios que considerem tanto a vigilância do Estado sobre o acervo crítico para continuidade do serviço concedido quanto a liberdade assegurada ao ente privado para alocar seus ativos de modo a preservar suas condições de competição num mercado em constante transformação.

Não há tampouco razão para se vincular a reversão a uma suposta continuidade tarifária de longo prazo, após o término das atuais concessões. Na remota hipótese de que venham a ser assinados futuros contratos de concessão com o mesmo objeto, se esses vierem a ser celebrados com terceiros beneficiários da reversibilidade, não estarão vinculados às condições atuais. O atual patamar de tarifas do STFC decorre dos valores iniciais e das regras de reajuste e revisão estabelecidas no contexto de quase vinte anos atrás. A base tecnológica, os custos de produção e o nível de demanda são totalmente diferentes hoje e serão ainda mais a partir de 2025, de forma que não faz sentido defender a manutenção da relação de equilíbrio econômico-financeiro existente nos ajustes firmados em 1998. A equação financeira estabelecida em um contrato não se estende ao que lhe suceder, vez que depende das condições mercadológicas e tecnológicas do momento do ajuste e, ao menos em parte, da capacidade e do interesse da futura concessionária em agregar sinergias com outras atividades. 

Um novo contrato supõe uma nova equação econômico-financeira, que será gerada a partir das condições de execução do serviço. Essas, por sua vez, serão definidas em função da evolução da demanda e das políticas de universalização a serem estabelecidas. Não se pode pressupor que, em um setor de rápida evolução tecnológica, o cenário da prestação do STFC nos vinte anos seguintes a 2025, especialmente no que tange a custos e tecnologias disponíveis para a prestação do serviço, seja o mesmo vigente no atual período. Portanto, nada impede – ao contrário, recomenda-se – que ao se desenhar, ainda que em imaginação, os novos contratos, sejam atualizados patamares tarifários em função de uma nova avaliação dos custos da prestação do serviço ou ainda que se busquem tarifas inferiores às atuais por meio do próprio procedimento licitatório a ser realizado, nos termos do art. 89, III, da LGT.

Aquilo que se deve gerir permanentemente é o conjunto ótimo de ativos que, empregados diretamente na fruição do serviço, mostrem-se efetivamente críticos à sua continuidade. Nesse contexto, é inevitável reconhecer que, diante do caráter dinâmico da exploração de serviços de telecomunicações e da acelerada evolução tecnológica que marca o setor, determinados bens venham a se mostrar desnecessários à prestação do serviço. Não se trata aqui apenas de esgotamento de vida útil. Cuida-se de bens que, seja pela adoção de arranjos mais eficientes de alocação, seja pela introdução de novas tecnologias, não necessitam mais ser aplicados à prestação do STFC no âmbito da concessionária, ainda que possam ser aproveitados em outras atividades, seja pela prestadora ou por terceiros. Em tais casos, manter a reversibilidade sobre esses bens mostra-se medida prejudicial à eficiência empresarial e à própria modicidade tarifária, pois faz recair sobre a tarifa o custo de amortização de um bem que não mais é necessário à prestação do serviço. Mais prejudicial seria a manutenção da regra de reversibilidade sobre bens que jamais estiveram associados à prestação do serviço.

Todo esse arrazoado demonstra que, em se tratando sobretudo de imóveis, o critério de incidência da reversibilidade não pode prescindir de um exame caso a caso; não havendo justificativa para a aplicação de forma automática do instituto. Entendo que lógica harmoniza-se com o preceito insculpido no art. 3º, IV, do RCBR, no qual justamente se propôs a Agência a dar um conceito a bens reversíveis:

Art. 3º Para efeitos deste Regulamento, são adotadas as seguintes definições:

(...)

IV - Bens Reversíveis: equipamentos, infra-estrutura, logiciários ou qualquer outro bem, móvel ou imóvel, inclusive Bens de Massa, ou direito integrantes do patrimônio da Prestadora, de sua controladora, controlada ou coligada, indispensáveis à continuidade e atualidade da prestação do serviço no regime público; (destaque nosso)

Por força da redação regulamentar qualquer bem imóvel, indispensável à continuidade e atualidade da prestação do serviço deve ser tido como reversível. Por exclusão óbvia, imóveis desassociados dessa finalidade - como aquele examinado no presente procedimento - não o são.

Nos autos do Processo TC 024.646/2014-8, instaurado a partir de Relatório de Auditoria que avaliou a atuação da Anatel, nos anos de 1998 a 2014, no exercício das atividades de regulamentação, fiscalização, acompanhamento e controle de bens reversíveis foi expedido o Acórdão nº 3311/2015–TCU–Plenário, no bojo do qual fixaram-se diversas determinações e recomendações a respeito da matéria. Em um primeiro momento, a Agência opôs Embargos de Declaração, por meio do Ofício nº 154/2015/PR-Anatel de 29/12/2015, visando sanear aparentes contradições, omissões e obscuridades contidas no decisum. Resultante dessa medida, foi expedido o Acórdão nº 1809/2016–TCU–Plenário, pelo qual os Embargos foram parcialmente acolhidos. Ali, diante da alegação da Agência quanto a obscuridade no Acórdão embargado no que concerne à extensão do conceito de bens reversíveis, foram feitas as seguintes ponderações pelo Min. Relator Benjamin Zymler:

Inicialmente, ressalto que o conceito de bens reversíveis tem gerado inúmeras discussões. Diante disso e considerando que esse conceito é fundamental para o deslinde das questões analisadas neste processo, dediquei uma parte do meu voto anterior à conceituação jurídica dos bens reversíveis no âmbito da concessão de STFC.

Naquela oportunidade, destaquei que os bens reversíveis são aqueles afetados à prestação do serviço, que serão revertidos ao poder público ao término da concessão, independentemente de terem sido transferidos ao concessionário no momento da concessão ou de terem sido incorporados pelo concessionário ao serviço durante a execução do contrato.

Saliento que a referida afetação decorre do caráter essencial desses bens para a adequada prestação do serviço público concedido, como se observa na cláusula 21.1 dos contratos de concessão celebrados em 1998, a seguir transcrita:

"Cláusula 21.1.- Integram o acervo da presente concessão, sendo a ela vinculados, todos os bens pertencentes ao patrimônio da Concessionária e que sejam indispensáveis à prestação do serviço ora concedido, especialmente aqueles qualificados como tal no Anexo 1 - Qualificação dos Bens Reversíveis da Prestação do Serviço Telefônico Fixo Comutado Local. "

Ao tratar dessa questão, a cláusula 21.1 dos contratos de concessão celebrados em 2006 reiterou serem esses bens imprescindíveis, como se observa abaixo:

"Cláusula 22.1. - Integram o acervo da presente concessão, sendo a ela vinculados, todos os bens pertencentes ao patrimônio da Concessionária, bem como de sua controladora, controlada, coligada ou de terceiros, e que sejam indispensáveis à prestação do serviço ora concedido. especialmente aqueles qualificados como tal no Anexo 1 - Qualificação dos Bens Reversíveis da Prestação do Serviço Telefônico Fixo Comutado Local. "

Em consonância com esse entendimento, a própria Anatel editou o Regulamento de Controle de Bens Reversíveis (RCBR), cujo art. 3°, IV, assim define tais bens:

"IV- Bens Reversíveis: equipamentos, infra-estrutura, logiciários ou qualquer outro bem, móvel ou imóvel, inclusive Bens de Massa, ou direito integrantes do patrimônio da Prestadora, de sua controladora, controlada ou coligada, indispensáveis à continuidade e atualidade da prestação do serviço no regime público. "

Essa definição é consentânea com o conceito utilizado no meu voto que fundamentou o acórdão ora embargado, logo, entendo que ela pode ser adotada no âmbito deste processo, o que afastará a suposta ambiguidade apontada pela embargante.

Assim sendo, julgo que deve ser comunicado à Anatel que a definição sob comento foi considerada adequada pelo TCU.

Na parte dispositiva da decisão foi acordado esclarecer à Anatel que a definição de bens reversíveis constante do art. 3°, IV, do Regulamento de Controle de Bens Reversíveis (RCBR), editado por essa agência reguladora, foi considerada adequada pelo TCU (item 9.2.1). Pontua-se-se que, conquanto se encontre atualmente pendente de deliberação o Pedido de Reexame apresentado pela Agência, tal definição não foi objeto do inconformismo recursal. 

Das ponderações transcritas percebe-se que o Tribunal encareceu a observância da letra das regras contratuais e regulamentares, o que de forma alguma contraria o entendimento apresentado quanto à não reversibilidade do imóvel avaliado.

Nesse contexto, cumpre igualmente ponderar que a corrente discussão no âmbito do Congresso Nacional acerca da revisão do modelo de concessões no setor de telecomunicações, gira em torno de Projeto de Lei (PL nº 3.543/2015, da Câmara dos Deputados, protocolado no Senado Federal sob o PLC nº 79/2016) cuja justificação já contempla premissa semelhante àquela acima apresentada. Do documento em questão, ressalto os seguintes trechos:

Um ponto importante a ser destacado nesta discussão acerca da concessão como instrumento de política pública é que no cerne dessa outorga está a questão da reversibilidade dos bens devidos pela necessidade da continuidade do serviço prestado em regime público. A reversão está, assim, vinculada à necessidade de assegurar a continuidade da prestação do serviço concedido. A esse respeito, é pertinente a leitura dos fundamentos da reforma institucional do setor, constantes da Exposição de Motivos nº 231, de 10/12/1996, do Ministério das Comunicações:

(...)

A disciplina da reversão não deriva diretamente da LGT, já que, conforme art. 93, inciso XI, desse diploma legal, o Contrato de Concessão deve indicar os bens reversíveis, se houver. A reversibilidade pressupõe a identificação dos bens efetivamente indispensáveis à fruição do STFC. Sem embargo, tal tarefa, qual seja, a indicação dos ativos que integram o rol de bens reversíveis é bastante complexa, já que uma mesma infraestrutura de rede pode suportar a prestação de diversos serviços de telecomunicações. Tal fenômeno é usualmente descrito como ‘convergência tecnológica’.

Como resultado desse processo de convergência de redes, bens que outrora eram dedicados unicamente à prestação do STFC em regime público passaram a ser empregados, concomitantemente, para o provimento de outros serviços cujo regime jurídico de exploração não impõe obrigações de continuidade.

Dessa forma, reconhece-se a complexidade associada à definição dos limites da reversibilidade sobre o patrimônio da Concessionária. Contudo, é importante ressaltar que o objetivo do instituto da reversibilidade é preservar a continuidade do serviço, e não disputar a titularidade dos direitos de propriedade das redes. Assim, a continuidade dos serviços não requer que a propriedade das redes esteja nas mãos do poder público. Além disso, a tarefa regulatória associada ao controle e ao acompanhamento da evolução de todos os elementos de rede das Concessionárias parece demasiadamente custosa, senão inviável.

De outra forma, o zelo do princípio da continuidade em telecomunicações por meio de uma abordagem patrimonial é ineficiente, por ser essa tarefa extremamente complexa e custosa, e possivelmente ineficaz, na medida em que implica considerável risco de litígio judicial acerca dos bens. A gestão de direitos e de obrigações – dita como uma abordagem funcional - parece mais eficiente que a imposição de controle patrimonial.

Por oportuno, registra-se também entendimento judicial deste ano, proferido em sentença pela 5ª Vara Federal Cível de São Paulo - SP, em ação ordinária movida por outra concessionária de STFC (Telefônica Brasil S/A) em desfavor da Anatel (Processo nº 0014570-14.2014.403.6100). Naquele feito, a Interessada buscou o Poder Judiciário uma vez que a Agência lhe impôs condições para alienação de determinados bens imóveis que, embora tenham sido anteriormente úteis à prestação do serviço concedido, deixaram de sê-lo, tornando-se dispensáveis. Requereu, concomitantemente, a exclusão desses bens da RBR.

Ao acolher parcialmente o pedido da Telefônica, para determinar a exclusão da RBR da maior parte dos imóveis referenciados na petição inicial, o Juízo entendeu que, por se tratar de "imóveis desocupados, não utilizados na exploração da atividade objeto da concessão" não haveria fundamento para a negativa de sua desvinculação. Tal caso, em acréscimo às considerações acima tecidas e aos precedentes mencionados, ilustra, de forma pontual, que o entendimento por um critério de reversibilidade decorrente exclusivamente da utilização do bem na prestação do serviço encontra respaldo em posicionamentos que já vêm motivando decisões em outras esferas.

Por fim, e à luz das razões fáticas, jurídicas, econômicas e regulatórias que impõem o reconhecimento da não reversibilidade do imóvel da Data de Terras nº 10, verifica-se que sua dispensabilidade deve restar ratificada para os efeitos de cumprimento - nesse caso concreto - das disposições cautelares às quais se encontra submetida a Sercomtel, devendo ser atendido o requerimento por ela formulado.

Cumpre registrar que, por não se tratar de bem reversível, não há que se cogitar na aplicação ao caso do disposto no art. 17 do RCBR, referente às obrigações de depósito em conta bancária vinculada e aplicação de recursos na concessão decorrentes da alienação de bens que guardam aquela natureza.

IV - Da hipótese de "despatrimonialização da concessão"

Consta do Parecer nº 230/2018/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI 2621898), recomendação de que a decisão neste caso concreto examine ainda os riscos à continuidade da prestação do serviço em regime público, especialmente diante da possibilidade de despatrimonialização da concessão. As considerações tecidas no tópico anterior dirigem-se em grande medida a ponderar o critério que deve presidir o juízo de reversibilidade feito sobre a gestão patrimonial das concessionárias.

Tal recomendação também foi endereçada pela área técnica no Informe nº 31/2018/SEI/COUN1/COUN/SCO (SEI 2779949). Ali, em raciocínio que se amolda àquele acima exposto, destacou a SCO, em síntese, que o juízo acerca do patrimônio da concessionária indispensável para a prestação do serviço não pode desconsiderar questões de cunho tecnológico e econômico. Transcreve-se:

Qualquer análise que se faça em relação a esse assunto suscitará questões de cunho tecnológico e econômico. Boa parte dessa reversibilidade foi estabelecida no momento da concessão, quando havia uma demanda predominante no âmbito do STFC. Assim, há de se pressupor, o que se evidencia na prática, que a evolução tecnológica possa ter vindo a diminuir a necessidade de espaço físico para a prestação do STFC aos mesmos assinantes (ou, sobretudo, a um número cada vez menor - tendência atual). Consequentemente, não seriam necessários tantos imóveis para a prestação do STFC nas mesmas condições apresentadas no momento do repasse da concessão.

Obsolescência tecnológica e novas práticas de gestão atingem diretamente o acervo de bens reversíveis existentes nas empresas que prestam o STFC em concessão. O que outrora demandava grandes espaços físicos e tecnologia avantajada em dimensões, ora requer poucas áreas e equipamentos refinadíssimos, reduzindo consideravelmente os recursos anteriormente exigidos.

Ainda, nos termos da Análise nº 5/2015-GCIF, mencionada anteriormente, o Conselheiro ratifica tal consideração quando, no parágrafo 4.2.141, pondera que "observou-se que a manutenção de um estoque de capital reversível acima do ponto ótimo prejudica a obtenção de maiores níveis de eficiência e, consequentemente, de tarifas menores e mais competitivas frente a concorrentes que atuam em regime jurídico mais flexível".

Imperioso se torna reavivar que, desde a publicação da LGT, corroborada pelo RCBR, há a previsão de alienação, oneração ou substituição de bens reversíveis, mediante obrigatória aprovação prévia desta Agência, a qual deve considerar a garantia de continuidade e atualidade do serviço prestado no regime público, assim como o benefício decorrente para o usuário do serviço.

Como se pode notar, o legislador previu a garantia do serviço com a maleabilidade ofertada ao órgão regulador de apreciar a imprescindibilidade da necessidade do bem à concessão, provavelmente com uma visão futura de possíveis ajustes serem necessários, como expansão, atualização, redução do ativo e, até mesmo, reparação de falhas.

Perante toda a controvérsia, traz-se aqui o relato do Conselheiro Rodrigo Zerbone em seu Voto nº 186/2015-GCRZ, nos autos do supramencionado Processo nº 53500.025781/2011: "(...) embora a reversibilidade seja importante para garantir a atratividade do serviço concedido após o término do atual contrato de concessão, sua operação é dificultosa e impõe limitações à eficiência empresarial, o que pode ir contra o próprio bem jurídico tutelado, que é a continuidade do STFC em regime público. Isto impõe ao regulador a necessidade de encontrar um equilíbrio entre as iniciativas que ora privilegiam a intervenção regulatória ora a eficiência empresarial na gestão da reversibilidade no STFC". (destaque nosso)

O que se deve reforçar, mais uma vez, são os aspectos deletérios que visões de maximização do acervo patrimonial a qualquer preço podem ter sobre a prestação do serviço (ao resultarem em custos às concessionárias que afetam sua competitividade e sua produtividade) e que afetam, via reflexa, os próprios usuários (ausência ou menores ganhos de produtividade a serem compartilhados).

É importante reconhecer que a intervenção excessiva nos critérios de alocação de ativos pela concessionária, isto é, determinações que extrapolam os limites definidos em contrato, podem afetar o desempenho da companhia na medida em que reduz as possibilidades de ganhos decorrentes da alocação eficiente de seus ativos, colocando-a em desvantagem perante os demais operadoras de mercado.

Inclusive, dentre as intervenções impostas pelo Estado aos setores de tecnologia, aquelas afetas à alocação de recursos têm o potencial de serem as mais danosas, uma vez que a competitividade de empresas nesse segmento pressupõe a evolução sistemática do acervo patrimonial, sua modernização e, sem exceção, sua desmobilização. Essas premissas são coerentes com a própria evolução tecnológica e miniaturização típicas desses setores.

Assim, proposições que incidam sobre a dinâmica da eficiência alocativa exigem um exame preambular, de caráter técnico, de modo a evitar imposições que extrapolem o objeto da atuação regulatória e, nos casos mais extremos, imponham prejuízo ao desempenho da concessionária.

Embora seja certo que a evolução tecnológica implique alteração no uso de imóveis (redução do espaço ocupado por centrais etc), e que isso não possa ser ignorado pelo regulador ao buscar o "equilíbrio" mencionado pela área técnica ao referenciar o Voto nº 186/2015-GCRZ, no presente caso sequer se trata dessa hipótese, vez que o bem em questão não era destinado ao suporte de qualquer atividade voltada à prestação do serviço. Ou seja, mais grave ainda seria decisão que imobilizasse a alocação desse ativo.

Essas observações igualmente destinam-se a endereçar o ponto levantado pela PFE concernente a eventual necessidade de uma visão mais ampla da questão, ressaltando que a existência de diversos outros pedidos similares ao ora analisado em tramitação corresponder à aludida "despatrimonialização" pela dilapidação do patrimônio efetivo dos bens reversíveis, sem que haja uma necessária substituição por bens que efetivamente poderão ser revertidos ao Poder Público.

Em primeiro lugar, repise-se que a operação em apreço não cuida da substituição de um bem reversível por um bem de terceiro, ou ainda mais da alienação de um bem reversível. Por força das disposições vigentes na LGT, no RCBR e nos Contratos de Concessão, não há disciplina específica que imponha vedação ou sequer condicionamentos à alienação, à substituição ou à oneração de bens não reversíveis, como o imóvel localizado na Data de Terras nº 10. A figura da ratificação de dispensabilidade, nos moldes acima demonstrados, decorre de determinação administrativa com a qual se objetivou criar um filtro para que bens reversíveis não fossem alienados sem o conhecimento e a anuência da Anatel.

Assim, por óbvio, a alienação de bem não reversível não tem o condão de reduzir o acervo dos bens efetivamente reversíveis.

A existência de outros pedidos em tramitação tampouco deve servir de obstáculo para a ratificação de dispensabilidade de um determinado imóvel não reversível. Por força do histórico e dos argumentos acima levantados evidencia-se que jamais houve a fixação normativa (legal ou infralegal) de um determinado "nível patrimonial" para as concessionárias do STFC, pelo contrário. A própria LGT prevê inclusive a possibilidade de alienação dos bens reversíveis, desde que anuída pela Agência.

Os pedidos de ratificação em tramitação vêm sendo objeto de procedimentos específicos, como este sob apreciação. À luz do exposto entende-se que a cada um deles deva ser aplicado o critério da indispensabilidade do bem para a prestação do serviço concedido, e não dos valores desses bens - sejam eles individual ou globalmente considerados.

  V - Da atual situação da Sercomtel

Tal entendimento é particularmente relevante no caso concreto uma vez estando a Sercomtel sob acompanhamento especial por parte desta Agência, por conta da fragilidade de sua situação econômico-financeira, que justificou inclusive a instauração de processo para avaliação acerca da aplicação de caducidade.

Dessas disposições fica evidenciado que o juízo a respeito da dispensabilidade desse ativo possui inegável reflexo sobre um dos meios de soerguimento econômico-financeiro da empresa. 

É certo que o cenário de recuperação judicial do Grupo impõe maior cautela nas ações da Agência em relação à concessionária, notadamente no que se refere ao controle dos bens reversíveis. No sentido dessa maior cautela e por tal razão, encontra-se a Sercomtel submetida as previsões do já citado Acórdão nº 366, de 1º/9/2017 (SEI 1846303), proferido pelo Conselho Diretor no âmbito dos autos nº 53500.007234/2013-36, dentre as quais destacam-se as seguintes:

d) determinar à SERCOMTEL S.A. TELECOMUNICAÇÕES que se abstenha de alienar e/ou onerar qualquer bem móvel ou imóvel integrante de seu patrimônio, bem como de suas controladas ou coligadas, sem a comprovação prévia, ratificada pela Agência, da dispensabilidade de tais bens para a continuidade do serviço de telecomunicações prestado em regime público, excetuando-se os bens em desuso, cuja guarda traga risco ambiental ou a saúde pública (sucatas);

e) fixar que o descumprimento da alínea "a" acarretará à SERCOMTEL S.A. TELECOMUNICAÇÕES multa igual a duas vezes o valor do bem alienado e/ou onerado e, em caso de risco à continuidade do serviço de  telecomunicações prestado em regime público, a respectiva reposição de tal bem por bem idêntico ou outro com as mesmas características e que cumpra as mesmas funções que o bem  alienado;

A imposição dessas determinações já cria restrições sobre a gestão da totalidade de bens da Sercomtel (reversíveis ou não; móveis ou imóveis) que correspondem a um exame prévio por esta Agência de toda e qualquer alienação e oneração. Percebe-se, contudo, que a cautela adotada diz respeito a uma verificação prévia e não a uma vedação indistinta de operações envolvendo os bens.

Nesse contexto, o exame do imóvel feito nos autos revela que a negativa à ratificação de sua dispensabilidade atentaria contra (i) as disposições legais, regulamentares e contratuais; (ii) a gestão eficiente de ativos pela concessionária (com reflexos negativos inclusive para os usuários do serviço); e principalmente (iii) contra um dos meios de recuperação econômico-financeira apontados pela própria empresa como iniciativa necessária.

Enfim, a circunstância fática (estado de fragilidade econômico-financeira) não é causa ensejadora de afetação do bem. Caso contrário, teria o condão de impor, no caso concreto, uma gestão ineficiente de ativos. Ou seja, uma contradição à pretensão legislativa, consoante trecho da Exposição de Motivos nº 231, de 10/12/1996, do Ministério das Comunicações, transcrito alhures.

Por derradeiro, considerando o cenário fático e as preocupações regulatórias concernentes às perspectivas operacionais da Sercomtel, entendo haver maturidade regulatória suficiente para que se compreenda que uma abordagem dogmática e absolutista sobre o instituto da reversibilidade não é a melhor fiadora da continuidade da prestação dos serviços. É a efetiva realização de investimentos, aspecto indissociável da gestão eficiente dos bens, que melhor endereça o objetivo de "garantir, a toda a população, o acesso às telecomunicações, a tarifas e preços razoáveis, em condições adequadas", nos termos do art. 2º da LGT.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, propõe-se ao Conselho Diretor que em atendimento ao requerimento apresentado pela Sercomtel S.A. Telecomunicações, ratifique a dispensabilidade do bem imóvel localizado na Data de Terras nº 10, Quadra nº 4, Bairro Aeroporto, no Município de Londrina, Estado do Paraná, registrado sob a matrícula nº 3.555 junto ao 3º Ofício de Registro de Imóveis de Londrina.

Nota de rodapé

1 A discussão nos referidos autos girou em torno, sobretudo, dos efeitos da reversibilidade sobre bens imóveis administrativos e das diretrizes a serem observadas, paralelamente ao disposto no RCBR, em operações que envolvam bens reversíveis e que dependam de anuência da Anatel. A deliberação adotada pelo Conselho Diretor, em sua 842ª Reunião, foi a de revogar, por razões de conveniência e oportunidade, as diretrizes de ambos os temas com fundamento no Voto nº 3/2018/SEI/PR (SEI 2327238). Em síntese, prevaleceu o entendimento de que o estabelecimento de diretrizes deverá se dar no âmbito da revisão do RCBR, e não em caso concreto.

 


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Documento assinado eletronicamente por Leonardo Euler de Morais, Conselheiro, em 25/10/2018, às 17:57, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 23, inciso II, da Portaria nº 912/2017 da Anatel.


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Referência: Processo nº 53500.070758/2017-97 SEI nº 3401271