Boletim de Serviço Eletrônico em 23/12/2024
Timbre

Voto nº 15/2024/AF

Processo nº 53500.113347/2023-41

Interessado: TIM S/A, CLARO S.A., Telefonica do Brasil S/A

CONSELHEIRO

ALEXANDRE FREIRE

ASSUNTO

Pedido de anulação de dispositivos do Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações, aprovado pela Resolução nº 765, de 6 de novembro de 2023.

EMENTA

PROCESSO ADMINISTRATIVO REGULATÓRIO. DIREITO DO CONSUMIDOR. SUSPEIÇÃO. PETIÇÕES EXTEMPORÂNEAS. NÃO CONHECIMENTO. ENUNCIADO Nº 21 DA ANATEL. PEDIDOS DE INGRESSO DE TERCEIROS INTERESSADOS INTEMPESTIVOS E SEM CONTRIBUIÇÕES PARA O DEBATE. INDEFERIMENTO. ENUNCIADO Nº 21 DA ANATEL. PEDIDO DE ANULAÇÃO DO RGC. PERDA DE OBJETO QUANTO AO ART. 39, § 2º, DO RGC, POR REVOGAÇÃO. NULIDADE DOS ARTS. 21, § 3º, INC. IV (EM PARTE), 23, 31, § 2º, 34, § 2º, 39, CAPUT (EM PARTE) E § 1º (POR ARRASTAMENTO), 74, E DO ART. 72, INC. I, ALÍN. "A" (POR ARRASTAMENTO), DEMONSTRADA. VALIDADE DAS DEMAIS DISPOSIÇÕES. ATENDIMENTO DOS OBJETIVOS DO DECRETO PRESIDENCIAL Nº 11.378, DE 18 DE OUTUBRO DE 2023, AO PROGRAMA DE APRIMORAMENTO DA QUALIDADE DA REGULAÇÃO BRASILEIRA (QUALIREG), ÀS DIRETRIZES DA OCDE, AOS ODS DA AGENDA 2030 DA ONU. INTERPRETAÇÃO DA REGULAMENTAÇÃO. PEDIDO PARCIALMENTE DEFERIDO. DETERMINAÇÕES DIVERSAS AO GRUPO DE IMPLANTAÇÃO.

1. Embora o eg. Superior Tribunal de Justiça entenda que é dispensada a juntada dos atos constitutivos da pessoa jurídica, excepciona-se a sua aplicação quando há dúvidas sobre a existência de poderes de representação.

2. Nos termos do entendimento pacificado do eg. Superior Tribunal de Justiça, a arguição de suspeição é faculdade exclusiva das partes, não se estendendo a terceiros interessados.

3. Consoante entendimento pacificado no eg. Supremo Tribunal Federal, não se aplicam os institutos de impedimento e suspeição referidos no CPC nos processos objetivos, cujo escopo não se relaciona à tutela mediata de interesses subjetivos das partes, mas sim para a avaliação da conformidade de normas do ordenamento jurídico em relação às normas superiores.

4. A coautoria de trabalhos acadêmicos ou a coincidência de instituições frequentadas pelo excepto e pelo autor de parecer juntado ao processo não ensejam o reconhecimento de suspeição por amizade íntima.

5. Afasta-se a ocorrência de conflito de interesses, pois não há demonstração de que o Vistor tenha qualquer vínculo, direto ou indireto, com os requerentes no processo.

6. As petições protocoladas após a data de divulgação da pauta de Reunião na Biblioteca e na página da Agência na internet não devem ser recebidas nos termos do Enunciado nº 21 da Anatel, exceto quando trouxerem contribuições relevantes para o debate, a critério do Conselho Diretor.

7. Os pedidos de ingresso de terceiros apresentados após o limite temporal estabelecido no Enunciado nº 21 da Anatel devem ser indeferidos.

8. Com amparo no entendimento do STF, a revogação superveniente de dispositivo regulamentar impugnado em pedido de anulação acarreta a perda ulterior do seu objeto, restando esta prejudicada quanto a esse. Assim, declara-se a perda de objeto quanto à anulação do art. 39, § 2º, do RGC.

9. Nos termos do art. 21 do Decreto nº 10.411/2020, é válido o ato normativo aprovado sem o cumprimento das formalidades ali estatuídas.

10. Ressalvados os arts. 21, § 3º, inc. IV (em parte), 23, 31, § 2º, 34, § 2º, 39, caput (em parte) e § 1º, 74, e, por arrastamento, o art. 72, inc. I, alín. "a", os pedidos de anulação não demonstram a nulidade das disposições impugnadas à luz da legislação que lhe é superior.

11. O art. 23 do RGC é nulo por violar o art. 51 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), aprovado pela Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, ao impossibilitar a alteração de conteúdo de contrato a priori, mesmo que seja de comum acordo entre as partes, incorrendo no risco de, na intenção de proteger o consumidor, prejudicá-lo ao obrigá-lo a migrar para uma oferta menos favorável às suas necessidades.

12. O art. 31, § 2º, do RGC, é nulo porque permite a migração automática do consumidor sem garantir que a nova oferta seja compatível com suas necessidades, por se basear somente no critério econômico, podendo gerar desequilíbrio contratual e violar o princípio da boa-fé objetiva, afrontando o art. 422 do Código Civil e o art. 4º, III, do CDC. Ressalva-se que essa nulidade não impede a aferição da conformidade da conduta da prestadora à luz do art. 39 e do art. 54 do CDC. Determina-se ao Grupo de Implantação que avalie o emprego de aplicações de ciências comportamentais em prol do bem-estar do consumidor.

13. O art. 34, § 2º, do RGC, numa avaliação mais detida, ao se imiscuir na forma pela qual os colaboradores das prestadoras são remunerados pela captação de clientes, eleva os custos de transação sem demonstração dos benefícios, imiscuindo-se na autonomia negocial em relações que não são regidas pelo CDC. Sem uma avaliação minimamente precisa de suas consequências, apresenta potencial de abuso regulatório.

14. Os arts. 21, § 3º, inc. IV, e 39, caput, ao fazerem referência a expressões que aludem ao “momento da contratação”, incorrem em parcial violação ao art. 2º, § 1º, da Lei nº 10.192/2002, ao possibilitar, na prática, a proibição de reajustes de ofertas por período superior a um ano, criando mais restrições que o escopo da norma em questão. Por sua vez, o art. 39, § 1º, é nulo por arrastamento consequente da nulidade da expressão eliminada do caput.

15. O art. 74 do RGC viola os arts. 109, inc. II, da LGT, para os serviços concedidos e prestados em regime público, e 129 c/c 130 e 109, inc. II, da LGT, ao impor a prestação de serviços gratuitos, ressalvados os de emergência e o SAC, que são objeto de regulamentação específica. Destaca-se, por outro lado, que a cobrança por serviços não prestados, como a cobrança de serviços de dados sem a devida contraprestação, pode caracterizar prática abusiva nos termos do art. 39 do CDC.

16. A decisão fundamenta-se no Decreto Presidencial nº 11.738, de 18 de outubro de 2023, que dispõe sobre o Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação (PRO-REG), no Decreto nº 12.150, de 20 de agosto de 2024, que instituiu a Estratégia Nacional de Melhoria Regulatória - Estratégia Regula Melhor e no Memorando de Entendimento firmado entre Brasil e Estados Unidos, com o objetivo de prestigiar boas práticas regulatórias. Esse programa adota princípios, estratégias, ações e procedimentos destinados a promover a melhoria da qualidade da regulação por meio do aperfeiçoamento contínuo e simplificação do processo regulatório.

17. A fundamentação está alinhada com o que a OCDE reiteradamente vem recomendando quanto à inibição dos dark patterns para a promoção do bem-estar do consumidor.

18. Identifica-se sintonia com o Objetivo 16 (metas 16.3 e 16.7) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas, com a meta 16.3 das metas brasileiras, devidamente revisadas pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), voltados à universalização do acesso à justiça e à construção de instituições eficazes, responsáveis e inclusivas, na medida em que se busca uma relação mais harmoniosa entre consumidores e fornecedores.

19. Pedido de anulação parcialmente deferido. Interpretação da regulamentação quanto ao caput do art. 21, para restringir o alcance à oferta principal, e quanto ao §2º do art. 36, para fixar que é possível a renovação automática em caso de consentimento expresso. Determinação ao Grupo de Implantação, no que diz respeito ao registro de ofertas (para excluir facilidades adicionais do alcance do art. 21, caput), à migração automática à caracterização da renovação automática (a qual não será caracterizada quando houver consentimento expresso do consumidor) e à régua de suspensão (para operacionalização da possibilidade de contratação granular de serviços mediante consentimento expresso e informação em linguagem simples), que faça as devidas conformações no Manual Operacional do RGC para compatibilização com o escopo da presente deliberação, empregando-se aplicações das ciências comportamentais.

REFERÊNCIAS

Constituição Federal.

Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 - Código de Defesa do Consumidor.

Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, Lei Geral das Telecomunicações (LGT).

Lei nº 9.784 , de 29 de janeiro de 1999 - Lei do Processo Administrativo Federal.

Lei nº 10.192, de 14 de fevereiro de 2001, que dispõe sobre medidas complementares ao Plano Real e dá outras providências.

Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil.

Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 - Código de Processo Civil.

Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 - Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).

Lei nº 13.848 de 25 de junho de 2019 - Lei Geral das Agências Reguladoras.

Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019 - Lei de Liberdade Econômica.

Decreto nº 6.523, de 31 de julho de 2008, que regulamenta a Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, para fixar normas gerais sobre o Serviço de Atendimento ao Consumidor - SAC (revogado).

Decreto nº 10.411 de 30 de junho de 2020, que regulamenta a análise de impacto regulatório, de que tratam o art. 5º da Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019, e o art. 6º da Lei nº 13.848, de 25 de junho de 2019.

Decreto nº 11.034, de 5 de abril de 2022, que regulamenta a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 - Código de Defesa do Consumidor, para estabelecer diretrizes e normas sobre o Serviço de Atendimento ao Consumidor.

Decreto nº 11.704, de 14 de setembro de 2023, que institui a Comissão Nacional para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

Decreto nº 11.738, de 18 de outubro de 2023, que dispõe sobre o Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação - PRO-REG.

Resolução nº 73, de 25 de novembro de 1998, que aprova o Regulamento dos Serviços de Telecomunicações

Regimento Interno da Anatel, aprovado pela Resolução nº 612, de 29 de abril de 2013.

Resolução Anatel nº 632, de 7 de março de 2014 (revogada), que aprova o Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações – RGC.

Resolução nº 709, de 27 de março de 2019, que aprova o Regulamento Geral de Numeração - RGN.

Resolução Anatel nº 765, de 6 de novembro de 2023, que aprova o Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações.

Resolução Anatel nº 768, de 19 de agosto de 2024, que revoga, altera Resoluções expedidas pela Anatel, aprova o Regulamento de Universalização do Serviço Telefônico Fixo Comutado Prestado no Regime Público, e o Modelo de Contrato de Concessão do Serviço Telefônico Fixo Comutado na modalidade Local e o Regulamento de Tarifação do Serviço Telefônico Fixo Comutado Prestado Destinado ao Uso do Público em Geral - STFC.

Portaria GM/MDIC nº 69, de 3 de abril de 2023.

Enunciado nº 21, da Súmula da Anatel.

Análise nº 54/2023/AF (SEI nº 10406893).

Análise nº 4/2024/RG (SEI nº 11509210).

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RELATÓRIO

Ao analisar as disposições atacadas no RGC recentemente aprovado pela Agência, o ilustre Conselheiro Raphael Garcia assim se manifestou em sua judiciosa fundamentação:

os dispositivos relacionados ao Sistema de Registro de Oferta (arts. 21 e 23) não padecem de qualquer ilegalidade, destacando-se que a Tim S.A. apenas pretende reabrir uma discussão já encerrada no Conselho Diretor, sendo que esse problema foi devidamente endereçado em Análise de Impacto Regulatório (AIR);

as disposições relacionadas ao Reajuste de Ofertas (arts. 21, § 3º, inc. IV, e 39) decorrem de conclusão desenvolvida em AIR, que identificou a falta de informação adequada sobre as condições de contratação como um problema persistente para o consumidor. Acrescentou que:

não há qualquer óbice formal para que a Anatel regule a matéria dessa forma;

a avaliação da proporcionalidade dessa regra não deve se limitar aos seus custos e benefícios, tendo sido realizada na AIR, onde a alternativa decisória escolhida é resultado de um juízo de ponderação entre os direitos fundamentais patrimoniais e de livre iniciativa das prestadoras, e os benefícios da nova regra para os consumidores, ponto ratificado pela PFE/Anatel em seu parecer;

as regras vigentes, que estabeleciam diversas formas de se informar o consumidor, não surtiram o efeito desejado;

o antigo RGC garantia ao consumidor, entre outros direitos, o prévio conhecimento e a informação adequada sobre as condições de contratação, prestação, periodicidade e índice aplicável em caso de reajuste;

apesar disso, a AIR ainda identificava a falta de informação adequada quanto às condições da contratação como um problema regulatório a ser solucionado, indicando que a regra então vigente ainda não surtia o efeito desejado;

embora a legislação não tenha nenhum comando expresso quanto à possibilidade de adoção de datas-base, não há nenhuma vedação para a regulação da matéria pela Anatel;

sobre a migração automática de Ofertas (Art. 31, §§1º e 2º), destacou que:

a intenção do novo RGC é estimular a prática de ofertas mais longevas para facilitar a sua compreensão pelo consumidor, sendo responsabilidade da prestadora gerenciar melhor o relacionamento com os seus clientes nesse aspecto;

espera-se que essa migração seja temporária, até que o consumidor possa buscar uma nova oferta que melhor satisfaça o seu bem-estar, considerando que a ausência desse comprometimento poderia prejudicar o seu bem-estar;

nos termos do Decreto nº 10.411/2020, "a inobservância ao disposto neste Decreto não constitui escusa válida para o descumprimento da norma editada e nem acarreta a invalidade da norma editada" e que, ainda assim, o dispositivo foi objeto de análise macro na AIR desenvolvida; e

o art. 64 do RIA permite emendas ao texto original por qualquer integrante do Conselho Diretor;

sobre as regras voltadas à oferta por canais terceirizados (Art. 34, §§ 1º e 2º), as alegações das prestadoras não merecem prosperar, pontuando que:

a ausência de consulta pública e de AIR não ensejam a anulação da disposição;

a disposição comentada é direcionada ao telemarketing e visa a coibir práticas predatórias e abusivas de representantes comerciais, proteger dados pessoais de consumidores e prevenir a ocorrência de fraudes em seu detrimento; e

discutir o mérito da proposta é incompatível com o pedido de anulação, sendo que eventual ineficiência da proposta pode ser objeto de estudo mediante avaliação de resultado regulatório (ARR);

não há vício na disposição associada à renovação automática de Oferta com Prazo de Permanência (art. 36, § 2º), salientando-se que se trata de proibição à renovação automática de ofertas que estabeleçam uma contrapartida, em que o consumidor poderá aderir, desde que de forma expressa;

acerca dos arts. 70 a 74, que tratam do impedimento de cobrança de assinatura durante a suspensão parcial:

não restaram demonstrados os prejuízos financeiros alegados pelas prestadoras;

os serviços prestados durante a suspensão não impõem custos aos consumidores, como o recebimento de chamadas e a realização de chamadas para serviços públicos de emergência, representando custos marginais para as próprias prestadoras, que não demonstraram o prejuízo inequívoco daí resultante;

o novo RGC desonerou as prestadoras de várias obrigações existentes no RGC revogado nos diversos serviços (SMP, SeAC, SCM e STFC), o que torna essa cobrança ainda mais injustificada;

a discussão sobre modelos de custos tem cabimento apenas na relação entre concorrentes para fins de aplicação do PGMC, não fazendo sentido no que diz respeito às relações entre prestadoras (fornecedoras) e usuários (consumidores);

as multas contratuais e os juros de mora já seriam incentivos suficientes para incentivar o adimplemento contratual; e

houve realização de exaustivos debates e análise, em obediência ao Decreto nº 10.411/2020;

o prazo para rescisão (art. 73) foi objeto de estudo, tendo sido rejeitada alternativa regulatória de sua redução, pois esta se revelou prejudicial tanto aos usuários quanto às prestadoras, destacando-se que esse prazo já constava na norma revogada, não havendo qualquer inovação regulatória neste particular;

a assimetria regulatória (art. 90) não é novidade no setor e já constava do RGC revogado, assim como em outros atos normativos, a exemplo do Decreto do SAC (Decreto nº 6.523/2008), cujo art. 3º, § 2º, dispensava os fornecedores de televisão por assinatura com até cinquenta mil assinantes da disponibilidade ininterrupta do SAC, situação na qual ele seria submetido à regulamentação setorial. Sem prejuízo, destacou que:

o CDC não proíbe o regramento assimétrico, chamando a atenção para a exposição da PFE/Anatel, no sentido de que o entendimento do eg. Supremo Tribunal Federal, na ADI 7416, invocado por Telefônica e Claro em seus arrazoados, não tratou da assimetria, mas sim da constitucionalidade de obrigação sobre disponibilidade de informação (mais especificamente, sobre a entrega diária de velocidade de recebimento e envio de dados pela rede mundial de computadores) exigível de todas as prestadoras indistintamente em Lei Estadual;

a medida visa a promover a competitividade no setor;

o eg. Superior Tribunal de Justiça já tem entendimento pacífico no sentido de que é possível esse tratamento assimétrico, nos termos do Enunciado nº 608 de sua Súmula de Jurisprudência, assim redigido:

Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão;

a disposição em análise busca compatibilizar o tratamento favorecido às empresas de pequeno porte e a proteção ao consumidor, sem que, com isso, reste fragilizada a força normativa do CDC; e

as manifestações (petições, pareceres e demais anexos) juntadas após a inclusão do processo em pauta de Reunião do Conselho Diretor não devem ser conhecidas.

Ao final, votou:

pela improcedência dos pedidos de anulação apresentados por TIM S/A, OI S/A - Em Recuperação Judicial, TELEFÔNICA BRASIL S/A e CLARO S/A;

pelo não conhecimento das petições extemporâneas (11596399, 11596663, 11596717, 11613522, 11613288 e 11613672);

por determinar o arquivamento dos autos.

Em 29 de abril de 2024, expediu-se o Ofício nº 65/2024/AF-ANATEL (SEI nº 11845109) às áreas técnicas solicitando diligências sobre a possibilidade de aperfeiçoamento de algumas disposições questionadas (arts. 31, 36, caput e § 2º, e 74) à luz de referenciais teóricos das ciências comportamentais - notadamente sobre a possibilidade da aplicação de nudges - e sobre os arts. 21, § 3º, inc. IV, e 34, do RGC, no que diz respeito, para estes últimos, ao período necessário para uma avaliação adequada de seu resultado regulatório.

Em 28 de maio de 2024, o Instituto de Defesa de Consumidores (IDEC), apresentou manifestação no processo (SEI nº 12050064) aduzindo o seguinte:

o Conselheiro-Vistor estaria agindo em conflito de interesses por ter relação de proximidade com o signatário do parecer juntado ao processo, pois "o único interesse que fundamenta esta decisão de estudos complementares é o de atender as recomendações do parecerista que defende interesses das prestadoras, que por sua vez utilizam da relação de influências mútuas entre o Conselheiro e o parecerista para impedir a Agência de aplicar a norma já aprovada", acrescentando, ainda, que o Vistor não disporia da imparcialidade necessária para a apreciação do caso e que estaria agindo em conflito de interesses nos termos do art. 5º da Portaria nº 828, de 5 de agosto de 2010, do art. 4º, da Lei nº 12.813, de 16 de maio de 2013 (Lei de Conflito de Interesses), do art. 8º-B, inc. VII, da Lei 13.848/2019 (Lei Geral das Agências Reguladoras) e do art. 20 da Lei 9.784/99, o que seria decorrente de uma relação profissional de amizade publicamente declarada com uma pessoa que, segundo alegado, "exerce influência direta" sobre o Vistor;

o Vistor estaria em desvio de poder e desvio de interesse ao postergar indevidamente o início da vigência do novo RGC; e

tem legítimo interesse para se habilitar como terceiro interessado, nos termos do art. 9º, inc. III, da Lei 9.784/1999.

Em 29 de maio de 2024, por meio do Informe nº 50/2024/PRRE/SPR (SEI nº 11967287), as áreas técnicas encaminharam resposta à diligência a que se refere o Ofício nº 65/2024/AF-ANATEL (SEI nº 11845109), conforme sintetizado a seguir:

ponderam inicialmente que o procedimento de anulação de ato normativo não é a instância adequada para se rever o mérito do RGC, por ser destinado apenas para a avaliação da validade ou da invalidade do ato impugnado, sendo que nova revisão do RGC dependeria de inclusão em agenda regulatória;

no RGC anterior, identificou-se problema regulatório associado à ausência de clareza de oferta, em que as prestadoras não praticavam as condições previstas em seus planos de serviços, mas sim em promoções. Nesse contexto, o consumidor teria maior dificuldade de compreender os termos da oferta apresentada.

para mitigar esse cenário, propôs-se harmonizar a nomenclatura das ofertas e vedar a sobreposição de instrumentos aplicáveis a uma relação contratual, com o objetivo de tornar as ofertas mais fidedignas ao consumidor final e aumentar a transparência da operadora;

asseverou-se que as promoções poderiam ser encerradas a qualquer tempo, colocando em xeque a segurança esperada pelo consumidor nesse processo, e que não se observou a ocorrência dessa prática em outros países. Como solução para esse problema regulatório, eliminou-se a distinção entre oferta e promoção, trabalhando-se apenas com a nomenclatura “oferta”;

o então Conselheiro Emmanoel Campelo, relator do projeto no Conselho Diretor, manifestou-se pelo seu acolhimento, no que foi seguido pelo Conselheiro Vicente Aquino, quando proferiu seu Voto-Vista, que destacou que essa mudança de entendimento é necessária para permitir a comparação de ofertas entre as diversas prestadoras;

em relação aos questionamentos apresentados, trouxeram-se as seguintes considerações:

art. 31, § 2º: nos termos do voto-vista do Conselheiro Vicente Aquino, a manutenção de oferta de igual ou menor valor (art. 31, § 2º, do RGC) após a sua expiração é uma solução que causa menos transtornos ao consumidor do que a suspensão dos serviços;

art. 36, § 2º: a multa por rescisão antecipada possui uma racionalidade própria, tendo afirmado, ainda, que “não é possível aderir apenas a uma parte da Oferta, e sim somente com todos os seus termos (no caso, multa rescisória)”;

art. 74: tem o objetivo de prevenir o endividamento do consumidor, sugerindo que essa proibição seja mantida;

art. 34: após considerações sobre o regime do Decreto nº 10.411/2020 para a ARR, optou-se por não incluir disposições do RGC na agenda de ARR, “mas sim iniciar o procedimento de monitoramento regulatório de resultados do Regulamento, nos termos do Informe nº 18/2024/PRRE/SPR”.

Registrou que o RGC se enquadra em três das cinco hipóteses do art. 13, § 3º, do Decreto nº10.411/2020, que autorizam a ARR, sendo que bastaria a ocorrência de uma delas para se deflagrar tal avaliação.

No entanto, pontuou que a experiência tem demonstrado que a realização de ARR tem sido mais exitosa em períodos de vigência maiores e que o monitoramento se difere da ARR “por ser um processo contínuo, periódico, durante o qual são analisados a implementação da regulação e seu desempenho, por meio de indicadores, com o objetivo de identificar eventuais problemas e progressos, inclusive indicando quando a ARR precisa ser conduzida.”

Assim, sugeriu que a ARR do RGC seja deflagrada após cinco anos de sua entrada em vigor, salvo situação em que o processo de monitoramento indique algum ponto que necessite ser mais bem estudado pela ARR;

art. 21, § 3º: considerou que a Anatel está implementando sistema próprio (“Busca Ofertas”) para a criação de inteligência de negócios que permita a comparação dos diversos atributos das ofertas postas à disposição do consumidor, conferindo maior clareza e transparências às práticas contratuais.

Por meio dos Ofícios nº 164/2024/AF-ANATEL (SEI nº 12233797), nº 165/2024/AF-ANATEL (SEI nº 12248305),  nº 166/2024/AF-ANATEL (SEI nº 12248477) e nº 167/2024/AF-ANATEL (SEI nº 12248902), determinou-se diligências para que TIM S.A, Oi S.A. - Em Recuperação Judicial, Telefônica Brasil S.A., Claro S.A. trouxessem estudos e informações a respeito das repercussões dos arts. 34 e 74 do novo RGC.

Em suas respostas (SEI nº 12328904 - Telefônica,  12334746 - Claro, nº 12328904 - TIM e nº 12378385 e nº 12433145 - Oi), no geral, reiteraram os argumentos jurídicos já apresentados e trouxeram estudos anedóticos. No entanto, chama-se a atenção para as manifestações da Oi, que procedeu a uma apresentação detalhada da estruturação das parcerias com terceiros colaboradores na captação de clientes.

Por meio da Petição SEI nº 12467554, a Associação NEO pediu o ingresso no feito e juntou parecer do Professor Floriano de Azevedo Marques Neto.

É o relatório.

DAS CONSIDERAÇÕES POR PARTE DESTE CONSELHEIRO

A presente fundamentação encontra-se dividida em nove partes. Na primeira, avalia-se a exceção de suspeição e arguição de conflito de interesses, considerando seus pressupostos formais e materiais, com estudo sobre a imparcialidade da atuação do Vistor e sobre as circunstâncias que levaram ao pedido de vistas, sem prejuízo da avaliação de indícios da prática de ato de litigância de má-fé. Na segunda, examina-se o recebimento de petições extemporâneas protocoladas após o Acórdão nº 98, de 18 de abril de 2024 (SEI nº 11848257), por meio do qual não se conheceu de petições da Algar Telecom S.A. e da Telcomp. Na terceira, estudam-se os pedidos de ingresso apresentados pelo IDEC e pela Associação NEO. Na quarta, declara-se prejudicado o pedido de anulação do art. 39, § 2º, do RGC. Na quinta, discorre-se sobre a validade das disposições questionadas. Por fim, faz-se a conformação do objeto do presente voto com o Decreto nº 11.738, de 18 de outubro de 2023, que dispõe sobre o Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação (PRO-REG), com as recomendações de boas práticas regulatórias do Programa de Aprimoramento da Qualidade da Regulação Brasileira (Quali-REG), com as boas práticas regulatórias recomendadas pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU).

 

I - Sobre a suspeição arguida  

 

Neste tópico, são analisados os argumentos apresentados na Petição (SEI nº 12050064) do Instituto de Defesa de Consumidores (IDEC), em que se alega a suspeição do Conselheiro Vistor.  

A análise será dividida em dois momentos: inicialmente, serão examinado os aspectos formais que indicam a inadmissibilidade da suspeição; em seguida, os argumentos de mérito serão avaliados.  

Desde já, destaca-se que a suspeição arguida apresenta vícios formais que inviabilizam seu conhecimento. Contudo, em respeito à relevância do tema e aos princípios da transparência e da integridade, algumas questões de mérito serão abordadas.  

 

I.a - Inadmissibilidade formal da suspeição  

 

Os aspectos formais que impossibilitam a admissibilidade da suspeição serão tratados conforme a seguinte estrutura: ausência de comprovação de representação legal e estatutária da peticionária, ilegitimidade do terceiro interessado para arguir suspeição e descabimento de arguição de suspeição em processo objetivo.  

Qualquer uma dessas razões, isoladamente, já seria suficiente para que a suspeição não fosse conhecida.  

 

I.a.1 - Ausência de poderes de representação  

 

Não foram apresentados os atos constitutivos da entidade peticionária nem os instrumentos de mandato dos signatários, o que impede a verificação da legitimidade de representação. Tal omissão configura falha processual significativa.  

Embora o Superior Tribunal de Justiça tenha entendimento de que a juntada de atos constitutivos pode ser dispensada, isso se aplica apenas quando não há dúvidas fundadas sobre a validade da representação (AgInt no AREsp n. 2.230.102/RN, Rel. Ministro Humberto Martins). No presente caso, a ausência de comprovação inviabiliza o reconhecimento jurídico da petição.  

 

I.a.2 - Ilegitimidade de terceiro interessado  

 

Nos termos da legislação vigente, a arguição de suspeição é uma prerrogativa exclusiva das partes diretamente envolvidas no processo, não se estendendo a terceiros interessados. Esse entendimento, consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça (AgRg no AREsp n. 642.205/SC, Rel. Ministro Moura Ribeiro; REsp 1.262.604, Rel. Ministra Eliana Calmon; e AgRg no REsp 1.349.206/SC, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques), é plenamente aplicável ao presente caso, em que a peticionária reconhece expressamente sua condição de terceira interessada. 

 

I.a.3 - Descabimento de arguição em processo objetivo

 

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal estabelece que os processos objetivos, como o normativo-regulatório em análise, não comportam as regras processuais comuns de impedimento e suspeição. Assim, não há fundamento jurídico para a arguição no contexto do presente processo.  

 

I.b - Aspectos materiais  

 

Passa-se agora à análise dos argumentos apresentados no mérito, ainda que, conforme já exposto, a ausência de requisitos formais torne desnecessária essa apreciação.  

 

I.b.1 - Ausência de suspeição ou conflito de interesses  

 

Os fatos alegados não demonstram qualquer elemento que comprometa a imparcialidade do Conselheiro Vistor. As interações acadêmicas e profissionais mencionadas refletem atividades próprias do ambiente universitário e não configuram relação de proximidade que possa gerar parcialidade.  

O Vistor, em cumprimento aos princípios de transparência e integridade, registrou anteriormente, em 24 de fevereiro de 2023, um memorando informando suspeição em casos específicos, que não incluem o presente.  

Ademais, colaborações acadêmicas ou eventuais relações institucionais não se confundem com as exigências de imparcialidade administrativa, conforme reiteradamente destacado pela doutrina e jurisprudência.  

 

I.b.2 - Motivação do pedido de vistas  

 

O pedido de vistas teve como objetivo aprofundar o exame de questões técnicas específicas, especialmente no que se refere à aplicação de elementos das ciências comportamentais em dispositivos regulatórios. Não houve qualquer indicação de conduta voltada a postergar deliberadamente o processo.  

As alegações de que o pedido teria sido realizado com tal finalidade não encontram respaldo na tramitação e nos registros formais do processo.  

 

I.c - Conclusão  

 

Diante do exposto, ausentes os requisitos formais e materiais necessários para o processamento da exceção de suspeição, conclui-se pela sua rejeição, submetendo-se a deliberação ao Conselho Diretor da Anatel, nos termos do art. 49, §1º, do RIA.

 

II - Não conhecimento das petições extemporâneas

 

Nos termos da Análise do ilustre Relator, decidiu-se "pelo não conhecimento das petições extemporâneas (SEI nº 11596399, nº 11596663, nº 11596717, nº 11613522, nº 11613288 e nº 11613672)", tendo a referida Análise entendido por aplicar o entendimento cristalizado no Enunciado nº 21, da Súmula da Anatel.

Sem prejuízo, anota-se que foram interpostas as seguintes petições posteriormente ao pedido de vistas: Petição Manifestação (SEI nº 11779332), Petição Manifestação TELCOMP (SEI nº 11834055), Petição Denúncia de Conflito de Interesses (SEI nº 12050064) e Pedido de Habilitação como 3º Interessado, da Associação NEO (SEI nº 12467554).

Por meio do Acórdão nº 98, de 18 de abril de 2024 (SEI nº 11848257), não se conheceu de petições da Algar Telecom S.A. e da Telcomp, encontrando-se pendentes de avaliação a Petição Denúncia de Conflito de Interesses (SEI nº 12050064) e Pedido de Habilitação como 3º Interessado, da Associação NEO (SEI nº 12467554).

O Enunciado nº 21 da Anatel assim dispõe, verbis:

As petições extemporâneas, quando não caracterizado abuso do exercício do direito de petição, devem ser conhecidas e analisadas pelo Conselho Diretor desde que protocolizadas até a data de divulgação da pauta de Reunião na Biblioteca e na página da Agência na internet.

É facultado o exame dessas petições, no caso concreto, pelo Conselheiro ou pelo Conselho Diretor após o prazo estipulado e até o julgamento da matéria, sobretudo se a manifestação do interessado trouxer a lume a notícia de fato novo ou relevante que possa alterar o desfecho do processo.

Não há necessidade de desentranhamento de petições extemporâneas, ainda que não conhecidas por esse órgão colegiado.

Reiterando o entendimento exposto pelo Vistor na Análise nº 54/2023/AF (SEI nº 10406893), as manifestações mencionadas foram apresentadas muito após o termo final para tanto, conforme estabelecido no Enunciado em estudo.

Nesse precedente, não se conheceu do parecer do Exmo. Ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello, atualmente aposentado, que, anos atrás, foi seu superior hierárquico .

Revela-se, assim, manifesto o intento das peticionárias em postergar continuamente o deslinde do caso, buscando reabrir uma discussão já exaurida.

Os argumentos apresentados nas mencionadas petições apenas reiteram questões já debatidas em esferas anteriores e buscam rever a essência daquilo que foi decidido pelo Conselho Diretor a respeito do que deve ser o RGC vigente.

Assim, não se conhece da Petição Denúncia de Conflito de Interesses (SEI nº 12050064) e da Pedido de Habilitação como 3º Interessado, da Associação NEO (SEI nº 12467554).

 

III - Intempestividade dos pedidos de ingresso de terceiro

 

Requereram seu ingresso como terceiro no feito, nos termos do art. 9º, inc. II, da Lei nº 9.784/99, o IDEC, no âmbito da Petição referenciada nos itens anteriores desta Análise, e Associação NEO, na Petição (SEI nº 12467554).

Todavia, depreende-se que o referido pleito foi formulado muito após a inclusão do processo na pauta de reunião do Conselho Diretor, sendo o seu indeferimento a medida apropriada.

Além disso, pelo teor das petições apresentadas, não se identificaram fatos e fundamentos que contribuam para alteração do desfecho do processo.

Assim, com fundamento no Enunciado nº 21 da Súmula da Anatel, indeferem-se os pedidos de ingresso.

 

IV - Perda de objeto do pedido de anulação do art. 39, § 2º

 

Tem-se por prejudicado o pedido de anulação do art. 39, § 2º, do RGC, pois foi revogado pela Resolução nº 768, de 19 de agosto de 2024, com efeitos a partir de 1º de janeiro de 2026.

O eg. STF possui entendimento pacífico no sentido de que a revogação superveniente de dispositivos legais impugnados em ação direta de inconstitucionalidade acarreta a perda ulterior do seu objeto, restando esta prejudicada quanto a esses (neste sentido: cf. ADI nº 3936, Relator(a): Ministra Rosa Weber).

Na medida em que a ação direta de inconstitucionalidade e o pedido de anulação se tratam de lides objetivas, aplica-se o referido entendimento ao presente caso.

Acrescenta-se que, por meio do Acórdão nº 228, de 28 de agosto de 2024 (SEI nº 12496811), o Conselho Diretor da Anatel, prorrogou o início da vigência do o art. 39, § 2º, do novo RGC, para o dia 1º de setembro 2025. Isto é, o art. 39, § 2º, terá vigência por apenas quatro meses, não produzindo mais efeitos a partir de 1º de janeiro de 2026.

 

V - Admissibilidade do pedido de anulação e mérito

 

Em adesão ao entendimento do eminente Relator, admite-se o pedido de anulação nos termos da Análise nº 4/2024/RG (SEI nº 11509210).

De igual forma, adere-se parcialmente aos seus termos no que diz respeito à ausência de demonstração de invalidade das disposições que seguem:

arts. 21 (registro de ofertas, objeto de impugnação por Tim S.A.):

O art. 21 do RGC não apenas é válido, como se constitui em evolução da Anatel para a promoção do bem-estar do consumidor, permitindo-lhe comparar as ofertas das diversas prestadoras.

Essa ferramenta permitirá à Anatel envidar esforços para desenvolver recursos que permitam, com o uso de insights das ciências comportamentais, a recomendação de ofertas mais alinhadas com o perfil do consumidor, incluindo sua capacidade de pagamento, de modo a prevenir o seu superendividamento, trazendo mais eficiência à aplicação dos arts. 32 e 33 do novo RGC.

No entanto, com fundamento no art. 133, inc. XXXII, do RIA, segundo o qual, compete ao Conselho Diretor deliberar na esfera administrativa quanto à interpretação da legislação de telecomunicações e sobre os casos omissos, revela-se necessário que se fixe o sentido e alcance do termo "oferta" no art. 21, caput, do novo RGC, de modo que o seu alcance compreenda apenas a oferta principal, com exclusão de produtos e serviços acessórios. 

Nesse sentido, excluem-se do alcance do termo "oferta", para fins de aplicação do art. 21, do RGC, as facilidades adicionais, que não são inerentes ao serviço que se pretende contratar, cabendo ao Grupo de Implantação proceder às devidas alterações no Manual Operacional para essa finalidade.

arts. 21, § 3º, inc. IV, e 39 (datas-bases para reajuste, objeto de impugnação por Claro S.A. e Telefônica Brasil S.A.):

Inicialmente, não se identifica quaisquer nulidades para o art. 21, § 3º, inc. IV, e para o art. 39, caput e § 3º, do novo RGC, à exceção das expressões "da data da contratação", constante do art. 21, § 3º, inc. IV, e "contados da data da contratação da Oferta pelo Consumidor", inserida no art. 39, caput, sobre os quais serão discorridos oportunamente.

Nos termos do Voto nº 21/2023/VA, do ilustre Conselheiro Vicente Aquino (SEI nº 10871000), que culminou na aprovação do novo RGC no Processo nº 53500.061949/2017-68, essas disposições visam a assegurar o estrito cumprimento do art. 2º, § 1º, da Lei nº 10.192/2001, que veda a correção monetária antes que se complete o primeiro ano de contratos que tenham duração igual ou superior a esse período, assim redigido (grifos acrescidos):

Art. 2º É admitida estipulação de correção monetária ou de reajuste por índices de preços gerais, setoriais ou que reflitam a variação dos custos de produção ou dos insumos utilizados nos contratos de prazo de duração igual ou superior a um ano.

§ 1º É nula de pleno direito qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de periodicidade inferior a um ano.

Portanto, entende-se que a regra é válida e que resta, ainda, afastada a ocorrência de abuso de poder regulatório (art. 4º, caput, da Lei nº 13.874/2019), pois se trata de regra voltada ao "estrito cumprimento a previsão explícita em lei".

De igual forma, até mesmo a elaboração de avaliação de impacto regulatório estaria dispensada para a disposição em estudo nos termos do art. 4º, inc. II, do Decreto nº 10.411/2020.

Com efeito, o comando em exame se trata de "ato normativo destinado a disciplinar direitos ou obrigações definidos em norma hierarquicamente superior que não permita, técnica ou juridicamente, diferentes alternativas regulatórias" (grifou-se).

Anota-se que o art. 39, § 3º, é válido, pois apenas determina ao Grupo de Implantação que discipline como se procederá ao cumprimento de norma hierarquicamente superior, qual seja, o art. 3º, parágrafo único, da Lei nº 9.472/97. Este, por sua vez, deve ser lido conjuntamente com o art. 3º, inc. IV, da mesma Lei.

O art. 3º, inc. IV, da Lei nº 9.472/97, reconhece o direito do usuário à informação adequada sobre as condições de prestação dos serviços, suas tarifas e preços. Para essa finalidade, o art. 3º, parágrafo único, determina que a prestadora de serviço divulgue, em seu sítio eletrônico, de forma clara e de fácil compreensão pelos usuários, tabela com o valor das tarifas e preços praticados e a evolução dos reajustes realizados nos últimos cinco anos.

Portanto, o art. 39, § 3º, do RGC, ao assentar a competência do Grupo de Implantação para disciplinar a forma de cumprimento das disposições em comento, não incorre em qualquer nulidade, pois não inova na esfera de obrigações exigíveis das prestadoras.

Todavia, assim como as expressões relacionadas à data da contratação, acima referidas, entende-se que o art. 39, § 1º , é nulo, conforme será visto em tópico próprio.

art. 36, § 2º (renovação automática de oferta com prazo de permanência)

O art. 36 do RGC encontra-se assim redigido:

Art. 36. A Oferta poderá prever Prazo de Permanência de no máximo 12 (doze) meses, durante o qual o Consumidor se comprometerá a permanecer a ela vinculado, em contrapartida a um benefício concedido pela Prestadora]

§ 1º O tempo máximo previsto no caput poderá ser superior para Consumidor pessoa jurídica

§ 2º É vedada a renovação automática de Oferta com Prazo de Permanência

§ 3º O Prazo de Permanência não poderá exceder o Prazo de Vigência da Oferta

§ 4º As condições gerais da permanência são regidas pelas regras previstas na Lei nº 8.078, de 1990, devendo ser informado claramente ao Consumidor

I - o período de tempo predeterminado durante o qual deverá permanecer vinculado à Oferta

II - a descrição do benefício concedido e seu valor; e

III - o valor da multa em caso de rescisão antecipada da Oferta.

Adentrando ao teor dessas disposições, e acompanhando a fundamentação do ilustre Relator, não se identifica qualquer nulidade no art. 36, § 2º, do RGC.

No entanto, e com fundamento no já mencionado art. 133, inc. XXXII, do RIA, para efeitos de dirimir eventuais divergências interpretativas, sugere-se fixar entendimento no sentido de que o termo "renovação automática" compreenda apenas aquelas situações para as quais não houve consentimento expresso do consumidor para essa finalidade. Isto é, não se considerará renovação automática quando o consumidor houver manifestado expressamente essa intenção durante a contratação da oferta ou posteriormente a ela.

Como consectário dessa medida, determina-se ao Grupo de Implantação que proceda às devidas modificações no MOP para que incorpore o entendimento ora adotado.

art. 73 (prazo para rescisão, objeto de impugnação por Oi S.A. - em Recuperação Judicial):

A princípio, consoante exposto pelo ilustre Relator em sua Análise, não houve alteração, em relação à norma revogada, do prazo total dos procedimentos de suspensão (total e parcial) relacionados à cobrança de débitos e a disposição em comento foi exaustivamente debatida em Análise de Impacto Regulatório.

Rejeita-se, assim, a sua nulidade.

art. 90 e 91 (medidas assimétricas, objeto de impugnação por Tim S.A., Claro S.A. e Telefônica Brasil S.A.):

Como bem destacado pelo ilustre Relator, o antigo RGC já empregava medidas assimétricas para as pequenas prestadoras.

Com efeito, nos termos da fundamentação da Análise do ilustre Relator e do Parecer da PFE/Anatel, o precedente invocado por Telefônica S.A. não discutiu qualquer aspecto relacionado ao tema.

Ademais, acrescenta-se que este não é o momento para se discutir o acerto ou o desacerto das medidas de assimetria, e que o tópico poderá ser abordado com maior profundidade pelo Conselho Diretor da Anatel por ocasião do exame do novo PGMC.

Nos tópicos que seguem, adota-se o seguinte roteiro: avalia-se a nulidade das disposições relacionadas à proibição da alteração das características das ofertas (art. 23), à migração automática de ofertas (art. 31, § 2º), às relações com colaboradores (art. 34, § 2º), às disposições relativas à data-base (arts. 21, § 3º, inc. IV, e 39, caput, e § 1º) e à régua de suspensão (arts. 70 e 74).

 

IV.a - Proibição de alteração das características das ofertas

 

O art. 23 do RGC se encontra assim redigido:

Art. 23. Durante a vigência da Oferta registrada nos termos do art. 21, é vedado à Prestadora alterar qualquer característica de preço, acesso e fruição constante da Oferta, exceto mediante determinação da Anatel conforme previsto no art. 25 ou, no caso do SeAC, em decorrência de cessação de contrato de distribuição de conteúdo sobre o Canal de Programação, ou de descumprimento das regras relativas à classificação indicativa do conteúdo.

Diante disso, entende-se que há nulidade nesse ponto, destacando-se, inicialmente, que essa disposição não diz respeito apenas à forma pela qual a prestadora deve dar publicidade às suas ofertas, mas sim ao regramento pelo qual ela pode alterar validamente os seus instrumentos jurídicos de contratação pelos seus usuários. Isto é, visa a regulamentar o tráfego jurídico de suas operações propriamente ditas.

O art. 51 do CDC determina o seguinte:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

(...)

XIII - autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração

Tem-se, portanto, que o CDC não veda de forma absoluta a alteração de contrato entre fornecedor e consumidor. O que a norma limita é a possibilita de modificação unilateral do contrato após a sua celebração.

Entende-se, portanto, que, ao vedar de antemão qualquer alteração de oferta, o RGC ofende a regra consumerista, podendo acarretar prejuízo ao consumidor, ainda que a intenção fosse protegê-lo e facilitar seu entendimento. Isso porque pode haver situações em que a alteração de cláusula contratual seja benéfica ao consumidor, como, por exemplo, na inclusão de determinado item que passe a ser necessário ao consumidor sem que ele precise alterar a sua oferta, com risco de ter que aderir a uma oferta pior por causa de item que se torne imprescindível em certo momento.

Não bastasse a nulidade em comento, numa perspectiva ex ante, essa regra incentivaria as prestadoras a realizar ofertas de curto prazo como sucedâneo para mitigar as restrições decorrentes do seu teor. É razoável supor que as prestadoras limitem suas ofertas, por exemplo, a um mês, ou, ainda, a uma quinzena.

Apesar de ser compreensível que a finalidade da regra seja facilitar que o consumidor compreenda os termos das ofertas que lhe são apresentadas, minimizando os ruídos que possam ocorrer de uma proliferação excessiva de informações, nota-se que, ainda que fosse válida, ela tenderia a ser inefetiva, conforme visto no parágrafo acima.

Assim, anula-se o art. 23 do RGC.

 

V.b - Migração automática de ofertas e renovação automática de oferta com prazo de permanência

 

As disposições relacionadas à migração de ofertas são impugnadas por Tim S.A., Claro S.A. e Telefônica Brasil S.A.

Inicialmente, não se identifica nulidade de forma quanto às disposições correlatas a esse tópico, uma vez que foram previamente debatidas, consoante exposto no seguinte trecho do Voto nº 21/2023/VA (SEI nº 10871000), do ilustre Conselheiro Vicente Aquino:

5.242. Debatemos a questão em reunião extraordinária do CDUST, realizada aos 26 de outubro de 2022, da qual participaram, dentre outros, representantes do Ministério Público, do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), da Defensoria Pública, dos Procons, do Conexis e o Procurador Geral da PFE-Anatel, conforme Ata.

5.243. Consensou-se que o remédio apresentado para combater a migração automática do consumidor, de fato, poderia acarretar mais prejuízos do que benefícios aos stakeholders da relação de consumo, sugerindo-se a revisão das consequências decorrentes da inércia do consumidor.

5.244. Ao se avaliarem as possíveis alternativas à problemática em questão, entendeu-se que a degradação da qualidade do serviço contratado seria menos gravosa ao usuário do que o aumento do preço cobrado por sua prestação (como ocorre atualmente) ou do que a sua suspensão (como proposto no Anexo I da Minuta de Resolução SEI nº 9389461).

5.245. A complexidade do tema justifica a dificuldade de se encontrar uma solução definitiva que seja isenta de consequências negativas às partes. No entanto, a partir do debate realizado com os membros do CDUST; da compreensão dos receios e desafios enfrentados pela Área Técnica, responsável pelo acompanhamento das reclamações registradas pelos consumidores nos canais de atendimento da Anatel; e das considerações apresentadas pela PFE-Anatel e pelo Conexis, elaborei uma proposta de ajuste à redação do dispositivo em comento, prevendo consequências menos extremas e reforçando o direito à informação do usuário.

5.246. Minha proposta busca garantir a continuidade da prestação do serviço pelo mesmo valor contratado ou outro a ele inferior. Ainda no intuito de proteger o consumidor de migrações para Ofertas que lhes sejam prejudiciais e garantir seu direito de rescisão contratual, entendo relevante que se afaste a previsão de novo prazo mínimo de permanência no caso em que a migração ocorra independentemente da manifestação expressa do usuário.

Consoante exposto na Análise do ilustre Relator no presente pedido de anulação, o tema foi discutido em AIR, ainda que com outra redação, na qual se debateu sobre as condições gerais da oferta. E a disposição aprovada pelo Conselho Diretor foi a mais adequada para endereçar eficazmente os diversos problemas identificados pelo Conselheiro-Vistor na reflexão expressa na transcrição acima.

Por sua vez, o art. 64 do RIA permite emendas ao texto original por qualquer Conselheiro, não havendo nenhuma previsão que determine que deve ser mantida a redação originalmente submetida à consulta pública no ato normativo posteriormente aprovado.

Sem prejuízo, o art. 21 do Decreto nº 10.411/2020, dispõe que "a inobservância ao disposto neste Decreto não constitui escusa válida para o descumprimento da norma editada e nem acarreta a invalidade da norma editada".

No entanto, destaca-se que as disposições em comento apresentam vícios materiais, conforme será exposto a seguir.

O art. 31 do RGC encontra-se assim redigido:

Art. 31. As Prestadoras deverão comunicar ao Consumidor, com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, preferencialmente por meio eletrônico, entre outros:

I - a extinção de Oferta com Prazo de Vigência indeterminado;

II - o término do Prazo de Vigência determinado da Oferta;

III - o término do Prazo de Permanência;

IV - os reajustes que passarão a vigorar; e,

V - a alteração da lista de canais disponibilizados na Oferta contratada de SeAC, nos casos previstos no art. 23.

§ 1º As comunicações relacionadas aos incisos I e II deverão alertar o Consumidor sobre a necessidade de adesão a uma nova Oferta e as consequências de não a fazer no prazo estabelecido.

§ 2º Caso o Consumidor não manifeste sua adesão a uma nova Oferta antes da extinção ou do término do Prazo de Vigência daquela à qual está vinculado, a Prestadora poderá habilitá-lo em outra Oferta, registrada em sistema da Anatel nos termos do art. 21, que seja de igual ou menor valor e sem Prazo de Permanência.

§ 3º Quando da extinção ou término do Prazo de Vigência da Oferta na Forma de Pagamento Pré-Paga, a Prestadora deverá garantir ao Consumidor, até a rescisão do contrato, a manutenção de seu crédito para utilização em uma nova Oferta na Forma de Pagamento Pré-Paga da mesma Prestadora.

Adentrando no teor do dispositivo, entende-se que o art. 31, § 2º, do novo RGC, é nulo porque permite a migração automática do consumidor sem garantir que a nova oferta seja compatível com suas necessidades. Embora o critério de "igual ou menor valor" seja econômico, ele pode não refletir a qualidade ou utilidade do serviço para o consumidor. Isso pode gerar desequilíbrio contratual e violar o princípio da boa-fé objetiva, que exige que os contratos sejam cumpridos de forma a respeitar a confiança e os legítimos interesses de ambas as partes, conforme o art. 422 do Código Civil e o art. 4º, III, do CDC.

Ademais, o art. 39 do CDC apresenta um rol exemplificativo de práticas abusivas e, num juízo de ponderação, apesar da louvável intenção do Conselho Diretor em buscar afirmar mais efetivamente a proteção do consumidor, especialmente para evitar situações de superendividamento, não é possível presumir que, numa análise prospectiva (ex ante), a adoção de comportamento que implique o desatendimento da disposição do RGC em análise seja considerada, por si só, prática abusiva (MIRAGEM, 2016, p. 331).

Somente numa avaliação posterior (ex post), à luz do art. 39 do CDC, é que será possível aferir a abusividade da prática, destacando-se, especialmente os seus incisos V e X assim redigidos, com grifos acrescidos:

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)

(...)

V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;

X - elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços; (Incluído pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994);

A partir dessas disposições, depreende-se que, a despeito da nulidade que ora se reconhece, a prestadora continua sujeita a obrigações que decorrem de texto expresso de lei, devendo evitar o abuso no exercício de sua liberdade negocial.

À luz das lições do Professor Bruno Miragem (2016, p. 312), essa avaliação deve considerar a natureza da atividade, os produtos e serviços prestados e as características do mercado em que está inserido, em que a prática abusiva pode decorrer, por exemplo, do exercício de posição dominante, bem como de conduta atentatória à boa-fé contratual consequente de dissimulação ou de aproveitamento da vulnerabilidade, dependência ou catividade do consumidor.

A seu turno, a inércia do consumidor em exercer a opção referida no art. 31, § 1º, do RGC - cuja validade é reconhecida - por ocorrência da extinção ou do término do prazo de oferta, possui consequências que não são triviais para os contratos por ele firmados junto às prestadoras, por terem o potencial de repercutir em sua capacidade de pagamento no futuro e de lhe limitar o exercício de direitos.

Os termos desses contratos, por sua vez, são resultantes de ofertas unilaterais amplamente dirigidas ao usuários, os quais dispõem de margem substancialmente baixa para negociar os termos e, como tais, são caracterizados como contratos de adesão nos termos do art. 54, caput, do CDC.

Sem prejuízo do cumprimento do art. 39 do CDC, acima mencionado, a pactuação dos efeitos do encerramento ou expiração da oferta sujeita-se à incidência do art. 54, §§ 3º e 4º, do CDC, e deve ser redigida com destaque, de forma clara e ostensiva, a permitir facilmente sua compreensão pelo consumidor.

A disposição em referência encontra-se assim redigida (com grifos acrescidos):

Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.

§ 1° A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão do contrato.

§ 2° Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde que a alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto no § 2° do artigo anterior.

§ 3o Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor. (Redação dada pela nº 11.785, de 2008)

§ 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.

Além disso, conforme já discorrido em tópico anterior, o art. 51 do CDC dispõe que são nulas de pleno direito cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou qualidade do contrato após sua celebração. Embora aqui não se trate especificamente de uma cláusula contratual, mas sim de um dispositivo regulamentar que possibilita a migração de consumidor para outra oferta, tem-se justamente um exemplo da lógica que buscou-se proibir pela Lei Consumerista, pois trata-se de regra que permite a modificação unilateral do contrato em caso de inércia do consumidor, isto é, sem qualquer manifestação ou mesmo ciência prévia deste.

Assim, anula-se o art. 31, § 2º, do RGC.

Por fim, algumas condutas são recomendadas para se mitigar os riscos de cometimento das práticas abusivas, cabendo ao Grupo de Implantação, com o auxílio do Nudge.lab, promover as devidas alterações no MOP para essa finalidade, tais como, empregar soluções das ciências comportamentais para incremento do bem-estar do consumidor, a fim de evitar, por exemplo, que o consumidor tenha seu contrato rescindido e fique sem o serviço em situações que gostaria de manter, ponto este que será discorrido mais aprofundadamente no subtópico que segue.

 

V.b.1 - Aplicações de ciências comportamentais para a proteção do consumidor

 

Uma das ideias que, até certo tempo atrás, norteavam a proteção da defesa do consumidor era a de que, desde que estivesse devidamente informado, sempre teria condições de tomar decisões mais alinhadas com suas preferências e com o seu bem-estar.

Para isso, bastaria a eliminação da assimetria informacional entre o consumidor e o fornecedor, situação na qual a sua vulnerabilidade técnica estaria contornada.

Com o tempo, e com o aparecimento de diversos estudos em ciências comportamentais, esse entendimento, pouco a pouco, foi perdendo força.

Apesar de relevante, a divulgação de informações raramente conduz a uma boa escolha pelo consumidor (BEN-SHAHAR; SCHNEIDER, 2014, p. 6).

Mais especificamente, com os estudos das chamadas heurísticas e vieses, começou a prevalecer a perspectiva de que a forma pela qual o questionamento e as alternativas decisórias são tornadas disponíveis ao consumidor são igualmente importantes, não bastando, para tanto, a simples mitigação da assimetria informacional (SILONY; HELLERING, 2015, p. 214-218).

No mundo extremamente complexo em que vivemos, não é possível supor que esse consumidor dispõe do tempo e do conhecimento necessários para tomar decisões exaustivamente informadas em todas as esferas de sua vida.

Em suma, há escolhas demais a serem feitas, e nas mais diversas esferas da vida, e capacidade de avaliação de menos.

Isso não significa dizer que o consumidor seja irracional, mas sim, que ele dispõe de racionalidade limitada.

Ele não é a pessoa totalmente racional, capaz de avaliar milimetricamente todas as consequências futuras de todas as alternativas disponíveis, que a ciência econômica tradicional pressupõe no seu desenvolvimento teórico.

Essa racionalidade existe, mas até certo ponto: o consumidor, quando toma uma decisão, avalia suas consequências, mas à luz das informações de que dispõe num determinado momento, e nem sempre de forma exaustivamente refletida, pois, muitas vezes, recorre a “atalhos mentais” - os chamados vieses e heurísticas, que podem ser conscientes ou não.

Há, assim, um descasamento entre o que as pessoas devem decidir e o que elas conseguem decidir de maneira suficientemente informada para maximizarem seu bem-estar.

Nesse passo, é fundamental que os fornecedores e as instituições estatais (incluindo as agências reguladoras) pensem criativamente como podem criar arquiteturas de escolha que, sem tolher a liberdade do consumidor, permitam, na medida do possível, que eles realizem escolhas que estejam alinhadas com suas preferências, numa perspectiva que Cass Sunstein e Richard Thaler (2019, p. 257) denominam de paternalismo libertário.

O paternalismo libertário se sustenta em duas premissas antagônicas, buscando conciliá-las, saber:

o consumidor é quem tem mais condições de avaliar como cada escolha disponível pode afetar o seu bem-estar. As instituições estatais, em virtude de seus processos burocráticos e das diversas falhas de governo estão em piores condições de realizar essa avaliação; e

no entanto, a complexidade que nos envolve impede que esse consumidor consiga avaliar exaustivamente as consequências dessas escolhas disponíveis. Nesse cenário, é importante pensar em arquiteturas decisórias que permitam que o consumidor possa dispor de preferências presumidas para a hipótese de sua inação.

Mais especificamente, quando o consumidor não expressasse sua escolha, seria adotado um padrão decisório (ao que se denomina de default) que fosse compatível com essas preferências. Esses padrões decisórios são os nudges.

E, para se preservar a soberania do consumidor, que, embora seja racional, possui racionalidade limitada e enfrenta severas restrições de tempo, é assegurada a possibilidade de adotar outra escolha expressamente (opt out), sem que isso seja peremptoriamente vedado.

Por sua vez, os nudges devem facilitar a vida das pessoas a quem se dirijam (HALPERN, 2015, p. 78; SUNSTEIN, 2021, p. 87); atrair a sua atenção, criando, se possível, uma conexão no nível emocional (HALPERN, 2015, p. 105); atentar para os aspectos culturais e para os comportamentos sociais informalmente adotados pelas pessoas de maneira geral (HALPERN, 2015, p. 125); e, preferencialmente, devem ser implementados antes que haja a consolidação do padrão comportamental que se pretende inibir (HALPERN, 2015, p. 125).

De igual forma, as instituições governamentais devem agir para tornar essas escolhas mais intuitivas para o consumidor/cidadão, pois, como visto, as pessoas não dispõem de tempo e de capacidade de processamento para avaliar exaustivamente as informações associadas e as consequências das escolhas que fazem.

É desejável, assim, uma cooperação entre os setores público e privado (no caso, regulador e regulados) que consiga desenvolver nudges associados a um desenho intuitivo das escolhas disponíveis (SUNSTEIN, 2013, p. 209 et seq.), voltados a uma melhoria do bem-estar do consumidor dos serviços regulados.

O ilustre Conselheiro Vicente Aquino, em seu Voto, bem assentou a necessidade de adoção de elementos das ciências comportamentais para que se evite, por meio dos chamados dark patterns, a utilização de behavioral insights em detrimento do consumidor, consoante se depreende do art. 5º, inc. II, do RGC.

Igualmente, o ilustre Conselheiro Artur Coimbra, em seu voto oralmente proferido na 926ª Reunião do Conselho Diretor, ocorrida em 26 de outubro de 2023, bem assentou a importância dessa iniciativa pra promover o bem-estar do consumidor.

Ademais, em adesão aos fundamentos que subsidiaram a construção da disposição regulatória em estudo, conclama-se o fornecedor a exercer sua parcela de responsabilidade social, para que os retornos financeiros da empresa não se deem à custa de prejuízos ao consumidor, os quais podem ser irrecuperáveis se não forem adequadamente administrados.

A história dispõe de um rico repertório de eventos dessa natureza, incluindo casos em que corporações atuaram no desenvolvimento de pesquisas enviesadas que comprometeram a saúde e a vida de consumidores e de outras pessoas em situação de vulnerabilidade (MICHAELS, 2024).

É necessário que se levantem evidências precisas, sempre lembrado que, não raro, pesquisas na área das humanidades (economia, sociologia etc.), qualitativas ou quantitativas, por mais rigorosas que sejam, são suscetíveis a imprecisões decorrentes de dificuldades no ajuste das metodologias para o problema estudado (BECKER, 2022, p. 64 et seq.).

Assim, recomenda-se ao fornecedor que adote insights das ciências comportamentais, incluindo a colaboração com o Nudge.lab, grupo de estudo instituído pelo Ceadi, por meio da Portaria Anatel nº 2832, de 11 de junho de 2024, para essa finalidade.

 

V.c - Relações entre prestadoras e colaboradores externos

 

A ausência de prévio debate público e de análise de impacto regulatório, por si só, não acarreta vício em disposição regulatória, conforme o teor do art. 21 do Decreto nº 10.411/2020, já comentado anteriormente.

Inicialmente, quanto ao art. 34, § 1º, que determina que a prestadora deve assegurar a existência de instrumentos de combate a fraudes e utilização dos dados pessoais dos consumidores de acordo com as determinações legais aplicáveis, não se identifica nenhuma inovação no leque de obrigações por elas devidas, reconhecendo-se, assim, a sua validade.

Todavia, reconhece-se a nulidade do art. 34, § 2º, do novo RGC, que trata da remuneração dos contratos com parceiros comerciais, considerando o grau de intervenção que foi impresso, no caso, na liberdade contratual das prestadoras e de seus colaboradores.

Chama-se a atenção para o que foi aduzido por Oi S.A - em recuperação judicial, na petição (SEI nº 12378385), no sentido de que:

a redação da disposição interfere indevidamente nas relações contratuais privadas entre a prestadora e seus parceiros comerciais, o que contraria os artigos 173 e 174 da Constituição Federal, que regulam a atividade econômica e a liberdade de iniciativa; e

esse regramento acarretará custos adicionais e impactos financeiros significativos, pois exigiria uma reformulação completa dos procedimentos adotados, com elevados investimentos em TI e mudanças no modelo de negócios.

Em sua manifestação, a prestadora em referência detalha a metodologia atual de remuneração de seus parceiros comerciais, que inclui uma combinação de comissão básica, bônus de venda, indicadores de qualidade e estornos por fraudes, a qual seria adequada para prevenir essas fraudes e garantir a remuneração adequada dos parceiros.

Nos termos do art. 4º, inc. V, da Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019, que institui a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica (LLE), o aumento de custos de transação sem demonstração dos benefícios, pode caracterizar abuso de poder regulatório, verbis:

Art. 4º É dever da administração pública e das demais entidades que se vinculam a esta Lei, no exercício de regulamentação de norma pública pertencente à legislação sobre a qual esta Lei versa, exceto se em estrito cumprimento a previsão explícita em lei, evitar o abuso do poder regulatório de maneira a, indevidamente:

(...)

V - aumentar os custos de transação sem demonstração de benefícios;

Os custos de transação, cujas origens remontam aos trabalhos do saudoso Professor Ronald Coase, notadamente o "Problema do Custo Social" (1960), são um conceito econômico essencial para o estudo do próprio Direito, incluindo a atividade regulatória do Estado (YEUNG; CAMELO, 2024, p. 196-197).

Esses custos de transação referem-se às despesas que agentes e organizações enfrentam ao buscar informações sobre possíveis parceiros, negociar os termos de contratos, ajustes e acordos, decidir se devem ou não firmar um contrato e, finalmente, monitorar o seu cumprimento.

Comentando o art. 4º, inc. V, da LLE, os professores Luciano Timm e Leonardo Marques (2020) destacam que o aumento de custos de transação só é justificável se houver evidências de ganhos de eficiência no médio ou longo prazo que justifiquem esse aumento, pois do contrário, essa majoração implicará apenas em perdas de eficiência e de competividade e em desperdício de riqueza social.

Por sua vez, Maria João Rolim, Alice Khouri e Bernardo Ferreira (2021), discorrendo sobre o instituto do abuso regulatório, entendem que é importante que o regulador, ao exercer sua atividade normativa, apresente alternativas regulatórias - após a adoção de eventos de participação pública e com consideração da manutenção do status quo como opção possível - e faça uma leitura conjugada com o art. 20 da LINDB, segundo o qual, a sua atuação deve "considerar as consequências práticas da decisão".

É necessário avaliar mais evidências a respeito da efetividade dessa disposição, pois, a despeito da louvável fundamentação trazida no Voto nº 21/2023/VA (SEI nº 10871000), acolhido pelo Conselho Diretor da Anatel, ali mesmo é reconhecida a carência de mais dados a respeito da estruturação das operações entre as prestadoras e seus colaboradores.

Dessa forma, tem-se que a disposição em comento é nula por elevar custos de transação sem avaliação dos benefícios daí decorrentes. Por sua vez, isso não impede eventual atuação futura da Agência para investigação do ponto, após um diagnóstico claro de que ele constitui um problema regulatório que necessite avaliação e tratamento mais detidos​​​.

Reconhece-se que existem reclamações a respeito do tema e reafirma-se que a intenção do Conselho Diretor, ao ter aprovado inicialmente a disposição em comento, está alinhada com a sua missão institucional de, dentre outras, proteger o consumidor dos serviços regulados.

É possível que haja um conhecimento disperso que precise ser assimilado pela própria Anatel para que eventualmente apresente uma solução que assegure mais eficientemente o bem-estar do consumidor à luz de dados e informações a serem produzidos para o desenvolvimento de uma política pública baseada em evidências (cf. SUNSTEIN, 2018, p. 104 et seq.)

Além disso, deve-se ter em mente que, apesar das semelhanças entre as práticas desenvolvidas no setor bancário e no de telecomunicações, apenas após o devido levantamento dessas informações é que se poderá constatar se essas semelhanças são suficientes para sustentar o empréstimo normativo realizado no RGC.

Dado o grau de intervenção que o art. 34, § 2º, do RGC, imprime nas relações privadas entre prestadoras e colaboradoras, é necessário que essas informações sejam devidamente coletadas e sistematizadas antes que se tome uma decisão a seu respeito, com participação dos próprios regulados, e, em seguida, desenho das alternativas decisórias possíveis, não se descartando, a princípio, até mesmo opções de corregulação ou de autorregulação.

Em tempo, a avaliação de nulidade de disposição regulatória para fins de incidência do art. 4º, inc. V, da LLE, não se opera automaticamente, e depende da avaliação das circunstâncias do caso e do possível alcance da norma, em que a decisão de sua anulação deve observar as suas consequências, nos termos do art. 20 da LINDB.

No presente caso, anular o art. 34, § 2º, do novo RGC, afigura-se como medida mais afinada com o cumprimento, numa perspectiva holística, da missão institucional da Anatel, do que mantê-lo.

Numa nova reflexão feita à luz de insumos posteriores à própria aprovação do novo RGC, isso se deve à dinâmica dos seguintes fatores no caso concreto, sem que qualquer um deles isoladamente seja condição necessária nem suficiente para a anulação de disposição regulatória, e que, em seu conjunto, denotam potencial de abuso regulatório com a elevação de custos de transação sem a demonstração de benefícios nos termos do art. 4º, inc. V, da LLE:

a ausência de discussão prévia sobre a repercussão do art. 34, § 2º, do RGC, em relações privadas que não são regidas pelo CDC, e sem que haja, dentro do possível, a devida internalização das suas consequências esperadas e a mitigação daquilo que se encontra fora do espectro de previsibilidade; e

as possíveis consequências significativas que a disposição poderá ter para modelos de negócios que não são imediatamente relacionados a prestação de serviços regulados, trazidas por Oi S/A - em recuperação judicial, na petição SEI nº 12378385. Ante a ausência de maiores estudos que possam infirmar o que foi alegado por Oi S/A - em recuperação judicial, deve-se presumir a sua boa-fé ao apresentar tais pontos (art. 2º, inc. II, da LLE).

Não bastasse, há excessiva intervenção nos modelos de negócios das prestadoras e dos seus parceiros, em desatendimento aos princípios de liberdade estatuídos na LGT. Embora a LGT, pela própria caracterização da regulação no setor como intervenção do Estado no domínio econômico, atribua ao regulador um poder de maior ingerência que aquele que se verifica normalmente no setor privado, tem-se, aqui, que o art. 34, § 2º, em comento, cria uma singularidade normativa incompatível, neste momento, com as normas que lhes são superiores.

Assim, no que diz respeito à relação com colaboradores, acolhe-se o pedido para anular o art. 34, § 2º, do RGC. 

 

V.d - Disposições relacionadas à aplicação da data-base (arts. 21, § 3º, inc. IV, e 39, caput e § 1º)

 

Conforme discorrido anteriormente, as expressões "da data da contratação", constante do art. 21, § 3º, inc. IV, e "contados da data da contratação da Oferta pelo Consumidor", inserida no art. 39, caput, ensejam a declaração de nulidade parcial, com redução de texto, dessas disposições.

A técnica de declaração de nulidade com redução de texto é reiteradamente empregada pelo eg. Supremo Tribunal Federal para avaliação da conformidade de leis e outros atos normativos com o texto constitucional que lhes é superior, não havendo qualquer impossibilidade de se aplicar essa técnica para normas das agências reguladoras que exorbitem a margem de discricionariedade conferida pelo legislador, em avaliação que deve ser feita caso a caso.

O Ministro e Professor Gilmar Mendes (2012, p. 942), ao discorrer sobre essa técnica decisória, narra que a doutrina e a jurisprudência brasileiras aceitam a teoria da divisibilidade da lei. Segundo essa teoria, o Tribunal deve declarar a inconstitucionalidade apenas das normas viciadas, mantendo intactas as partes não afetadas, a menos que estas não possam funcionar de forma independente. É essencial verificar a possibilidade de divisibilidade, examinando o grau de dependência entre os dispositivos e se a norma remanescente após a nulidade parcial corresponde à vontade do legislador.

Nesse sentido, retorna-se à letra das disposições mencionadas, com destaque das expressões que ensejam a nulidade parcial em estudo:

Art. 21. Toda Oferta de serviços de telecomunicações deverá ser registrada em sistema da Anatel antes de sua comercialização.

(...)

§ 3º Quando do registro da Oferta no sistema previsto no caput, deverá ser informado o Prazo de Comercialização, bem como as seguintes condições de preço, acesso e fruição do(s) serviço(s):

(...)

IV - critérios e data-base de reajuste, que não poderá ser inferior a 12 (doze) meses da data da contratação, observado o disposto no art. 39;

Art. 39. Os reajustes dos valores das tarifas ou preços cobrados pelos serviços de telecomunicações não poderão ser realizados em prazos inferiores a 12 (doze) meses contados da data da contratação da Oferta pelo Consumidor.

Por sua vez, o art. 2º, caput e §§ 1º e 2º, da Lei nº 10.192/2001, encontra-se assim redigido:

Art. 2º É admitida estipulação de correção monetária ou de reajuste por índices de preços gerais, setoriais ou que reflitam a variação dos custos de produção ou dos insumos utilizados nos contratos de prazo de duração igual ou superior a um ano.

§ 1º É nula de pleno direito qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de periodicidade inferior a um ano.

§ 2º Em caso de revisão contratual, o termo inicial do período de correção monetária ou reajuste, ou de nova revisão, será a data em que a anterior revisão tiver ocorrido.

(...)

A norma em comento não é clara sobre como deve incidir a data-base para as ofertas. Caso se adote um entendimento no sentido de que esse prazo deve ser contado da data da contratação, ainda que essa contratação ocorra no dia imediatamente anterior ao momento em que a oferta complete um ano, é possível que haja um cenário de incerteza jurídica que pode ser desfavorável ao próprio consumidor.

Ainda assim, deve ser preservada uma redação que esteja em conformidade com o art. 2º, caput e §§ 1º e 2º, da Lei nº 10.192/2001.

Portanto, não havendo qualquer incompatibilidade entre o restante do teor do art. 21, § 3º, inc. IV, e do art. 39, caput, do RGC, com a exclusão, respectivamente, dos trechos "da data da contratação" e "contados da data da contratação da Oferta pelo Consumidor", declara-se a nulidade parcial, com redução de texto, do art. 21, § 3º, inc. IV, e do art. 39, caput, do RGC, para retirar as expressões em referência de sua redação.

Por fim, salienta-se a relevância de o usuário ter conhecimento da data-base de seu contrato no momento da contratação, devendo o Grupo de Implantação fazer os devidos ajustes no Manual Operacional para que ali sejam consignadas as rotinas que permitam ao consumidor internalizar adequadamente a data-base do contrato, possibilitando uma avaliação criteriosa sobre a contratação de determinado produto de telecomunicações.

Em consequência da anulação dos trechos "da data da contratação", entende-se que, igualmente, deve ser anulado o §1º do art. 39, cujo objetivo é regulamentar o reajuste a partir da data da contratação. Com a exclusão do termo, conforme defendido nos itens acima, não há mais justificativa para a manutenção dessa previsão, gerando sua anulação por arrastamento. 

Portanto, anulam-se:

parcialmente, com redução de texto, o art. 21, § 3º, inc. IV e o art. 39, caput, do RGC, com a exclusão, respectivamente, dos trechos "da data da contratação" e "contados da data da contratação da Oferta pelo Consumidor"; e

na íntegra o art. 39, § 1º, do RGC.

 

V.e - Régua de suspensão

 

À semelhança das demais disposições, identifica-se a ausência de nulidade formal do regramento da régua de suspensão, conforme art. 21 do Decreto nº 10.411/2020, mencionado anteriormente.

As disposições relacionadas à régua de suspensão encontram-se nos arts. 70 e 74 do RGC, a seguir transcritos, em tabela comparativa com o seu correspondente em relação ao RGC anterior:

RGC 2023

RGC 2014

(Disposições correspondentes)

TÍTULO VI

DA SUSPENSÃO DO SERVIÇO E DA RESCISÃO CONTRATUAL

 

CAPÍTULO I

DA SUSPENSÃO E RESCISÃO CONTRATUAL POR FALTA DE PAGAMENTO OU DE CRÉDITO

CAPÍTULO VI

DA SUSPENSÃO E RESCISÃO CONTRATUAL POR FALTA DE PAGAMENTO OU INSERÇÃO DE CRÉDITO

Art. 70. A Prestadora poderá suspender o provimento do serviço após o decurso de 15 (quinze) dias da data em que notificar o Consumidor quanto à existência de débito vencido, do término dos créditos ou de seu prazo de validade.

Art. 90. Transcorridos 15 (quinze) dias da notificação de existência de débito vencido ou de término do prazo de validade do crédito, o Consumidor pode ter suspenso parcialmente o provimento do serviço.

Art. 74. É vedada a cobrança de assinatura ou qualquer outro valor referente à utilização do serviço durante o período de suspensão.

Art. 95. É vedada a cobrança de assinatura ou qualquer outro valor referente ao serviço durante o período de suspensão total.

 

Feito isso, avaliam-se, uma a uma as disposições da régua de suspensão.

Art. 70 (prazo para a suspensão dos serviços):

A disposição em análise apenas reproduz o seu correspondente no RGC anterior, retirando a menção à expressão "parcialmente". Isoladamente considerada, ante a nova redação, ela apenas permite a suspensão total dos serviços após o transcurso do prazo ali referido, ampliando a margem de ação prestadora.

Assim, rejeita-se a nulidade alegada.

Art. 74 (proibição de cobrança durante o período de suspensão):

O art. 74 do RGC, ao vedar a cobrança de qualquer valor referente à utilização do serviço durante o período de suspensão, impõe à prestadora a manutenção de serviços que possuem custos de implantação e manutenção necessariamente positivos, ainda que a identificação exata desses custos comporte dificuldades metodológicas, em que a postura da Anatel revela interferência excessiva na condução dos modelos de negócio das operadoras.

Isto é, a proibição de cobrança implicaria na obrigação de se prestarem serviços gratuitos ao consumidor inadimplente, em que a Anatel estaria "tabelando" o preço em "zero" durante o período imediatamente posterior à deflagração da "régua de suspensão".

O Professor Egon Bockmann Moreira (2024 p. 249 et seq.), ao discorrer sobre a prestação do serviço adequado, diz que é necessário que se preserve a isonomia de tratamento dos usuários - em que o benefício concedido a uma parte deles impacta as tarifas cobradas dos demais - e que é inviável a prestação de serviços gratuitos ou abaixo do custo.

Aliás, o voto oral do ilustre Conselheiro Artur Coimbra, proferido na 926ª Reunião do Conselho Diretor, converge com essa linha de pensamento ao ponderar que é necessária "a manutenção do equilíbrio entre a preservação dos direitos, a preservação de recuperação do crédito pelas prestadoras e a não-oneração do usuário adimplente".

O Professor Moreira adverte, ainda, que a pedra de toque dos serviços públicos deve ser a sua sustentabilidade financeira, em que o vínculo entre concessionário e usuários é tanto contratual quanto coletivo, com direitos e deveres recíprocos.

Destaca-se que a ideia de sustentabilidade se aplica tanto para os serviços prestados em regime público como para os prestados em regime privado, aos quais se assegura maior margem de liberdade à prestadora, especialmente no que diz respeito à liberdade de precificação, expressamente determinada no art. 129 da LGT.

Com efeito, traz-se à baila o pensamento da Conselheira Cristiana Leão (2014, p. 73-75), que, em trabalho primoroso, expõe didaticamente as diferenças entre os regimes de prestação nos serviços de telecomunicações, concluindo que, no regime privado, há maior liberdade para a iniciativa privada em comparação ao regime público.

Por fim, especialmente no que diz respeito aos serviços prestados em regime público, a proibição de cobrança implica em desconto de 100% no preço dos serviços referidos no art. 72, I, do RGC, sem que haja esse desconto para os usuários adimplentes.

Esses serviços compreendem o recebimento de chamadas e de mensagens de texto pelo prazo de 30 (trinta) dias do início da suspensão; a possibilidade de originar chamadas e enviar mensagens de texto aos serviços públicos de emergência definidos na regulamentação; a manutenção de seu código de acesso, nos termos da regulamentação; e o acesso ao Atendimento Telefônico da Prestadora.

Desse rol, apenas o Serviço de Atendimento ao Consumidor - SAC (art. 3º do Decreto nº 11.034/2022) e os serviços de emergência são gratuitos (art. 109, inc. II, da LGT e arts. 65-A e seguintes da Resolução nº 73, de 25 de novembro de 1998 - Regulamento de Serviços), seja por determinação legal ou infralegal.

Nada obstante, acrescenta-se que a desativação de código de acesso e o seu reaproveitamento sujeita-se a regime de quarentena de seis meses (art. 32 do RGN e item 22 do Ato nº 13672, de 27 de setembro de 2022, que aprova o Procedimento para a Atribuição e Designação de Recursos de Numeração).

Feita essa ressalva, a imposição do fornecimento de novos serviços gratuitos para além daqueles acima mencionados, ainda que com limitação no tempo (30 dias), implica em novo condicionamento para o exercício da atividade autorizada. Embora a imposição de novos condicionamentos não seja vedada, ela depende de expedição de medida correlata formal neste sentido, inclusive com observância das suas consequências nos termos do art. 20 da LINDB.

Lembra-se que, no Voto do ilustre relator, não se conseguiu aferir o custo dos serviços tornados gratuitos com o novo RGC, o que demonstra, por si só, a impossibilidade de se avaliar as consequências práticas da decisão, as quais não são triviais.

Assim, ao determinar a proibição de cobranças durante o período de suspensão, ressalvado os serviços que já são gratuitos por regulamentação específica, o art. 74 do novo RGC viola os arts. 109, I, para os serviços concedidos, prestados em regime público, e 129 c/c 130 e 109, II, aplicável subsidiariamente, da LGT, para os serviços autorizados, prestados em regime privado.

Desta forma, anula-se o art. 74 do RGC e, por arrastamento, o seu art. 72, inc. I, alín. "a", o qual determina que as prestadoras do SMP e do STFC devem garantir ao Consumidor o recebimento de chamadas e de mensagens de texto pelo prazo de 30 (trinta) dias do início da suspensão, uma vez que são serviços caracterizados como onerosos. 

Por outro lado, destaca-se que essa anulação não afasta o cumprimento do art. 72, inc. I, alíneas "b", "c" e "d", relacionadas à manutenção dos serviços de emergência, do código de acesso e da utilização do SAC, os quais, nos termos de suas regulamentações respectivas, não podem trazer custos ao consumidor.

Possibilidade de contratação de serviços onerosos, desde que atendidas determinadas condições:

À semelhança das ponderações trazidas nos tópicos anteriores, e com a possibilidade de cobrança de serviços fornecidos após a inadimplência, essa anulação não afasta situações em que se verifique, a posteriori, a ocorrência de práticas abusivas nos termos do art. 39 do CDC e, sem prejuízo do cumprimento do art. 54, caput, também do CDC, além do Decreto nº 11.034/2022 e do Regulamento de Serviços, acima comentados.

Os contratos de consumo nos serviços de telecomunicações, caracterizam-se pelos seus aspectos sinalagmático e oneroso, impondo obrigações recíprocas entre prestadoras (notadamente a de fornecer o serviço contratado) e usuários (notadamente, a de pagar pelo serviço), em que essas obrigações se traduzem na vantagem buscada pela contraparte na relação.

Por sua vez, repisa-se que o art. 39, incs. V e X, do CDC, anteriormente estudado, determina que exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva e elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços são condutas com que ensejam o cometimento de prática abusiva, a exemplo do que ocorre com a cobrança de tráfego de dados de usuários sem o fornecimento do serviço correspondente.

Além disso, o art. 6º, incs. III a V, do CDC elencam uma série de direitos básicos do consumidor no que diz respeito à informação adequada, à boa-fé contratual e à desproporção das prestações, verbis (com grifos acrescidos):

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(...)

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (Redação dada pela Lei nº 12.741, de 2012)

IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

Comentando a ideia de sinalagma contratual, o Professor Bruno Miragem (2016, p. 331-332) pontua que os contratos de consumo devem ser pautados pelo conceito de equivalência material, o qual está associado a uma relação de justeza entre o valor do produto e o valor do que pode ser adquirido com o dinheiro pelo qual foi vendido (justa causa e justo preço).

Essa ideia denota que as partes em um contrato devem ter um equilíbrio justo nas suas prestações, garantindo que o valor do produto corresponda ao valor pago, conforme acordado entre elas no exercício de sua liberdade contratual.

Ainda, destaca-se, novamente, que o art. 129 da LGT, conforme discorrido anteriormente, assegura a liberdade de precificação nos serviços prestados em regime privado, em que essa relação de justeza não pode, em nenhuma hipótese implicar tabelamento dos serviços.

Embora não seja possível elencar exaustivamente todas as ações que podem ser adotadas pela prestadora para mitigar o risco de cometimento das práticas potencialmente abusivas em estudo, algumas diretrizes já podem ser adotadas de pronto, pelo Grupo de Implantação a que se refere o art. 93 do RGC para que sejam inseridas no Manual Operacional referido no seu art. 95, a saber:

caso haja transcurso do prazo do art. 70 sem pagamento, emprego de default de suspensão total dos serviços, com exceção dos serviços gratuitos por força de Lei, Decreto ou Regulamento, sem que haja cobrança do consumidor a partir daí;

a critério da prestadora, em avaliação objetiva e não-discriminatória, possibilidade de o consumidor optar pela continuidade dos demais serviços prestados mediante cobrança - isto é, de forma onerosa - desde que atendidos os seguintes pontos:

manifestação expressa do consumidor que denote sua intenção inequívoca nessa contratação, durante a contratação ou posteriormente a ela. Trabalha-se com a premissa de que a suspensão dos serviços pagos, mas sem a possibilidade de cobrança a partir do transcurso do prazo do art. 70 do RGC é mais benéfica ao usuário, empregando-se, aqui, um nudge (SUNSTEIN, 2021, p. 9-10). No entanto, permite-se-lhe que proceda a tal contratação após um processo de escolha com mais obstáculos, de forma que a confirmação se transforme em instrumento que lhe permita refletir sobre as suas consequências, especialmente as de caráter financeiro;

identificação granular dos serviços que serão efetivamente fornecidos, com indicação do valor individual de cada um deles e do valor total a ser pago pelo consumidor, ressaltando-se que a identificação granular dos serviços e de seus valores individuais não dá direito ao consumidor de desmembrar o pacote a ele oferecido a fim de escolher pontualmente eventuais serviços que pretende manter em caso de inadimplência; e

emprego de linguagem simples, intuitiva e direta que permita que o consumidor facilmente compreenda as consequências da escolha realizada.

 

VI - Aderência aos objetivos do Decreto Presidencial nº 11.738, de 18 de outubro de 2023

 

Inicialmente, destaca-se que o novo RGC foi reconhecido pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços como um instrumento de boa prática regulatória. Esse reconhecimento levou a Anatel a receber recentemente o "Selo de Boas Práticas Regulatórias - Padrão Outro". Essa premiação foi concedida devido ao teor e às rotinas adotadas para a aprovação desse normativo, com base nos critérios estatuídos na Portaria GM/MDIC nº 69, de 3 de abril de 2023: Previsibilidade, Qualidade Regulatória, Participação Social, Convergência Regulatória e Fardo Regulatório.

Em 19 de outubro de 2023, foi editado o Decreto Presidencial nº 11.738, cujo escopo é a institucionalização do "Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação - PRO-REG, com a finalidade de apoiar a implementação de boas práticas regulatórias e de aprimorar a coordenação do processo regulatório na administração pública federal direta, autárquica e fundacional" (art. 1º, com grifos acrescidos).

É importante anotar que ele estabelece uma série de objetivos, os quais já comportam densidade normativa suficiente para orientar a atuação dos diversos entes que compõem a administração pública federal, incluindo a Anatel.

Dentre esses objetivos, elencam-se os seguintes (art. 3º):

Art. 3º O PRO-REG contemplará a formulação e a adoção de medidas que objetivem:

I - fortalecer, simplificar e racionalizar o sistema regulatório;

II - fortalecer a capacidade de formulação e análise de políticas públicas no processo regulatório;

III - disseminar boas práticas regulatórias nacionais e internacionais aos órgãos e às entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional;

IV - aprimorar a coordenação e o alinhamento estratégico entre as políticas setoriais e o processo regulatório;

V - contribuir para o desenvolvimento e fortalecimento das capacidades regulatórias dos órgãos e das entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional;

VI - desenvolver e aperfeiçoar mecanismos de controle social e de transparência no âmbito do processo regulatório;

VII - promover o fortalecimento da autonomia, transparência e eficiência das agências reguladoras; e

VIII - apoiar tecnicamente os órgãos e as entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional na implementação de medidas de boas práticas regulatórias.

Ressalta-se, ainda, que, no âmbito do PRO-REG, publicou-se o Decreto nº 12.150, de 20 de agosto de 2024, instituiu, a Estratégia Nacional de Melhoria Regulatória - Estratégia Regula Melhor. Tal estratégia tem a finalidade estabelecer e difundir boas práticas regulatórias, com foco no cidadão, de modo a promover a evolução contínua do processo regulatório, aprimorar o ambiente de negócios e assegurar os interesses da sociedade. Tem como objetivo geral e objetivos específicos os seguintes:

Art. 4º O objetivo geral da Estratégia Regula Melhor é aprimorar a qualidade regulatória, observada a necessidade de reduzir assimetrias na adoção de boas práticas entre agentes reguladores.

Art. 5º São objetivos específicos da Estratégia Regula Melhor:

I - comunicar, sensibilizar e promover o engajamento dos diversos atores envolvidos na atividade regulatória, com vistas à adoção consistente, ampla e efetiva de boas práticas;

II - estimular a criação, o compartilhamento e o uso do conhecimento;

III - incentivar a cooperação entre os reguladores das esferas federativas e outros atores relevantes no processo regulatório em âmbito local, nacional e internacional;

IV - desenvolver capacidades institucionais necessárias às atividades de regulação;

V - promover a revisão periódica do estoque regulatório, a simplificação da regulação e a adoção de medidas regulatórias para reduzir a burocracia e os custos regulatórios e para incentivar a inovação;

VI - ampliar a transparência e a participação social efetiva, inclusiva e contínua; e

VII - articular-se com os órgãos e as entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, com vistas a promover a coerência regulatória e a concorrência nos mercados e apoiar as decisões com base em evidências.

O Regula Melhor estabelece a necessidade de promover uma regulação eficiente, que minimize os custos regulatórios para os agentes econômicos e a sociedade, ao mesmo tempo que simplifica o processo regulatório.

Recentemente, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) firmou um memorando de entendimento, de caráter não vinculante, com o Escritório de Informações e Assuntos Regulatórios dos Estados Unidos, buscando aprimorar as regulamentações por meio da troca de conhecimentos.

Esse acordo é parte da Estratégia Nacional de Boas Práticas Regulatórias e inclui a criação de recomendações técnicas e a realização de projetos-piloto em ambientes controlados. Além disso, almeja fortalecer o entendimento dos sistemas regulatórios de ambos os países, promover o comércio e o investimento, e adotar práticas regulatórias eficientes e inovadoras.

O item 1.5 do acordo em questão preconiza que as boas práticas regulatórias, aplicáveis durante a atividade normativa, devem:

i. basear-se em processos de tomada de decisão baseados em evidências;

ii. servir a objetivos de política claramente identificados e sejam eficazes em alcançar esses objetivos;

iii. considerar os efeitos distributivos dos regulamentos na sociedade, incluindo efeitos econômicos, ambientais e sociais;

iv. minimizar custos e distorções de mercado;

v. proporcionar benefícios que justifiquem seus custos;

vi. incentivar abordagens regulatórias que evitem encargos e restrições desnecessárias à inovação e competição no mercado;

vii. ser claros, simples e práticos para os usuários;

viii. não criar inconsistências com regulamentos e políticas existentes do governo federal de cada Participante;

ix. ser compatíveis, quando apropriado, com princípios de concorrência, comércio e investimento nacionais e internacionais;

x. ser consistentes com obrigações internacionais;

xi. promover aspectos relacionados à transparência e participação de entidades reguladas e usuários no processo regulatório;

xii. incentivar a previsibilidade no processo regulatório para empresas e investidores; e

xiii. incentivar a adoção de tecnologias emergentes e a digitalização dos processos regulatórios, facilitando assim a adaptação às mudanças tecnológicas e promovendo maior eficiência e agilidade nas interações entre reguladores e partes reguladas.

A fundamentação apresentada está em consonância com esses objetivos, especialmente no que se refere ao fortalecimento da capacidade de formulação e análise de políticas públicas no processo regulatório. Ela busca, sobretudo, consagrar o princípio da liberdade de escolha do consumidor, associando-o à aplicação de soluções das ciências comportamentais que têm como objetivo simplificar sua vida.

Com isso, dá-se maior concretude aos incisos I, II e III, anotando-se que, quanto ao último, a OCDE vem reiteradamente estimulando a inibição do emprego dos padrões comerciais obscuros em detrimento do consumidor, conforme será visto posteriormente.

 

VII - As boas práticas regulatórias recomendadas pelo Programa de Aprimoramento da Qualidade da Regulação Brasileira

 

Por sua vez, O Programa de Aprimoramento da Qualidade da Regulação Brasileira (QualiREG) é uma iniciativa da Controladoria Geral da União, realizada com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e do Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos (UNOPS), para disseminar uma cultura de mensuração sistemática da qualidade regulatória no Brasil. O QualiREG procura compreender as dificuldades enfrentadas pelas agências e outros entes que atuam nessa área e promover ações para superá-las.

A CGU, no livro digital “Boas Práticas Regulatórias do QualiREG – Programa de Aprimoramento da Qualidade da Regulação Brasileira”, elaborado em parceria com o UNOPS e o PNUD, reúne experiências e pesquisas aplicadas sobre a construção da capacidade institucional dessas entidades, além de debates sobre os desafios e oportunidades nessa temática.

Na referida obra, Patrícia Valente (2024, p. 49) destaca que:

Nesse debate, um dos principais, senão o principal requisito que caracteriza as agências reguladoras, é a autonomia decisória dessas entidades da administração pública indireta. Não se discute que as agências, para que possam atingir seus objetivos, devam tomar suas decisões conforme suas próprias motivações técnicas. Isso significa, na prática, garantir que essas estruturas administrativas decidam conforme seu melhor julgamento técnico, com respaldo em procedimentos que as legitimam, e em última instância sobre as matérias que a lei lhes reserva. Se na criação das agências reguladoras esses requisitos não eram familiares, passadas mais de 2 décadas, já são aceitos e espera-se que sejam aplicados na prática em diversos setores da economia brasileira.

(...)

Nesse contexto, os fundamentos adotados, que buscam promover uma maior autonomia do consumidor - aprimorada tanto pela ampliação de sua liberdade contratual quanto pela promoção de seu bem-estar por meio de soluções da economia comportamental - constitui-se uma melhoria da qualidade regulatória da Anatel, tomada em bases técnicas que encontram consenso mesmo em nível internacional.

 

VIII - As boas práticas regulatórias recomendadas pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE

 

Nos últimos anos, o Brasil tem aderido, ainda que não membro, a diversas recomendações da OCDE. Essa organização mantém vários grupos de trabalho que discutem temas como governança das instituições estatais, transparência, relacionamento com o cidadão, com o mercado e com as entidades da sociedade civil, regulação (incluindo a transição para a economia digital), entre outros. Dessa forma, tais temas ganham um tom estratégico que vai além do ordenamento constitucional brasileiro. Assim, busca-se fornecer não apenas soluções que melhorem o bem-estar das pessoas, mas que, igualmente, auxiliem as instituições a chegarem a soluções de forma eficiente.

A OCDE (2022, p. 21 e seguintes) tem incentivado a adoção de medidas para inibir práticas comerciais obscuras, pois essas práticas causam diversos tipos de danos aos consumidores, como a redução da autonomia, perdas financeiras, danos à privacidade, perda de confiança, distorções na competição, frustração e eventos psicológicos adversos semelhantes, entre outros.

A decisão adotada está alinhada com as práticas recomendadas pela OCDE, pois mantém o RGC, que estipula a inibição de dark patterns por parte dos fornecedores e considera a possibilidade de aplicação de nudges que tragam benefícios ao consumidor.

 

IX - A relação com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU)

 

A Agenda 2030 constitui-se em compromisso assumido por todos os países que fizeram parte da Cúpula das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, em 2015, a qual contempla os 193 Estados-membros da ONU, incluindo o Brasil. Conforme disposto no sítio eletrônico da Organização das Nações Unidas no Brasil (https://brasil.un.org/pt-br/sdgs):

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável são um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade. Estes são os objetivos para os quais as Nações Unidas estão contribuindo a fim de que possamos atingir a Agenda 2030 no Brasil.

São 17 (dezessete) os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que compõem a Agenda 2030, conforme figura abaixo:

Fonte: https://brasil.un.org/pt-br/sdgs

O Brasil é um dos países signatários da referida Agenda, cuja importância é reconhecida mundialmente por seus objetivos de erradicar a pobreza, além de respeitar e proteger o meio ambiente e o clima. Como resultado esperado, estima-se proporcionar às pessoas uma vida mais digna e justa.

Entende-se, portanto, que a Agenda 2030 possui um caráter obrigatório para o Poder Executivo brasileiro. Com efeito, em meados do ano de 2016, editou-se o Decreto Presidencial nº 8.892, que tinha por escopo, "internalizar, difundir e dar transparência ao processo de implementação da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas, subscrita pela República Federativa do Brasil" (art. 1º).

Em 2023, o Decreto Presidencial nº 11.704 revogou o Decreto nº 8.892, mas instituiu a Comissão Nacional para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, com a finalidade de contribuir para a internalização da Agenda 2030 no País (art. 1º, inc. I), competindo-lhe, dentre outros pontos, acompanhar e monitorar o alcance dos ODS (art. 2º, inc. II) e identificar, sistematizar e divulgar boas práticas e iniciativas que colaborem para o alcance dos ODS (art. 2º, inc. IV).

Por meio dos referidos Decretos, o Brasil firmou seu compromisso na implementação dos objetivos e indicadores da mencionada Agenda. Pontua-se que a Agenda 2030 estabelece diretrizes, já a implementação concreta dos objetivos e indicadores é responsabilidade das instituições governamentais dos países signatários.

O Decreto Presidencial nº 11.704/2023 simboliza um ato de reafirmação do compromisso brasileiro com a implementação dos ODS, sendo de observância obrigatória pelos órgãos e entidades do Poder Executivo Federal, incluindo a Anatel.

A Anatel, responsável pela concepção, implementação e monitoramento de políticas públicas de ampliação de conectividade no setor de telecomunicações, tem a discricionariedade para avaliar quais políticas públicas estão mais alinhadas com os ODS, que são de observância obrigatória pela Agência.

Os fundamentos adotados relacionam-se com Objetivo 16 ("Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis"), na medida em que buscam promover uma maior harmonização na relação entre as prestadoras (fornecedoras) e seus usuários (consumidores).

Como consequência, identifica-se o atendimento das seguintes metas:

16.3 Promover o Estado de Direito, em nível nacional e internacional, e garantir a igualdade de acesso à justiça, para todos: espera-se que haja uma maior efetividade da atuação da Anatel na condução das ações de promoção do bem-estar do consumidor que lhe dizem respeito no setor de telecomunicações, diminuindo as perspectivas de litigiosidade que se verificam historicamente no Brasil;

16.7 Garantir a tomada de decisão responsiva, inclusiva, participativa e representativa em todos os níveis: a inibição dos dark patterns constitui-se num passo adicional para uma inclusão e a responsividade regulatórias, pois, como consequência, espera-se que mais consumidores sejam afetados positivamente com os consectários da deliberação que ora se adota.

A Agenda 2030 foi objeto de alinhamento interno, para o caso brasileiro, sendo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), responsável por desenvolver metas brasileiras, conforme fundamentado estudo realizado pelo referido Instituto.

Destaca-se a meta nacional 16.3 - Fortalecer o Estado de Direito e garantir o acesso à justiça às pessoas envolvidas em conflitos, especialmente àquelas que se encontram em situação de vulnerabilidade, pois busca-se diminuir a litigiosidade em relações consumeristas.

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável são interconectados e desafiadores, tendo como foco principal o desenvolvimento humano no Brasil e no Mundo. As principais dimensões desse projeto têm natureza social, ambiental, econômica e institucional. O desenvolvimento do mundo somente é concebível por um caminho sustentável, com medidas verdadeiramente transformadoras. Justamente por isso, foram definidos 17 objetivos e 169 metas globais interconectadas, a serem atingidos até 2030.

Neste ponto, pela relevância do tema, destaca-se o Objetivo 1 da Agenda 2030 que é o de acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares. Para o caso analisado, destacam-se as seguintes metas:

Meta 1.3 - Implementar, em nível nacional, medidas e sistemas de proteção social adequados, para todos, incluindo pisos, e até 2030 atingir a cobertura substancial dos pobres e vulneráveis;

Meta 1.4 - Até 2030, garantir que todos os homens e mulheres, particularmente os pobres e vulneráveis, tenham direitos iguais aos recursos econômicos, bem como o acesso a serviços básicos, propriedade e controle sobre a terra e outras formas de propriedade, herança, recursos naturais, novas tecnologias apropriadas e serviços financeiros, incluindo microfinanças;

Meta 1.a - Garantir uma mobilização significativa de recursos a partir de uma variedade de fontes, inclusive por meio do reforço da cooperação para o desenvolvimento, para proporcionar meios adequados e previsíveis para que os países em desenvolvimento, em particular os países menos desenvolvidos, implementem programas e políticas para acabar com a pobreza em todas as suas dimensões; e

Meta 1.b - Criar marcos políticos sólidos em níveis nacional, regional e internacional, com base em estratégias de desenvolvimento a favor dos pobres e sensíveis a gênero, para apoiar investimentos acelerados nas ações de erradicação da pobreza.

O objetivo 1 possui a premissa mais sensível e básica de todas as outras. A pobreza extrema é o nível mais drástico para afetar o desenvolvimento dos países e a dignidade humana. Não sem motivo figura como primeiro objetivo da Agenda 2030. Todas as medidas regulatórias adotadas pela Anatel devem se atentar, em maior ou menor nível, ao combate sistemático e perene da pobreza.

O Brasil está empenhado no cumprimento dessas metas, sendo relevante o estudo desenvolvido pelo IPEA, quanto à adequação das metas globais da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável à realidade brasileira. Trata-se de um importante instrumento de suporte técnico e institucional às ações governamentais para a formulação e reformulação de políticas públicas e programas nacionais de desenvolvimento.

Com essa iniciativa, o Brasil ganha destaque no sentido de ter à sua disposição um instrumento orientativo para a territorialização dos ODS, sem perder de vista os fundamentos da proposta original.

CONCLUSÃO

Voto por:

não conhecer da Petição Denúncia de Conflito de Interesses (SEI nº 12050064) e da Pedido de Habilitação como 3º Interessado, da Associação NEO (SEI nº 12467554);

rejeitar a suspeição arguida, submetendo a sua deliberação ao Conselho Diretor da Anatel, nos termos do art. 49, § 1º, do RIA;

indeferir o pedido de ingresso apresentado por IDEC - Instituto de Defesa de Consumidores;

declarar prejudicado o pedido de anulação quanto ao art. 39, § 2º, do Anexo da Resolução Anatel nº 765, de 6 de novembro de 2023, que aprova o Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações, pela sua revogação superveniente; 

deferir, em parte, o pedido para anular os arts. 23, 31, § 2º, 34, § 2º, 39, § 1º (por arrastamento), 74, o art. 72, inc. I, alín. "a" (por arrastamento), e anular parcialmente, com redução de texto, o art. 21, § 3º, inc. IV - dele retirando a expressão "da data da contratação" - e o art. 39, caput, - dele retirando a expressão "contados da data da contratação da Oferta pelo Consumidor" - todos do Anexo da Resolução Anatel nº 765, de 6 de novembro de 2023, que aprova o Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações;

fixar interpretação, com fundamento no art. 133, inc. XXXII, do RIA, no sentido de que:

o sentido e alcance do termo "oferta" no art. 21, caput, do novo RGC, compreende apenas a oferta principal, com exclusão de produtos e serviços acessórios;

o termo "renovação automática", no art. 36, §2º, compreende apenas aquelas situações para as quais não houve consentimento expresso do consumidor em tal sentido, sendo válidas as renovações quando previa e expressamente autorizadas, seja durante a contratação, seja posteriormente a ela;

acompanhar parcialmente a Análise nº 4/2024/RG (SEI nº 11509210) para:

não conhecer das petições extemporâneas nos termos da Análise 4/2024/RG (SEI nº 11509210);

rejeitar os pedidos de anulação das disposições não mencionadas no item 6.1.5;

determinar ao Grupo de Implantação a que se refere o art. 93 do RGC que proceda às devidas conformações da presente decisão no Manual Operacional referido no seu art. 95, com observância das seguintes diretrizes:

para os fins do art. 21, caput, considerar o entendimento no sentido de que o termo "oferta" compreende apenas a oferta principal, com exclusão de facilidades adicionais que não são inerentes ao serviço que se pretende contratar;

no que diz respeito ao sentido e alcance do art. 36, § 2º, do RGC fixa-se entendimento no sentido de que o termo "renovação automática" compreende apenas aquelas situações para as quais não houve consentimento expresso do consumidor em tal sentido, sendo válidas as renovações quando prévia e expressamente autorizadas, seja durante a contratação, seja posteriormente a ela;

para mitigar os riscos de que o consumidor fique sem serviço de telecomunicações em virtude de sua inércia, empregue soluções das ciências comportamentais para estimulá-lo a ter uma postura ativa perante o seu contrato;

para os fins do art. 39, fazer, caso necessário, os devidos ajustes no Manual Operacional para que ali sejam consignadas as rotinas que permitam ao consumidor internalizar adequadamente a data-base do contrato, de modo a poder avaliar adequadamente se deve ou não contratar determinado produto de telecomunicações;

caso haja transcurso do prazo do art. 70 sem pagamento, emprego de default de suspensão total dos serviços, com exceção dos serviços gratuitos por força de Lei, Decreto ou Regulamento, sem que haja cobrança do consumidor a partir daí;

a critério da prestadora, em avaliação objetiva e não-discriminatória, possibilidade de o consumidor optar pela continuidade dos demais serviços prestados mediante cobrança - isto é, de forma onerosa - desde que atendidos os seguintes pontos:

manifestação expressa do consumidor após a suspensão do serviço, que denote sua intenção inequívoca nessa contratação. Trabalha-se com a premissa de que a suspensão dos serviços pagos, mas sem a possibilidade de cobrança a partir do transcurso do prazo do art. 70 do RGC é mais benéfica ao usuário, empregando-se, aqui, um nudge (SUNSTEIN, 2021, p. 9-10). No entanto, permite-se-lhe que proceda a tal contratação após um processo de escolha com mais obstáculos, de forma que a confirmação se transforme em instrumento que lhe permita refletir sobre as suas consequências, especialmente as de caráter financeiro;

identificação granular dos serviços que serão efetivamente fornecidos, com indicação do valor individual de cada um deles e do valor total a ser pago pelo consumidor; e

emprego de linguagem simples, intuitiva e direta que permita que o consumidor facilmente compreenda as consequências da escolha realizada;

dar conhecimento da presente decisão ao Centro de Altos Estudos em Comunicações Digitais e Inovações Tecnológicas (Ceadi), para adoção das providências que entender cabíveis relativamente ao Nudge.lab; e

cumpridas as determinações acima, arquivar o processo.


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Documento assinado eletronicamente por Alexandre Reis Siqueira Freire, Conselheiro, em 23/12/2024, às 17:43, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 23, inciso II, da Portaria nº 912/2017 da Anatel.


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Referência: Processo nº 53500.113347/2023-41 SEI nº 12633519