Análise nº 64/2024/AF
Processo nº 53500.033378/2019-33
Interessado: Tim S A
CONSELHEIRO
ALEXANDRE FREIRE
ASSUNTO
Recurso Administrativo com pedido de efeito suspensivo, contra o Despacho Decisório nº 4/2020/COGE/SCO (SEI nº 5088422), que aplicou sanções em decorrência de violação ao Regulamento de Remuneração pelo Uso de Redes de Prestadoras do Serviço Telefônico Fixo Comutado (RUR/STFC), aprovado pela Resolução nº 588, de 7 de maio de 2012.
EMENTA
DIREITO REGULATÓRIO. RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DE DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES. PETIÇÃO EXTEMPORÂNEA. CONHECIMENTO. ENUNCIADO Nº 21 DA ANATEL. RETENÇÃO INDEVIDA DE RECEITAS DE REMUNERAÇÃO PELO USO DE REDES. POSSIBILIDADE DE AGRAVAMENTO DA SANÇÃO. ENUNCIADO Nº 22 DA SÚMULA DA ANATEL. INFRAÇÃO QUE SE CONSUMA COM A MERA RETENÇÃO, INDEPENDENTEMENTE DE PAGAMENTO POSTERIOR, PERDURANDO ATÉ A SATISFAÇÃO DO DÉBITO. ART. 23 DO RRUR-STFC. PGMC. AUSÊNCIA DE REVOGAÇÃO. ENTENDIMENTO DA ÁREA TÉCNICA POSTERIORMENTE INVALIDADO PELO CONSELHO DIRETOR. BOA-FÉ QUE PERSISTE ATÉ A PUBLICAÇÃO DA DECISÃO DE INVALIDAÇÃO. ROL. EMPREGO DAQUELA MAIS PRÓXIMA DA DATA DA SANÇÃO DE PRIMEIRA INSTÂNCIA. VALOR BASE DA MULTA QUE NÃO PODE SER INFERIOR AO DOBRO DO PROVEITO ECONÔMICO. INCIDÊNCIA DO ART. 18, § 2º, DO RASA. IDENTIFICAÇÃO DE NOVAS AGRAVANTES OCORRIDAS APÓS O INÍCIO DO QUINQUÊNIO QUE ANTECEDE O COMETIMENTO DA INFRAÇÃO. INCORPORAÇÃO NA DOSIMETRIA DA MULTA. CESSAÇÃO DA INFRAÇÃO APÓS AÇÃO DA ANATEL. AFASTAMENTO DA ATENUANTE DE NOVENTA POR CENTO DO ART. 20, INC. I, DO RASA. ATENUANTE MAIS BENÉFICA DECORRENTE DE ALTERAÇÃO NORMATIVA POSTERIOR À OCORRÊNCIA DA INFRAÇÃO. INAPLICABILIDADE. TEMPUS REGIT ACTUM. ENTENDIMENTO DO STJ. PREVISÃO EXPRESSA DO RASA. CORREÇÃO MONETÁRIA. RECOMPOSIÇÃO DO VALOR REAL DO PROVEITO ECONÔMICO. MANUTENÇÃO. ATENDIMENTO AOS OBJETIVOS DO DECRETO PRESIDENCIAL Nº 11.378, DE 18 DE OUTUBRO DE 2023, AO DECRETO Nº 12.150, DE 20 DE AGOSTO DE 2024, AO PROGRAMA DE APRIMORAMENTO DA QUALIDADE DA REGULAÇÃO BRASILEIRA - QUALIREG, ÀS DIRETRIZES DA OCDE SOBRE A PROMOÇÃO DO ENFORCEMENT REGULATÓRIO, AOS OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DA AGENDA 2030 DA ONU.
1. Nos termos da Súmula nº 21, de 10 de outubro de 2017, é facultado o conhecimento de petições extemporâneas protocolizadas após a data de divulgação da pauta de Reunião do Conselho Diretor na Biblioteca e na página da Agência na internet e até o julgamento da matéria, sobretudo se a manifestação noticiar fato novo ou relevante que possa alterar o desfecho do processo. Conhecimento das petições extemporâneas protocoladas em 26 de junho de 2024 e em 21 de agosto de 2024.
2. Nos termos do Enunciado nº 22 da Súmula da Anatel, "é possível o agravamento da sanção imposta no âmbito do julgamento de recursos administrativos e pedidos de reconsideração (reformatio in pejus), desde que oportunizada manifestação prévia ao interessado e ouvida a Procuradoria Federal Especializada junto à Anatel".
3. A infração ao art. 3º do Regulamento de Remuneração pelo Uso de Redes de Prestadoras do Serviço Telefônico Fixo Comutado - RRUR-STFC, aprovado pela Resolução nº 588, de 7 de maio de 2012, consuma-se com a mera retenção indevida de receitas, não sendo afastada pelo posterior pagamento.
4. O art. 23 do RRUR-STFC não foi revogado pela Resolução nº 600, de 8 de novembro de 2012, que criou o Plano Geral de Metas de Competição (PGMC). Precedente do Conselho Diretor.
5. Presume-se a boa-fé do administrado sobre o teor de ato nulo praticado pela Anatel até o momento em que ele toma conhecimento da decisão que a invalida, diretamente ou por meio de publicação oficial.
6. Uma vez publicada a decisão que invalidou o ato nulo que daria lastro à retenção de receitas praticada pela infratora, esta deveria, de imediato, adotar as medidas necessárias para cessar tal prática. Identificada a retenção indevida por cerca de dois anos e meio, solucionada apenas após ação efetiva da Anatel, devem ser aplicadas as penalidades resultantes do descumprimento do art. 3º do RRUR-STFC.
7. A infração ao art. 3º do RRUR-STFC é de caráter permanente e perdura desde o momento da retenção indevida das receitas até o momento em que ocorre a sua liberação.
8. Para fins de cálculo de multa, utiliza-se a Receita Operacional Líquida (ROL) da Infratora mais próxima disponível no momento da decisão primeira instância.
9. Nos termos do art. 18, § 2º, do RASA, o valor-base da sanção pecuniária não deve ser inferior ao dobro da vantagem auferida com retenção indevida de receitas da remuneração pelo uso de redes.
10. Identificadas novas agravantes dentro do quinquênio que antecede o cometimento da infração, deve-se proceder ao seu cômputo, com as devidas repercussões no cálculo da pena de multa.
11. A cessação da infração após provocação da Anatel afasta a aplicação da atenuante prevista no art. 20, inc. I, do RASA, no percentual de noventa por cento.
12. Conforme entendimento do STJ, pelo princípio tempus regit actum, a aplicação da pena deve obedecer aos critérios vigentes na data da infração, ressalvada previsão expressa em sentido diverso. O §2º do art. 5º da Resolução nº 746, de 22 de junho de 2021, determina que “as alterações promovidas ao RASA aplicam-se a todos os processos pendentes de decisão de primeira instância, quando da sua entrada em vigor”. As alterações do RASA entraram em vigor em 1º de julho de 2021, quando já havia decisão de primeira instância neste processo. Incide, portanto, a atenuante de cinquenta por cento nos termos da redação original do art. 20, inc. II, do RASA, com afastamento da atenuante de setenta por cento, resultante de alteração normativa posterior à decisão de primeira instância.
13. A correção monetária do proveito econômico é uma medida destinada a recompor o seu valor real para o momento presente, não sendo afastada nem mesmo pelo pagamento.
14. A decisão fundamenta-se no Decreto Presidencial nº 11.738, de 18 de outubro de 2023, que dispõe sobre o Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação - PRO-REG, no sentido de prestigiar boas práticas regulatórias, com princípios, estratégias, ações e procedimentos destinados a promover a melhoria da qualidade da regulação por meio do aperfeiçoamento contínuo do processo regulatório.
15. A decisão considera integralmente os estudos apresentados no livro digital “Boas Práticas Regulatórias do QualiREG – Programa de Aprimoramento da Qualidade da Regulação Brasileira” elaborado pela CGU em parceria com o Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos (UNOPS) e com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), e no presente caso, reforçam a capacidade regulatória da Anatel para inibir a consolidação de cenários de concorrência desleal resultante da retenção indevida de receitas de remuneração pelo uso de redes.
16. A fundamentação está alinhada com as recomendações da OCDE para manutenção de um ambiente regulatório marcado por regras claras e efetivas, contribuindo para um ambiente competitivo saudável.
17. A decisão contribui significativamente para o cumprimento do Objetivo 16 (notadamente das metas 16.3, 16.6 e 16.7) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas, e das metas brasileiras 16.3 e 16.7, devidamente revisadas pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), voltadas à universalização do acesso à justiça e à construção de instituições eficazes, responsáveis e inclusivas, na medida em que se reafirma a força normativa dos regulamentos da Anatel, com a devida resposta regulatória e com o emprego dos instrumentos adequados ao caso em apreciação.
18. Recurso administrativo conhecido e não provido.
19. Reforma de ofício, com majoração da pena de multa.
REFERÊNCIAS
Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, Lei Geral de Telecomunicações - LGT.
Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal (LPA).
Decreto nº 11.738, de 18 de outubro de 2023, que dispõe sobre o Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação - PRO-REG.
Decreto nº 12.150, de 20 de agosto de 2024, que instituiu a Estratégia Nacional de Melhoria Regulatória - Estratégia Regula Melhor.
Regulamento de Remuneração pelo Uso de Redes de Prestadoras do Serviço Telefônico Fixo Comutado (RRUR/STFC), aprovado pela Resolução nº 588, de 7 de maio de 2012.
Resolução nº 589, de 7 de maio de 2012, que aprova o Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas (RASA).
Resolução nº 600, de 8 de novembro de 2012, atualizada pela Resolução nº 694, de 17 de julho de 2018 - Plano Geral de Metas de Competição (PGMC).
Resolução nº 612, de 29 de abril de 2013, que aprova o Regimento Interno da Anatel (RIA).
BRASIL. Agência Nacional de Telecomunicações. Acórdão nº 42/2016-CD, de 05 de fevereiro de 2016, no processo nº 53500.016003/2015-85. Relator: Conselheiro Aníbal Diniz. Brasília, 2016.
_____. Agência Nacional de Telecomunicações. Acórdão nº 295, de 19 de agosto de 2016, no processo nº 53500.016003/2015-85. Relator: Conselheiro Igor Vilas Boas de Freitas. Brasília, 2016.
_____; Agência Nacional de Telecomunicações. Acórdão nº 657, de 20 de dezembro de 2019, no processo nº 53500.043874/2018-14. Relator: Conselheiro Emmanoel Campelo de Souza Pereira. Brasília, 2019.
_____. Agência Nacional de Telecomunicações. Acórdão nº 68, de 10 de março de 2020, no processo nº 53500.030979/2016-41. Relator: Conselheiro Moisés Queiroz Moreira. Brasília, 2020.
_____. Agência Nacional de Telecomunicações. Acórdão nº 111, de 26 de março de 2020, no processo nº 53500.004455/2013-52. Relator: Conselheiro Vicente Bandeira de Aquino Neto. Brasília, 2020.
_____. Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. Secretaria de Competitividade e Política Regulatória; Brasil. Advocacia-Geral da União. Secretaria de Atos Normativos; ESTADOS UNIDOS. Escritório de Gestão e Orçamento. Escritório de Informações e Assuntos Regulatórios; Estados Unidos. Departamento de Comércio. Administração de Comércio Internacional. Memorando de Entendimento sobre Cooperação Conjunta em Boas Práticas Regulatórias. Washington, D.C., 20 de setembro de 2024.
_____. Superior Tribunal de Justiça. Acórdão no Recurso Especial nº 2.103.140/ES. Relator: Ministro Gurgel de Faria. Brasília, 04 jun. 2024. Disponível em: STJ.Jus. Acesso em: 19 jun. 2024.
_____. Supremo Tribunal Federal. Acórdão no Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 641.054/RJ. Relator: Ministro Luiz Fux. Brasília, DJe 25 jun. 2012. Disponível em: STF. Acesso em: 18 jun. 2024.
_____. Supremo Tribunal Federal. Acórdão no Recurso Extraordinário nº 678.347/RN. Relator: Ministro Teori Zavascki. Brasília, 07 ago. 2014. Disponível em: STF.Jus. Acesso em: 18 jun. 2024.
COOTER, Robert; GILBERT, Michael. Public Law and Economics. New York: Oxford University Press, 2002.
HADDOCK, David D; MCCHESNEY, Fred S.; SPIEGEL, Menahem. Um fundamento econômico ordinário para sanções legais extraordinárias. Trad. Cristiano Carvalho. In: SALAMA, Bruno Meyerhof (coord.) Direito e economia – textos escolhidos. São Paulo; Saraiva, 2010, p. 143-209.
MOREIRA, Egon Bockmann. Processo administrativo: princípios constitucionais e a Lei nº 9.784/1999 - com especial atenção à LINDB. 6. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2022.
OCDE. Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Regulatory Enforcement and Inspections, OECD Best-Practice Principles for Regulatory Policy. Paris: OECD Publishing, 2014. Disponível em: doi.org. Acesso em: 01 mai. 2024.
ONU. Organização das Nações Unidas. Objetivos de Desenvolvimento Sustentável no Brasil. 2023. Disponível em: Brasil.org. Acesso em: 14 abr. 2023.
POLINSKY, A., Mitchell; SHAVELL, Steven. The Economic Theory of Public Enforcement of Law. Journal of Economic Literature, 38, p. 45-76, mar. 2000.
VALENTE, Patrícia Rodrigues Pessôa. Autonomia Decisória. In: VALENTE, Patrícia Rodrigues Pessôa (org.). Boas Práticas Regulatórias: Programa de aprimoramento da qualidade da Regulação Brasileira (QualiREG). Brasília: 2024, p. 49-55. Disponível em: CGU. Acesso em: 30 de abr. de 2024
RELATÓRIO
Trata-se de Recurso Administrativo com pedido de efeito suspensivo (SEI nº 5839267) interposto por TIM S.A. (TIM), sucessora por incorporação da TIM CELULAR S.A., CNPJ nº 02.421.421/0001-11, em face do Despacho Decisório nº 4/2020/COGE/SCO (SEI nº 5088422), de 04 de março de 2020, da Superintendente de Controle de Obrigações (SCO), exarado nos seguintes termos:
O SUPERINTENDENTE DE CONTROLE DE OBRIGAÇÕES, SUBSTITUTO, DA AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES, no uso de suas atribuições legais, regulamentares e regimentais, examinando o Procedimento para Apuração de Descumprimento de Obrigações em epígrafe, instaurado em face da TIM S.A. (sucessora por incorporação da TIM CELULAR S.A.), CNPJ/MF sob n.º 02.421.421/0001-11, em razão da constatação de indícios de infração às regras de remuneração de redes;
CONSIDERANDO o teor do Informe nº 7/2020/SEI/COGE/SCO (SEI nº 5086730), o qual se adota como razão de decidir,
RESOLVE:
1. Aplicar a sanção de MULTA no valor de R$ 1.419.089,15 (um milhão, quatrocentos e dezenove mil oitenta e nove reais e quinze centavos), nos termos do art. 173, II, da Lei nº 9.472/97, por violação art. 3º c/c o § 1.º do art. 23, ambos do Regulamento de Remuneração pelo Uso de Redes de Prestadoras do Serviço Telefônico Fixo Comutado – STFC, aprovado pela Resolução nº 588, de 7 de maio de 2012.
1.1 Caso a prestadora resolva, nos termos do disposto no § 5º do art. 33 do Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas, aprovado pela Resolução nº 589/12, renunciar expressamente ao direito de recorrer da decisão de primeira instância no prazo para recurso, fará jus a um fator de redução de 25% (vinte e cinco por cento) no valor da multa ora aplicada, desde que faça o recolhimento dentro do prazo de vencimento do boleto, totalizando para esse caso o montante de R$ 1.064.316,86 (um milhão, sessenta e quatro mil trezentos e dezesseis reais e oitenta e seis centavos).
O feito se trata de Procedimento para Apuração de Descumprimento de Obrigações (PADO) instaurado em 23 de agosto de 2019, por meio do Despacho Ordinatório de Instauração nº 382/2019/COGE/SCO (SEI nº 4527658), emitido pela Gerência de Controle de Obrigações Gerais (COGE), em desfavor da TIM S.A. (sucessora por incorporação da TIM CELULAR S.A.), CNPJ/MF nº 02.421.421/0001-11.
O procedimento foi deflagrado em decorrência da presença de indícios de infração ao art. 3.º, combinado com o art. 23, § 1º, ambos do Regulamento de Remuneração pelo Uso de Redes de Prestadoras do Serviço Telefônico Fixo Comutado – STFC, aprovado pela Resolução nº 588, de 7 de maio de 2012, em que a TIM teria deixado de realizar pagamentos relativos à remuneração pelo uso de redes de prestadoras do STFC entre os meses de junho e dezembro de 2015.
Os dispositivos citados encontram-se assim redigidos:
Art. 3º A remuneração pelo uso da Rede Local é devida à Prestadora de STFC quando sua Rede Local for utilizada para originar ou terminar chamadas e é calculada com base na Tarifa de Uso de Rede Local (TU-RL).
Art. 23. Para efeito deste Regulamento e até que a Anatel determine, no âmbito do PGMC (Plano Geral de Metas de Competição), quais são os Grupos detentores de PMS, as Prestadoras de STFC, que não pertençam a Grupos que incluam Concessionárias de STFC na modalidade Local, são consideradas prestadoras de STFC pertencente a Grupo sem PMS.
§ 1º Os valores máximos das Tarifas de Uso de Prestadora de STFC pertencente a Grupo sem PMS na oferta de interconexão em rede fixa são até 20% (vinte por cento) superiores aos maiores valores das respectivas Tarifas de Uso das Prestadoras de STFC pertencentes a Grupo detentor de PMS na oferta de interconexão em rede fixa, atuante na mesma área geográfica do PGO do STFC.
O contexto fático que ensejou a abertura do presente procedimento está descrito no Memorando nº 80/2018/SEI/CPRP/SCP (SEI nº 3375994), de 14 de novembro de 2018, expedido no Processo nº 53504.001041/2017-65, que versa sobre a reclamação administrativa manejada por Claro S.A. (Claro) contra a TIM.
Nos termos do referido Memorando, identificaram-se indícios de descumprimento dos dispositivos acima listados.
Em tempo, observa-se que o procedimento sancionador foi instaurado em face de TIM Celular S.A., autorizada do Serviço Móvel Pessoal - SMP, CNPJ/MF n.º 04.206.050/0001-80.
No entanto, conforme já apontado pela área técnica em primeira instância administrativa, relembra-se, de acordo com o que já mencionado por TIM S.A., CNPJ/MF nº 02.421.421/0001-11, em vários dos petitórios apresentados no processo, que esta é sucessora, por incorporação, daquela primeira.
Em 23 de agosto de 2019, por meio do Ofício nº 1646/2019/COGE/SCO-ANATEL (SEI nº 4527730), notificou-se a TIM para apresentar sua defesa, tendo ela registrado ciência em 09 de setembro de 2019, conforme Certidão de Intimação Cumprida (SEI nº 4598616).
Em 24 de setembro de 2019, a TIM apresentou defesa (SEI nº 4656179), em que tece as seguintes alegações:
com a aprovação do PGMC, por meio da Resolução nº 600, de 08 de novembro de 2012, a Anatel não teria considerado o mercado de remuneração pelo uso de redes fixas de interconexão como relevante, e, portanto, não merecedor da implementação de medidas assimétricas;
como consequência, não incidiriam, no caso, os efeitos do art. 23, § 1º, da Resolução nº 588/2012 e que tal norma se encontraria revogada. Ainda segundo a TIM, esse entendimento teria sido corroborado pelo Ofício nº 73/2015/PRRE, de 25 de junho de 2015;
outras prestadoras impugnaram esse posicionamento no Processo nº 53500.016003/2015-85, no qual o Conselho Diretor da Agência, acolhendo a Análise nº 13/2016-GCAD, de 27 de janeiro de 2016, dentre outras medidas, invalidou o Ofício nº 73/2015/PRRE;
a TIM interpôs pedido de reconsideração contra essa deliberação, o qual foi indeferido pelo Conselho Diretor;
a matéria se encontraria em discussão no processo judicial nº 0058190-14.2016.4.01.3400;
o acordo celebrado com a Claro na reclamação acima mencionada teria impactos apenas financeiros, não implicando desistência da tese e nem renúncia a direito. A TIM entende, ainda, que poderia reaver o valor caso o pedido na ação judicial acima fosse acolhido;
a revogação do art. 23 do RRUR-STFC pelo PGMC afastaria qualquer justa causa para a instauração do presente procedimento; e
ainda que se entenda que o caso comporte pena de multa, deve ser aplicado o art. 20, inc. I, do RASA, com redução do seu valor em 90% em decorrência da cessação espontânea da conduta.
Na ocasião, juntou os seguintes documentos: Procuração (SEI nº4656180), cópia da manifestação CT/DAR/2015-JS (SEI nº 4656181), em que se postula a revogação do art. 23 do RRUR-STFC, cópia do Ofício n.º 73/2015/PRRE (SEI nº 4656182 e nº 4656187), cópia do Informe nº 89/2015-CPRP/PRRE/SCP/SPR, de 08 de outubro de 2015 (SEI nº 4656183), cópia do Parecer nº 01384/2015/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI nº 4656185), cópia do pedido de reconsideração (SEI nº 4656186), cópia de registro de reunião no processo ocorrida em 26 de outubro de 2017, no processo nº 53504.001041/2017-65, e petições informando o acordo celebrado no processo nº 53504.001041/2017-65 e requerendo o seu arquivamento (SEI nº 4656189).
Em 25 de setembro de 2019, ante a desnecessidade de produção de provas, determinou-se a intimação da TIM para apresentação de alegações finais (SEI nº 4661504). Para essa finalidade, expediu-se notificação em 26 de setembro de 2019 (SEI nº 4661513), com a TIM tomando ciência em 27 de setembro de 2019 (SEI nº 4670676).
Em 02 de outubro de 2019, a TIM apresentou alegações finais (SEI nº 4688937), tendo, em síntese, reiterado as teses apresentadas na peça de defesa, já elencadas anteriormente.
Em 04 de março de 2020, produziu-se o Informe nº 7/2020/COGE/SCO (SEI nº 5086730), em que se sugeriu aplicação de multa, em desfavor da TIM, no valor de R$ 1.419.089,15 (um milhão, quatrocentos e dezenove mil oitenta e nove reais e quinze centavos), nos termos do art. 173, II, da Lei nº 9.472/1997, por violação ao art. 3º c/c o art. 23, § 1.º, ambos do Regulamento de Remuneração pelo Uso de Redes de Prestadoras do Serviço Telefônico Fixo Comutado – STFC, aprovado pela Resolução nº 588, de 7 de maio de 2012.
No referido Informe, teceram-se as seguintes constatações:
o processo não apresenta vícios formais, tendo sido observado o rito adequado e garantidas as defesas constitucionalmente exigidas. Além disso, não há prescrição da pretensão punitiva administrativa;
sem que houvesse a intervenção da Anatel, a reclamação administrativa apresentada pela Claro não teria um desfecho exitoso;
as alegações da TIM sobre insegurança regulatória decorrente do advento do PGMC não merecem acolhida à luz do entendimento do Conselho Diretor;
a conduta da TIM configurou retenção indevida de receitas, com infringência ao art. 3º c/c o art. 23, § 1º, da Resolução nº 588/2012;
no que diz respeito à dosimetria da pena, a infração deve ser classificada como "grave", conforme art. 9º, § 3º, inc. II, do RASA, pois, por meio da conduta praticada, a TIM auferiu vantagem direta;
a TIM contava, na ocasião, com oito antecedentes;
a ROL para o ano de 2018 totalizava R$ 371.038.858,18 (trezentos e setenta e um milhões, trinta e oito mil, oitocentos e cinquenta e oito reais e dezoito centavos) e, assim, a TIM foi classificada como empresa "média-grande", em que a multa aplicável pode variar entre R$ 3.000,00 (três mil reais) e R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais);
a multa é a sanção mais razoável, proporcional e adequada para a infração constatada, havendo o emprego da metodologia de descumprimento de obrigações gerais para o seu cálculo, mas com descarte da variável Vfixo;
a atenuante alegada pela TIM não merece acolhimento, pois a cessação da conduta infrativa não foi voluntária, mas sim consequência de uma ação da Anatel após provocação de outra prestadora que foi prejudicada pela retenção indevida. Todavia, pontou que deve ser aplicada a atenuante de 50% do valor da multa, nos termos do art. 20, inc. II, do RASA;
a princípio, o valor da multa corresponderia a R$ 15.013,53 (quinze mil, treze reais e cinquenta e três centavos). No entanto, nos termos da reclamação da Claro, a TIM auferiu vantagem no valor de R$ 4.266.982,86 (quatro milhões, duzentos e sessenta e seis mil, novecentos e oitenta e dois reais e oitenta e seis centavos) e R$ 218.387,74 (duzentos e dezoito mil, trezentos e oitenta e sete reais e setenta e quatro centavos), referente aos DETRAFs de junho a dezembro de 2015;
esse valor, "devidamente corrigido pelo IGP-DI, acrescido de multa de 2% (dois por cento) e juros de 1% (um por cento) ao mês pro rata die", totaliza R$ 4.485.379,60 (quatro milhões, quatrocentos e oitenta e cinco mil, trezentos e setenta e nove reais e sessenta centavos);
o valor foi devidamente atualizado para a data do Informe, totalizando R$ 6.342.816,32 (seis milhões, trezentos e quarenta e dois mil, oitocentos e dezesseis reais e trinta e dois centavos), em que a diferença entre o valor original e o atualizado é de R$ 1.857.436,72 (um milhão, oitocentos e cinquenta e sete mil, quatrocentos e trinta e seis reais e setenta e dois centavos), o qual seria correspondente à vantagem auferida; e
segundo o art. 18, § 2º, do RASA, o valor da multa nunca pode ser inferior ao dobro da vantagem auferida, e que, sendo assim, o valor da multa, após a incidência das agravantes e atenuantes, totaliza R$ 1.419.089,15 (um milhão, quatrocentos e dezenove mil, oitenta e nove reais e quinze centavos).
Na mesma data, proferiu-se o Despacho Decisório nº 4/2020/COGE/SCO (SEI nº 5088422), já referido anteriormente.
Em 10 de julho de 2020, expediu-se o Ofício nº 655/2020/COGE/SCO-ANATEL (SEI nº 5740054), com a finalidade de notificar a TIM sobre o teor do Despacho Decisório proferido, a qual registrou ciência em 27 de julho de 2020, conforme Certidão de Intimação Cumprida (SEI nº 5798781).
Em 06 de agosto de 2020, a TIM formalizou recurso administrativo (SEI nº 5839267), aduzindo o seguinte:
a sua conduta teria se desenvolvido no estrito cumprimento do dever legal, pois teria sido respaldada pelo Ofício nº 73/2015/PRRE, de 25 de junho de 2015, o qual expressou entendimento no sentido de que o art. 23 do RRUR-STFC foi revogado pelo PGMC;
essa revogação seria consequência das seguintes premissas:
o art. 23 do RRUR-STFC teria expressamente consignado que sua vigência estaria limitada até o momento em que a Anatel determinasse, no âmbito do PGMC, quais são os Grupos detentores de PMS;
as disposições contendo as assimetrias estão localizados no Título III ("Disposições finais e transitórias") do Regulamento;
o PGMC não manteve a medida assimétrica prevista no RRUR-STFC; e
não houve vantagem auferida em decorrência da conduta praticada, pois os valores não teriam sido imediatamente devolvidos à Claro por opção desta última. Destacou que não se sustenta a premissa empregada no Informe em que se fundamentou o Despacho Decisório recorrido, no sentido de que a ação da Anatel foi necessária para a cessação da infração, pois ela teria sido consequência de acordo celebrado entre duas prestadoras.
Ao fim, formulou os seguintes requerimentos:
Diante de todo o exposto, a TIM requer:
i. nos termos do Art. 115, § 1º, alínea ‘b’ do RIA17, a retratação pelo Superintendente de Controle de Obrigações; ou
ii. caso não haja retratação, o que se admite apenas por hipótese, a remessa do presente Recurso à apreciação do Conselho Diretor, a fim de reformar o Despacho Decisório n.º 4/2020/COGE/SCO, de 04 de março de 2020, decidindo-se, ao final, pelo arquivamento do presente PADO sem aplicação qualquer sanção à TIM, em razão dos argumentos ora apresentados.
Em 29 de julho de 2022, a área técnica produziu o Informe nº 105/2022/COGE/SCO (SEI nº 8132926), em que examinou o recurso interposto, sugeriu o seu conhecimento, o encaminhamento do processo à PFE/Anatel para manifestação e a retratação parcial do Despacho Decisório recorrido nos termos do art. 115, §§ 1º, 7º e 8º, do RIA, e do Enunciado nº 17, de 13 de novembro de 2014, da Anatel, a partir das seguintes considerações:
o recurso interposto preenche os pressupostos cabíveis;
o Ofício nº 73/2015/PRRE não se constitui em manifestação válida para interpretar o direito no âmbito da Anatel conforme art. 40 e 133, inc. XXXII, do RIA;
o tema já foi enfrentado no Processo nº 53500.016003/2015-85, no qual o Conselho Diretor da Anatel exerceu sua competência para tratar da interpretação (art. 133, inc. XXXII, do RIA) da matéria em discussão, nos termos da Análise nº 65/2016/SEI/IF (SEI nº 0678490) e do Acórdão nº 295 (SEI nº 0748993), de 19 de agosto de 2016;
a atuação da Anatel para uma solução da reclamação administrativa da Claro iniciou-se em 31 de janeiro de 2017, enquanto a transação somente se realizou em 08 de agosto de 2018. Sendo assim, ao contrário do que alega a recorrente, exigiu-se uma atuação efetiva da Agência para a cessação da retenção indevida;
os termos do ajuste celebrado entre Claro e TIM são irrelevantes para a caracterização da infração e "a vantagem deve ser estimada segundo a disponibilidade financeira do montante que permaneceu de posse da devedora até a data da transação";
deve-se proceder à revisão da multa, com base nas seguintes premissas:
a vantagem auferida deve corresponder à diferença entre o valor devido atualizado e o valor original;
a atualização deve ser realizada até o mês anterior ao pagamento e este será considerado realizado na data da comunicação da transação à Anatel; e
o período de mora teve início em 31 de dezembro de 2015 e se estendeu até 31 de julho de 2018, último dia do mês anterior ao pagamento do débito, ocorrido em 08 de agosto de 2018, em que:
Nesses termos, tem-se o valor atualizado em R$ 5.834.308,60 (cinco milhões, oitocentos e trinta e quatro mil trezentos e oito reais e sessenta centavos) (SEI nº 5088211). A diferença, portanto, entre o valor original de R$ 4.485.379,60 e o atualizado é de R$ 1.348.929,00 (um milhão, trezentos e quarenta e oito mil novecentos e vinte e nove reais), que remonta à vantagem auferida.
deve-se proceder à revisão das agravantes, tomando-se como referência a data de 31 de dezembro de 2015 para a identificação das infrações cometidas há menos de cinco anos nos termos do art. 2º, inc. II, do RASA. Assim, identificaram-se dezenove antecedentes (art. 19, inc. II, do RASA) e a multa deve ser majorada em dezenove por cento; e
houve cálculo de multa a maior, devendo ela ser diminuída de R$ 1.419.089,15 (um milhão, quatrocentos e dezenove mil, oitenta e nove reais e quinze centavos) para R$ 963.135,31 (novecentos e sessenta e três mil, cento e trinta e cinco reais e trinta e um centavos).
Em 12 de setembro de 2022, a PFE/Anatel se manifestou por meio do Parecer nº 478/2022/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI nº 9118317), trazendo as seguintes considerações:
observaram-se as formalidades procedimentais cabíveis;
não é possível a reformatio in pejus em juízo de retratação, motivo pelo qual, nessa fase, não se pode proceder à inclusão das novas agravantes identificadas no Informe nº 105/2022/COGE/SCO (SEI nº 8132926). Entretanto, essa inclusão é possível na esfera recursal propriamente dita, conforme previsto no art. 64 da Lei nº 9.784/99, e no art. 125, §§ 1º, 3º e 4º, do RIA;
deve-se posicionar a ROL empregada para o ano de 2019, por ser a mais próxima do momento da aplicação da sanção, com descarte da ROL do ano de 2018; e
não é cabível o emprego da atenuante de setenta por cento prevista no art. 20, inc. II, do RASA, pois essa disposição foi inserida em 2021, muito após o cometimento da infração.
Em 24 de abril de 2023, a área técnica produziu o Informe nº 35/2023/COGE/SCO (SEI nº 9738210), no qual apresentou as seguintes ponderações:
deve ser acatada a recomendação da PFE/Anatel no que diz respeito ao percentual da atenuante a que se refere o art. 20, inc. II, do RASA, aplicando-se o percentual de cinquenta por cento;
igualmente, deve ser acatada a recomendação de se empregar a ROL mais próxima da data da sanção, qual seja, a relativa ao ano de 2019, em que o valor da multa, a princípio, corresponderia a R$ 11.462,07 (onze mil, quatrocentos e sessenta e dois reais e sete centavos). Dado que tal valor seria muito inferior ao dobro da vantagem auferida, empregou-se a metodologia descrita no Informe nº 105/2022/COGE/SCO (SEI nº 8132926);
após a incorporação das novas agravantes (num total de dezenove), com acréscimo de dezenove por cento sobre a pena-base, e da atenuante de cinquenta por cento, o valor da multa passaria a totalizar R$ 1.605.225,51 (um milhão, seiscentos e cinco mil, duzentos e vinte e cinco reais e cinquenta e um centavos);
a TIM deve ser intimada para se manifestar sobre a possibilidade de agravamento da pena antes da decisão do Conselho Diretor.
Na mesma data, expediu-se o Ofício nº 70/2023/COGE/SCO-ANATEL (SEI nº 9755131) para notificar a TIM para manifestação em sede recursal. A TIM registrou ciência em 18 de maio de 2023, conforme Certidão de Intimação Cumprida (SEI nº 10256618).
Em 02 de junho de 2023 (SEI nº 10337801), a TIM apresenta suas alegações, em que reiterou os pontos levantados em suas razões recursais, acrescentando que a postura da Anatel violaria os princípios da boa-fé administrativa e da proteção da confiança. Quanto aos critérios de dosimetria, alegou o seguinte (grifos acrescidos):
Assim, caso prevaleça o (incorreto) entendimento de que esta Prestadora auferiu indevida vantagem, é justo que, se considere no cálculo correspondente à correção do valor devido: (i) como marco inicial, a data (a) do trânsito em julgado do Processo n.º 53500.016003/2015-85 (22 de agosto de 2016) ou, quando menos, (b) da publicação, no Diário Oficial da União – DOU, da decisão em que o Conselho Diretor invalidou o entendimento consubstanciado no Ofício n.º 73/2015 (05 de fevereiro de 2016) ou (c) da referida deliberação, pelo Conselho Diretor (27 de janeiro de 2016); e (ii) como marco final, a data em que essa própria Agência formalizou nos autos a tentativa de quitação, pela TIM, do valor pretendido pela Claro, para calcular tal suposta vantagem – qual seja, 26 de outubro de 2017 (data em que a CPRP registrou nos autos tal esforço desta Prestadora) – o que desdobrará no recálculo do valor encontrado na linha “Valor Corrigido pela Selic” da tabela abaixo:
Pede, ao final, o arquivamento do feito, ou, em caráter sucessivo, que haja alteração dos critérios de dosimetria, nos seguintes termos:
Diante de todo o exposto, a TIM requer a remessa do Recurso Administrativo e das presentes Alegações à apreciação do Conselho Diretor, a fim de não acolher a proposta de majoração da multa aplicada pelo Despacho Decisório n.º 4/2020/COGE/SCO, de 04 de março de 2020, decidindo-se, ao final, pelo arquivamento do presente PADO sem aplicação de qualquer sanção à TIM, em razão dos argumentos ora apresentados ou, alternativamente, pela alteração dos critérios de dosimetria adotados no valor da sanção nos termos apresentados nos autos.
Em 03 de maio de 2024, a área técnica produziu o Informe nº 10/2024/COGE/SCO (SEI nº 11352801), no qual, de forma sucinta, reitera, quanto à materialidade e à autoria da infração, as considerações já apresentadas no Informe nº 105/2022/COGE/SCO (SEI nº 8132926). Além disso, concluiu que as alegações recursais não infirmaram os fundamentos trazidos no Informe nº 35/2023/COGE/SCO (SEI nº 9738210) para a possibilidade de reformatio in pejus em sede recursal.
Na mesma data, à luz dos fundamentos expostos no Informe acima mencionado, a Superintendência de Controle de Obrigações (SCO) exarou o Despacho Decisório nº 88/2024/COGE/SCO (SEI nº 11695930), encaminhando o recurso interposto ao Conselho Diretor.
Ainda na mesma data, a SCO encaminhou o processo para o Superintendente Executivo da Anatel por meio da Matéria para Apreciação do Conselho Diretor nº 80 (SEI nº 11412242).
Em 25 de abril de 2024, a TIM apresentou nova manifestação (SEI nº 11885492) em que, sinteticamente, reitera os argumentos de defesa já apresentados anteriormente no processo.
Em 07 de maio de 2024, a Superintendência Executiva, por meio de Despacho Ordinatório (SEI nº 11932476), encaminhou o processo para a Secretaria do Conselho Diretor da Anatel.
Distribuiu-se o processo para minha relatoria em 09 de maio de 2024, conforme Certidão de Distribuição (SEI nº 11951192).
Em 26 de junho de 2024, a TIM apresentou manifestação (SEI nº 12191726), em que reiterou a revogação do art. 23, § 1º, do RRUR pelo PGMC, a necessidade observância do Ofício invalidado como medida de homenagem à proteção de confiança e à segurança jurídica, pedindo o arquivamento do feito ou, em sendo o caso, a rejeição da proposta de majoração da multa.
Em 21 de agosto de 2024, a Recorrente apresentou nova manifestação (SEI nº 12460892), na qual argumenta que já vinha tomando medidas para resolver as questões financeiras em disputa e que vinha tentando obter a sua quitação, e que essas tentativas demonstram seu compromisso em resolver a questão de forma justa e que não houve vantagem indevida. Mencionou processo interposto pela Oi S.A. que guarda relação com o presente caso e solicitou que a Anatel delibere sobre esse processo antes de tomar qualquer decisão final no PADO em questão, além de tecer considerações sobre o cálculo da vantagem percebida. Pediu o arquivamento do PADO e, em caráter sucessivo, a revisão do cálculo da vantagem auferida, com as suas repercussões na penalidades aplicada.
É o relatório.
fundamentação
A fundamentação da presente Análise encontra-se dividida em nove partes. Na primeira, analisa-se a admissibilidade do recurso. Na segunda, discorre-se sobre o agravamento da sanção em fase recursal. Na terceira, recebe-se petição interposta extemporaneamente. Na quarta, traz-se o entendimento da Anatel sobre a caracterização da retenção indevida de receitas de remuneração de uso de redes fixas como infração administrativa. Na quinta, examinam-se a materialidade e a autoria da infração. Na sexta, tecem-se considerações sobre as alegações de violação à boa-fé objetiva e à proteção de confiança. Na sétima, avalia-se a dosimetria da pena aplicada, conjuntamente com a proposta de majoração decorrente da identificação de novos antecedentes em desfavor da TIM. Por fim, fundamenta-se a presente decisão com o Decreto nº 11.738, de 18 de outubro de 2023, que dispõe sobre o Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação (PRO-REG), com o Programa de Aprimoramento da Qualidade da Regulação Brasileira (QualiREG), com as boas práticas regulatórias recomendadas pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), e com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU).
I – Admissibilidade do Recurso
A instauração e a instrução do presente processo atenderam à sua finalidade, com observância aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, conforme dispõem a Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal (LPA), e o Regimento Interno da Anatel (RIA), aprovado pela Resolução nº 612, de 29 de abril de 2013.
O recurso administrativo deverá ser encaminhado à autoridade hierarquicamente superior quando não houver retratação pela autoridade que proferiu a decisão.
No presente caso, tem-se que o recurso administrativo foi dirigido para a SCO, que dele conheceu e manteve a decisão recorrida. Portanto, cabível é o encaminhamento para decisão do Conselho Diretor, conforme previsto no art. 115, § 1º, alín. “b”, do RIA, assim transcrito:
Do Recurso Administrativo
Art. 115. Das decisões da Agência, quando não proferidas pelo Conselho Diretor, cabe interposição de recurso administrativo por razões de legalidade e de mérito, independentemente de caução.
§ 1º O recurso administrativo será dirigido à autoridade que proferiu a decisão, que:
a) decidirá sobre o seu conhecimento, nos termos do art. 116;
b) na hipótese de conhecimento, caso não se retrate, o encaminhará à autoridade hierarquicamente superior.
Não se vislumbra, ainda, a incidência das hipóteses de não conhecimento do presente recurso, previstas no art. 116 do RIA, a saber:
Art. 116. O recurso, dentre outras hipóteses, não será conhecido quando interposto:
I - fora do prazo;
II - por quem não seja legitimado;
III - por ausência de interesse recursal;
IV - após exaurida a esfera administrativa;
V - quando contrariar entendimento fixado em Súmula da Agência.
Parágrafo único. O não conhecimento do recurso não impede a Administração de rever de ofício o ato ilegal, desde que não ocorrida preclusão administrativa.
Quanto à tempestividade, a recorrente tomou ciência do Despacho Decisório recorrido em 27 de julho de 2020 e o recurso foi formalizado em 06 de agosto de 2020, atendendo ao prazo de 10 (dez) dias definido pelo RIA.
De igual forma, a recorrente é parte legítima deste procedimento, possuindo interesse na reforma da decisão, estando regularmente representada.
Estão presentes os requisitos de admissibilidade recursal, devendo o Conselho Diretor conhecer do pedido de reforma da decisão.
Assim, admite-se o recurso interposto.
II - Das Petições Extemporâneas
Em 26 de junho de 2024, a TIM apresentou petição (SEI nº 12191726), defendendo a revogação do art. 23, § 1º, do RRUR pelo PGMC, a validade do entendimento trazido no Ofício nº 73/2015/PRRE e a rejeição da proposta de majoração da multa.
Em 21 de agosto de 2024, ela formalizou nova petição (SEI nº 12460892) alegando que, conforme exposto acima, empreendeu esforços para a quitação do valor retido, que há pendência na análise de processo interposto pela Oi, e pedindo o arquivamento do PADO e, em caráter sucessivo, a revisão do cálculo da vantagem auferida, com as suas repercussões na penalidades aplicada.
A disciplina do tratamento a ser conferido às petições extemporâneas é orientada pelo Enunciado nº 21, de 10 de outubro de 2017, da Súmula da Anatel, nos seguintes termos:
As petições extemporâneas, quando não caracterizado abuso do exercício do direito de petição, devem ser conhecidas e analisadas pelo Conselho Diretor desde que protocolizadas até a data de divulgação da pauta de Reunião na Biblioteca e na página da Agência na internet.
É facultado o exame dessas petições, no caso concreto, pelo Conselheiro ou pelo Conselho Diretor após o prazo estipulado e até o julgamento da matéria, sobretudo se a manifestação do interessado trouxer a lume a notícia de fato novo ou relevante que possa alterar o desfecho do processo.
Não há necessidade de desentranhamento de petições extemporâneas, ainda que não conhecidas por esse órgão colegiado.
O protocolo da petição ocorreu antes da publicação da pauta da Reunião do Conselho Diretor na qual foi incluído este Processo.
Assim, conhece-se da manifestação acima.
III - Possibilidade de agravamento da sanção (reformatio in pejus)
A área técnica no Informe nº 10/2024/COGE/SCO (SEI nº 11352801), destacou que as alegações trazidas pela recorrente não infirmaram os fundamentos que viabilizam a reformatio in pejus em sede recursal.
A PFE/Anatel, no Parecer nº 478/2022/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI nº 9118317), manifestou-se no sentido de que é possível o agravamento da sanção (reformatio in pejus) na esfera recursal administrativa, desde que haja a regular intimação para a apresentação de alegações, nos termos do art. 64, parágrafo único da LPA, e desde que sejam respeitados os princípios da razoabilidade, proporcionalidade e motivação. Acrescenta que tal entendimento está respaldado na jurisprudência de diversos tribunais do país e no entendimento da Anatel.
O agravamento da pena (reformatio in pejus), em sede recursal, é matéria pacificada no Conselho Diretor, conforme Enunciado nº 22 da Súmula da Anatel.
Veja-se o que diz o art. 64 da LPA:
Art. 64. O órgão competente para decidir o recurso poderá confirmar, modificar, anular ou revogar, total ou parcialmente, a decisão recorrida, se a matéria for de sua competência.
Parágrafo único. Se da aplicação do disposto neste artigo puder decorrer gravame à situação do recorrente, este deverá ser cientificado para que formule suas alegações antes da decisão. (grifou-se)
No mesmo sentido, o art. 125, §§ 3º e 4º, do RIA dispõe:
Art. 125. A tramitação do recurso administrativo observará as seguintes regras:
(...)
§3º A autoridade competente para decidir o recurso administrativo poderá confirmar, modificar, anular ou revogar total ou parcialmente, a decisão recorrida, se a matéria for de sua competência.
§4º Se da aplicação do disposto no §3º puder decorrer gravame à situação do recorrente, este deverá ser intimado para que, no prazo de 15 (quinze) dias, formule suas alegações antes da decisão. (grifou-se)
Consolidando o entendimento do Conselho Diretor quanto à possibilidade de reformatio in pejus em recurso administrativo, o Enunciado nº 22, de 18 de outubro de 2019, da Súmula da Anatel, estabelece que:
É possível o agravamento da sanção imposta no âmbito do julgamento de recursos administrativos e pedidos de reconsideração (reformatio in pejus), desde que oportunizada manifestação prévia ao interessado e ouvida a Procuradoria Federal Especializada junto à Anatel.
A propósito, a possibilidade de revisão de uma decisão administrativa é fundamentada no princípio da autotutela da administração pública, conforme estabelecido no Enunciado nº 346, da Súmula do STF, que afirma que a Administração Pública pode anular seus próprios atos. Ou seja, o Estado possui o poder-dever de corrigir atos ilegais, incluindo os atos de efeitos concretos.
Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado do eg. Supremo Tribunal Federal:
Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. ATENDIMENTO BANCÁRIO. REGULAMENTAÇÃO POR NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS LOCAIS. POSSIBILIDADE. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA PARA RATIFICAR A JURISPRUDÊNCIA DA CORTE. PROCESSO ADMINISTRATIVO. RECRUDESCIMENTO DA SANÇÃO ADMINISTRATIVA EM RECURSO DO ADMINISTRADO. PRINCÍPIO DA AUTOTUTELA. POSSIBILIDADE.
1. Os municípios têm competência para regulamentar o atendimento ao público em instituições bancárias, uma vez que se trata de matéria de interesse local.
2. A jurisprudência da Corte sobre a matéria foi ratificada pelo Plenário desta Corte quando do julgamento do RE 610.221, da Relatoria da E. Min. Ellen Gracie, cuja Repercussão Geral restou reconhecida.
3. A possibilidade da administração pública, em fase de recurso administrativo, anular, modificar ou extinguir os atos administrativos em razão de legalidade, conveniência e oportunidade, é corolário dos princípios da hierarquia e da finalidade, não havendo se falar em reformatio in pejus no âmbito administrativo, desde que seja dada a oportunidade de ampla defesa e o contraditório ao administrado e sejam observados os prazos prescricionais.
4. In casu, o acórdão recorrido assentou: “ADMINISTRATIVO - FUNCIONAMENTO DOS BANCOS – EXIGÊNCIAS CONTIDAS EM LEI ESTADUAL E MUNICIPAL – LEGALIDADE. 1. A jurisprudência do STF e do STJ reconheceu como possível lei estadual e municipal fazerem exigências quanto ao funcionamento das agências bancárias, em tudo que não houver interferência com a atividade financeira do estabelecimento (precedentes). 2. Leis estadual e municipal cuja argüição de inconstitucionalidade não logrou êxito perante o Tribunal de Justiça do Estado do RJ. 3. Em processo administrativo não se observa o princípio da "non reformatio in pejus" como corolário do poder de auto tutela da administração, traduzido no princípio de que a administração pode anular os seus próprios atos. As exceções devem vir expressas em lei. 4. Recurso ordinário desprovido.” 5. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo a que se nega provimento.
(ARE 641054 AgR, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 22/05/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-124 DIVULG 25-06-2012 PUBLIC 26-06-2012, grifos acrescidos)
Da mesma forma, sobre o rito a ser seguido para a reformatio in pejus, consignam-se as lições de Egon Bockmann Moreira (2022, p. 317-318):
A Lei nº 9.784/1999 fixa que, se da confirmação, modificação, anulação ou revogação da decisão recorrida “puder decorrer gravame à situação do recorrente, este deverá ser cientificado para que formule suas alegações antes da decisão” (art. 64, parágrafo único).
Em primeiro lugar, a norma impede a reforma para pior sem prévio conhecimento e defesa do recorrido. Caso o órgão julgador cogite, mesmo em tese, de qualquer agravamento da decisão recorrida (“puder decorrer gravame”), deverá previamente notificar o recorrente de maneira fundamentada, indicando qual o agravamento imaginado e suas consequências. Em decorrência, abre‑se prazo para a manifestação do recorrente.
Ou seja: nenhum gravame inédito aos autos poderá ocorrer sem o conhecimento prévio e o exercício da ampla defesa e do contraditório por parte do recorrente. Inclusive, poderão ser realizadas diligências probatórias, e o órgão julgador deverá levar em conta a manifestação do recorrente na motivação da decisão.
Ou seja, é possível o agravamento da pena, em sede de recurso administrativo, desde que assegurado ao interessado o exercício das garantias da ampla defesa e do contraditório.
Dito isso, a recorrente foi devidamente intimada para apresentar suas alegações quanto à possibilidade da reformatio in pejus.
Assim, restam atendidas as formalidades processuais para eventual agravamento da pena pelo Conselho Diretor.
IV - Entendimento do Conselho Diretor sobre a caracterização da retenção indevida de receitas de remuneração de uso de redes fixas como infração administrativa
Inicialmente, anota-se que o Conselho Diretor da Anatel tem entendimento reiterado no sentido que a retenção indevida de receitas de remuneração pelo uso de redes fixas deve ser caracterizada como infração administrativa, independentemente de pagamento posterior.
Nesse sentido, transcrevem-se as ementas dos seguintes precedentes, relatados, respectivamente, pelos então ilustres Conselheiros Emmanoel Campelo e Moisés Queiroz Moreira e pelo ilustre Conselheiro Vicente Aquino, com grifos acrescidos:
Acórdão nº 657, de 20 de dezembro de 2019
Processo nº 53500.043874/2018-14
Recorrente/Interessado: HOJE SISTEMAS DE INFORMÁTICA LTDA.
CNPJ nº 08.868.001/0001-64
Conselheiro Relator: Emmanoel Campelo de Souza Pereira
Fórum Deliberativo: Reunião nº 880, de 12 de dezembro de 2019
EMENTA
RETENÇÃO DE RECEITAS DEVIDAS A TÍTULO DE REMUNERAÇÃO PELO USO DE REDES FIXAS. PAGAMENTO POSTERIOR DO VALOR DEVIDO NÃO AFASTA A MATERIALIDADE DA INFRAÇÃO. CÁLCULO DA MULTA COM BASE NO DOBRO DA VANTAGEM AUFERIDA, NOS TERMOS DO ART. 18, § 2º, DO RASA.
1. A comprovação do pagamento das parcelas retidas indevidamente a título de remuneração pelo uso de redes fixas não afasta o descumprimento ao disposto no art. 3º do Regulamento de Remuneração pelo Uso de Redes de Prestadoras do Serviço Telefônico Fixo Comutado - RRUR-STFC , aprovado pela Resolução nº 588, de 7 de maio de 2012.
2. Para o cálculo da multa base será aplicado sobre a vantagem estimada a determinação do § 2º do art. 18 do RASA, utilizando-se o dobro da vantagem auferida pela retenção indevida de receitas.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os membros do Conselho Diretor da Anatel, por unanimidade, nos termos da Análise nº 269/2019/EC (SEI nº 4872263), integrante deste acórdão:
a) conhecer do Recurso interposto pela HOJE SISTEMAS DE INFORMÁTICA LTDA., CNPJ nº 08.868.001/0001-64, contra o Despacho Decisório nº 338/2019/COGE/SCO (SEI nº 4102281) para, no mérito, negar-lhe provimento; e,
b) não conhecer da petição extemporânea SEI nº 5011375, nos termos da Súmula nº 21.
Participaram da deliberação o Presidente Leonardo Euler de Morais e os Conselheiros Emmanoel Campelo de Souza Pereira, Moisés Queiroz Moreira e Vicente Bandeira de Aquino Neto.
Acórdão nº 68, de 10 de março de 2020
Processo nº 53500.030979/2016-41
Recorrente/Interessado: TRANSIT DO BRASIL S.A
CNPJ nº 02.868.267/0001-20
Conselheiro Relator: Moisés Queiroz Moreira
Fórum Deliberativo: Reunião nº 882, de 5 de março de 2020
EMENTA
RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO PARA APURAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES (PADO). SUPERINTENDÊNCIA DE CONTROLE DE OBRIGAÇÕES (SCO). RETENÇÃO DE RECEITAS DEVIDAS A TÍTULO DE REMUNERAÇÃO PELO USO DE REDES FIXAS. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO.
1. Em sede de Reclamação Administrativa, restou caracterizada a prática de retenção de receitas devidas a título de remuneração pelo uso de redes fixas e consequente vantagem auferida indevidamente.
2. O pagamento dos valores de interconexão devidos não afasta a prática da infração.
3. Recurso Administrativo conhecido para, no mérito, negar-lhe provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os membros do Conselho Diretor da Anatel, por unanimidade, nos termos da Análise nº 29/2020/MM (SEI nº 5228538), integrante deste acórdão, conhecer do Recurso Administrativo interposto para, no mérito, negar-lhe provimento.
Participaram da deliberação o Presidente Leonardo Euler de Morais, os Conselheiros Emmanoel Campelo de Souza Pereira, Moisés Queiroz Moreira e Vicente Bandeira de Aquino Neto e o Conselheiro Substituto Carlos Manuel Baigorri.
Acórdão nº 111, de 26 de março de 2020
Processo nº 53500.004455/2013-52
Recorrente/Interessado: OI S.A.
CNPJ nº 76.535.764/0001-43
Conselheiro Relator: Vicente Bandeira de Aquino Neto
Fórum Deliberativo: Circuito Deliberativo nº 48, de 26 de março de 2020
EMENTA
RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO PARA APURAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES (PADO). REGULAMENTO DE REMUNERAÇÃO PELO USO DE REDES DE PRESTADORAS DO SERVIÇO TELEFÔNICO FIXO COMUTADO - STFC. PAGAMENTO POSTERIOR DO VALOR DEVIDO NÃO AFASTA A MATERIALIDADE DA INFRAÇÃO. INFRAÇÃO DE NATUREZA GRAVE. OBTENÇÃO DE VANTAGEM DIRETA. NÃO CONFIGURAÇÃO DA MÁ-FÉ. CÁLCULO DA MULTA COM BASE NO DOBRO DA VANTAGEM AUFERIDA, NOS TERMOS DO ART. 18, § 2º, DO RASA. EQUÍVOCO NA APLICAÇÃO DOS PERCENTUAIS DE AGRAVAMENTO. NECESSIDADE DE REVISÃO DE OFÍCIO. REFORMATIO IN MELLIUS. ADOÇÃO DE MEDIDAS CORRETIVAS ANTES DA AÇÃO DA AGÊNCIA. NÃO COMPROVAÇÃO. ATENUANTE DE 50% CONCEDIDA PELA ÁREA TÉCNICA. MANUTENÇÃO. RECURSO ADMINISTRATIVO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. Recurso Administrativo interposto em face de decisão que aplicou a sanção de multa no valor de R$ 2.010.880,58 (dois milhões, dez mil, oitocentos e oitenta reais e cinquenta e oito centavos), por descumprimento do disposto no art. 3º do Regulamento de Remuneração pelo Uso de Redes de Prestadoras do Serviço Telefônico Fixo Comutado (RRUR-STFC), aprovado pela Resolução nº 458, de 8 de fevereiro de 2007, vigente à época dos fatos.
2. Conforme documentação acostada aos autos da Reclamação Administrativa nº 53500.021692/2010-35, entre o período de 1º de abril de 2010 e 31 de janeiro de 2011, a FALKLAND TELECOMUNICAÇÕES fomentou a geração de tráfego artificial para fins de ensejar a remuneração pelo uso de suas redes. O cálculo da vantagem auferida pela OI não deve considerar aqueles valores relativos ao tráfego artificial fomentado.
3. A comprovação do pagamento intempestivo das parcelas devidas a título de remuneração pelo uso de redes fixas não afasta a materialidade do ilícito decorrente de sua retenção indevida.
4. A Infração deve ser considerada grave quando, dentre outras hipóteses, o infrator tiver agido de má-fé ou auferido, diretamente, vantagem em decorrência de sua conduta ilícita. Inteligência dos incisos I e II do § 3º do art. 9º do Regulamento para Aplicação de Sanções Administrativas (RASA/2012), aprovado pela Resolução nº 589, de 7 de maio de 2012.
5. Em sede de Reclamação Administrativa, restou caracterizada a prática de retenção de receitas devidas a título de remuneração pelo uso de redes móveis e consequente vantagem auferida indevidamente.
6. A conduta descrita como retenção de receitas, per si, não é suficiente para se caracterizar a ocorrência de má-fé prevista no art. 7º do RASA/2012.
7. Em atenção ao disposto no § 2º do art. 18 do RASA/2012, o valor-base da sanção pecuniária não deve ser inferior ao dobro da vantagem auferida com retenção indevida de receitas devidas a título de remuneração pelo uso de redes.
8. O art. 19, inciso III, do RASA/2012 impõe que o valor-base da multa seja acrescido em 10% (dez por cento) para cada uma das hipóteses que fundamentam a classificação do ilícito como grave previstas em seu art. 9º, § 3º, a partir da segunda ocorrência, até o limite de 40% (quarenta por cento).
9. No caso dos autos, identificou-se equívoco na aplicação do art. 19, inciso III, do RASA/2012. Incrementou-se o valor-base da multa em 10% (dez por cento) em virtude da classificação do ilícito como grave, nos termos do incisos I e II do § 3º do art. 9º do RASA/2012, os quais tratam, respectivamente, das hipóteses de o infrator ter agido de má-fé e de ter auferido, diretamente, vantagem em decorrência do ilícito cometido. Necessidade de reforma, de ofício, do valor da multa aplicada, para fins de exclusão desse percentual de agravamento, diante da não constatação de má-fé.
10. A cessação do ilícito provocada por ação da Anatel e somente após a instauração da Reclamação Administrativa referente à retenção de receitas não faz incidir a atenuante de 90% (noventa por cento) prevista no art. 20, inciso I, do RASA/2012.
11. O art. 20, inciso II, do RASA/2012 permite a atenuação da pena em 50% (cinquenta por cento) nos casos de cessação da irregularidade e reparação total do dano ao serviço e ao usuário, imediatamente ou em prazo consignado pela Anatel. Após a ação da Agência, o comportamento da Recorrente mostrou-se positivo, pois ela não se utilizou de artifícios para embaraçar a instrução do processo e procedeu ao reparo dos danos causados, por meio da quitação dos valores devidos antes da instauração do presente Pado. Foi adequada a aplicação da referida atenuante pela Área Técnica.
12. Retificação da multa aplicada, reduzindo-a de R$ 2.010.880,58 (dois milhões, dez mil, oitocentos e oitenta reais e cinquenta e oito centavos) para R$ 1.503.445,27 (um milhão, quinhentos e três mil, quatrocentos e quarenta e cinco reais e vinte e sete centavos), diante da (i) não caracterização do ilícito no período entre 1º de abril de 2010 e 31 de janeiro de 2011; e (ii) não incidência da hipótese prevista no art. 19, inciso III, do RASA/2012.
13. Recurso Administrativo conhecido e não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os membros do Conselho Diretor da Anatel, por unanimidade, nos termos da Análise nº 48/2020/VA (SEI nº 5226039), integrante deste acórdão:
a) conhecer do Recurso Administrativo para, no mérito, negar-lhe provimento; e,
b) retificar, de ofício, a sanção de multa aplicada, de R$ 2.010.880,58 (dois milhões, dez mil, oitocentos e oitenta reais e cinquenta e oito centavos) para R$ 1.503.445,27 (um milhão, quinhentos e três mil, quatrocentos e quarenta e cinco reais e vinte e sete centavos), diante da:
b.1) não caracterização do ilícito no período entre 1º de abril de 2010 e 31 de janeiro de 2011; e,
b.2) não incidência da hipótese prevista no art. 19, inciso III, do Regulamento para Aplicação de Sanções Administrativas (RASA/2012), aprovado pela Resolução nº 589, de 7 de maio de 2012.
Participaram da deliberação o Presidente Substituto Emmanoel Campelo de Souza Pereira, os Conselheiros Moisés Queiroz Moreira e Vicente Bandeira de Aquino Neto e o Conselheiro Substituto Carlos Manuel Baigorri.
Ausente o Presidente Leonardo Euler de Morais, no gozo de licença prevista no art. 26, § 1º, do Decreto nº 2.338/97.
Portanto, a conduta imputada à TIM caracteriza-se, a princípio, como infração administrativa, independente da realização de posterior transação com a Claro, então credora.
V - Ausência de ofensa aos princípios da segurança jurídica, da boa-fé objetiva e da proteção de confiança
Em 05 de fevereiro de 2016, o Conselho Diretor, nos autos do Processo nº 53500.016003/2015-85, por meio do Acórdão nº 42/2016-CD (SEI nº 0412091 - fl. 206/206-verso dos autos físicos da reclamação), acolhendo, na oportunidade, a Análise nº 13/2016-GCAD, do então ilustre Conselheiro Aníbal Diniz, decidiu invalidar o Ofício nº 73/2015/PRRE, de 25 de junho de 2015, e seus respectivos efeitos e consignou expressamente a ausência de revogação do art. 23 do RRUR-STFC.
Acrescenta-se, ainda, que:
a TIM requereu o seu ingresso no referido feito como terceiro interessado em 11 de novembro de 2015 (SEI nº 0412091 - fls. 154-156 dos autos físicos da reclamação) em que deixa clara a sua compreensão de que, no Processo nº 53500.016003/2015-85, discutia-se a validade do entendimento expressado no Ofício n.º 73/2015/PRRE, especialmente no que diz respeito à revogação do art. 23, § 1º, do RRUR-STFC, pelo PGMC, aprovado pela Resolução n.º 600, de 08 de novembro de 2012; e
a TIM interpôs pedido de reconsideração do Acórdão acima em 17 de março de 2016 (SEI nº 0342840 - no Processo nº 53500.006224/2016-26, apenso ao Processo nº 53500.016003/2015-85). Em nota de rodapé à página 02 da petição em comento, a prestadora informa ter tomado conhecimento do Acórdão nº 42/2016-CD nas seguintes circunstâncias:
o Acórdão n.° 42/2016-CD foi publicado no Diário Oficial da União em 04 de março de 2016. Diante disso, nessa mesma data, foram solicitadas cópias do processo no FOCUS (Protocolo n.° 785456-2016). A solicitação foi deferida pela ANATEL em 07 de março de 2016, com a disponibilização de link para acesso aos arquivos digitais do processo (doc. 01).
Por sua vez, o Conselho Diretor da Anatel, por meio do Acórdão nº 295, de 19 de agosto de 2016 (SEI nº 0748993), relatado pelo então ilustre Conselheiro Diretor Igor Freitas, indeferiu o pedido de reconsideração do Acórdão nº 42/2016-CD.
Igualmente, indeferiu-se pedido de atribuição de efeito suspensivo apresentado no pedido de reconsideração, conforme Despacho Decisório nº 18/2016/SEI/PR, de 10 de maio de 2016 (SEI nº 0460456).
Da Análise do então ilustre Conselheiro Aníbal Diniz, extrai-se que o Gerente de Regulamentação não era competente para expedir ato com o teor do Ofício n.º 73/2015/PRRE, que compete ao Conselho Diretor interpretar os seus próprios atos e que o cenário que adveio do teor do ofício em questão gerou evidente insegurança jurídica no mercado.
Confiram-se, a propósito, as seguintes transcrições:
4.2.27. Desta feita, afirmar a revogação implícita do art. 23 do RRUR pelo PGMC causa grande instabilidade e insegurança, jurídica e regulatória, ao setor. E, mais importante, a conclusão exposta pela Agência, por meio do Informe nº 89 e pela Procuradoria em seu Parecer de que a intenção de revogação do art. 23 do RRUR-STFC é clara, não merece prosperar.
4.2.28. As decisões e atos da Agência devem sempre se nortear pela motivação, gerando efeitos após, e apenas após, a sua publicação ou notificação, garantindo transparência e segurança aos regulados. Assim, ao sugerir a ratificação do entendimento exarado no Ofício nº 73/2015/PRRE, fica respaldado o entendimento equivocado de que houve a revogação tácita do art. 23 do RRUR-STFC, concedendo legitimidade a um ato nulo e, principalmente, ignorando os efeitos produzidos no setor, demonstrado pelos inúmeros agentes interessados no presente processo.
4.2.29. Vale ressaltar que a Superintendência de Planejamento e Regulamentação — SPR trabalha na proposta de revogação expressa dos atos normativos expedidos pela Agência que tenham sido implicitamente revogados por outros aprovados posteriormente ou que não tenham mais eficácia.
(...)
4.2.36. Depreende-se, portanto, da leitura dos dispositivos legais e regulamentares acima transcritos, que compete ao Conselho Diretor da Anatel, e somente a ele, exercer o poder normativo da Agência.
(...)
4.2.49. A segurança jurídica e regulatória deve permear a atuação regulamentar da Anatel, sendo, portanto incabível a “ratificação” do Ofício nº 73, por se tratar de ato administrativo eivado de vícios, o Supremo Tribunal Federal, por meio de Súmulas já se manifestou sobre o assunto da seguinte forma:
(...)
4.2.53. Por fim, considerando os dispositivos legais e regulamentares aplicáveis à matéria, não há possibilidade de conclusão diferente do que a premente necessidade de invalidação do ofício equivocadamente expedido, a necessária realização de Análise de Impacto Regulatório — AIR sobre a vigência do art. 23 do RRUR-STFC, seguida de consulta interna e consulta pública, em pleno atendimento ao disposto no Regimento Interno da Anatel.
Anota-se que o art. 24 da LINDB, invocado pela TIM na manifestação SEI nº 10337801, sequer existia à época dos fatos.
Em tese, seria possível sustentar a boa-fé da recorrente caso ela tivesse imediatamente adotado as medidas tendentes à liberação ou ao depósito em Juízo, mediante ação de consignação em pagamento, dos valores devidos à Claro tão logo tivesse tomado ciência do Acórdão nº 42/2016-CD, o que se deu em meados de março de 2016, ocasião em que se formalizou o posicionamento do Conselho Diretor.
Em tempo, ainda que irrelevante para a caracterização do momento inicial da infração, e diferentemente do que a Tim a alega, o pedido de reconsideração da Oi S.A. - em recuperação judicial foi apreciado na mesma ocasião em que se decidiu o pedido de reconsideração da própria Tim, conforme Acórdão nº 295, de 19 de agosto de 2016, abaixo transcrito:
AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕE
Acórdão nº 295, de 19 de agosto de 2016
Processo nº 53500.016003/2015-85
Recorrente/Interessado: OI S.A., TELEMAR NORTE LESTE S.A., OI MÓVEL S.A., TIM CELULAR S.A.
Conselheiro Relator: Igor Vilas Boas de Freitas
Fórum Deliberativo: Reunião nº 807, de 18 de agosto de 2016
EMENTA
SUPERINTENDÊNCIA DE PLANEJAMENTO E REGULAMENTAÇÃO. ACÓRDÃO Nº 42/2016-CD DETERMINANDO A INVALIDAÇÃO DO OFÍCIO Nº 73/2015/PRRE. NECESSIDADE DE ELABORAÇÃO DE ANÁLISE DE IMPACTO REGULATÓRIO. AUSÊNCIA DE REVOGAÇÃO EXPRESSA DO ART. 23 DO RRUR-STFC. AVALIAÇÃO DE INCLUSÃO NO PGMC DE DISPOSITIVO QUE TRATE DO ASSUNTO. PEDIDOS DE RECONSIDERAÇÃO APRESENTADOS POR OI E TIM.
1. Inexistência de fato novo ou circunstância relevante suscetível de justificar a reforma da decisão recorrida.
2. Pelo não conhecimento do Pedido de Reconsideração da OI S.A., TELEMAR NORTE LESTE S.A. e OI MÓVEL S.A.
3. Pelo conhecimento e não provimento do Pedido de Reconsideração da TIM CELULAR S.A.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os membros do Conselho Diretor da Anatel, por unanimidade, nos termos da Análise nº 65/2016/SEI/IF (SEI nº 0678490), integrante deste acórdão:
a) não conhecer do Pedido de Reconsideração da OI S.A., TELEMAR NORTE LESTE S.A. e OI MÓVEL S.A., por ser intempestivo; e,
b) conhecer do Pedido de Reconsideração da TIM CELULAR S.A. para, no mérito, negar-lhe provimento, mantendo-se integralmente a decisão exarada por este Conselho Diretor por meio do Acórdão nº 42/2016-CD.
Participaram da deliberação o Presidente João Batista de Rezende e os Conselheiros Igor Vilas Boas de Freitas, Anibal Diniz e Otavio Luiz Rodrigues Junior.
Ausente o Conselheiro Rodrigo Zerbone Loureiro, por motivo de férias.
Todavia, pelo teor do Processo nº 53504.001041/2017-65 (Reclamação Administrativa promovida pela Claro), a situação ainda perdurou durante todo o ano de 2017, estendendo-se até o mês de agosto de 2018, ocasião em que se noticiou o acordo celebrado entre ambas.
Identifica-se que houve, na verdade, a recalcitrância da TIM em cessar a retenção indevida, o que se deu muito após a apresentação da reclamação da Claro.
Quanto ao teor da Petição SEI nº 12460892, destaca-se que o prosseguimento das negociações, que, conforme visto acima, somente foram se encerrar quando já tramitava, há quase dois anos, reclamação administrativa interposta pela Claro, denota que a Tim continuou a externalizar-lhe os custos de capital decorrente da retenção indevida de receitas.
Com efeito, o CPC vigente (arts. 539 e ss.), assim como o CPC de 1973, dispõe de instrumento para que se faça cessar a mora do credor em receber a quantia que lhe é devida e a do devedor em pagá-la, qual seja, a ação de consignação em pagamento, em que se permite, inclusive, a discussão do valor devido, transcrevendo-se as seguintes disposições, com grifos acrescidos:
Art. 540. Requerer-se-á a consignação no lugar do pagamento, cessando para o devedor, à data do depósito, os juros e os riscos, salvo se a demanda for julgada improcedente.
Art. 544. Na contestação, o réu poderá alegar que:
(...)
IV - o depósito não é integral.
Parágrafo único. No caso do inciso IV, a alegação somente será admissível se o réu indicar o montante que entende devido.
Art. 545. Alegada a insuficiência do depósito, é lícito ao autor completá-lo, em 10 (dez) dias, salvo se corresponder a prestação cujo inadimplemento acarrete a rescisão do contrato.
§ 1º No caso do caput, poderá o réu levantar, desde logo, a quantia ou a coisa depositada, com a consequente liberação parcial do autor, prosseguindo o processo quanto à parcela controvertida.
§ 2º A sentença que concluir pela insuficiência do depósito determinará, sempre que possível, o montante devido e valerá como título executivo, facultado ao credor promover-lhe o cumprimento nos mesmos autos, após liquidação, se necessária.
Nota-se que a infração relacionada à retenção de receitas é associada justamente à externalização dos custos de capital para concorrente e ao ambiente de concorrência desleal que isso pode criar, em que a infração tem repercussões que se projetam além das meras relações negociais entre as partes, alcançando a própria ideia de fair competition.
Isto é, a diminuição a inexistência de vantagem econômica depende de medida que implique na cessação do recebimento dos frutos da quantia retida pelo devedor, o que pode se dar, caso haja recalcitrância do credor, com o depósito em juízo da quantia devida, em ação de consignação em pagamento.
Rejeita-se o alegado na petição em comento.
Afasta-se, assim, a boa-fé da TIM na sua atuação, eis que essa cessação só se efetivou após transcorridos cerca de dois anos e meio após o momento em que ela tomou conhecimento do teor do Acórdão nº 42/2016-CD, o qual, conforme visto acima, invalidou o Ofício nº 73/2015/PRRE.
VI - Materialidade e autoria da infração e fixação do momento da sua ocorrência
Inicialmente, destaca-se que a TIM não nega a ocorrência da retenção de receitas.
Todavia, ela defende que se encontra albergada pelo teor do Ofício n.º 73/2015/PRRE, de 25 de junho de 2015, que legitimaria essa retenção.
Segundo a recorrente, tal documento expressaria entendimento da Anatel no sentido de que o art. 23, § 1º, do Regulamento de Remuneração pelo Uso de Redes de Prestadoras do Serviço Telefônico Fixo Comutado (RURR-STFC), aprovado pela Resolução nº 588, de 7 de maio de 2012, teria sido revogado pela Resolução n.º 600, de 08 de novembro de 2012, que aprovou o PGMC.
No entanto, conforme já exaustivamente exposto, o Conselho Diretor da Anatel, ao ser provocado por outras operadoras, invalidou o Ofício n.º 73/2015/PRRE.
Acrescenta-se que a cessação da conduta infrativa se deu apenas após o manejo de Reclamação Administrativa pela Claro, depois de transcorridos cerca de dois anos e meio, contados do momento em que a TIM tomou conhecimento do Acórdão nº 42/2016-CD.
A tese adotada pela recorrente, na verdade, procura impregnar que o contexto fático estaria consolidado pela ideia do "fato consumado" a partir do Ofício n.º 73/2015/PRRE, o qual foi posteriormente invalidado.
Sobre o ponto - embora em caso concreto relacionado à acessibilidade a cargos públicos - o eg. Supremo Tribunal Federal já teve a oportunidade de se manifestar sobre a inaplicabilidade da tese:
Ementa: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO REPROVADO QUE ASSUMIU O CARGO POR FORÇA DE LIMINAR. SUPERVENIENTE REVOGAÇÃO DA MEDIDA. RETORNO AO STATUS QUO ANTE. “TEORIA DO FATO CONSUMADO”, DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA LEGÍTIMA E DA SEGURANÇA JURÍDICA. INAPLICABILIDADE. RECURSO PROVIDO.
1. Não é compatível com o regime constitucional de acesso aos cargos públicos a manutenção no cargo, sob fundamento de fato consumado, de candidato não aprovado que nele tomou posse em decorrência de execução provisória de medida liminar ou outro provimento judicial de natureza precária, supervenientemente revogado ou modificado.
2. Igualmente incabível, em casos tais, invocar o princípio da segurança jurídica ou o da proteção da confiança legítima. É que, por imposição do sistema normativo, a execução provisória das decisões judiciais, fundadas que são em títulos de natureza precária e revogável, se dá, invariavelmente, sob a inteira responsabilidade de quem a requer, sendo certo que a sua revogação acarreta efeito ex tunc, circunstâncias que evidenciam sua inaptidão para conferir segurança ou estabilidade à situação jurídica a que se refere.
3. Recurso extraordinário provido.
(RE 608482, Relator(a): TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 07-08-2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-213 DIVULG 29-10-2014 PUBLIC 30-10-2014)
O tema explorado nesse paradigma (nº 476) diz respeito à "Manutenção de candidato investido em cargo público por força de decisão judicial de caráter provisório pela aplicação da teoria do fato consumado", no qual se fixou a seguinte tese:
"Não é compatível com o regime constitucional de acesso aos cargos públicos a manutenção no cargo, sob fundamento de fato consumado, de candidato não aprovado que nele tomou posse em decorrência de execução provisória de medida liminar ou outro provimento judicial de natureza precária, supervenientemente revogado ou modificado."
Nada obstante, entende-se que os fundamentos da decisão oferecem um contributo para o distensionamento de duas premissas que norteiam a avaliação do caso: a proteção da segurança jurídica e a ausência de produção de efeitos de atos nulos.
Entende-se, a partir de tal julgado, e ante a precariedade do Ofício n.º 73/2015/PRRE, que poderia ser revisto pelo Conselho Diretor, como de fato o foi, afastando qualquer possibilidade de consolidação jurídica do arcabouço resultante do ofício mencionado.
É presumível que, até a sua invalidação, a Tim tenha agido de boa-fé. Sendo assim, não seria possível a caracterização da infração até 04 de março de 2016, data da publicação oficial do Acórdão nº 42/2016-CD.
Por outro lado, a partir do momento em que o Conselho Diretor invalida o teor do ato que daria lastro à postura então adotada pela recorrente, retirando todos os seus efeitos jurídicos, a TIM deveria, imediatamente, adotar as medidas tendentes à cessação da retenção, agora indevida, das receitas de remuneração de redes devidas à Claro.
No entanto, conforme visto anteriormente, a TIM adotou postura diametralmente oposta, em que o impasse somente se resolveu cerca de dois e meio depois.
Reputa-se demonstrado que a recorrente reteve injustificadamente receitas de remuneração pelo uso de redes fixas que deveriam ser pagas à Claro entre os meses de junho de 2015 e dezembro de 2015, em violação ao art. 3.º, combinado com o art. 23, § 1º, do RRUR-STFC, situação esta que só veio a ser regularizada em meados de agosto de 2018.
Salienta-se que a infração é de caráter permanente e que a sua consumação é identificada desde o momento em que se verifica a retenção indevida até o seu adimplemento.
Com isso, a infração permaneceu entre 04 de março de 2016 (data da publicação do Acórdão nº 42/2016-CD) e 08 de agosto de 2018, data em que se noticiou o acordo celebrado entre TIM e Claro na reclamação administrativa.
Essa circunstância terá efeito prático apenas para a identificação dos antecedentes da infratora, em que deverão ser descartados aqueles ocorridos anteriormente a 04 de março de 2011, termo inicial quinquênio que antecede o cometimento da infração.
VII - Dosimetria da pena
No presente tópico, abordam-se os seguintes pontos: fixação do valor-base da multa e emprego da ROL, circunstâncias agravantes e circunstâncias atenuantes.
VII.a - Valor-base da multa e emprego da ROL
Neste subitem, adota-se o seguinte percurso: num primeiro momento, tecem-se considerações iniciais sobre o regramento para a dosimetria do valor-base da multa nos casos da espécie, com especial atenção para o art. 18, § 2º, do RASA; em seguida, avaliam-se as alegações da TIM sobre os marcos inicial e final da correção do proveito econômico; e, ao fim, procede-se à fixação do valor-base da multa propriamente dito.
VII.a.1 - Considerações iniciais
A PFE/Anatel, em seu opinativo, recomendou que se empregasse, no cálculo da multa, a ROL mais próxima da data da aplicação da sanção.
Mais especificamente, a ROL empregada na decisão de primeira instância, relativa ao ano de 2018, deveria ser substituída pela ROL do ano de 2019.
A partir desse entendimento, a área técnica, com aplicação da metodologia para o Descumprimento de Obrigações Contratuais, apurou o valor de R$ 11.462,07 (onze mil quatrocentos e sessenta e dois reais e sete centavos).
No entanto, partir da planilha apresentada pela Claro na reclamação administrativa e dos cálculos da área técnica, identifica-se vantagem econômica manifestamente superior a essa cifra.
Sendo assim, deve ser observado o art. 18, especialmente o § 2º, do RASA que assim dispõe, com grifos acrescidos:
Art. 18. No cálculo do valor base da multa devem ser considerados os seguintes aspectos:
I - quantidade de usuários afetados;
II - período de duração da infração;
III - a situação econômica e financeira do infrator, em especial sua capacidade de geração de receitas e seu patrimônio;
IV - a proporcionalidade entre a gravidade da falta e a intensidade da sanção; e
V - o vulto da vantagem auferida, direta ou indiretamente, pelo infrator.
§ 1º Para fins de apuração do disposto no inciso III do caput, deve ser adotada a receita operacional líquida anual do infrator, considerada por serviço prestado, excepcionados os casos em que não seja possível a sua identificação ou não seja aplicável, hipótese em que a Agência poderá adotar outro critério, acompanhado de fundamentação.
§ 2º O valor base da multa nunca será inferior ao dobro da vantagem auferida, quando estimável.
(...)
Assentada essa premissa, entende-se que, quanto ao cálculo do proveito econômico, as alegações da TIM não merecem acolhimento.
VII.a.2 - Termo inicial da correção
A TIM pede que seja determinado, como marco inicial da correção da vantagem auferida, a data "(a) do trânsito em julgado do Processo n.º 53500.016003/2015-85 (22 de agosto de 2016) ou, quando menos, (b) da publicação, no Diário Oficial da União – DOU, da decisão em que o Conselho Diretor invalidou o entendimento consubstanciado no Ofício n.º 73/2015 (05 de fevereiro de 2016) ou (c) da referida deliberação, pelo Conselho Diretor (27 de janeiro de 2016)".
Ocorre que não se pode concordar com nenhuma dessas teses, nada obstante o momento inicial da infração tenha sido fixado em 04 de março de 2016.
Com efeito, a correção monetária constitui-se em medida para recomposição do valor real e sua incidência deve retroagir ao momento em que o valor inadimplido deveria ser pago.
A circunstância de a TIM ter agido de boa-fé até tal momento não afasta a necessidade de atualização da vantagem auferida.
Além disso, embora o momento inicial da infração administrativa tenha sido fixado no dia 04 de março de 2016, pontua-se que essa afirmação tem efeitos apenas administrativos, não se projetando para os efeitos civis o ajuste celebrado entre TIM e Claro e nem elidindo o proveito econômico obtido pela retenção do capital, com danos significativos ao ambiente concorrencial.
O proveito econômico da TIM, por sua vez, é resultante de uma contratação regida por normas de direito privado, e é uma decorrência exclusiva daquilo que as partes voluntariamente ajustaram quanto aos seus termos.
Esse proveito, por sua vez, pelos regulamentos da Anatel, especialmente o disposto art. 18, § 2º, do RASA, é tomado de empréstimo para a dosimetria da multa.
Qualquer entendimento em sentido contrário se traduziria em valor que não iria refletir essa correção e, assim, seria aquém da vantagem econômica efetivamente auferida pelo infrator.
Assim, rejeita-se o pleito formulado nesse sentido.
VII.a.3 - Termo final da correção
A TIM pede que seja determinado como marco final da correção da vantagem auferida, a "data em que essa própria Agência formalizou nos autos a tentativa de quitação, pela TIM, do valor pretendido pela Claro, para calcular tal suposta vantagem – qual seja, 26 de outubro de 2017 (data em que a CPRP registrou nos autos tal esforço desta Prestadora) – o que desdobrará no recálculo do valor encontrado na linha “Valor Corrigido pela Selic” da tabela abaixo".
Igualmente, tal pleito não merece prosperar.
Com efeito, na Reclamação Administrativa proposta pela Claro (Processo nº 53504.001041/2017-65), foi necessário, inclusive, que a então Superintendente de Competição produzisse, em 10 de abril de 2018, Informe com proposta de decisão (SEI nº 2575572), cujo dispositivo sugerido se encontra assim redigido:
5.1 Diante do exposto, com base no art. 175 da Lei Geral de Telecomunicações (LGT), Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997 c/c art. 52 e 242, inciso XII, do Regimento Interno da Anatel, aprovado pela Resolução nº 612, de 29 de abril de 2013, propõe-se:
I - CONFERIR tratamento sigiloso aos documentos SEI nº 1157083, 1925933 e 2100644, com concessão de vistas/cópias apenas para CLARO S.A. e TIM CELULAR S.A. E INTELIG TELECOMUNICAÇÕES LTDA.;
II - DETERMINAR à TIM CELULAR S.A. E INTELIG TELECOMUNICAÇÕES LTDA. que se abstenham de reter receitas decorrentes da remuneração pelo uso de rede da Claro S.A, nos termos da regulamentação aplicável ao Setor de Telecomunicações, sob pena de aplicação das sanções cabíveis
III - DETERMINAR à TIM CELULAR S.A. E INTELIG TELECOMUNICAÇÕES LTDA. o pagamento dos valores devidos à Claro S.A. a título de interconexão de redes referente aos DETRAFs de junho a dezembro de 2015, no prazo de até 15 (quinze) dias, contados da notificação de presente decisão, incluindo encargos, multas e correção monetárias estabelecidos contratualmente, referentes aos valores/encargos decorrentes dos atrasos relatados; descontando-se eventual pagamento já efetuado com relação a valores do período acima mencionado e não constante dos autos da presente Reclamação;
IV - DETERMINAR à TIM CELULAR S.A. E INTELIG TELECOMUNICAÇÕES LTDA. que no prazo de 5 (cinco) dias da efetivação do pagamento previsto no item II apresente à Anatel o comprovante;
V - ENVIAR Memorando à Superintendência de Controle de Obrigação (SCO) para análise quanto à uma possível instauração de PADO, nos termos do art. 158, IV, do Regimento Interno da Anatel, aprovado pela Resolução nº 612, de 29/04/2013;
VI - NOTIFICAR as partes do teor da presente decisão.
5.2. Saliente-se que o Processo deve ser remetido à PFE antes de proferida a decisão.
O teor desse informe denota inequivocamente que, no momento de sua produção, ainda persistia o estado de litigiosidade decorrente da retenção indevida de receitas de remuneração de redes pela TIM.
Ademais, o processo de reclamação só voltou novamente a ser movimentado em 08 de agosto de 2018, quando houve a notícia de celebração de acordo entre Claro e TIM.
Assim, não merece reparo o entendimento da área técnica, a qual, inclusive, considerou como termo final da mora, o dia 08 de agosto de 2018, acima mencionado.
VII.a.4 - Fixação do valor-base da multa
Com essas considerações, tem-se que a recorrente não trouxe ao processo elementos que permitam infirmar o cálculo realizado pela área técnica, o qual foi objeto de correções após recomendação da PFE/Anatel, trazida no Parecer nº 478/2022/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI n° 9118317).
Assim, e com fundamento no art. 18, § 2º, do RASA, mantém-se o valor-base da multa proposto no Informe nº 35/2023/COGE/SCO (SEI nº 9738210) e no Informe nº 10/2024/COGE/SCO (SEI nº 11352801), no total de R$ 2.697.858,00 (dois milhões, seiscentos e noventa e sete mil, oitocentos e cinquenta e oito reais), o qual corresponde ao dobro da vantagem auferida pela recorrente, fixada em R$ 1.348.929,00 (um milhão, trezentos e quarenta e oito mil, novecentos e vinte e nove reais).
VII.b - Circunstâncias agravantes
Consoante referido no tópico V, entende-se que a infração ocorreu entre 04 de março de 2016 e 08 de agosto de 2018.
Nos termos do art. 2º, inc. II, do RASA, antecedente é o registro de sanção administrativa imposta pela Agência, precedente no tempo em prazo não superior a 5 (cinco) anos, contado do trânsito em julgado administrativo do Pado (Procedimento para Apuração de Descumprimento de Obrigações) até a data do cometimento da nova infração, excluído o caso de reincidência específica.
Por sua vez, nos termos do art. 19, inc. II, do RASA:
Art. 19. O valor da multa será acrescido, nos percentuais abaixo, caso incidam as seguintes circunstâncias agravantes:
(...)
II - 1% (um por cento) para cada caso de antecedente, até o limite de 20%; e
(...)
As condenações administrativas transitadas em julgado posteriormente a 04 de março de 2011 são aptas a ensejar o reconhecimento de maus antecedentes em desfavor da recorrente.
Por sua vez, examinando-se o teor do Extrato de Antecedentes SEI nº 8755664, todos os antecedentes ali identificados - num total de dezenove - são relacionados a processos transitados em julgado posteriormente a 04 de março de 2011.
Portanto, ainda que a linha de raciocínio aqui desenvolvida seja um diferente daquela desenhada no 3.11 do Informe nº 35/2023/COGE/SCO, conclui-se que deve ser mantido o entendimento no sentido que a multa-base deve ser majorada em dezenove por cento, nos termos do art. 19, inc. II, do RASA.
VII.c - Circunstâncias atenuantes
No Informe nº 35/2023/COGE/SCO (SEI nº 9738210), a área técnica havia proposto a aplicação de atenuante no percentual de setenta por cento, nos termos do art. 20, inc. II, do RASA, com a redação dada pela Resolução nº 746, de 22 de junho de 2021.
A PFE/Anatel, no Parecer n. 478/2022/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI nº 9118317), opinou pela impossibilidade de aplicação de atenuante em tal percentual, pois a norma em comento sequer existia à época dos fatos em apuração.
Em seguida, a área técnica, no Informe nº 35/2023/COGE/SCO (SEI nº 9738210), acolheu a recomendação da PFE/Anatel e aplicou a atenuante nos termos da redação original do art. 20, inc. II, do RASA, no percentual de cinquenta por cento, assim redigido:
Art. 20. O valor da multa será reduzido, nos percentuais abaixo, caso incidam as seguintes circunstâncias atenuantes:
(...)
II - 50% (cinquenta por cento), nos casos de cessação da infração e reparação total do dano ao serviço e ao usuário, imediatamente ou em prazo consignado pela Anatel, após a ação da Agência;
Por sua vez, a recorrente alega que a ação da Anatel teria sido irrelevante para a cessação da conduta infrativa, requerendo a aplicação da atenuante do art. 20, inc. I, no percentual de noventa por cento.
Entende que houve cessação espontânea da infração e reparação total do dano ao serviço e ao usuário, previamente à ação da Agência.
Com efeito, embora a redação do art. 20, inc. II, do RASA, seja mais favorável à recorrente, o eg. Superior Tribunal de Justiça tem entendimento no sentido de que não é possível a retroação de norma mais benéfica, salvo quando houver previsão expressa nesse sentido.
Confira-se, a propósito, a ementa do seguinte julgado, relatado pelo Exmo. Ministro Gurgel de Faria (com grifos acrescidos):
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA. LEI POSTERIOR MAIS BENÉFICA. RETROATIVIDADE. PREVISÃO EXPRESSA. NECESSIDADE.
1. A jurisprudência da Primeira Turma vem entendendo pela de possibilidade de retroação de lei mais benéfica nos casos que envolve penalidades administrativas, por compreender que o art. 5º, LV da Constituição da República traria princípio geral de Direito Sancionatório.
2. Acontece que no julgamento do Tema 1.199, o STF apontou a necessidade de interpretação conjunta dos incisos XL e XXXVI, do art. 5º da Constituição da República, devendo existir disposição expressa na legislação para se afastar o princípio do tempus regit actum, porque a norma constitucional que estabelece a retroatividade da lei penal mais benéfica está diretamente vinculada ao princípio do favor libertatis, peculiaridade inexistente no Direito Administrativo Sancionador, a exigir nova reflexão deste Tribunal sobre a matéria.
3. Não se mostra coerente (com o entendimento do STF) que se aplique o postulado da retroatividade de lei mais benéfica aos casos em que se discute a mera redução do valor de multa administrativa (portanto, muito mais brandos) e, por outro lado, deixe-se de aplicar o referido princípio às demandas de improbidade administrativa, cuja sanção é seguramente muito mais grave, com consequência que chegam a se equiparar às do Direito Penal.
4. Considerando os critérios delineados pelo STF, a rigor, a penalidade administrativa deve se basear pelo princípio do tempus regit actum, salvo se houver previsão autorizativa de aplicação do normativo mais benéfico posterior às condutas pretéritas.
5. No caso, é incontroverso que: a) após a prática da infração, houve a modificação do ato normativo que fixava a penalidade administrativa, pois, embora tenha sido preservada a sanção em si, o valor da multa foi reduzido; b) a aplicação retroativa da nova norma mais benéfica não se operou em razão da aplicação da própria norma, mas sim em decorrência de determinação judicial (acórdão recorrido), pelo que esta última decisão deve ser reformada.
6. Recurso especial provido.
(REsp n. 2.103.140/ES, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 4/6/2024, DJe de 18/6/2024.)
O §2º do art. 5º da Resolução nº 746, de 22 de junho de 2021, determina que “as alterações promovidas ao RASA aplicam-se a todos os processos pendentes de decisão de primeira instância, quando da sua entrada em vigor”. As alterações do RASA entraram em vigor em 1º de julho de 2021, quando já havia decisão de primeira instância neste processo. Desse modo, não há como pretender que as novas regras se apliquem ao presente caso.
Por sua vez, o acervo processual não autoriza o reconhecimento da atenuante de noventa por cento nos termos do art. 20, inc. I, do RASA, requerido pela TIM, eis que, conforme corretamente exposto no Informe nº 7/2020/COGE/SCO, que fundamentou o ato recorrido, a cessação da infração e a reparação do dano somente ocorreram após a deflagração da ação da Anatel e após longas tratativas desenvolvidas com a TIM e com a Claro, na Reclamação Administrativa nº 53504.001041/2017-65.
Assim, mantém-se a atenuante no percentual de cinquenta por cento, nos termos do art. 20, inc. II, do RASA, na sua redação original.
VII.d - Inocorrência de outras circunstâncias agravantes e atenuantes, valor definitivo da multa e razoabilidade da pena
Não se identifica a ocorrência de outras circunstâncias agravantes (art. 19 do RASA) nem atenuantes (art. 20 do RASA).
Assim, adota-se, como valor definitivo da multa aquele proposto pela área técnica no Informe nº 35/2023/COGE/SCO (SEI nº 9738210) e no Informe nº 10/2024/COGE/SCO (SEI nº 11352801), no total de R$ 1.605.225,51 (um milhão, seiscentos e cinco mil duzentos e vinte e cinco reais e cinquenta e um centavos).
Não há elementos que permitam inferir a ausência de proporcionalidade da multa que enseje nova dosimetria, motivo pelo qual torna-se a pena aplicada definitiva.
Com efeito, o cálculo da pena se deu apenas com a aplicação de critérios vinculantes constantes do próprio RASA, sem qualquer avaliação ad hoc.
Todavia, não fosse o teor do art. 18, § 2º, do RASA, seria possível que houvesse um cenário de aplicação de pena nitidamente inócua, a qual, para ser majorada além da aplicação dos critérios normativamente vinculantes, enfrentaria nítidas objeções de segurança jurídica, especialmente aquelas inseridas no art. 4º-A da Lei de Liberdade Econômica.
Assim, a decisão adotada mitiga os riscos daquilo que se chama de underdeterrence, isto é, da incapacidade de a multa servir como instrumento dissuasório suficiente para os casos da espécie, o que poderia decorrer da aplicação da reprimenda resultante da Metodologia de Obrigações Gerais.
Lembra-se, ainda, que, mais que servir como medida de retribuição para um ato, e a despeito de a teoria econômica sugerir uma proporcionalidade entre o dano causado e uma sanção eficientemente aplicada (POLINSKY, SHAVELL, 2000, p. 76), a pena deve objetivar primariamente a redução da ocorrência de infrações para um nível socialmente ótimo, consideradas a probabilidade de detecção do ilícito e os seus custos de aplicação, desde o procedimento sancionador até a fase de execução propriamente dita (COOTER; GILBERT, 2002, p. 479).
Não raro, a simples indenização civil é insuficiente para uma dissuasão da conduta do ofensor, sendo necessária alguma punição adicional (HADDOCK et alii, 2010, p. 187), em que a multa ora aplicada cumpre esse papel.
VIII - Aderência aos objetivos do Decreto nº 11.738/2023, com os ditames do Decreto nº 12.150/2024 e com as diretrizes de memorando de entendimento firmado entre o MDIC e os Estados Unidos
Em 19 de outubro de 2023, foi editado o Decreto Presidencial nº 11.738, cujo escopo é a institucionalização do "Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação - PRO-REG, com a finalidade de apoiar a implementação de boas práticas regulatórias e de aprimorar a coordenação do processo regulatório na administração pública federal direta, autárquica e fundacional" (art. 1º, com grifos acrescidos).
É importante anotar que ele estabelece uma série de objetivos, os quais já comportam densidade normativa suficiente para orientar a atuação dos diversos entes que compõem a administração pública federal, incluindo a Anatel.
Dentre esses objetivos, elencam-se os seguintes (art. 3º):
Art. 3º O PRO-REG contemplará a formulação e a adoção de medidas que objetivem:
I - fortalecer, simplificar e racionalizar o sistema regulatório;
II - fortalecer a capacidade de formulação e análise de políticas públicas no processo regulatório;
III - disseminar boas práticas regulatórias nacionais e internacionais aos órgãos e às entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional;
IV - aprimorar a coordenação e o alinhamento estratégico entre as políticas setoriais e o processo regulatório;
V - contribuir para o desenvolvimento e fortalecimento das capacidades regulatórias dos órgãos e das entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional;
VI - desenvolver e aperfeiçoar mecanismos de controle social e de transparência no âmbito do processo regulatório;
VII - promover o fortalecimento da autonomia, transparência e eficiência das agências reguladoras; e
VIII - apoiar tecnicamente os órgãos e as entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional na implementação de medidas de boas práticas regulatórias.
A prorrogação da entrada em vigor do novo Regulamento Geral de Direitos do Consumidor (RGC) reforça a transparência das ações da Anatel perante o setor regulado e aos consumidores, principais beneficiários deste regulamento, proporcionando segurança jurídica a todos os atores envolvidos, preservando-se as justas expectativas dos direitos dos consumidores.
Expõe-se, ainda, que, no âmbito do PRO-REG, publicou-se o Decreto nº 12.150, de 20 de agosto de 2024, instituiu, a Estratégia Nacional de Melhoria Regulatória - Estratégia Regula Melhor. Tal estratégia tem a finalidade estabelecer e difundir boas práticas regulatórias, com foco no cidadão, de modo a promover a evolução contínua do processo regulatório, aprimorar o ambiente de negócios e assegurar os interesses da sociedade. Tem como objetivo geral e objetivos específicos os seguintes:
Art. 4º O objetivo geral da Estratégia Regula Melhor é aprimorar a qualidade regulatória, observada a necessidade de reduzir assimetrias na adoção de boas práticas entre agentes reguladores.
Art. 5º São objetivos específicos da Estratégia Regula Melhor:
I - comunicar, sensibilizar e promover o engajamento dos diversos atores envolvidos na atividade regulatória, com vistas à adoção consistente, ampla e efetiva de boas práticas;
II - estimular a criação, o compartilhamento e o uso do conhecimento;
III - incentivar a cooperação entre os reguladores das esferas federativas e outros atores relevantes no processo regulatório em âmbito local, nacional e internacional;
IV - desenvolver capacidades institucionais necessárias às atividades de regulação;
V - promover a revisão periódica do estoque regulatório, a simplificação da regulação e a adoção de medidas regulatórias para reduzir a burocracia e os custos regulatórios e para incentivar a inovação;
VI - ampliar a transparência e a participação social efetiva, inclusiva e contínua; e
VII - articular-se com os órgãos e as entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, com vistas a promover a coerência regulatória e a concorrência nos mercados e apoiar as decisões com base em evidências.
O Regula Melhor estabelece a necessidade de promover uma regulação eficiente, que minimize os custos regulatórios para os agentes econômicos e a sociedade, ao mesmo tempo que simplifica o processo regulatório.
Recentemente, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) firmou um memorando de entendimento, de caráter não vinculante, com o Escritório de Informações e Assuntos Regulatórios dos Estados Unidos, buscando aprimorar as regulamentações por meio da troca de conhecimentos.
Esse acordo é parte da Estratégia Nacional de Boas Práticas Regulatórias e inclui a criação de recomendações técnicas e a realização de projetos-piloto em ambientes controlados. Além disso, almeja fortalecer o entendimento dos sistemas regulatórios de ambos os países, promover o comércio e o investimento, e adotar práticas regulatórias eficientes e inovadoras.
O item 1.5 do acordo em questão preconiza que as boas práticas regulatórias, aplicáveis durante a atividade normativa, devem:
i. basear-se em processos de tomada de decisão baseados em evidências;
ii. servir a objetivos de política claramente identificados e sejam eficazes em alcançar esses objetivos;
iii. considerar os efeitos distributivos dos regulamentos na sociedade, incluindo efeitos econômicos, ambientais e sociais;
iv. minimizar custos e distorções de mercado;
v. proporcionar benefícios que justifiquem seus custos;
vi. incentivar abordagens regulatórias que evitem encargos e restrições desnecessárias à inovação e competição no mercado;
vii. ser claros, simples e práticos para os usuários;
viii. não criar inconsistências com regulamentos e políticas existentes do governo federal de cada Participante;
ix. ser compatíveis, quando apropriado, com princípios de concorrência, comércio e investimento nacionais e internacionais;
x. ser consistentes com obrigações internacionais;
xi. promover aspectos relacionados à transparência e participação de entidades reguladas e usuários no processo regulatório;
xii. incentivar a previsibilidade no processo regulatório para empresas e investidores; e
xiii. incentivar a adoção de tecnologias emergentes e a digitalização dos processos regulatórios, facilitando assim a adaptação às mudanças tecnológicas e promovendo maior eficiência e agilidade nas interações entre reguladores e partes reguladas.
Sublinha-se, ademais, que a fundamentação está alinhada com esses objetivos, especialmente aqueles descritos no art. 3º, incisos V e VI, do Decreto nº 11.738/2023, no art. 1º, inc. VII (incentivo à concorrência), do Decreto nº 12.150/2024, bem como no item 1.5, inc. iv, do Memorando mencionado, na medida em que inibe a concorrência desleal. No caso, essa concorrência desleal é evidenciada pela resistência da TIM em liberar os valores devidos pelo uso de redes fixas, impondo a uma concorrente direta um custo adicional injusto, em benefício próprio.
Dessa forma, fortalece-se e legitima-se a capacidade regulatória da Anatel na promoção de suas intervenções no mercado e, concomitantemente, à confiabilidade esperada na correção de condutas indesejadas perpetradas pelas prestadoras.
IX - As boas práticas regulatórias recomendadas pelo Programa de Aprimoramento da Qualidade da Regulação Brasileira
Por sua vez, O Programa de Aprimoramento da Qualidade da Regulação Brasileira (QualiREG) é uma iniciativa da Controladoria Geral da União, realizada com o apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e do Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos (UNOPS), para disseminar uma cultura de mensuração sistemática da qualidade regulatória no Brasil. O QualiREG procura compreender as dificuldades enfrentadas pelas agências e outros entes que atuam nessa área e promover ações para superá-las.
A CGU, no livro digital “Boas Práticas Regulatórias do QualiREG – Programa de Aprimoramento da Qualidade da Regulação Brasileira”, elaborado em parceria com o UNOPS e o PNUD, reúne experiências e pesquisas aplicadas sobre a construção da capacidade institucional dessas entidades, além de debates sobre os desafios e oportunidades nessa temática.
Na referida obra, Patrícia Valente (2024, p. 49) destaca que:
Nesse debate, um dos principais, senão o principal requisito que caracteriza as agências reguladoras, é a autonomia decisória dessas entidades da administração pública indireta. Não se discute que as agências, para que possam atingir seus objetivos, devam tomar suas decisões conforme suas próprias motivações técnicas. Isso significa, na prática, garantir que essas estruturas administrativas decidam conforme seu melhor julgamento técnico, com respaldo em procedimentos que as legitimam, e em última instância sobre as matérias que a lei lhes reserva. Se na criação das agências reguladoras esses requisitos não eram familiares, passadas mais de 2 décadas, já são aceitos e espera-se que sejam aplicados na prática em diversos setores da economia brasileira.
(...)
Nesse contexto, a decisão ora adotada, no sentido de punir uma infração direta a uma disposição regulatória sensível, que pode comprometer o regular fluxo de caixa de uma prestadora em favor de outra que se aproveita da retenção indevida de receitas, criando um cenário de concorrência desleal, aumentam a efetividade da supervisão regulatória promovida pela Anatel.
X - As boas práticas regulatórias recomendadas pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE
Nos últimos anos, o Brasil tem aderido, ainda que não membro, a diversas recomendações da OCDE.
Tal organização mantém vários grupos de trabalho que discutem temas como governança das instituições estatais, transparência, relacionamento com o cidadão, com o mercado e com entidades da sociedade civil, regulação (inclusive na transição para a economia digital), dentre outros. Isso faz com que esses temas ganhem um tom estratégico que vai além do ordenamento constitucional pátrio. Busca-se não apenas fornecer soluções que melhorem o bem-estar das pessoas, mas, também, outras que auxiliem as instituições a chegarem a essas soluções de forma eficiente.
Em relação ao ambiente regulatório, a OCDE (2023, tradução livre) já alertou para riscos de judicialização e recomenda que sejam previstas soluções que tendem a levar a resultados mais satisfatórios que as demais alternativas decisórias disponíveis. Veja-se:
Basear-se nas forças de mercado e na litigância judicial não é uma abordagem que se adapta a todas as situações ou jurisdições e, como todas as decisões de políticas públicas, tem suas desvantagens. Confiar nos tribunais pode ter efeitos colaterais indesejados: a falta de conhecimento técnico pode significar que os tribunais tomem decisões menos alinhadas com a inovação técnica do que um órgão regulador, por exemplo. Os participantes do mercado regulado também podem preferir ter como contraparte um órgão regulador, se esta instituição for transparente e promover o compliance, emitir orientações claras e mostrar a devida atenção às circunstâncias específicas de cada negócio – em oposição à incerteza que pode resultar de ter que esperar por uma decisão judicial para saber como interpretar uma determinada disposição jurídica.
No presente caso, a aplicação da sanção nos patamares sugeridos pela área técnica traduz-se em medida condizente com esses parâmetros, na medida em que a Anatel sinaliza ao mercado que zela pela higidez do ambiente concorrencial, não tolerando condutas que se traduzam em concorrência desleal, devidamente tipificadas nas regulamentações aplicáveis.
XI - Da relação com a Agenda 2030: Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU)
A Agenda 2030 constitui-se em compromisso assumido por todos os países que fizeram parte da Cúpula das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, em 2015, a qual contempla os 193 Estados-membros da ONU, incluindo o Brasil. Conforme disposto no sítio eletrônico da Organização das Nações Unidas no Brasil (https://brasil.un.org/pt-br/sdgs):
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável são um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade. Estes são os objetivos para os quais as Nações Unidas estão contribuindo a fim de que possamos atingir a Agenda 2030 no Brasil.
São 17 (dezessete) os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que compõem a Agenda 2030, conforme figura abaixo:
Fonte: https://brasil.un.org/pt-br/sdgs
O Brasil é um dos países signatários da referida Agenda, cuja importância é reconhecida mundialmente por seus objetivos de erradicar a pobreza, além de respeitar e proteger o meio ambiente e o clima. Como resultado esperado, estima-se proporcionar às pessoas uma vida mais digna e justa.
Entende-se, portanto, que a Agenda 2030 possui um caráter obrigatório para o Poder Executivo brasileiro. Com efeito, em meados do ano de 2016, editou-se o Decreto Presidencial nº 8.892, que tinha por escopo, "internalizar, difundir e dar transparência ao processo de implementação da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas, subscrita pela República Federativa do Brasil" (art. 1º).
Em 2023, o Decreto Presidencial nº 11.704 revogou o Decreto nº 8.892, mas instituiu a Comissão Nacional para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, com a finalidade de contribuir para a internalização da Agenda 2030 no País (art. 1º, inc. I), competindo-lhe, dentre outros pontos, acompanhar e monitorar o alcance dos ODS (art. 2º, inc. II) e identificar, sistematizar e divulgar boas práticas e iniciativas que colaborem para o alcance dos ODS (art. 2º, inc. IV).
Por meio dos referidos Decretos, o Brasil firmou seu compromisso na implementação dos objetivos e indicadores da mencionada Agenda. Pontua-se que a Agenda 2030 estabelece diretrizes, já a implementação concreta dos objetivos e indicadores é responsabilidade das instituições governamentais dos países signatários.
O Decreto Presidencial nº 11.704/2023 simboliza um ato de reafirmação do compromisso brasileiro com a implementação dos ODS, sendo de observância obrigatória pelos órgãos e entidades do Poder Executivo Federal, incluindo a Anatel.
A Anatel, responsável pela concepção, implementação e monitoramento de políticas públicas de ampliação de conectividade no setor de telecomunicações, tem a discricionariedade para avaliar quais políticas públicas estão mais alinhadas com os ODS, que são de observância obrigatória pela Agência.
Os fundamentos adotados relacionam-se com Objetivo 16 ("Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis"), na medida em que buscam a promoção de um ambiente concorrencial justo, num mercado que já é significativamente concentrando, evitando que uma prestadora se locuplete indevidamente às custas de uma concorrente.
Como consequência, identifica-se o atendimento das seguintes metas:
16.3 Promover o Estado de Direito, em nível nacional e internacional, e garantir a igualdade de acesso à justiça, para todos: a fundamentação adotada reafirma a força normativa dos regulamentos expedidos pela Anatel, promovendo, assim o rule of law;
16.6 Desenvolver instituições eficazes, responsáveis e transparentes em todos os níveis: a manutenção da multa denota uma atuação efetiva da Agência no exercício de sua missão institucional, dando concretização à meta em estudo;
16.7 Garantir a tomada de decisão responsiva, inclusiva, participativa e representativa em todos os níveis: a aplicação da atenuante de cinquenta por cento traduz-se em medida de responsividade regulatória, pois leva em consideração a cessação da prática infrativa, ainda que posteriormente à deflagração da ação da Agência, após provocação da Claro.
A Agenda 2030 foi objeto de alinhamento interno, para o caso brasileiro, sendo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), responsável por desenvolver metas brasileiras, conforme fundamentado estudo realizado pelo referido Instituto.
Destacam-se a meta nacional 16.3 - Fortalecer o Estado de Direito e garantir o acesso à justiça às pessoas envolvidas em conflitos, especialmente àquelas que se encontram em situação de vulnerabilidade, em que, como visto, a deliberação que se adota reafirma o rule of law; e a meta nacional 16.7 - Ampliar a transparência, a accountability e a efetividade das instituições, em todos os níveis, pois se percebe a efetividade da atuação da Anatel.
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável são interconectados e desafiadores, tendo como foco principal o desenvolvimento humano no Brasil e no Mundo. As principais dimensões desse projeto têm natureza social, ambiental, econômica e institucional. O desenvolvimento do mundo somente é concebível por um caminho sustentável, com medidas verdadeiramente transformadoras. Justamente por isso, foram definidos 17 objetivos e 169 metas globais interconectadas, a serem atingidos até 2030.
Neste ponto, pela relevância do tema, destaca-se o Objetivo 1 da Agenda 2030 que é o de acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares. Para o caso analisado, destacam-se as seguintes metas:
Meta 1.3 - Implementar, em nível nacional, medidas e sistemas de proteção social adequados, para todos, incluindo pisos, e até 2030 atingir a cobertura substancial dos pobres e vulneráveis;
Meta 1.4 - Até 2030, garantir que todos os homens e mulheres, particularmente os pobres e vulneráveis, tenham direitos iguais aos recursos econômicos, bem como o acesso a serviços básicos, propriedade e controle sobre a terra e outras formas de propriedade, herança, recursos naturais, novas tecnologias apropriadas e serviços financeiros, incluindo microfinanças;
Meta 1.a - Garantir uma mobilização significativa de recursos a partir de uma variedade de fontes, inclusive por meio do reforço da cooperação para o desenvolvimento, para proporcionar meios adequados e previsíveis para que os países em desenvolvimento, em particular os países menos desenvolvidos, implementem programas e políticas para acabar com a pobreza em todas as suas dimensões; e
Meta 1.b - Criar marcos políticos sólidos em níveis nacional, regional e internacional, com base em estratégias de desenvolvimento a favor dos pobres e sensíveis a gênero, para apoiar investimentos acelerados nas ações de erradicação da pobreza.
O objetivo 1 possui a premissa mais sensível e básica de todas as outras. A pobreza extrema é o nível mais drástico para afetar o desenvolvimento dos países e a dignidade humana. Não sem motivo figura como primeiro objetivo da Agenda 2030. Todas as medidas regulatórias adotadas pela Anatel devem se atentar, em maior ou menor nível, ao combate sistemático e perene da pobreza.
O Brasil está empenhado no cumprimento dessas metas, sendo relevante o estudo desenvolvido pelo IPEA, quanto à adequação das metas globais da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável à realidade brasileira. Trata-se de um importante instrumento de suporte técnico e institucional às ações governamentais para a formulação e reformulação de políticas públicas e programas nacionais de desenvolvimento.
Com essa iniciativa, o Brasil ganha destaque no sentido de ter à sua disposição um instrumento orientativo para a territorialização dos ODS, sem perder de vista os fundamentos da proposta original.
conclusão
Voto por:
conhecer das petições SEI nº 12191726 e (SEI nº 12460892) para indeferi-las;
conhecer e negar provimento ao recurso administrativo; e
rever, de ofício, o valor da sanção fixada no Despacho Decisório nº 4/2020/COGE/SCO (SEI nº 5088422), no valor de R$ 1.419.089,15 (um milhão, quatrocentos e dezenove mil oitenta e nove reais e quinze centavos), elevando-a para R$ 1.605.225,51 (um milhão, seiscentos e cinco mil duzentos e vinte e cinco reais e cinquenta e um centavos).
| Documento assinado eletronicamente por Alexandre Reis Siqueira Freire, Conselheiro Relator, em 27/09/2024, às 19:07, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 23, inciso II, da Portaria nº 912/2017 da Anatel. |
A autenticidade deste documento pode ser conferida em http://www.anatel.gov.br/autenticidade, informando o código verificador 12138962 e o código CRC CBAD5481. |
Referência: Processo nº 53500.033378/2019-33 | SEI nº 12138962 |