Boletim de Serviço Eletrônico em 07/03/2024
Timbre

Análise nº 17/2024/VA

Processo nº 53500.059860/2021-18

Interessado: Zenvia Mobile Serviços Digitais S.A, Algar Telecom S.A.

CONSELHEIRO

VICENTE BANDEIRA DE AQUINO NETO

ASSUNTO

Recursos Administrativos interpostos pela ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A. e pela ALGAR TELECOM S.A. contra o Despacho Decisório nº 217/2022/CPRP/SCP, de 21 de dezembro de 2022, proferido pelo Superintendente de Competição da Anatel.

EMENTA

reclamação administrativa. superintendência de competição (scp). DISPAROS MASSIVOS DE short message service (sMS) - aplicação para pessoa (A2P). CONFLITOS ENTRE PRESTADORAS Do SERVIÇO MÓVEL PESSOAL (SMP) E DE SERVIÇO DE VALOR ADICIONADO (SVA). recursos administrativos. PETIÇÃO EXTEMPORÂNEA. SÚMULA Nº 21/2017. reavaliação do Plano Geral de Metas de Competição (PGMC). Análise de Impacto Regulatório (AIR). Tema 11: Mercado de SMS Corporativo. ausência de condições mercadológicas passíveis de regulação assimétrica. princípio constitucional da livre iniciativa. necessidade de transparência dos preços praticados pela algar. ÔNUS DA PROVA. INCUMBÊNCIA De quem alega. provedor de Serviços de Valor Adicionado (SVA) é usuário de serviços de telecomunicações mesmo nas contratações por atacado. Inteligência do art. 61, § 1º, da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997 (Lei Geral de Telecomunicações - LGT). direito de acesso à necessária e suficiente informação sobre os preços praticados e à evolução dos reajustes realizados nos últimos 5 (cinco) anos. Adoção do Índice de Serviços de Telecomunicações (IST) nos casos de conflito quanto ao índice a ser empregado para reajustes. existência de empresa intermediária que objetive implementar solução de segurança na rede. possibilidade. condicionamento de formalização de contrato entre a empresa intermediária e a integradora para o acesso à rede da operadora de SMP. impossibilidade. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO DE ACOMPANHAMENTO E CONTROLE (PAC) PARA ACOMPANHAMENTO DO CUMPRIMENTO DA DECISÃO. ADERÊNCIA AOS OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DA AGENDA 2030 DA ONU. RECURSOS CONHECIDOS E NÃO PROVIDOS. PETIÇÃO EXTEMPORÂNEA INDEFERIDA.

1. Recursos Administrativos interpostos pela Zenvia e pela Algar em face do Despacho Decisório nº 217/2022/CPRP/SCP, de 21 de dezembro de 2022.

2. Nos termos da Súmula nº 21, de 10 de outubro de 2017, deve-se conhecer das petições extemporâneas protocolizadas até a data de divulgação da pauta de Reunião do Conselho Diretor na Biblioteca e na página da Agência na internet, desde que não caracterize abuso do exercício do direito de petição. Conhecimento da petição extemporânea SEI nº 11041493, protocolizada antes da publicação da pauta da presente deliberação.

3. A Análise de Impacto Regulatório (AIR) realizada por ocasião da reavaliação do Plano Geral de Metas de Competição (PGMC) em seu Tema 11: Mercado de SMS (Short Message Service) Corporativo não identificou, por ora, falhas de mercado que justifiquem uma intervenção regulatória ex ante por parte da Anatel, tendo concluído pela ausência, neste momento, de condições mercadológicas passíveis de regulação assimétrica.

4. A Anatel deve observar o princípio constitucional da livre iniciativa e seus consectários, buscando não intervir - ou intervir minimamente - no modelo de negócios das prestadoras de telecomunicações. Neste caso concreto, a interferência promovida foi no sentido de assegurar a isonomia entre os stakeholders por meio da transparência e publicidade das informações relativas ao serviço prestados pela Algar, nos termos do parágrafo único do art. 3º da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997 (Lei Geral de Telecomunicações - LGT) .

5. Ausência de comprovação nos autos quanto à possibilidade de a ferramenta de segurança contratada pela Algar gerar atrasos na entrega das mensagens SMS. Cabe a quem alega o ônus da prova dos fatos que alega, nos termos do disposto no art. 85 do Regimento Interno da Anatel (RIA), aprovado pela Resolução nº 612, de 29 de abril de 2013, e do art. 36 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999 (Lei de Processo Administrativo - LPA).

6. Como provedora de Serviços de Valor Adicionado (SVA), a Zenvia é usuária de serviços de telecomunicações, nos termos do § 1º do art. 61 da LGT e, mesmo que suas contratações se deem no atacado, ela é detentora dos direitos enumerados no art. 3º dessa Lei, dentre eles o direito de acesso à necessária e suficiente informação sobre os preços praticados e à evolução dos reajustes realizados nos últimos 5 (cinco) anos.

7. Adoção do Índice de Serviços de Telecomunicações (IST) nos casos de conflito quanto ao índice a ser empregado para reajustes, por se tratar de uma métrica composta por outros índices consagrados na economia brasileira e selecionados por trabalho conjunto entre a Anatel e a Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), sendo o mais representativo da atualização de valores intrínsecos à indústria de telecomunicações.

8. Não se vedou a existência de empresa intermediária que tenha como escopo implementar solução de segurança na rede da Algar, mas sim que essa operadora condicione o acesso à sua rede por parte da Zenvia à existência de um contrato entre a empresa intermediária e a Zenvia, pois isso fere um dos corolários do princípio constitucional da livre iniciativa, que é a liberdade de contratar.

9. Deve ser instaurado o Processo de Acompanhamento e Controle (PAC) para que a Agência verifique a concretização não apenas das determinações relativas ao art. 3º da LGT, mas também o adimplemento da integralidade dos comandos exarados nestes autos, nos termos do que ocorreu nos processos Zenvia X Telefônica e Zenvia X Tim.

10. Determinação adicional para que a Superintendência de Controle de Obrigações (SCO), no âmbito do PAC a ser instaurado para fins de atesto ao cumprimento das determinações exaradas neste processo, averigue se os dados a serem publicizados no sítio eletrônico da Algar poderão ser facilmente encontrados pelos usuários de serviços de telecomunicações, sem utilização de termos exageradamente técnicos ou com direcionamento a páginas intermediárias que dificultem o acesso às informações.

11. A proposta de encaminhamento se relaciona com o Objetivo 16 da Agenda 2030, que busca promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis e, mais especificamente, com a Meta nº 16.6, que visa desenvolver instituições eficazes, responsáveis e transparentes em todos os níveis, e com a Meta nº 16.7, que pretende garantir a tomada de decisão responsiva, inclusiva, participativa e representativa em todos os níveis.

12. Recursos conhecidos e não providos. Petição extemporânea indeferida.

REFERÊNCIAS

Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988.

Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997 (Lei Geral de Telecomunicações - LGT).

Lei nº 9.874, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.

Lei nº 13.673, de 5 de junho de 2018, que altera as Leis nº 8.987/1995, nº 9.427/1996 e nº 9.472/1997, para tornar obrigatória a divulgação de tabela com a evolução do valor da tarifa e do preço praticados pelas concessionárias e prestadoras de serviços públicos.

Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019, que institui a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica e estabelece garantias de livre mercado.

Regimento Interno da Anatel, aprovado pela Resolução nº 612, de 29 de abril de 2013.

RELATÓRIO

Cuida-se dos Recursos Administrativos interpostos por ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A. e por ALGAR TELECOM S.A. contra o Despacho Decisório nº 217/2022/CPRP/SCP (SEI nº 9479852), de 21 de dezembro de 2022, proferido pelo Superintendente de Competição da Anatel.

O presente processo foi iniciado a partir da Reclamação Administrativa proposta em 20 de agosto de 2021 pela Zenvia Mobile Serviços Digitais S.A. (SEI nº 7293279) em face da Algar Telecom S.A. devido à cominação de contratação de empresa intermediária na relação contratual existente entre as partes referente à entrega massiva de SMS (Short Message Service - SMS) A2P (aplicação para pessoa) via short number, à alteração de política de precificação da terminação massiva de mensagens curtas e à ameaça de descontinuidade do contrato firmado. 

Em 14 de setembro de 2021, ocorreu reunião de conciliação entre as partes (SEI nº 7401668), mas não se logrou êxito quanto a algum acordo. 

Aos 3 de novembro de 2021, a Algar protocolizou sua peça defensiva (SEI nº 7619276) aduzindo, dentre outros argumentos, a inexistência de qualquer discriminação em relação à Zenvia, assim como qualquer impedimento de acesso à sua rede.

Na data de 20 de janeiro de 2022, expediu-se o Despacho Ordinatório SEI nº 7934789, por meio do qual a Reclamação Administrativa foi declarada saneada e as partes foram notificadas para apresentação de Alegações Finais.

Em 16 de fevereiro de 2022, as partes apresentaram suas respectivas Alegações Finais: a Zenvia sob o SEI nº 8060957 e a Algar sob o SEI nº 8062372.

Aos 28 de julho de 2022, expediu-se o Informe nº 227/2021/CPRP/SCP (SEI nº 7668106) por meio do qual o Setor Técnico da Agência sugeriu, dentre outros: (i)  definir que a atualização dos valores devidos pela gestão e disponibilização pela Algar de sistemas de encaminhamento de SMS A2P à Zenvia limite-se à variação acumulada pelo Índice de Serviços de Telecomunicações (IST), desde a entrada em vigor da Lei nº 13.673, de 5 de junho de 2018, que incluiu o parágrafo único no art. 3º da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, a Lei Geral de Telecomunicações (LGT); (ii) determinar que, na repactuação dos valores devidos pela gestão e disponibilização pela Algar de sistemas de encaminhamento de SMS A2P à Zenvia, seja observado o valor definido no item (i), com a manutenção da faixa de volume inicialmente contratada; (iii) estabelecer que, no exercício do item (ii), seja considerado como início de vigência dos valores a data de 28 de julho de 2021, até que a Algar exerça o previsto no art. 3º, parágrafo único, da LGT, incluído pela Lei nº 13.673/2018, momento em que deverá ser repactuada a relação considerando os termos publicizados; (iv) determinar que a Algar não exija, sob nenhum pretexto, formalização de instrumento contratual entre a Zenvia e terceiros, obstaculizando o acesso aos sistemas de encaminhamento de SMS A2P; (v) determinar que se instaure processo para acompanhamento da implementação pela Algar do disposto no artigo 3º, parágrafo único, da LGT, incluído pela Lei nº 13.673/2018. 

Na data de 8 de agosto de 2022, a Procuradoria Federal Especializada junto à Anatel (PFE/Anatel) emitiu o Parecer nº 00430/2022/PFE-ANATEL/PGF/AGU, aprovado parcialmente pelo Despacho nº 03009/2022/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI nº 9461144), no qual discordou da proposta do Setor Técnico de atender ao pedido da Zenvia de fixar o Índice de Serviços de Telecomunicações (IST) como critério de reajuste do objeto dos contratos celebrados entre as partes desde o início da vigência da Lei nº 13.673/2018, pois não encontra razão para alteração do índice de reajuste livremente pactuado entre as partes.

Em 21 de dezembro de 2022, a Área Técnica expediu o Informe nº 219/2022/CPRP/SCP (SEI nº 9473421) no qual, para além de examinar o opinativo da PFE/Anatel e as manifestações que as partes apresentaram no interregno em que os autos ali estavam, propôs os seguintes ajustes ao dispositivo constante do Informe nº 227/2021/CPRP/SCP (SEI nº 7668106) para que a SCP: (i) defina que a atualização dos valores devidos pela gestão e disponibilização pela Algar de sistemas de encaminhamento de SMS A2P à Zenvia se limite à variação acumulada pelo IST, desde a entrada em vigor da Lei nº 13.673/2018, que introduziu o parágrafo único no art. 3º da LGT; (ii) determine que, na repactuação dos valores devidos pela gestão e disponibilização pela Algar de sistemas de encaminhamento de SMS A2P à Zenvia, seja observado o valor definido no item (i), com a manutenção da faixa de volume inicialmente contratada; (iii) estabeleça que, no exercício do item (ii), seja considerado como início de vigência dos valores a data de 28 de julho de 2021, até que a Algar exerça o previsto no art. 3º, parágrafo único, da LGT, momento em que deverá ser repactuada a relação considerando os termos publicizados; (iv) determine que a Algar não exija, sob nenhum pretexto, formalização de instrumento contratual entre a Zenvia e terceiros, obstaculizando o acesso aos sistemas de encaminhamento de SMS A2P; e (v) determine a instauração de processo para acompanhamento da implementação pela Algar quanto ao disposto no art. 3º, parágrafo único, da LGT.

Nessa mesma data foi exarado o Despacho Decisório nº 217/2022/CPRP/SCP (SEI nº 9479852) acatando os termos do Informe supra.

Aos 16 de janeiro de 2023, a Zenvia interpôs Recurso Administrativo (SEI nº 9690874) no qual asseverou não ter a Agência, na decisão atacada, se manifestado de modo expresso quanto à decisão da Algar de tratar de maneira diferente as mensagens originadas por "marcas globais" em comparação com outras mensagens, argumentando que, para além de inexistir base técnica ou fática para essa diferenciação, não foram apresentadas evidências de riscos de segurança específicos associados às "marcas globais". Defendeu, ainda, haver a possibilidade de a ferramenta de segurança contratada pela Algar resultar em atrasos na entrega de mensagens SMS, o que poderia prejudicar os usuários finais que dependem dessas mensagens para informações importantes.

A Algar, nesse mesmo dia, igualmente interpôs seu Recurso Administrativo (SEI nº 9691824) aduzindo, em epítome, que o Despacho Decisório nº 217/2022/CPRP/SCP (SEI nº 9479852) se equivocou em relação aos seguintes pontos: (i) Reajuste Contratual: o índice de reajuste (IGP-M) deveria ser aplicado de acordo com o que foi inicialmente acordado entre as partes, desde a data de assinatura até o término do contrato, e que o parágrafo único do art. 3º da LGT não se aplicaria a essa situação; (ii) Acesso aos Sistemas de Encaminhamento de SMS A2P: a Algar não estaria impedindo o acesso da Zenvia à sua rede, mas apenas exigindo que tal empresa formalizasse contratos com terceiros (como a INFOBIP) para a filtragem de dados criptografados no afã de proteger sua rede de telecomunicações, o que não violaria o direito de escolha da Zenvia; e (iii) Processo de Acompanhamento: não haveria necessidade de instauração desse processo para acompanhar a implementação do parágrafo único do art. 3º da LGT, já que tal medida não seria aplicável às relações de atacado devido à inexistência de vulnerabilidade técnica ou econômica da Zenvia em relação à Algar. 

A SCP, ao seu turno, proferiu em 19 de janeiro de 2023 o Despacho Decisório nº 5/2023/CPRP/SCP (SEI nº 9694455), no qual conheceu das peças recursais interpostas.

Em 9 de fevereiro de 2023, a Zenvia apresentou Contrarrazões (SEI nº 9810499) sustentando, em suma, o acerto do decisum hostilizado quanto aos pontos indicados na peça recursal da Algar (vide item 4.12 supra), assentando que tal decisão foi fulcrada em argumentos de regulação e proteção do mercado. 

Em 16 de fevereiro de 2023, a Algar protocolizou suas Contrarrazões (SEI nº 9839268), esclarecendo que o novo modelo de negócios SMS A2P da empresa visava promover a segurança da rede e não discriminava o acesso de outras empresas como a Zenvia. Afirmou também que os custos do novo sistema de segurança cibernética não seriam repassados aos usuários finais, mas sim às marcas "globais", que lucravam com o acesso a esses usuários. Defendeu que o quanto aduzido pela Zenvia, como a falta de diferenciação técnica entre mensagens internacionais e nacionais e a possibilidade de atrasos na entrega das mensagens, não se mostrava relevante para contestar a decisão da Anatel. Também argumentou que a Algar não detinha poder de mercado no mercado de SMP e que o novo modelo de negócios não era contrário à regulamentação setorial ou à legislação concorrencial.

Na data de 18 de abril, foi realizada nova reunião de conciliação (SEI nº 10124316) entre as partes, porém ambas não manifestaram interesse em promover um acordo.

O Corpo Técnico, então, emitiu o Informe nº 28/2023/CPRP/SCP, de 11 de maio de 2023 (SEI nº 9813205), por meio do qual analisou tanto as peças recursais interpostas como as respectivas contrarrazões, acabando por sugerir o conhecimento e o não provimento dos dois Recursos Administrativos interpostos.

Naquela mesma data, os autos foram encaminhados para este Colegiado por meio da Matéria para Apreciação do Conselho Diretor nº 197/2023 (SEI nº 9951756), tendo sido distribuídos para o meu gabinete, para fins de relatoria, conforme Certidão de Distribuição SCD nº 10304920.

Em  24 de outubro de 2023, a Algar apresentou a petição SEI nº 11041493 na qual listou as razões que ensejariam a reforma parcial do Despacho Decisório nº 217/2022/CPRP/SCP (SEI nº 9479852): (i) licitude da especificação do IGP-M como índice inflacionário; (ii) regularidade do modelo da Algar que prevê a INFOBIP como sua intermediária na contratação dos seus serviços de SMS A2P para o tráfego advindo de Clientes Global, por se tratar de um arranjo contratual de direito privado; e (iii) ausência de fundamento para instituição do Procedimento de Acompanhamento e Controle. 

Por meio da Análise nº 135/2023/VA (SEI nº 10883824), solicitei a prorrogação da relatoria em função da complexidade da matéria debatida no feito, o que foi acatado pelos meus pares do Conselho Diretor, segundo se extrai da Certidão de Julgamento SEI nº 11084042, de 26 de outubro de 2023.

Na data de 7 de dezembro de 2023, a Zenvia protocolizou a manifestação SEI nº 11238515 requerendo vista e cópia integral dos autos, bem como a concessão do acesso eletrônico, via sistema SEI, para mais 2 (dois) procuradores. Tal pleito foi respondido por meio do Ofício nº 84/2023/VA, de 20 de dezembro de 2023 (SEI nº 11286473).

É o breve relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

Inicialmente, destaco que a tramitação do processo se deu em consonância com os dispositivos legais e regulamentares, tendo sido observados os princípios do processo legal, do contraditório e da ampla defesa, segundo estabelecem a Lei nº 9.874, de 29 de janeiro de 1999, Lei de Processo Administrativo (LPA), e o Regimento Interno da Anatel (RIA), aprovado pela Resolução nº 612, de 29 de abril de 2013.

A fundamentação da presente Análise encontra-se dividida em 4 (quatro) partes. Na primeira, avaliarei a admissibilidade dos Recursos Administrativos interpostos. Na segunda, abordarei as petições extemporâneas protocolizadas pelas partes. Na terceira, tratarei do mérito recursal, apresentando um contexto acerca do assunto debatido nos autos para, então, imiscuir-me e posicionar-me sobre as alegações de cada Recurso Administrativo e suas respectivas Contrarrazões. Por fim, na quarta e derradeira parte, procederei à conformação do objeto da presente análise com as boas práticas regulatórias recomendadas pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU).

I - DA ADMISSIBILIDADE DOS RECURSOS ADMINISTRATIVOS

A notificação das Recorrentes acerca do inteiro teor do Despacho Decisório nº 217/2022/CPRP/SCP (SEI nº 9479852) se deu em 5 de janeiro de 2023, em conformidade com as Certidões de Intimação Cumprida SEI nº 9655679 (Zenvia) e nº 9651803 (Algar). Logo, a contagem do prazo iniciou-se em 6 de janeiro de 2023, esgotando-se no dia 15 daquele mês. Tendo tal data sido dia não útil (domingo), o dies ad quem do prazo recursal restou prorrogado para 16 de janeiro de 2023, data da interposição dos Recursos Administrativos segundo os Recibos Eletrônicos de Protocolo SEI nº 9690875 (Zenvia) e nº 9691825 (Algar). Dessa maneira, tem-se que ambos são tempestivos.

Além disso, ambas as Recorrentes possuem interesse na reforma da decisão recorrível, estão regularmente representadas e nos Recursos interpostos não há contrariedade a entendimento fixado em Súmula pela Agência.

Verifico, portanto, a presença dos pressupostos previstos no art. 116 do RIA, de modo a ser correta a decisão de conhecimento contida no Despacho Decisório nº 5/2023/CPRP/SCP, de 19 de janeiro de 2023 (SEI nº 9694455).

II - DAS PETIÇÕES EXTEMPORÂNEAS DA ALGAR E DA ZENVIA

Como relatado anteriormente, na data de 24 de outubro de 2023 a Algar apresentou a petição SEI nº 11041493, na qual listou as seguintes razões que ensejariam a reforma parcial do Despacho Decisório nº 217/2022/CPRP/SCP (SEI nº 9479852): (i) licitude da especificação do Índice Geral de Preços - Mercado (IGP-M) como índice inflacionário; (ii) regularidade do modelo da Algar que prevê a INFOBIP como sua intermediária na contratação de seus serviços de SMS A2P para o tráfego advindo de Clientes Global, por se tratar de um arranjo contratual de direito privado; e (iii) ausência de fundamento para instituição do Procedimento de Acompanhamento e Controle (PAC).

A Zenvia protocolizou a manifestação SEI nº 11238515 em 7 de dezembro de 2023 requerendo vista e cópia integral dos autos, bem como a concessão do acesso eletrônico, via sistema SEI, para mais 2 (dois) procuradores.

Como se vê, a petição da Zenvia apresentou pedidos de ordem procedimental e, estando o processo sob minha relatoria, os respondi por meio do Ofício nº 84/2023/VA (SEI nº 11286473). 

Já a manifestação da Algar, igualmente protocolizada quando os autos já se encontravam sob minha relatoria, trouxe pedidos relacionados ao mérito do processo, reiterando suas alegações recursais. Dessa maneira, examinarei seu recebimento à luz da Súmula nº 21 da Anatel, datada de 10 de outubro de 2017, cujo teor replico a seguir:

"As petições extemporâneas, quando não caracterizado abuso do exercício do direito de petição, devem ser conhecidas e analisadas pelo Conselho Diretor desde que protocolizadas até a data de divulgação da pauta de Reunião na Biblioteca e na página da Agência na internet.

É facultado o exame dessas petições, no caso concreto, pelo Conselheiro ou pelo Conselho Diretor após o prazo estipulado e até o julgamento da matéria, sobretudo se a manifestação do interessado trouxer a lume a notícia de fato novo ou relevante que possa alterar o desfecho do processo.

Não há necessidade de desentranhamento de petições extemporâneas, ainda que não conhecidas por esse órgão colegiado".

(Destaquei)

Para além de ter sido apresentada antes da inserção do presente feito na pauta de julgamento pelo Colegiado, a manifestação não configura abuso do direito de petição, de modo que sugiro a meus pares seu conhecimento.

Adicionalmente, esclareço que tratarei dos pleitos reapresentados pela Algar ao longo desta Análise, em capítulos dedicados aos temas correspondentes.

III - DO MÉRITO RECURSAL

Passo a tratar, a seguir, dos Recursos Administrativos interpostos pela Zenvia e pela Algar em face do Despacho Decisório nº 217/2022/CPRP/SCP, de 21 de dezembro de 2022 (SEI nº 9479852). Antes, porém, entendo oportuno apresentar uma brevíssima contextualização sobre o tema para fins de clareza.

III.1 - Do contexto 

Como disse preteritamente, em 20 de agosto de 2021 a Zenvia propôs Reclamação Administrativa em desfavor da Algar devido: (i) à cominação de contratação de empresa intermediária na relação contratual existente entre as partes relativa à entrega massiva, via short number, de SMS A2P; (ii) à alteração de política de precificação da terminação massiva de mensagens curtas; e (iii) à ameaça de descontinuidade do contrato firmado.

Nos termos da exordial apresentada (SEI nº 7293279), a Zenvia é uma empresa prestadora de Serviço de Valor Adicionado (SVA) que consiste na integração com prestadoras do Serviço Móvel Pessoal (SMP) para disparo automatizado de mensagens SMS, viabilizando a comunicação das empresas que são suas clientes diretas junto aos respectivos consumidores, efetivos ou potenciais.

A Reclamante já ingressou com outras Reclamações Administrativas semelhantes na Anatel, a saber: (i) Zenvia e Tim S.A. (Processo nº 53500.036283/2020-13); (ii) Zenvia e Claro S.A. (Processo nº 53500.036288/2020-38e (iii) Zenvia e Telefônica Brasil S.A (Processo nº 53500.036292/2020-04). Mutatis mutandis, ela aduziu em tais processos que as prestadoras do SMP vêm impondo, ao longo do tempo, majorações injustificadas para os preços praticados no âmbito dos contratos de entrega massiva de SMS, o que estaria impactando não só a sua atuação no mercado de prestação de SVA de integração com prestadoras de SMP para disparo automatizado de mensagens SMS, mas também o próprio ecossistema de tal mercado.

A Superintendência de Competição (SCP) elaborou, então, um minucioso e percuciente estudo sobre o mercado de comunicações corporativas via mensagens curtas (SMS), bem como das nuances de cada Reclamação Administrativa proposta pela Zenvia e concluiu que a atualização dos valores devidos pela gestão e disponibilização de sistemas de encaminhamento de SMS A2P pelas prestadoras do SMP à Zenvia se limite à variação acumulada pelo IST desde a entrada em vigor da Lei nº 13.673/2018, que introduziu mudança no parágrafo único do art. 3º da LGT.

Nessa medida, a SCP decidiu o seguinte: 

Despacho Decisório nº 64/2021/CPRP/SCP - SEI nº 6726967: 

(...)

I - DEFINIR que, para o caso concreto, a atualização dos valores devidos pela gestão e disponibilização pela TELEFÔNICA BRASIL S.A. de sistemas de encaminhamento de SMS A2P à ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A. se limite à variação acumulada pelo Índice de Serviços de Telecomunicações (IST), desde a entrada em vigor da Lei nº 13.673, de 05 de junho de 2018, que introduziu mudança no parágrafo único do art. 3º da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, a Lei Geral de Telecomunicações (LGT).

II - DETERMINAR que no Instrumento Contratual (SEI nº 5831471) os valores devidos pela gestão e disponibilização pela TELEFÔNICA BRASIL S.A. de sistemas de encaminhamento de SMS A2P à ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A., seja observada a definição do item I, com a manutenção da faixa de volume inicialmente contratada.

III - ESTABELECER que, no exercício do item II, seja considerado como início de vigência dos valores a data de 1º de abril de 2020 até que a TELEFÔNICA BRASIL S.A. exerça o previsto no artigo 3º, parágrafo único, da LGT, incluído pela Lei nº 13.673, de 05 de junho de 2018, momento em que deverá ser repactuada a relação considerando os termos publicizados.

IV - DETERMINAR que se instaure processo para acompanhamento da implementação pela TELEFÔNICA BRASIL S.A. do disposto no artigo 3º, parágrafo único, da LGT, incluído pela Lei nº 13.673, de 05 de junho de 2018.

(...)

------------------------------------------------------------------------------------------------

Despacho Decisório nº 67/2021/CPRP/SCP - SEI nº 6727378:

(...)

I - DEFINIR que, para o caso concreto, a atualização dos valores devidos pela gestão e disponibilização pela TIM S.A. de sistemas de encaminhamento de SMS A2P à ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A. se limite à variação acumulada pelo Índice de Serviços de Telecomunicações (IST), desde a entrada em vigor da vigor da Lei nº 13.673, de 05 de junho de 2018, que introduziu mudança no parágrafo único do art. 3º da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, a Lei Geral de Telecomunicações (LGT).

II - DETERMINAR que, na repactuação dos valores devidos pela gestão e disponibilização pela TIM S.A. de sistemas de encaminhamento de SMS A2P à ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A., seja observada a definição do item I, com a manutenção da faixa de volume inicialmente contratada.

III - ESTABELECER que, no exercício do item II, seja considerado como início de vigência dos valores a data de 14 de junho de 2020 até que a TIM S.A. exerça o previsto no artigo 3º, § único, da LGT, incluído pela Lei nº 13.673, de 05 de junho de 2018, momento em que se deverá repactuar a relação considerando os termos publicizados.

IV - DETERMINAR que se instaure processo para acompanhamento da implementação pela TIM S.A. do disposto no artigo 3º, § único, da LGT, incluído pela Lei nº 13.673, de 05 de junho de 2018.

(...)

------------------------------------------------------------------------------------------------

Despacho Decisório nº 72/2021/CPRP/SCP - SEI nº 6767013:
(...)

I - DEFINIR que, para o caso concreto e na repactuação contratual, a atualização dos valores devidos pela gestão e disponibilização pela CLARO S.A. de Large Accounts de SMS à ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A. se limite à variação acumulada pelo Índice de Serviços de Telecomunicações (IST), desde a entrada em vigor da vigor da Lei nº 13.673, de 05 de junho de 2018, que introduziu mudança no parágrafo único do art. 3º da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, a Lei Geral de Telecomunicações (LGT).

II - DETERMINAR que, na repactuação dos valores devidos pela gestão e disponibilização pela CLARO S.A. de Large Accounts de SMS à ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A., em decorrência do item 9.1. do Instrumento Contratual (SEI nº 5831372), seja observado o valor definido no item I deste Despacho, com a manutenção da faixa de volume inicialmente contratada.

III - ESTABELECER que, no exercício do item II, seja considerado como início de vigência dos valores a data de 10 de outubro de 2020 até que a CLARO S.A. exerça o previsto no artigo 3º, parágrafo único, da LGT, incluído pela Lei nº 13.673, de 05 de junho de 2018, momento em que deverá ser repactuada a relação considerando os termos publicizados.

IV - DETERMINAR que se instaure processo para acompanhamento da implementação pela CLARO S.A. do disposto no artigo 3º, parágrafo único, da LGT, incluído pela Lei nº 13.673, de 05 de junho de 2018.

(...)

Assim como no presente caso, em todas as Reclamações Administrativas foram interpostos Recursos Administrativos contra tais decisões. No processo da Zenvia e Claro (Processo nº 53500.036283/2020-13), as peças recursais não foram enviadas a este Colegiado devido as partes terem se manifestado pela ausência de interesse na continuidade da Reclamação Administrativa (vide Despacho Decisório nº 182/2021/CPRP/SCP - SEI nº  7271878). Contudo, os recursos interpostos nos autos Zenvia X Telefônica e Zenvia X Tim já foram examinados e a todos foi negado provimento. É o que se extrai dos Acórdãos a seguir reproduzidos (SEI nº 7625988 e nº 7770220, respectivamente):

"ACÓRDÃO Nº 369, DE 04 DE NOVEMBRO DE 2021

Processo nº 53500.036292/2020-04

Recorrente/Interessado: TELEFÔNICA BRASIL S.A., ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A

CNPJ nº 02.558.157/0001-62 e nº 14.096.190/0001-05

Conselheiro Relator: Emmanoel Campelo de Souza Pereira

Fórum Deliberativo: Reunião nº 906, de 21 de outubro de 2021

EMENTA

RECLAMAÇÃO ADMINISTRATIVA. COMPETÊNCIA DA ANATEL PARA DIRIMIR CONFLITOS ENTRE PRESTADORAS DO SERVIÇO MÓVEL PESSOAL (SMP) E DO SERVIÇO DE VALOR ADICIONADO (SVA). DISPAROS MASSIVOS DE SMS - A2P. OBSERVÂNCIA PELAS PRESTADORAS DO SMP DO DISPOSTO NO ART. 3º DA LEI GERAL DE TELECOMUNICAÇÕES (LGT) ACERCA DA NECESSÁRIA PUBLICIDADE DE TARIFAS E PREÇOS PRATICADOS NO MERCADO. NECESSIDADE DE ACOMPANHAMENTO DO MERCADO PELA AGÊNCIA. INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO DE ACOMPANHAMENTO E CONTROLE (PAC) PARA ACOMPANHAMENTO DO CUMPRIMENTO DA DECISÃO. RECURSOS CONHECIDOS E NÃO PROVIDOS. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA.

1. A Anatel tem o poder-dever de dirimir conflitos envolvendo prestadoras de serviços de telecomunicações, bem como competência para intervir no relacionamento que envolva o acesso a redes de telecomunicações por prestadores de SVA.

2. Aplicabilidade do art. 3º, parágrafo único, da LGT às contratações de serviços de telecomunicações no varejo e no atacado.

3. A suposta inexistência de um risco efetivo ao mercado não afasta o fato de que a integradora figura como usuária do serviço de telecomunicações e faz jus ao direito à informação adequada, necessária e suficiente sobre as condições de prestação do serviço, suas tarifas e preços.

4. Necessidade de acompanhamento mais detido e vigilante do mercado de SMS A2P, que poderá ser contemplado na revisão do Plano Geral de Metas de Competição - PGMC.

5. Determinar a instauração de Processo de Acompanhamento e Controle (PAC), com o propósito de acompanhar e verificar o cumprimento da decisão consubstanciada no Despacho recorrido.

6. Recursos conhecidos e não providos. Pela manutenção da decisão recorrida. Determinações adicionais.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os membros do Conselho Diretor da Anatel, por unanimidade, nos termos da Análise nº 134/2021/EC (SEI nº 7535289), integrante deste acórdão:

a) conhecer dos Recursos interpostos para, no mérito, negar-lhes provimento; e,

b) não conhecer das petições SEI nº 7564530 e SEI nº 7567016, nos termos da Súmula nº 21, de 10 de outubro de 2017.

Participaram da deliberação o Presidente Leonardo Euler de Morais e os Conselheiros Carlos Manuel Baigorri, Emmanoel Campelo de Souza Pereira, Moisés Queiroz Moreira e Vicente Bandeira de Aquino Neto."

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"ACÓRDÃO Nº 402, DE 06 DE DEZEMBRO DE 2021

Processo nº 53500.036283/2020-13

Recorrente/Interessado: TIM S.A., ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A.

CNPJ nº 02.421.421/0001-11 e nº 14.096.190/0001-05

Conselheiro Relator: Moisés Queiroz Moreira

Fórum Deliberativo: Reunião nº 907, de 25 de novembro de 2021

EMENTA

RECLAMAÇÃO ADMINISTRATIVA. SUPERINTENDÊNCIA DE COMPETIÇÃO. RECURSOS ADMINISTRATIVOS. CONHECIMENTO. NÃO PROVIMENTO. OUTRAS PROVIDÊNCIAS.

1. Recurso Administrativo interposto por TIM S.A. em face do Despacho Decisório nº 67/2021/CPRP/SCP.

2. Presença dos requisitos para sua admissibilidade. Conhecimento.

3. A ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A., enquanto prestadora de Serviço de Valor Adicionado (SVA), figura na condição de usuária, sendo titular dos direitos associados a tal condição. Inteligência do art. 61, § 1º, da Lei Geral de Telecomunicações (LGT).

4. Presença de indícios de abuso de poder econômico no provimento do serviço. Monopólio da terminação por prestadoras do Serviço Móvel Pessoal (SMP). Ausência de interoperabilidade entre as redes móveis no provimento do serviço.

5. A medida adotada em primeira instância conferiu baliza justa e suficiente para a solução do conflito, adotando abordagem responsiva voltada à adequação da conduta e restauração do direito à plena informação. Possibilidade.

6. A Anatel tem o poder-dever de dirimir conflitos envolvendo prestadoras de serviços de telecomunicações, bem como competência para intervir no relacionamento que envolva o acesso a redes de telecomunicações por prestadores de SVA. Não provimento.

7. Recurso Administrativo interposto por ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A. em face do Despacho Decisório nº 67/2021/CPRP/SCP.

8. Preenchimento dos requisitos para sua admissibilidade. Conhecimento.

9. As medidas pleiteadas pela Reclamante extrapolam os contornos do procedimento de Reclamação Administrativa, voltado exclusivamente à solução do conflito. Impossibilidade. Não provimento.

10. Recurso Administrativo interposto pela TIM em face do Despacho Decisório nº 101/2021/CPRP/SCP, que indeferiu seu pedido de restringir o acesso aos documentos instrutórios que fundamentaram a prolação do Despacho Decisório nº 67/2021/CPRP/SCP.

11. Preenchimento dos requisitos para sua admissibilidade. Conhecimento.

12. As informações para cujo acesso por terceiros a TIM pleiteia restrição devem ser públicas por força do Despacho Decisório nº 67/2021/CPRP/SCP, que, por sua vez, buscou restaurar à Reclamante o direito à plena informação, previsto no art. 3º, inciso IV e parágrafo único, da LGT. Não provimento.

13. Determinação à Superintendência de Competição para que inclua o mercado de disparo massivo de SMS A2P na próxima rodada de estudos pertinentes à reavaliação dos mercados relevantes do Plano Geral de Metas de Competição.

14. Determinação à Superintendência de Controle de Obrigações para que instaure Procedimento de Acompanhamento e Controle (PAC) para acompanhar e verificar o cumprimento do Despacho Decisório nº 67/2021/CPRP/SCP.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os membros do Conselho Diretor da Anatel, por unanimidade, nos termos da Análise nº 104/2021/MM (SEI nº 7332581), integrante deste acórdão:

a) conhecer dos Recursos Administrativos interpostos por TIM e por ZENVIA para, no mérito, negar-lhes provimento, mantendo-se o Despacho Decisório nº 67/2021/CPRP/SCP (SEI nº 6727378), de 1º de abril de 2021, e o Despacho Decisório nº 101/2021/CPRP/SCP (SEI nº 6888070), de 19 de maio de 2021; e,

b) receber a Petição de SEI nº 7313799, apresentada pela TIM, com base no exercício do direito de petição assegurado pelo art. 5º, inciso XXXIV, "a", da Constituição Federal, e indeferir os pedidos nela constantes, tendo em vista que referidas informações não alteram o racional da decisão adotada e cujo teor propõe-se manter integralmente.

Participaram da deliberação o Presidente Substituto Raphael Garcia de Souza e os Conselheiros Carlos Manuel Baigorri, Emmanoel Campelo de Souza Pereira, Moisés Queiroz Moreira e Vicente Bandeira de Aquino Neto."

(Grifado adrede)

Observa-se que o Conselho Diretor da Anatel, para além de referendar à unanimidade as decisões expedidas pela SCP, endossando as conclusões encontradas após análise dos processos (listadas no item 5.18 supra), determinou que a Área Técnica promovesse o estudo do mercado de disparo massivo de SMS A2P quando da reavaliação do Plano Geral de Metas de Competição (PGMC), bem como o acompanhamento quanto à consecução das determinações dos Acórdãos.

Quanto ao último ponto, destaco ter sido o Relator do Recurso Administrativo interposto pela Zenvia contra decisão da Superintendência de Controle de Obrigações (SCO) proferida no âmbito do Processo de Acompanhamento das determinações contidas no Acórdão nº 402, de 6 de dezembro de 2021 (SEI nº 7770220). Naquela ocasião, este Colegiado acatou unanimemente minha proposta de (i) conhecer e negar provimento ao Recurso Administrativo e (ii) determinar à Tim que aprimorasse a ferramenta de busca de seu sítio eletrônico de modo que, ao pesquisar pelo termo "A2P" ou "SMS A2P", o buscador passasse a direcionar o usuário diretamente à página que contém tais informações, deixando de direcioná-lo a páginas intermediárias (Acórdão nº 82, de 19 de abril de 2023 - SEI nº 10125192). 

Já o Processo de Acompanhamento referente à Telefônica foi arquivado sem remessa ao Conselho Diretor uma vez que, reconhecido o integral cumprimento às determinações do Acórdão nº 369, de 4 de novembro de 2021 (SEI nº 7625988), não houve interposição de Recurso Administrativo.

No que tange à avaliação do mercado de disparo massivo de SMS A2P a ser realizado no âmbito do PGMC, verifica-se que o Corpo Técnico da Agência de fato promoveu estudo refletido na Análise de Impacto Regulatório SEI nº 9114920 (Tema 11: Mercado de SMS (Short Message Service) Corporativo) e não identificou, por ora, falhas de mercado que justifiquem uma intervenção regulatória ex ante por parte da Anatel, tendo concluído, portanto, pela ausência, neste momento, de condições mercadológicas passíveis de regulação assimétrica: 

Além disso, tive a honra de relatar o processo que promoveu a Consulta Pública do PGMC e, nos termos do que a Área Técnica apontou na AIR, também concluí que não foram constatadas falhas de mercado significativas no Mercado de SMS Corporativo. É o que se depreende do seguinte excerto de minha Análise nº 114/2023/VA (SEI nº 10674872): 

"5.370. Da aplicação do Teste dos Três Critérios, concluiu-se na AIR (SEI nº 9114920) que o mercado de SMS não atenderia, cumulativamente, às três condições requeridas para ser objeto de regulação assimétrica ex ante no âmbito do PGMC:

a) presença de barreiras à entrada estruturais elevadas e não transitórias: esse seria o único critério atendido, tendo sido evidenciada a existência de barreiras à entrada com tais características no segmento do SMP que fornece SMS Corporativo;

b) manutenção do risco de exercício de poder de mercado em horizonte de tempo não desprezível: não há tal risco, considerando a quantidade e a diversidade de substitutos disponíveis no mercado; e

c) insuficiência da legislação de concorrência e da regulamentação disponível para redução da probabilidade de exercício de poder de mercado: não há na AIR evidências de que as disposições legais e regulamentares atuais não seriam suficientes para evitar tal eventualidade.

5.371. Tendo em vista que, do ponto de vista regulatório, não foram identificadas falhas de mercado significativas no Mercado de SMS Corporativo, não há necessidade de se estabelecerem medidas assimétricas ex ante."

(Grifado adrede)

Feita a presente e necessária contextualização acerca da matéria em debate, passo ao exame das questões de fundo dos Recursos Administrativos interpostos pela Zenvia e pela Algar em desfavor do Despacho Decisório nº 217/2022/CPRP/SCP (SEI nº 9479852), cuja reprodução faço abaixo para uma melhor compreensão de seus termos:

"O SUPERINTENDENTE DE COMPETIÇÃO DA AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES - ANATEL, no uso de suas atribuições legais, regulamentares e regimentais, bem como com fundamento no art. 159 do Regimento Interno da Anatel, aprovado pela Resolução nº 612, de 29 de abril de 2013, examinando os autos da Reclamação Administrativa em epígrafe, apresentada por ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A., CNPJ nº 14.096.190/0001-05, em face de ALGAR TELECOM S.A., inscrita no CNPJ/MF sob o nº 71.208.51/0001-74; e

CONSIDERANDO as razões e fundamentos constantes do Informe nº 277/2021/CPRP/SCP (SEI nº 7668106); do Parecer nº 00430/2022/PFE-ANATEL/PGF/AGU, aprovado parcialmente pelo Despacho nº 03009/2022/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI nº 9461144); e do Informe nº 219/2022/CPRP/SCP (SEI nº 9473421)

DECIDE:

I - DEFINIR que, para o caso concreto, a atualização dos valores devidos pela gestão e disponibilização pela ALGAR TELECOM S.A. de sistemas de encaminhamento de SMS A2P à ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A. se limite à variação acumulada pelo Índice de Serviços de Telecomunicações (IST), desde a entrada em vigor da Lei nº 13.673, de 05 de junho de 2018, que introduziu mudança no parágrafo único do art. 3º da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, a Lei Geral de Telecomunicações (LGT).

II - DETERMINAR que, na repactuação dos valores devidos pela gestão e disponibilização pela ALGAR TELECOM S.A. de sistemas de encaminhamento de SMS A2P à ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A., seja observado o valor definido no item I, com a manutenção da faixa de volume inicialmente contratada.

III - ESTABELECER que, no exercício do item II, seja considerado como início de vigência dos valores a data de 28 de julho de 2021, até que a ALGAR TELECOM S.A. exerça o previsto no artigo 3º, parágrafo único, da LGT, incluído pela Lei nº 13.673, de 05 de junho de 2018, momento em que deverá ser repactuada a relação considerando os termos publicizados.

IV - DETERMINAR que a ALGAR TELECOM S.A. não exija, sob nenhum pretexto, formalização de instrumento contratual entre a ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A. e terceiros, obstaculizando o acesso aos sistemas de encaminhamento de SMS A2P.

V - DETERMINAR que se instaure processo para acompanhamento da implementação pela ALGAR TELECOM S.A. do disposto no artigo 3º, parágrafo único, da LGT, incluído pela Lei nº 13.673, de 05 de junho de 2018.

VI - ATRIBUIR ACESSO RESTRITO​ aos documentos protocolizados no SEI sob os números: 7293279; 7293282; 7293283; 7293290; 7293293; 7400409;7400410; 7400411; 7400412; 7400414; 7400415; 7400416; e 9353395, com concessão de vista/cópia apenas para a ZENVIA MOBILE SERVIÇOS DIGITAIS S.A. e para a ALGAR TELECOM S.A.

VII - NÃO ATRIBUIR ACESSO RESTRITO aos documentos protocolizados no SEI sob os números: 7293280; 7293281; 7293284; 7293285; 7293286; 7293287; 7293288; 7293289; 7293294; 7293295; 7323671; 7339894; 7339895; 7339896; 7535297; 7535298; 7619276; 7682638; 8060957; 8060958; 8060959; 8060960; 8062372; 9228510; 9228511; 9228512; 9280843; 9353391; 9353392; e 9353396.

VIII - ARQUIVAR o presente processo, com fundamento no art. 53 do Regimento Interno da Anatel, aprovado pela Resolução nº 612, de 29 de abril de 2013, uma vez exaurida sua finalidade.

IX - NOTIFICAR as partes do inteiro teor desta decisão." 

(Grifos no original)

Como mencionei em linhas pretéritas, há insurgências de parte a parte em face do decisum prolatado pelo Superintendente de Competição. Passo, neste átimo, a examiná-las.

III.2 - Do Recurso Administrativo interposto pela Zenvia e das Contrarrazões da Algar

III.2.1 - Sobre a diferenciação quanto à origem das mensagens

A primeira questão aduzida pela Zenvia em seu Recurso Administrativo foi a ausência de manifestação da Anatel no que tange ao tratamento diferenciado que a Algar pretende promover quanto à origem das mensagens, distinguindo-as entre "marcas globais" e "clientes nacionais". Em sua peça recursal, a Recorrente defendeu que o Informe nº 277/2021/CPRP/SCP (SEI nº 7668106) permitiu tal diferenciação e que, ao acolher referido informe e ao se silenciar sobre o pedido da ZENVIA, a Agência tacitamente "o rejeitou (muito embora não tenha emitido decisão expressa a respeito, conforme estabelece e determina o art. 48 da Lei 9.784/99)". Assim, estaria se insurgindo contra essa decisão tácita que autorizou o tratamento distinto a partir do cliente originador da mensagem.

A Algar, por sua vez, rebateu as alegações ventiladas pela Zenvia acentuando que seu novo modelo de negócios SMS A2P "assegura um incremento da segurança das comunicações que beneficiará todos os usuários atendidos por sua rede, com especial vantagem devido ao fato de os custos de sua implementação não serem transferidos aos usuários finais". Destacou, ainda, que não impunha qualquer discriminação e que tratava de maneira absolutamente equânime a todos que buscam com ela contratar, tanto é que seu "novo modelo de negócios não é direcionado nem se aplica apenas à Zenvia".

De proêmio, em meu entender, não houve decisão tácita da Anatel quanto ao tema aqui discutido. O Informe nº 277/2021/CPRP/SCP (SEI nº 7668106), que fundamentou o Despacho Decisório nº 217/2022/CPRP/SCP (SEI nº 9479852) ora rechaçado, consignou não vislumbrar potencial discriminação quanto às condições de acesso e fruição do serviço e que, em havendo diferenciação nos insumos necessários para atendimento das "marcas globais", os valores deverão ser discriminados conforme serviço prestado.

O § 1º do art. 50 da Lei nº 9.874/1999 (Lei de Processo Administrativo - LPA) prevê que a motivação do ato administrativo pode compreender os fundamentos de pareceres, informações, decisões ou propostas que, nesses casos, passarão a integrar ato:

"Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:

I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;

II - imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;

III - decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;

IV - dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório;

V - decidam recursos administrativos;

VI - decorram de reexame de ofício;

VII - deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais;

VIII - importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo.

§ 1º A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato."

(Destaquei)

O Despacho recorrido adotou o Informe nº 277/2021/CPRP/SCP (SEI nº 7668106) como seu fundamento, conforme se observa da sua transcrição no item 5.24 supra. Assim, entendo que a Agência exarou decisão acerca da matéria aqui em debate no sentido de ser possível haver um tratamento diferenciado no que se refere à origem dos SMS. E, por força desse posicionamento, a Zenvia interpôs seu Recurso Administrativo pleiteando a manifestação deste Colegiado. Passo a tratar, abaixo, sobre tal entendimento.

Pois bem. Inicio minha exposição trazendo à lume o resumo dos direcionamentos que a Algar formulou à Zenvia no intuito de manter/renovar o contrato (SEI nº 7293282) para serviço de broadcast consistente na remessa, por ela e via sistema de transmissão e recepção de mensagens curtas, de informações fornecidas pela Zenvia para um grupo de celulares: (i) a necessária entabulação de contrato entre a Zenvia e a Infobip/Comfone, empresa que intermediaria a relação entre a Zenvia e a Algar para fins de implementação de solução de segurança da rede; e (ii) a remuneração da empresa intermediária se daria por meio do tráfego oriundo das marcas globais listadas pela Algar e seria indexada em euro ou dólar.

Num segundo momento, com o embate já estabelecido entre as partes, a Algar comunicou à Zenvia um reajuste unilateral na tabela de preços praticados entre as partes. Segundo a Zenvia, a indexação em euro ou dólar para o tráfego de SMS das marcas globais, no intuito de remunerar a empresa intermediária, configuraria aumento entre 669,42% (seiscentos e sessenta e nove vírgula quarenta e dois por cento) e 680% (seiscentos e oitenta por cento). Já o reajuste na tabela de preços praticados entre as partes implicaria incremento de 35,61% (trinta e cinco reais vírgula sessenta e um por cento), aumento esse superior à variação do IST, índice utilizado pela Anatel nos demais processos da Zenvia e anteriores a este.

Instado a se manifestar por meio desta Reclamação Administrativa, o Corpo Técnico da Anatel, após a oitiva da Algar em um amplo exercício do contraditório e da ampla defesa, assentou, em resumo, que: (i) a Algar estaria impedida de exigir que a Zenvia firmasse qualquer tipo de contrato com outras empresas para fins de manutenção/renovação do contrato de broadcast existente entre as partes; (ii) os reajustes pretendidos pela Algar seriam limitados à recomposição financeira acumulada desde a entrada em vigor da Lei nº 13.673/2018, sendo que o índice para a atualização dos valores seria o IST; e (iii) havia possibilidade de tratamento diferenciado das mensagens SMS a partir de sua origem, desde que os preços fossem devidamente discriminados conforme o serviço prestado. É o que se depreende dos trechos do Informe nº 277/2021/CPRP/SCP (SEI nº 7668106) abaixo, que reproduzo para melhor elucidação da matéria:

"4.120. Como já esclarecido anteriormente, a RECLAMANTE é usuária de serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, no caso, o envio de mensagens curtas (SMS). Muito embora a RECLAMANTE seja contratante de um volume muito substantivo de disparo de mensagens, isso não afasta a compreensão regulatória do SMS e a condição de usuária conferida por lei à RECLAMANTE.

4.121. Além disso, tem-se que a relação entre as partes foi estabelecida em momento anterior à vigência da Lei nº 13.673, de 2018, que se frise, incluiu o parágrafo único do art. 3º da LGT, determinando que a prestadora de serviço deverá divulgar em seu sítio eletrônico, de forma clara e de fácil compreensão pelos usuários, os valores das tarifas e preços praticados, além da evolução dos reajustes.

4.122. Com efeito, não se pode tomar por letra vazia um importante comando legal em pleno vigor, mas sim, deve-se conferir forma e aplicação prática à vontade do Legislador, a qual expressa inequívoca preocupação com a transparência, uma das importantes alavancas defensoras da competição. Veja-se[19]:

Entra em vigor lei da divulgação detalhada de tarifas de serviços públicos na internet

Agência Senado

As concessionárias de serviços de gás, água, telefonia e energia elétrica terão que divulgar na internet, de forma clara e de fácil compreensão, o valor das tarifas e a evolução dos preços ao longo dos últimos cinco anos. É o que estabelece a Lei 13.673/2018, que foi publicada no Diário Oficial da União e já entrou em vigor nesta quarta-feira (6).

4.123. Durante esse período de não divulgação dos preços praticados e da evolução dos reajustes realizados pela RECLAMADA, consoante o previsto no parágrafo único do art. 3º da LGT, a RECLAMANTE viu-se vulnerada e alijada desse valioso instrumento de publicidade das condições, o qual lhe foi conferido pelo Legislador. A publicidade permitiria equalizar as forças negociais e aproximar o distinto poder de barganha entre as partes.

4.124. Reconhecendo o poder-dever da ANATEL de dirimir conflitos, ponderando o direito legal à informação plena e previsível de preços conferida à RECLAMANTE (enquanto usuária dos serviços de telecomunicações), sopesando os riscos de irreversibilidade de uma condição de dominância da RECLAMADA, entende-se prudente e adequado limitar o reajuste pretendido pela RECLAMADA à recomposição financeira acumulada desde a entrada em vigor da Lei nº 13.673, de 2018, desde quando foi tolhido o direito que assiste à RECLAMANTE.

4.125. Diante do conflito quanto ao índice a ser adotado, propõe-se a adoção do Índice de Serviços de Telecomunicações (IST), uma métrica composta por outros índices consagrados na economia brasileira e selecionados por trabalho conjunto entre a Anatel e a Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Portanto, entende-se que o IST é aquele mais representativo da atualização de valores intrínsecos à indústria de telecomunicações.

4.126. Em suma, diante das evidências colhidas nos autos, contrastadas por um abrangente benchmark internacional e em face da possibilidade de existência de poder de mercado da RECLAMADA, o qual somente poderá ser atestado em definitivo por meio de estudo profundo decorrente da revisão ordinária do PGMC, tem-se que a submissão dos valores à atualização acumulada pelo IST é baliza regulatória justa e razoável capaz de prevenir efeitos mercadológicos deletérios e potencialmente irreversíveis, a exemplo da elevação não contestável de preços, pelo período em que a ALGAR não exercer o disposto no parágrafo único do art. 3º da LGT.

4.127. Diante de todo o exposto, justifica-se proposição de que a ALGAR exerça o previsto no artigo 3º, parágrafo único, da LGT, incluído pela Lei nº 13.673, de 05 de junho de 2018, sendo que os valores a serem publicizados devem, obviamente, englobar os custos relativos a eventuais sistemas e ferramentas de segurança, assim como quaisquer outros insumos relacionados à prestação do serviço. Nesse ponto, existindo diferenciação nos insumos do que se necessita para atendimento do que foi denominado "marcas globais", os valores devem ser discriminados conforme serviço prestado.

(...)

4.129. Inicialmente, cumpre pontuar que a imposição da figura do intermediário não representa, per se, atentado ao rol de direitos do usuário de serviços de telecomunicações acima discriminado.

4.130. A existência do intermediário não implica negação de acesso aos serviços de telecomunicações, visto que a ZENVIA continuará a ter acesso a toda sua atual cartela de clientes diretos, sendo que apenas as condições comerciais entre os perfis de clientes diretos serão diferenciadas.

4.131. Também não se vislumbra potencial discriminação quanto às condições de acesso e fruição do serviço, uma vez que, a ALGAR evidenciou em diversos momentos da instrução processual o fato de que a política negocial consistente na alocação da figura do intermediário se deu por motivos internos de segurança e estará presente no âmbito de todos seus relacionamentos, que abarquem as denominadas "marcas globais".

4.132. Entretanto, cabe um parênteses quanto ao direito do usuário à liberdade de escolha de sua prestadora de serviço.

(...)

4.134. Considerando o direito do usuário à liberdade de escolha da prestadora de serviço, cabe deixar registrado que, ainda que o arranjo pretendido pela ALGAR prospere, qualquer imposição de formalização de contrato com terceiro para vinculação de acesso à serviço deve ser combatida.

4.135. Neste sentido, caberá a ALGAR a composição de termos com o intermediário, no presente caso a COMFONE/INFOBIP, a fim de que se viabilize o modelo de negócio pretendido, inclusive com o incremento do serviço de segurança, entretanto, a ZENVIA não poderá ser compelida a formalizar instrumento contratual com um terceiro para que tenha acesso aos clientes da ALGAR, sejam eles clientes nacionais ou "marcas globais". Devendo ser o bastante a manutenção de relacionamento contratual apenas com a própria ALGAR."

(Negritos no original e sublinhados por mim)

A insurgência recursal da Zenvia, como eu disse anteriormente, reside no fato de ter a SCP permitido a diferenciação do tráfego de SMS entre marcas globais e marcas nacionais. Verifico, no entanto, que tal aquiescência se deu impondo limitação que visou assegurar a isonomia entre os stakeholders por meio da transparência e publicidade das informações relativas ao serviço. Explico.

A autorização para o tratamento distinto entre marcas globais e marcas nacionais teve como base o princípio constitucional da livre iniciativa e todos os elementos que lhe dão conteúdo, em especial a liberdade de empresa, a livre concorrência e a liberdade de contratar, segundo lucidamente leciona o Ministro e atual Presidente do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso (2001) em artigo publicado na Revista de Direito Administrativo1, verbis:

"O princípio da livre iniciativa, por sua vez, pode ser decomposto em alguns elementos que lhe dão conteúdo, todos eles desdobrados no texto constitucional. Pressupõe ele, em primeiro lugar, a existência de propriedade privada, isto é, de apropriação particular dos bens e dos meios de produção (CF, arts. 5°, XXII e 170, II). De parte isto, integra, igualmente, o núcleo da ideia de livre iniciativa a liberdade de empresa, conceito materializado no parágrafo único do art. 170, que assegura a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização, salvo nos casos previstos em lei. Em terceiro lugar situa-se a livre concorrência, lastro para a faculdade de o empreendedor estabelecer os seus preços, que hão de ser determinados pelo mercado, em ambiente competitivo (CF, art. 170, IV). Por fim, é da essência do regime de livre iniciativa a liberdade de contratar, decorrência lógica do princípio da legalidade, fundamento das demais liberdades, pelo qual ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (CF, art. 5°, II)."

(Grifei)

O Estado brasileiro tem como pilar de sua estrutura econômica a livre iniciativa e seus respectivos corolários, conforme indicado no trecho supratranscrito. A Constituição Federal de 1988 impôs o predomínio da iniciativa privada, permitindo a criação de um cenário de competição, essencial para a formação de uma estratégia empresarial eficiente.

A Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019, denominada "Lei da Liberdade Econômica", atenta aos fundamentos constitucionais que impuseram o predomínio da iniciativa privada e da livre concorrência, determinou que a interferência da Administração Pública nas atividades econômicas seria subsidiária e excepcional:

Art. 1º Fica instituída a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, que estabelece normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica e disposições sobre a atuação do Estado como agente normativo e regulador, nos termos do inciso IV do caput do art. 1º, do parágrafo único do art. 170 e do caput do art. 174 da Constituição Federal.

(...)

Art. 2º São princípios que norteiam o disposto nesta Lei:

(...)

III - a intervenção subsidiária e excepcional do Estado sobre o exercício de atividades econômicas; e

(...)

Logo, nota-se que a atividade econômica é própria do mercado e, apenas em situações específicas e extraordinárias, poderá sofrer a ingerência estatal.

Ressalto, todavia, que essa excepcionalidade deve se dar por meio da ponderação entre o princípio da livre iniciativa (e seus consectários acima mencionados) com os outros valores e objetivos igualmente previstos na Constituição. Isso porque que não há princípio que seja absoluto, razão pela qual deve se submeter à atividade reguladora e fiscalizadora do Estado, cujo fundamento é a efetivação das normas constitucionais destinadas a neutralizar ou reduzir as distorções que possam advir do abuso da liberdade de iniciativa e aprimorar-lhe as condições de funcionamento2.

É inquestionável, assim, que sejam os particulares os protagonistas da ordem econômica brasileira. Eles possuem o direito subjetivo à liberdade de empresa e de contratar, à livre concorrência e à busca do lucro. Mas têm o dever jurídico de obedecerem aos princípios de funcionamento da atividade econômica e ao disciplinamento relativo ao setor, sob pena de se sujeitarem à repreensão e à eventual punição por parte da Administração Pública.

In casu, percebo com nitidez que o Corpo Técnico da Agência, diante do impasse entre a Zenvia e a Algar e conhecedor de seu papel enquanto Estado em um setor que possui o mercado extremamente dinâmico e disruptivo, buscou equilibrar sua ação emitindo uma decisão que, ao mesmo tempo em que respeitou os princípios e fundamentos da ordem econômica moldados pela Constituição Federal, agiu com razoabilidade no intuito de remediar os desvirtuamentos que lhes foram apresentados. Trago, mais uma vez, os notáveis ensinamentos do Ministro Barroso3 acerca dessa crucial ponderação que deve ser feita nos casos de uma necessária intervenção estatal no mercado:

"À luz da Constituição brasileira, a ordem econômica funda-se, essencialmente, na atuação espontânea do mercado. O Estado pode, evidentemente, intervir para implementar políticas públicas, corrigir distorções e, sobretudo, para assegurar a própria livre iniciativa e promover seu aprimoramento. Este é o fundamento e o limite de sua intervenção legítima. A característica da disciplina está, exatamente, em que ela não pretende nem pode pretender substituir o mercado em seu papel central do sistema econômico.

(Destaquei)

Nessa medida, constato que o assentimento da SCP quanto à discriminação das mensagens SMS entre marcas globais e marcas nacionais se deu com o objetivo de atender à premissa de não intervir - ou intervir minimamente - no modelo de negócios das prestadoras de telecomunicações. Permitiu-se a diferenciação das mensagens SMS quanto à sua origem buscando preservar o modelo idealizado pela Algar que prestigia a segurança das redes, algo de extrema relevância hodiernamente, mas apontou a necessidade de a Algar publicizar os preços de seus serviços, buscando garantia ao direito à transparência e à previsibilidade a todos os usuários. Os Informes nº 277/2021/CPRP/SCP (SEI nº 7668106e nº 28/2023/CPRP/SCP (SEI nº 9813205) apontam nessa direção:

Informe nº 277/2021/CPRP/SCP (SEI nº 7668106

4.137. Neste sentido, são louváveis as buscas por aprimoramento das medidas de segurança relacionadas às redes de telecomunicações e as implementações de ferramentas de segurança como a pretendida pela ALGAR. Entretanto, como quaisquer outros insumos relacionados à prestação dos serviços, eles devem compor os custos, sem imputar ao usuário a necessidade de contratação com terceiros.

-------------------------------------------------------------------------------------------------------

Informe nº 28/2023/CPRP/SCP (SEI nº 9813205)

3.58.6. Dessa forma, qualquer incremento de valores, seja por motivos de segurança ou por quaisquer outras razões vinculadas a insumos relacionados à prestação do serviço, estarão englobadas nos preços publicizados, buscando garantia ao direito à transparência e à previsibilidade a todos os usuários dos serviços de telecomunicações.

(Grifei)

É essa transparência, aliada às demais determinações relativas à publicização dos preços aplicados, à utilização do IST como índice de reajuste e à vedação de formalização de contrato entre a Zenvia e a empresa intermediária, que fazem com que o Despacho ora combatido tenha resguardado a impessoalidade e a generalidade, atributos que devem permear os serviços públicos, beneficiando aos usuários como um todo.

A Zenvia alegou a impossibilidade técnica de ser distinguir as mensagens em função da proveniência, por não haver qualquer diferença do ponto de vista técnico entre as mensagens de marcas globais e as nacionais. Percebo que, de fato, não haverá qualquer discriminação técnica quanto à origem das mensagens, porque todas serão originadas da Zenvia. A distinção de tratamento será meramente contratual, pois, caso uma determinada mensagem seja emitida por algum cliente da Zenvia que esteja na lista de marca global, a remuneração será distinta de um cliente tido como marca nacional. E isso valerá para qualquer outra empresa integradora que possua contrato de broadcast com a Algar, não apenas à Zenvia.

Destaco, por oportuno, que o que mereceria reprimenda por parte desta Agência seria o fato de a Algar exigir a separação das mensagens quanto à fonte apenas da Zenvia, promovendo tratamento diferenciado somente dessa empresa e não das demais integradoras com as quais eventualmente possuísse contrato.

Por todo o exposto, concordo com o consentimento dado pela SCP à eventual distinção do tráfego de SMS a partir da origem das mensagens, por entender que tal ação constitui reflexo da liberdade de empresa que a Algar possui em montar o modelo de negócio que lhe aprouver. Concordo, igualmente, com a condição imposta no sentido de que, em optando a Algar pelo modelo de negócio que promova a separação das mensagens entre marcas globais e marcas não globais, os preços por seus serviços sejam publicizados e transparentes. Isso porque, ao fazer essa discriminação e publicização dos preços aplicáveis às marcas globais e marcas nacionais de modo detalhado, toda e qualquer empresa integradora que pretender firmar contrato para serviço de broadcast com a Algar será submetida às mesmas condições, garantindo, dessa forma, a isonomia entre os stakeholders desse mercado.

Nessa esteira, não merece acolhida a alegação recursal debatida neste tópico.

III.2.2 - Sobre a possibilidade de a ferramenta de segurança gerar atrasos na entrega das mensagens

No segundo e último ponto de sua peça recursal, a Zenvia acentuou que, em sendo implementada a solução de segurança, as mensagens enviadas aos usuários finais da Algar poderiam sofrer atrasos, uma vez que passaria a existir uma etapa adicional no processo de entrega.

A Algar, por sua vez, afirmou não haver qualquer evidência de que a solução de segurança tenha como efeito negativo o atraso na entrega de mensagens nas redes de telecomunicações na qual ela está implementada, tratando-se de especulação suscitada sem prova pela Zenvia.

Primeiramente, trago o entendimento da SCP que, por meio do Informe nº 28/2023/CPRP/SCP (SEI nº 9813205), esclareceu que a Administração Pública não restringirá formulações negociais dos entes regulados com base em possíveis efeitos não comprovados:

Informe nº 28/2023/CPRP/SCP (SEI nº 9813205)

"3.59.2 A implementação de sistemas de segurança ou de qualquer outro insumo que esteja atrelado à liberdade de formulação negocial por parte da prestadora de serviços não poderá ser restringida pela Administração Pública sob argumentações de possíveis efeitos não comprovados.

3.59.3 Ademais, tratamento dispensado a falhas e a atrasos na prestação dos serviços pode e deve ser objeto de tratativas e discriminação no corpo das cláusulas contratuais, figurando nas obrigações das partes, nas sanções previstas ou nos níveis de serviço pactuados, por exemplo."

Entendo corretos os argumentos ventilados pelo Setor Técnico no trecho supratranscrito. Observo, ainda, que a Zenvia, ao apresentar tal argumento, não se desincumbiu do ônus da prova que se lhe competia, em dissonância com o previsto no art. 36 da LPA e no art. 85 do RIA, verbis:

LPA

"Art. 36. Cabe ao interessado a prova dos fatos que tenha alegado, sem prejuízo do dever atribuído ao órgão competente para a instrução e do disposto no art. 37 desta Lei."

-------------------------------------------------------------------------------------------------------

RIA

"Art. 85. Cabe ao interessado a prova dos fatos que tenha alegado, sem prejuízo do dever atribuído ao órgão competente para a instrução."

O Conselho Diretor da Agência ratifica tal entendimento, conforme deliberações reproduzidas abaixo:

"ACÓRDÃO Nº 298, DE 08 DE SETEMBRO DE 2022

Processo nº 53500.032791/2018-08

Recorrente/Interessado: RCA COMPANY DE TELECOMUNICAÇÕES S.A.

CNPJ/MF nº 03.052.751/0001-40

Conselheiro Relator: Vicente Bandeira de Aquino Neto

Fórum Deliberativo: Reunião nº 915, de 1º de setembro de 2022

EMENTA

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO PARA APURAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES (PADO). INFRAÇÕES A DISPOSITIVOS DO PLANO GERAL DE METAS DE QUALIDADE PARA OS SERVIÇOS DE TELEVISÃO POR ASSINATURA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. OCORRÊNCIA. ÔNUS DA PROVA. INCUMBÊNCIA DA RECORRENTE. METODOLOGIA ADEQUADA. RECEITA OPERACIONAL LÍQUIDA (ROL). DEFINIÇÃO. IDENTIFICAÇÃO DE REINCIDÊNCIA ESPECÍFICA. IMPOSSIBILIDADE DE MANUTENÇÃO DA PENA DE ADVERTÊNCIA. REFORMATIO IN PEJUS. POSSIBILIDADE. RECURSO ADMINISTRATIVO CONHECIDO E PROVIDO PARCIALMENTE.

1. Recurso Administrativo interposto em face de decisão que aplicou advertência em razão de descumprimentos do Plano Geral de Metas de Qualidade para os Serviços de Televisão por Assinatura (PGMQ - TV), aprovado pela Resolução nº 411, de 14 de julho de 2005.

(...)

3. Cabe à Recorrente o ônus da prova dos fatos que alega, nos termos do disposto no art. 85 do Regimento Interno da Anatel (RIA), aprovado pela Resolução nº 612, de 29 de abril de 2013, e do art. 36 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999 (Lei de Processo Administrativo - LPA).

(...)

8. Recurso Administrativo conhecido e parcialmente provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os membros do Conselho Diretor da Anatel, por unanimidade, nos termos da Análise nº 86/2022/VA (SEI nº 8787532), integrante deste acórdão:

(...)

Participaram da deliberação o Presidente Carlos Manuel Baigorri e os Conselheiros Artur Coimbra de Oliveira, Emmanoel Campelo de Souza Pereira, Moisés Queiroz Moreira e Vicente Bandeira de Aquino Neto."

---------------------------------------------------------------------------------------------------

"ACÓRDÃO Nº 680, DE 04 DE DEZEMBRO DE 2018

Processo nº 53557.000099/2009-66

Recorrente/Interessado: TELEMAR NORTE LESTE S.A.

CNPJ/MF nº 33.000.118/0004-11

Conselheiro Relator: Otavio Luiz Rodrigues Junior

Fórum Deliberativo: Reunião nº 863, de 29 de novembro de 2018

EMENTA

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO PARA APURAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES (PADO). OFENSA AOS ARTS. 4º, INCISOS I E II, 8º, 9º, PARÁGRAFO ÚNICO, E 12 DO PLANO GERAL DE METAS DE UNIVERSALIZAÇÃO. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. NÃO OCORRÊNCIA. MATERIALIDADE DAS INFRAÇÕES CONFIRMADA. ÔNUS DA PROVA. INCUMBÊNCIA DA RECORRENTE. APLICAÇÃO DE NORMA DE LEGE FERENDA. IMPOSSIBILIDADE. METODOLOGIA ADEQUADA AO RASA. DISCUSSÃO SOBRE NORMAS REGULAMENTARES VIGENTES. FORO INADEQUADO. ESTABELECIMENTO DE VALORES MÍNIMOS PELA AGÊNCIA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. CALL DETAIL RECORD. NECESSIDADE DE APRESENTAÇÃO EM FORMATO BRUTO. ATENUANTE. NECESSIDADE DE SE COMPROVAR O CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS PARA SUA CONCESSÃO. CÁLCULO DE MULTA. RECEITA OPERACIONAL LÍQUIDA - ROL. UTILIZAÇÃO DA MAIS RECENTE DISPONÍVEL. REFORMATIO IN PEJUS. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. Recurso Administrativo interposto em face do Despacho Decisório nº 154/2017/SEI/COUN/SCO, de 11 de dezembro de 2017, que aplicou multa no valor de R$ 1.216.068,19 (um milhão, duzentos e dezesseis mil, sessenta e oito reais e dezenove centavos), por descumprimento dos arts. 4º, incisos I e II, 8º, 9º, parágrafo único, e 12 do Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU II), aprovado pelo Decreto nº 4.769, de 27 de junho de 2003.

(...)

4. Cabe à Recorrente o ônus da prova dos fatos que alega, nos termos do disposto no art. 85 do Regimento Interno da Anatel (RIA), aprovado pela Resolução nº 612, de 29 de abril de 2013, e do art. 36 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999 - Lei de Processo Administrativo (LPA).

(...)

14. Recurso conhecido e não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os membros do Conselho Diretor da Anatel, por unanimidade, nos termos da Análise nº 227/2018/SEI/OR (SEI nº 3419302), integrante deste acórdão:

(...)

Participaram da deliberação o Presidente Leonardo Euler de Morais e os Conselheiros Anibal Diniz, Otavio Luiz Rodrigues Junior e Emmanoel Campelo de Souza Pereira.​"

(Destaquei)

Inexistindo qualquer comprovação quanto ao argumento recursal debatido neste tópico, é de se rejeitá-lo.

Refutados os 2 (dois) pontos apresentados pela Zenvia em seu Recurso Administrativo, concluo pelo seu não provimento. 

III.3 - Do Recurso Administrativo interposto pela Algar e das Contrarrazões da Zenvia

III.3.1 - Sobre o índice de reajuste 

Como visto, a Algar sugeriu em sua peça recursal - e também em sua petição extemporânea SEI nº 11041493 - que o IGP-M deveria ser o índice de reajuste utilizado nos termos do que foi inicialmente acordado entre as empresas, desde a data de assinatura até o término do contrato, inexistindo falta de clareza quanto à sua aplicação ao contrato firmado. Consignou, ainda, que o parágrafo único do art. 3º da LGT não se aplicaria a tal situação, já que ele não visa à proteção de empresas milionárias com alto conhecimento técnico e poder de mercado, que realizam suas negociações no mercado de atacado, como é o caso da Zenvia. Por último, sustentou que a Zenvia não comprovou que a Algar utilizaria índice de reajuste distinto, e mais benéfico, para com qualquer outra empresa contratante de SMS A2P.

A Zenvia sustentou o acerto do Despacho Decisório nº 217/2022/CPRP/SCP (SEI nº 9479852) e a necessidade de utilização do IST para atualização dos valores praticados, porque os preços propostos pela Algar são abusivos e inviabilizam sua atividade econômica.

Como já mencionei ao contextualizar a presente matéria frente aos outros processos apresentados nesta Agência pela Zenvia (itens 5.13 a 5.24), o índice a ser utilizado para o reajuste de preços é um dos temas que coincidem em todas as Reclamações Administrativas propostas. E este Conselho Diretor referendou as decisões da SCP, quanto a esse tema, deduzindo os seguintes pontos:

as operadoras do SMP apresentam-se como controladoras (gate keepers) do monopólio da terminação de SMS corporativo, pois o encaminhamento massivo de SMS corporativo se dá apenas on-net, onde cada prestadora encaminha exclusivamente o tráfego SMS A2P para sua própria base de clientes SMP;

em que pese o fato de a Zenvia não configurar como um consumidor, nos termos do Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RGC), aprovado pela Resolução nº 632/2014, por não ser a destinatária final do serviço SMS, ela é usuária de serviços de telecomunicações, em conformidade com o previsto no § 1º do art. 61 da LGT, e detentora dos direitos enumerados no art. 3º desse mesmo normativo;

a Zenvia, como usuária de serviço de telecomunicação, possui o direito de acesso à necessária e suficiente informação sobre os preços praticados e a evolução dos reajustes realizados nos últimos 5 (cinco) anos, como determinado pelo parágrafo único do art. 3º da LGT, inserido pela Lei nº 13.673/2018;

as informações acerca dos preços praticados e a evolução dos reajustes realizados nos últimos 5 (cinco) anos, nos moldes preconizados pelo parágrafo único do art. 3º da LGT, não foram apresentadas por nenhuma das prestadoras do SMP contra quem a Zenvia propôs Reclamação Administrativa;

nos casos de impasse trazido à Anatel, o reajuste deve ser limitado à recomposição financeira acumulada desde a entrada em vigor da Lei nº 13.673/2018;

o IST deve ser adotado nos casos de impasse quanto ao índice a ser empregado para reajustes, por se tratar de uma métrica composta por outros índices consagrados na economia brasileira e selecionados por trabalho conjunto entre a Anatel e a Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), sendo o mais representativo da atualização de valores intrínsecos à indústria de telecomunicações; e 

a fixação de preço máximo, pela Anatel, com base nos preços dispostos nas Ofertas de Referência de Produto de Atacado (ORPA) de Roaming Nacional não é possível, uma vez que a lógica negocial e as especificidades técnicas e estruturais do mercado de SMS explorado pela Zenvia não coincidem com as daquele mercado, carecendo de razoabilidade a utilização dos mesmos parâmetros para determinação de preços. 

O racional delineado pela Área Técnica tanto naqueles quanto neste processo não carece de reparos. Explico.

Primeiramente, tem-se como irrefutável a constatação da existência de monopólio quanto à terminação de SMS corporativo, fruto da interoperabilidade entre redes de telecomunicações das operadoras do SMP. Essa constatação foi devida e minuciosamente explicada pela SCP neste e dos demais processos propostos pela Zenvia, onde se concluiu, após aprofundado estudo, que o relacionamento entre as partes é essencial para que a RECLAMANTE continue desenvolvendo adequadamente sua atividade econômica, na medida em que unicamente por meio desse relacionamento é que se faz possível o envio de SMS dos Clientes Diretos da RECLAMANTE aos Clientes do SMP desta Prestadora, repisando que a solução técnica de short number não se mostra interoperável.4

Em segundo lugar, e ao revés do que quer fazer crer a Algar, a classificação de uma determinada empresa como usuária dos serviços de telecomunicações não é pautada no fato de ela ser "milionária", ou possuir um "alto conhecimento técnico e poder de mercado", ou mesmo "realizar suas negociações no mercado de atacado". Sendo a Zenvia provedora de Serviço de Valor Adicionado, não restam dúvidas sobre a sua condição de usuária, nos termos do que prevê o § 1º do art. 61 da LGT:

"Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações.

§ 1º Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição."

(Grifei)

Em assim sendo, passo à terceira questão: figurando como usuária do serviço de telecomunicação prestado pela Algar, a Zenvia teria direito de acesso (i) às informações necessárias e suficientes sobre os preços praticados e (ii) à evolução dos reajustes realizados nos últimos 5 (cinco) anos, consoante dicção do inciso IV e do parágrafo único do art. 3º da LGT:

"Art. 3º O usuário de serviços de telecomunicações tem direito:

(...)
IV - à informação adequada sobre as condições de prestação dos serviços, suas tarifas e preços;
(...)

Parágrafo único. Para o cumprimento do disposto no inciso IV do caput deste artigo, a prestadora de serviço deverá divulgar em seu sítio eletrônico, de forma clara e de fácil compreensão pelos usuários, tabela com o valor das tarifas e preços praticados e a evolução dos reajustes realizados nos últimos cinco anos. (Incluído pela Lei nº 13.673, de 2018)"

Restou demonstrado neste e nos demais processos similares que nenhuma das empresas de SMP atendia aos comandos do inciso IV e do parágrafo único do art. 3º da LGT acima transcritos. Desse modo, a SCP entendeu que, a despeito de haver previsão pactuada de aplicação de reajuste pelo IGP-M, seria mais adequado limitar o reajuste à recomposição financeira acumulada desde a entrada em vigor da Lei nº 13.673/2018, que acrescentou o parágrafo único ao art. 3º da LGT. O Informe nº 277/2021/CPRP/SCP (SEI nº 7668106) foi preciso ao justificar tal escolha, razão pela qual peço vênia para reproduzi-lo:

"4.121. Além disso, tem-se que a relação entre as partes foi estabelecida em momento anterior à vigência da Lei nº 13.673, de 2018, que se frise, incluiu o parágrafo único do art. 3º da LGT, determinando que a prestadora de serviço deverá divulgar em seu sítio eletrônico, de forma clara e de fácil compreensão pelos usuários, os valores das tarifas e preços praticados, além da evolução dos reajustes.

4.122. Com efeito, não se pode tomar por letra vazia um importante comando legal em pleno vigor, mas sim, deve-se conferir forma e aplicação prática à vontade do Legislador, a qual expressa inequívoca preocupação com a transparência, uma das importantes alavancas defensoras da competição. Veja-se[19]:

Entra em vigor lei da divulgação detalhada de tarifas de serviços públicos na internet

Agência Senado

As concessionárias de serviços de gás, água, telefonia e energia elétrica terão que divulgar na internet, de forma clara e de fácil compreensão, o valor das tarifas e a evolução dos preços ao longo dos últimos cinco anos. É o que estabelece a Lei 13.673/2018, que foi publicada no Diário Oficial da União e já entrou em vigor nesta quarta-feira (6).

4.123. Durante esse período de não divulgação dos preços praticados e da evolução dos reajustes realizados pela RECLAMADA, consoante o previsto no parágrafo único do art. 3º da LGT, a RECLAMANTE viu-se vulnerada e alijada desse valioso instrumento de publicidade das condições, o qual lhe foi conferido pelo Legislador. A publicidade permitiria equalizar as forças negociais e aproximar o distinto poder de barganha entre as partes.

4.124. Reconhecendo o poder-dever da ANATEL de dirimir conflitos, ponderando o direito legal à informação plena e previsível de preços conferida à RECLAMANTE (enquanto usuária dos serviços de telecomunicações), sopesando os riscos de irreversibilidade de uma condição de dominância da RECLAMADA, entende-se prudente e adequado limitar o reajuste pretendido pela RECLAMADA à recomposição financeira acumulada desde a entrada em vigor da Lei nº 13.673, de 2018, desde quando foi tolhido o direito que assiste à RECLAMANTE.

4.125. Diante do conflito quanto ao índice a ser adotado, propõe-se a adoção do Índice de Serviços de Telecomunicações (IST), uma métrica composta por outros índices consagrados na economia brasileira e selecionados por trabalho conjunto entre a Anatel e a Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Portanto, entende-se que o IST é aquele mais representativo da atualização de valores intrínsecos à indústria de telecomunicações.

4.126. Em suma, diante das evidências colhidas nos autos, contrastadas por um abrangente benchmark internacional e em face da possibilidade de existência de poder de mercado da RECLAMADA, o qual somente poderá ser atestado em definitivo por meio de estudo profundo decorrente da revisão ordinária do PGMC, tem-se que a submissão dos valores à atualização acumulada pelo IST é baliza regulatória justa e razoável capaz de prevenir efeitos mercadológicos deletérios e potencialmente irreversíveis, a exemplo da elevação não contestável de preços, pelo período em que a ALGAR não exercer o disposto no parágrafo único do art. 3º da LGT."

(Destaques no original)

 Quando examinou situação semelhante no Processo nº 53500.036292/2020-04 (Zenvia X Telefônica), o Conselheiro Emmanoel Campelo, em sua Análise nº 134/2021/EC (SEI nº 7535289), confirmou o racional delineado pela SCP na escolha do IST como índice de reajuste: 

"5.60. Embora tenham uma relação de direito privado estabelecida, cabe à Anatel agir quando acionada, viabilizando um equilíbrio de forças na negociação, para produzir um resultado justo.

5.61. Entendo que a previsão contratual de índice de reajuste não afasta a possibilidade dessa Agência atuar, num contexto de negociação entre partes com poderes não proporcionais, e prever a utilização de índice que se mostre adequado.

5.62. Nesse sentido, considerando que o Índice de Serviços de Telecomunicações - IST é o mais representativo da atualização de valores intrínsecos à indústria de telecomunicações, justifica-se sua aplicação pelo período em que a Telefônica não observou o disposto no parágrafo único do art. 3º da LGT.

(...)
5.64. Desta forma, a Agência precisou atuar no caso em tela, promovendo o equilíbrio do jogo, para que a Zenvia de posse das informações tenha condições de participar da negociação em termos mais justos e até lá, arque com reajuste, que é devido à Telefônica, mas baseado em índice razoável para ambas as partes."

(Grifos no original)

O mesmo ocorreu no Processo nº 53500.036283/2020-13 (Zenvia X Tim), no qual o Conselheiro Moisés Moreira, em sua Análise 104/2021/MM (SEI nº 7332581), igualmente ratificou a integralidade das conclusões esposadas pela Área Técnica:

"5.148. Sobre este ponto, vale esclarecer que a proposta da área técnica deu-se de modo fundamentado em dois pilares, quais sejam: (i) nas análises em torno da estrutura do mercado do SMS A2P, as quais permitiram identificar a presença de indícios de falhas de mercado ante o monopólio detido pelas prestadoras do SMP sobre sua própria base de assinantes, configurando incentivo para eventual abuso de poder econômico pelas operadoras de redes móveis e (ii) no cerceamento ao direito à informação assegurado pela LGT, na forma trazida pela Lei nº 13.673/2018. Note-se que a conformação das duas situações ensejaram a proposta contida no Informe nº 679/2020/CPRP/SCP.

5.149. Assim, foram ponderados, além do direito legal da Zenvia à informação plena e previsível de preços, também os riscos de irreversibilidade de uma condição de dominância da Reclamada.

5.150. O que a área técnica verificou é que na estrutura do mercado de SMS A2P, na medida em que a oferta do serviço de entrega massiva de SMS por cada prestadora do SMP é monopolista, haveria incentivo para a fixação dos preços em patamares superiores àqueles que seriam praticados caso a oferta fosse competitiva, o que se coaduna com as alegações da Reclamante quanto a uma possível prática de preços abusivos.

5.151. Ainda que as informações disponíveis nos autos não deem conta da materialidade e extensão de eventual conduta abusiva, a medida proposta buscou conferir uma baliza racional à repactuação contratual entre as partes por meio da limitação do reajuste com base na variação do IST, que é índice representativo da atualização de valores intrínsecos à indústria de telecomunicações, a ser praticada até a efetiva publicização das informações. Buscou-se limitar temporariamente a majoração de preço por agente monopolista, conferindo balizas defensáveis e pouco intrusivas para a repactuação entre as partes, até que as informações acerca dos preços e reajustes praticados com todos os agentes no mercado, nos últimos cinco anos, sejam públicas.

5.152. Diante do exposto, entendo que a medida adotada pela área técnica com o propósito de pôr fim ao conflito entre as partes e preservar-lhes os direitos legalmente assegurados mostra-se adequada ao caso em tela, pois é restrita ao relacionamento entre as partes e em linha com os diagnósticos realizados em torno da estrutura do mercado SMS A2P."

A decisão ora vergastada impõe a limitação para o reajuste dos preços à variação acumulada do IST desde a entrada em vigor da Lei nº 13.848/2018 seja praticada até que seja implementado o previsto no parágrafo único do art. 3º da LGT. Trata-se de medida transitória que, sob abordagem responsiva, fomenta a correção da conduta por parte da Algar. Demais disso, põe fim ao conflito apresentado à esta Agência e assegura o direito da Zenvia à plena informação. 

A Algar defendeu, por fim, não ter a Zenvia demonstrado que a Algar utilizaria índice de reajuste diferente, e mais benéfico, para com qualquer outra empresa contratante de SMS A2P. Mas, fazendo coro ao que aduziu o Setor Técnico, cabe aqui uma indagação: como a Zenvia teria ciência acerca dos termos efetivamente negociados entre a Algar e demais integradoras ou interessadas nesse produto se nunca existiu a publicização das condições da oferta por parte da Algar? De fato, mostra-se inviável qualquer comprovação nesse sentido, o que faz com que sua argumentação fique distante da realidade.

Assim, entendo que os argumentos da Algar objetivando a alteração do IST como índice de reajustes expostos tanto em sua peça recursal quanto em sede de petição extemporânea não merecem prosperar.

III.3.2 - Sobre a exigência de formalização de contrato com terceiros

A Algar ancora sua alegação na tese de que a imposição de formalização de contrato entre a Zenvia e a Infobip/Comfone não desrespeitaria o direito de escolha da Zenvia e tampouco ensejaria um impedimento do acesso daquela empresa à sua rede.

No que concerne à presente questão, a Zenvia arguiu, em suas Contrarrazões, que o decisum se fundamentou em argumentos de regulação e proteção do mercado, repisando que a Algar exerce um monopólio em relação ao acesso a seus usuários do SMP e que não há interoperabilidade entre as redes móveis das diferentes prestadoras, o que a coloca em posição de dependência e fragilidade.

Pois bem. Acerca do tema, tenho 2 (duas) ponderações a fazer.

A uma, reitero as disposições por mim apresentadas nos itens 5.36 a 5.41, onde delineei alguns aspectos sobre o preceito constitucional da livre iniciativa. Aqui, cabe enfatizar que um de seus corolários constitui a liberdade de contratar, direito da Zenvia violado pela Algar ao exigir que se firmasse contrato entre a empresa intermediária/responsável pela solução de segurança e a Zenvia. Isso porque um agente econômico é livre para escolher discricionariamente seus parceiros comerciais, desde que tal escolha não possua intenção de se criar um monopólio. Portanto, não cabe à Algar determinar com quem a Zenvia deve formalizar contrato, muito menos impor tal contratação à manutenção/renovação da relação jurídica já existente entre as duas empresas.

A duas, repito que, conforme mencionado no tópico anterior, tem-se que a Zenvia constitui, frente à Algar, usuária de serviços de telecomunicações, segundo dispõe o § 1º do art. 61 da LGT alhures transcrito. Logo, ela é sujeito da totalidade dos direitos insculpidos no art. 3º da LGT, dentre eles o da liberdade de escolha da sua prestadora de serviço (inciso II): 

"Art. 3° O usuário de serviços de telecomunicações tem direito:

(...)

II - à liberdade de escolha de sua prestadora de serviço;"

De clareza solar, assim, os direitos a que assiste a Zenvia para que não lhe seja imputada a formalização de qualquer espécie contratual com a empresa intermediária. 

Estou, ainda, de acordo com a SCP quando tal área sabiamente esclarece, no Informe nº 277/2021/CPRP/SCP (SEI nº 7668106), que não fica vedada a existência de empresa intermediária que tenha como escopo implementar solução de segurança na rede da Algar, mas sim que essa operadora condicione o acesso à sua rede por parte da Zenvia à existência de um contrato entre a empresa intermediária e a Zenvia:  

"4.134. Considerando o direito do usuário à liberdade de escolha da prestadora de serviço, cabe deixar registrado que, ainda que o arranjo pretendido pela ALGAR prospere, qualquer imposição de formalização de contrato com terceiro para vinculação de acesso à serviço deve ser combatida.

4.135. Neste sentido, caberá a ALGAR a composição de termos com o intermediário, no presente caso a COMFONE/INFOBIP, a fim de que se viabilize o modelo de negócio pretendido, inclusive com o incremento do serviço de segurança, entretanto, a ZENVIA não poderá ser compelida a formalizar instrumento contratual com um terceiro para que tenha acesso aos clientes da ALGAR, sejam eles clientes nacionais ou "marcas globais". Devendo ser o bastante a manutenção de relacionamento contratual apenas com a própria ALGAR.

4.136. Considerando as pontuações acima descritas, não se vislumbra fundamentação legal ou regulamentar para afastamento da figura do intermediário nos termos apresentados pela ALGAR, desde que não haja nenhuma ameaça ao direito do usuário à liberdade de escolha de sua prestadora de serviço, nos termos do inciso II do artigo 3º da LGT.

4.137. Neste sentido, são louváveis as buscas por aprimoramento das medidas de segurança relacionadas às redes de telecomunicações e as implementações de ferramentas de segurança como a pretendida pela ALGAR. Entretanto, como quaisquer outros insumos relacionados à prestação dos serviços, eles devem compor os custos, sem imputar ao usuário a necessidade de contratação com terceiros."

(Destaques no original)

Em sua petição extemporânea, a Algar advogou a regularidade do modelo de negócio que possua a previsão de empresa intermediária por se tratar de um arranjo contratual de direito privado. O excerto supratranscrito elucida em definitivo tal questão, acentuando que não deve existir relação jurídica contratual entre a intermediária escolhida pela Algar e a Zenvia, sendo que qualquer arranjo que se refira à implementação de sistema de segurança na rede da Algar deve se ater tão somente à essa empresa e à intermediária.  

Portanto, afasto os argumentos guindados pela Algar no Recurso Administrativo e na petição extemporânea SEI nº 11041493.

III.3.3 - Sobre a instauração de Processo de Acompanhamento e Controle (PAC)

Por fim, a peça recursal da Algar arguiu ser prescindível a instauração de um PAC no intuito de acompanhar a implementação do parágrafo único do art. 3º da LGT, pois essa medida não seria aplicável às relações de atacado em função da inexistência de vulnerabilidade técnica ou econômica da Zenvia em relação à Algar.

Repiso, aqui, o tanto quanto aduzido nas seções anteriores no sentido de restar evidenciado pela SCP que as operadoras do SMP se apresentam como controladoras (gate keepers) do monopólio da terminação de SMS corporativo, pois o encaminhamento massivo de SMS corporativo se dá apenas on-net, onde cada prestadora encaminha exclusivamente o tráfego SMS A2P para sua própria base de clientes SMP. Relembro ainda que, nos termos do § 1º do art. 61 da LGT, a Zenvia constitui uma usuária de serviços de telecomunicações. O fato de ela consistir, segundo a Recorrente, em uma empresa integradora de grande porte não tem o condão de alterar sua natureza jurídica perante a Algar ou qualquer outra prestadora de serviços de telecomunicações, visto que se trata de uma provedora de serviços de valor adicionado.

Logo, as disposições do art. 3º da LGT são perfeitamente aplicáveis às relações promovidas pela Zenvia enquanto provedora de SVA. Em assim sendo, entendo ser imperiosa a instauração de processo de acompanhamento para que a Agência constate em tal feito a concretização não apenas das determinações relativas ao art. 3º da LGT, mas constate o adimplemento da integralidade dos comandos exarados nestes autos, nos termos do que ocorreu nos processos Zenvia X Telefônica e Zenvia X Tim.

Ainda acerca do que dispõe o art. 3º da LGT, mencionei no início da presente Análise que fui o Relator do recurso administrativo interposto pela Zenvia contra decisão da SCO proferida no âmbito do PAC relativo às determinações do Acórdão nº 402/2021 (SEI nº 7770220), Processo Zenvia X Tim.  Naquela ocasião, este Colegiado acatou à unanimidade, por meio do Acórdão nº 82, de 19 de abril de 2023 (SEI nº 10125192), a proposição que fiz no sentido de determinar à Tim que aprimorasse a ferramenta de busca de seu sítio eletrônico de modo que, ao pesquisar pelo termo "A2P" ou "SMS A2P", o buscador passe a direcionar o usuário diretamente à página que contém tais informações, deixando de direcioná-lo a páginas intermediárias.

Como para este feito também será instaurado PAC pelos mesmos fundamentos, julgo adequado que a SCO, antes de atestar o cumprimento à determinação referente ao art. 3º da LGT, verifique não somente se a Algar promoverá a publicização das informações em seu site, mas averigue se os dados poderão ser facilmente encontrados pelos usuários de serviços de telecomunicações, sem utilização de termos exageradamente técnicos ou com direcionamento a páginas intermediárias que dificultem o acesso às informações.   

De modo que, demonstrado o não cabimento da totalidade das alegações recursais da Algar, pugno pelo não provimento de seu Recurso Administrativo. E tendo os pedidos constantes da petição extemporânea sido igualmente examinados nos tópicos anteriores, sugiro o indeferimento de todos. 

IV - DA RELAÇÃO COM A AGENDA 2030: OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL (ODS) DA ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU)

A Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU) é um plano global para que, em 2030, possamos ter um mundo melhor para todos os povos e nações. Ela consubstancia um compromisso assumido por todos os países que fizeram parte da Cúpula das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável em 2015, a qual contempla os 193 Estados-membros da ONU, incluindo o Brasil, e envolve a adoção de medidas ousadas, abrangentes e essenciais para promover o Estado de Direito, os direitos humanos e a responsividade das instituições políticas.

A Agenda 2030 é composta de 17 (dezessete) Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e 169 (cento e sessenta e nove) metas universais. A figura abaixo ilustra esses objetivos, que, de acordo com sítio eletrônico da Organização das Nações Unidas no Brasil (https://brasil.un.org/pt-br/sdgs), são definidos como um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade:

Fonte: https://brasil.un.org/pt-br/sdgshttps://brasil.un.org/pt-br/sdgs

A atuação da Anatel também deve estar aderente a esses ODS e às metas que lhes são correlatas, e é importante que referida aderência esteja explícita nas decisões deste Conselho Diretor, como sempre defendeu o Conselheiro Alexandre Freire em todas as suas manifestações (vide Ofício nº 90/2023/AF-ANATEL - SEI nº 11203364).

A proposta de encaminhamento contida na presente Análise relaciona-se com o Objetivo 16 da Agenda 2030, que busca promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis. Dentre as metas desse ODS, destaco especificamente a Meta nº 16.6, que visa desenvolver instituições eficazes, responsáveis e transparentes em todos os níveis, e a Meta nº 16.7, que pretende garantir a tomada de decisão responsiva, inclusiva, participativa e representativa em todos os níveis.

CONCLUSÃO

Voto por:

conhecer dos Recursos Administrativos interpostos por Zenvia Mobile Serviços Digitais S/A e Algar Telecom S/A para, no mérito, negar-lhes provimento; 

receber a petição extemporânea SEI nº 11041493, apresentada pela Algar Telecom S/A e indeferir os pedidos nela constantes; e

determinar à Superintendência de Controle de Obrigações (SCO) que, no âmbito do Processo de Acompanhamento e Controle (PAC) a ser instaurado para fins de atesto ao cumprimento das determinações exaradas neste processo, averigue se os dados a serem publicizados no sítio eletrônico da Algar Telecom S/A poderão ser facilmente encontrados pelos usuários de serviços de telecomunicações, sem utilização de termos exageradamente técnicos ou com direcionamento à páginas intermediárias que dificultem o acesso às informações.

NOTAS

[1] BARROSO, Luís Roberto. A ordem econômica constitucional e os limites à atuação estatal no controle de preços. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, 226, p. 187-212, Outubro/Dezembro 2001. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/mod/resource/view.php?id=3071595 Acesso em: 23 fev. 2024. 
[2] Ibidem, p.191.

[3] Ibidem, p.205.

[4] Informe nº 277/2021/CPRP/SCP (SEI nº 7668106).


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Documento assinado eletronicamente por Vicente Bandeira de Aquino Neto, Conselheiro Relator, em 07/03/2024, às 17:19, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 23, inciso II, da Portaria nº 912/2017 da Anatel.


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Referência: Processo nº 53500.059860/2021-18 SEI nº 11368127