Timbre

Relatório de Atividades

ÁREA

Ouvidoria

introdução

O desenvolvimento das telecomunicações no Brasil desde a desestatização promovida no final dos anos 90 evidencia o acerto da decisão de outorgar à iniciativa privada a responsabilidade pelos serviços, seja em regime público, seja em regime privado. Montante significativo de recursos vem sendo utilizado desde então para a expansão da infraestrutura nacional de telecomunicações essencial para a geração de emprego, renda, conhecimento e inovação.

Por meio da definição de metas de universalização (no caso do regime público) ou do estabelecimento de compromissos editalícios de cobertura (no caso do regime privado), a Agência Nacional de Telecomunicações desempenhou de maneira louvável o seu papel institucional, contribuindo decisivamente para que os serviços fixos e móveis chegassem às comunidades mais distantes, a preços acessíveis.

Porém, o cenário atual não é o ideal, uma vez que milhões de brasileiros em localidades com menos de 600 habitantes ainda não têm à sua disposição o Serviço Móvel Pessoal (SMP), aquele que apresenta grande versatilidade de uso, pois combina a possibilidade de conversações e troca de dados por usuários em deslocamento, sendo ideal como ferramenta de trabalho e lazer, especialmente no momento em que novos aplicativos elevam a produtividade e o bem-estar das pessoas. 

No processo da Anatel relativo ao edital de licitação das radiofrequências por meio das quais se prestará o serviço móvel pessoal de quinta geração (53500.004083/2018-79), consta que existem 12,8 mil localidades com menos de 600 habitantes, nas quais vivem, pelo menos, 3,26 milhões de pessoas (vide planilha SEI 4092157) que continuarão sem acesso ou com acesso de baixa qualidade ao SMP mesmo com a implementação dos compromissos de abrangência ora propostos.

Recordamos que a Portaria n° 418, de 31 de janeiro de 2020 do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), que estabeleceu as diretrizes para o leilão das faixas de radiofrequências de 700 MHz, 2,3 GHz, 3,5 GHz e 26 GHz, destinadas à quinta geração,  definiu como obrigatório o atendimento com banda larga móvel em tecnologia 4G ou superior para cidades, vilas, áreas urbanas isoladas e aglomerados rurais que possuam população superior a 600 habitantes. 

Prestado em regime privado, o SMP segue lógica de mercado e não se pauta pela obrigação de atender 100% da população. É considerado atendido o município quando a área de cobertura do serviço contiver, pelo menos, 80% da área urbana de seu distrito-sede. O atendimento com serviço móvel nas localidades e distritos não-sede de municípios (vilas, estradas, zona rural, etc.) e nos 20% da área urbana do distrito-sede (onde não é obrigatória a cobertura), dependerá do plano de negócio das prestadoras de SMP que atendem a região. Ou seja, trata-se de cobertura facultativa, passível de negativa pela prestadora caso não lhe interesse financeiramente.

Durante a corrente pandemia do novo coronavírus, o sistema de telecomunicações tem sido bastante exigido, e ficou clara a disposição das prestadoras em atender às necessidades de seus clientes por meio de diversas medidas. Entretanto, a crise provocada pela doença evidenciou que muitos cidadãos residentes em áreas não atendidas tiveram severas dificuldades, por exemplo, de se cadastrar em site e aplicativo para o recebimento de benefícios temporários oferecidos pelo Governo Federal para sua subsistência. Evidente está que não se pode deixar para trás estas pessoas, cuja exclusão digital tem potencial lesivo até para a manutenção da vida.

Some-se a isto as diversas demandas que esta Ouvidoria recebe sobre a necessidade de expansão do SMP nas localidades mais longínquas.

Fato notório é que terceiros investem em equipamentos para ampliar a cobertura do SMP sem finalidade de transformar essa ampliação em negócio, tamanha a necessidade e relevância do serviço de telecomunicações.  Dessa forma, esses atores realizam investimentos próprios mesmo sem receber receita financeira por isso, apenas pela utilidade que o acesso ao serviço móvel pessoal fornece.

Daí a relevância da presente proposta, que tem como finalidade, em síntese, apresentar possibilidades de viabilização do uso de repetidores de baixa potência  (até 5 watts) como alternativa de inclusão de milhões de pessoas residentes em localidades com menos de 600 habitantes, com toda a segurança técnica para evitar interferências prejudiciais no espectro, sugerindo que tal solução seja avaliada inclusive como política pública emergencial. 

É fato que a instalação e operação desse tipo de equipamento sem o devido conhecimento específico dos parâmetros utilizados podem provocar efeitos danosos aos usuários já atendidos. Todavia, não se pode simplesmente banir a utilização dos repetidores de baixa potência, que, quando devidamente homologados e corretamente instalados, constituem-se uma alternativa de baixo custo para cobrir áreas de sombra, por exemplo, sem interferir prejudicialmente na rede. 

Deve-se, ainda, considerar que um dos objetivos da Agência é “promover a ampliação do acesso e o uso dos serviços, com qualidade e preços adequados”.  Nessa linha, o uso correto de repetidores de baixa potência parece socialmente justificável, dentro de certos parâmetros identificados por meio de contribuições obtidas em tomada pública de subsídios promovida por esta Ouvidoria. 

Desta forma, para incluir contingente significativo de brasileiros, certamente os repetidores de baixa potência poderiam ser utilizados como solução temporária, provisória, emergencial até a chegada da infraestrutura definitiva das prestadoras.

Estima-se que existissem cerca de 500 mil aparelhos destinados a ampliar a cobertura do SMP em 2016, segundo informações fornecidas pela Abranet. Trata-se de uma quantidade significativa. Supondo que este número seja o mesmo em 2019, verificamos que a maior parte destes equipamentos deve ter sido corretamente instalada, uma vez que a quantidade de processos abertos na Anatel em 2019 chegou a 45 (sendo 41 deles motivados por fiscalizações decorrentes de denúncias de operadoras, segundo informações do Memorando nº 27/2020/FIGF/SFI).

Reconhecemos que o tema apresenta complexidades e exige reflexão em um ambiente que exige soluções rápidas e inovadoras, em busca da conciliação de comandos jurídicos muitas vezes contraditórios. É preciso, no entanto, enfrentar o desafio de forma responsável à luz do princípio da razoabilidade, tendo como objetivo atender cidadãos que se encontram alijados do desenvolvimento tecnológico dos grandes centros.

Foi com esta finalidade que promovemos a tomada pública de subsídios (Consulta Pública nº 25/2020), que contou com a participação de prestadoras, indústria, usuários, associações, especialistas e servidores da Anatel, cujas manifestações foram valiosas para a elaboração do presente documento.

da distinção entre equipamentos

De acordo com a Portaria nº 1.683/2007, repetidores são equipamentos destinados a amplificar sinais de radiofrequências recebidos/enviados de canais específicos de uma determinada Estação Rádio-base com a qual interage.

Reforçadores são equipamentos destinados a operar em ambiente interno ou fechado que amplificam, em baixa potência (máximo de 33 dBm, conforme Resolução nº 454/2006, o equivalente a 2 Watts) e sem translação de frequência, os sinais recebidos de todos ou de um conjunto específico de canais de radiofrequência, de cada uma das subfaixas destinadas ao SMP.

Na prática, tanto um quanto outro equipamento tem como propósito possibilitar o acesso ao SMP em determinado local por meio de interação com uma Estação Rádio-base. 

Ressalvamos que essas definições regulamentares não são tão rígidas como parecem. No caso dos reforçadores, por exemplo, há possibilidade técnica de uso tanto de antena interna quanto externa de alto ganho, ainda que o equipamento não tenha sido projetado originalmente ou tenha sido homologado com o propósito de ser instalado para operação ao ar livre.

Quanto à potência, os reforçadores têm a sua limitada a 2 Watts, conforme requisitos técnicos e procedimentos de ensaios aplicáveis à certificação de produtos para telecomunicação de categoria I estabelecidos pela Anatel, enquanto os repetidores obedecem aos requisitos de Estações Radio-Bases (ERBs) e podem ter potência bem superior.

A Resolução nº 454/2006 admite o uso da chamada Estação Repetidora, sendo que a potência máxima radiada deve estar limitada: I - na direção da Estação Rádio-Base, ao valor estabelecido no regulamento para a Estação Móvel; e II - na direção da Estação Móvel, ao valor estabelecido no regulamento para a Estação Rádio-Base.

Para os usuários, leigos no assunto, a confusão é grande, porque é possível encontrar equipamentos com diversas características, preços e nomenclaturas (mini-repetidor, mega-reforçador, repetidor, reforçador, kit amplificador etc.), muitos deles homologados pela Anatel após terem sido devidamente testados em laboratório.

Conforme a Resolução 477/2007, os repetidores e reforçadores recebem o seguinte tratamento: 

Art. 102. A prestadora deve licenciar todas as estações de telecomunicações envolvidas na prestação do SMP.

§ 1º A prestadora deve informar à Anatel o número de Estações Móveis por ela habilitadas para os fins indicados no caput.

§ 2º A Estação Rádio Base do SMP somente pode iniciar o funcionamento comercial após licenciamento específico.

§ 3º A Repetidora do SMP deve obedecer aos mesmos procedimentos estabelecidos para as Estações Rádio Base.

§ 4º O Reforçador de Sinais do SMP deve ser caracterizado como equipamento acessório da Estação Rádio Base não sendo objeto de Licença de Funcionamento.

§ 5º Para fins de licenciamento, o conjunto de equipamentos, dispositivos e demais meios, seus acessórios e periféricos, instalados em um mesmo local, destinados à prestação do SMP, quando operados por uma mesma Prestadora, nas subfaixas de radiofrequências definidas na regulamentação do SMP, são considerados como componentes de uma mesma Estação Rádio Base.

Como se vê, os reforçadores são definidos como elementos acessórios da ERB a que se vinculam e são considerados como componentes da mesma. Neste contexto regulamentar, a responsabilidade pela integração desses elementos à rede parecer ter sido atribuída exclusivamente à prestadora, sendo ela responsável pelo licenciamento e pelo serviço prestado com o uso destes elementos para fins de acompanhamento de qualidade.

Lembramos, porém, que estão isentas do pagamento da Taxa de Fiscalização de Instalação (TFI) e da Taxa de Fiscalização de Funcionamento (TFF) Estações Rádio-Base e repetidoras de baixa potência dos serviços de telecomunicações de interesse coletivo, assim consideradas aquelas cuja potência de pico máxima, medida na saída do transmissor não seja superior a 5W (cinco watts), nos termos da Lei n 13.097, de 19 de janeiro de 2015. Mesmo diante da isenção tributária, observamos que a regulamentação da Anatel (Resolução 477/2007) exige licenciamento de estações repetidoras de baixa potência. 

Ressalte-se que a regulamentação, de 2007, não foi modernizada em face da lei de 2015, fato que merece atenção por parte deste órgão regulador. 

do uso do espectro

 É entendimento pacífico no âmbito da Anatel que o uso de equipamentos destinados a amplificar área de cobertura ou melhorar a qualidade do sinal do SMP exige autorização formal da Anatel nesse sentido, não bastando somente anuência da prestadora já autorizada a operar com o espectro de frequência. Isso porque entende-se que a autorização da prestadora tem caráter personalíssimo, não podendo ela permitir que outrem faça uso do espectro autorizado originária e unicamente para ela. Enfim, com base neste entendimento, não há como se admitir que uma pessoa faça uso do espectro de radiofrequência sem que tenha uma dupla autorização para tanto.

Embora frequentemente adquiridos e utilizados de boa fé, facilmente encontrados no mercado e, na maioria dos casos, homologados pela Agência (a base de dados de produtos homologados pela Anatel exibe 203 modelos de repetidores celulares e 55 de reforçadores "internos"), esses equipamentos não podem ser instalados livremente por terceiros não autorizados. De acordo com entendimento consolidado na Agência, há  total impossibilidade de terceiro fazer uso do espectro de radiofrequência de uma prestadora mediante o uso do repetidor/reforçador de sinal sem que exista uma autorização formal da Anatel nesse sentido (Parecer nº 01420/2015/PFE-ANATEL/PGF/AGU -SEI nº 1898575).

Compulsando autos de processos sancionatórios encontramos casos em que pessoas físicas e jurídicas reclamaram diversas vezes sobre a falta de cobertura e o desinteresse das prestadoras de SMP em solucionar o problema. Inconformadas com a situação, compraram repetidores por conta própria, homologados e disponíveis no mercado. Na sequência, ao colocar em funcionamento tais equipamentos, foram denunciadas pelas prestadoras, autuadas pela Anatel e processadas judicialmente por uso não autorizado de radiofrequência.

Em repetidas ocasiões, inclusive na tomada pública de subsídio que motivou este relatório, ficou claro que inexiste interesse das prestadoras de integrar à sua rede elementos que não são originalmente de sua propriedade e operação, sob as justificativas de que podem causar interferências, sobrecarregar a rede e dar aos usuários a impressão de que um serviço eventualmente de qualidade inferior é de sua responsabilidade, além de possíveis repercussões nos indicadores qualidade.

É entendimento consolidado na Anatel que o uso de repetidores/reforçadores de sinal por terceiros não prestadores de serviços de telecomunicações sem autorização configura ilegalidade e crime, à luz da Lei Geral de Telecomunicações - posicionamento este que é reiterado pela regulamentação editada pela Agência. O fato, quando constatado pela fiscalização, inclusive deve ser levado ao conhecimento do Ministério Público pela Agência, para que o mesmo apresente ao Judiciário a denúncia correspondente, se considerar pertinente.

Isso porque entende-se que a autorização de uso radiofrequência é pré-requisito para a obtenção do licenciamento de uma estação de telecomunicações. Ademais, a autorização para uso de radiofrequência está atrelada a uma etapa anterior, qual seja, a obtenção de autorização para a execução de um serviço de telecomunicações. Assim sendo, há entendimento de que não é possível a um usuário de um serviço de telecomunicações obter tal autorização, somente a pessoa autorizada a executá-lo ou prestá-lo possui tal outorga.

Sabe-se que o espectro de radiofrequências é um bem público, de fruição limitada, cujo uso é administrado pela Agência. Excetuando as faixas do espectro que são de uso livre, se respeitados os limites definidos para radiação restrita, nenhuma entidade ou pessoa está autorizada a iniciar atividade que envolva o uso do espectro, sem a autorização para o uso de radiofrequência. Isso porque o uso inadequado do espectro radioelétrico pode causar interferências prejudiciais não apenas aos serviços regulares de telecomunicações, mas também aos equipamentos de navegação de embarcações e aeronaves, sistemas de comunicação de ambulâncias, bombeiros, carros de polícia, aos serviços vinculados à segurança nacional, entre outros.

O direito ao uso da radiofrequência é atribuído ao prestador de serviço de telecomunicações, conforme disposições emanadas da Lei Geral de Telecomunicações (LGT), in verbis:

Art. 131. A exploração de serviço no regime privado dependerá de prévia autorização da Agência, que acarretará direito de uso das radiofrequências necessárias.

O uso da radiofrequência está associado diretamente à outorga de um serviço de telecomunicações, consoante pontua a Lei Geral de Telecomunicações, sendo impossível sua transferência sem que exista a transferência da outorga do serviço, in verbis:

Art. 163. O uso de radiofrequência, tendo ou não caráter de exclusividade, dependerá de prévia outorga da Agência, mediante autorização, nos termos da regulamentação.

§ 1° Autorização de uso de radiofrequência é o ato administrativo vinculado, associado à concessão, permissão ou autorização para prestação de serviço de telecomunicações, que atribui a interessado, por prazo determinado, o direito de uso de radiofrequência, nas condições legais e regulamentares.

Após obter a autorização para prestação do serviço de telecomunicações, no caso o Serviço Móvel Pessoal (SMP), a prestadora deve licenciar suas estações de telecomunicações, conforme a LGT:

Art. 162. A operação de estação transmissora de radiocomunicação está sujeita à licença de funcionamento prévia e à fiscalização permanente, nos termos da regulamentação.

No mesmo sentido, recordamos o já supramencionado art. 102 do Regulamento do Serviço Móvel Pessoal, que  assim dispõe:

Art. 102. A prestadora deve licenciar todas as estações de telecomunicações envolvidas na prestação do SMP.

§ 1º A prestadora deve informar à Anatel o número de Estações Móveis por ela habilitadas para os fins indicados no caput.

§ 2º A Estação Rádio Base do SMP somente pode iniciar o funcionamento comercial após licenciamento específico.

§ 3º A Repetidora do SMP deve obedecer aos mesmos procedimentos estabelecidos para as Estações Rádio Base.

§ 4º O Reforçador de Sinais do SMP deve ser caracterizado como equipamento acessório da Estação Rádio Base não sendo objeto de Licença de Funcionamento.

§ 5º Para fins de licenciamento, o conjunto de equipamentos, dispositivos e demais meios, seus acessórios e periféricos, instalados em um mesmo local, destinados à prestação do SMP, quando operados por uma mesma Prestadora, nas subfaixas de radiofrequências definidas na regulamentação do SMP, são considerados como componentes de uma mesma Estação Rádio Base.

A Procuradoria Federal Especializada na Anatel assim se manifestou a respeito do tema:

No caso em exame, há uma total impossibilidade de terceiro fazer uso do espectro de radiofrequência mediante o uso do reforçador de sinal sem que exista uma autorização formal da Anatel nesse sentido. Não basta uma anuência da prestadora já autorizada a operar com o espectro de frequência, a autorização deverá vir diretamente da Anatel. Como dito alhures, a autorização da prestadora tem caráter personalíssimo, não podendo ela permitir que outrem faça uso do espectro autorizado originária e unicamente para ela. Enfim, não há como se admitir que uma pessoa faça uso do espectro de radiofrequência sem que tenha uma autorização para tanto. 

Por fim, a LGT definiu como crime o desenvolvimento clandestino de atividades de telecomunicação:

Art. 183. Desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação:

Pena - detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, e multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, direta ou indiretamente, concorrer para o crime.

Art. 184. São efeitos da condenação penal transitada em julgado:

I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;

II - a perda, em favor da Agência, ressalvado o direito do lesado ou de terceiros de boa-fé, dos bens empregados na atividade     clandestina, sem prejuízo de sua apreensão cautelar.

Parágrafo único. Considera-se clandestina a atividade desenvolvida sem a competente concessão, permissão ou autorização de serviço, de uso de radiofreqüência e de exploração de satélite.

(...)

Art. 185. O crime definido nesta Lei é de ação penal pública, incondicionada, cabendo ao Ministério Público promovê-la.

 

A utilização não autorizada do espectro de radiofrequências sujeita o respectivo infrator às penalidades definidas na regulamentação específica, em conformidade com o art. 75 do RUE/2016:

Art. 75. A inobservância dos deveres inerentes ao uso de radiofrequências, a qualquer título, sujeita os infratores às sanções aplicáveis pela Anatel nos termos do art. 173 da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, do Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas e demais normas regulamentares aplicáveis.

O art. 173 da LGT prevê as seguintes sanções:

Art. 173. A infração desta Lei ou das demais normas aplicáveis, bem como a inobservância dos deveres decorrentes dos contratos de concessão ou dos atos de permissão, autorização de serviço ou autorização de uso de radiofreqüência, sujeitará os infratores às seguintes sanções, aplicáveis pela Agência, sem prejuízo das de natureza civil e penal:

I - advertência;

II - multa;

III - suspensão temporária;

IV - caducidade;

V - declaração de inidoneidade.

O uso não autorizado do espectro é considerado infração de natureza grave no âmbito da Anatel, nos termos do inciso VIII do § 3º do art. 9º do Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas (RASA/2012), aprovado pela Resolução nº  589, de 7 de maio de 2012, o qual dispõe:

Art. 9º As infrações são classificadas, segundo sua natureza e gravidade, em:

(...)

§ 3º A infração deve ser considerada grave quando verificada uma das seguintes hipóteses:

(...)

VIII - uso não autorizado de radiofrequências; (Redação dada pela Resolução nº 671, de 3 de novembro de 2016)

Compreende-se que o arcabouço jurídico neste campo restritivo tem como propósito prevenir e reprimir eventuais utilizações indevidas do espectro, impondo limites e parâmetros que permitam a fruição adequada dos serviços de telecomunicações.

A Resolução nº 589/2012 e a Portaria nº 788/2014 estabelecem os procedimentos, parâmetros e critérios para aplicação da sanção administrativa. Há entendimentos recentes do Conselho Diretor desta Agência (por exemplo: acórdão nº 384, de 18 de julho de 2019, e nº 418, de 7 de agosto de 2019), no sentido de se afastar a aplicação da Portaria nº 788/2014,  que dispõe sobre a metodologia de cálculo do valor base das sanções de multa relativa à execução sem outorga de serviço de telecomunicações ou pelo uso não autorizado do espectro de radiofrequências para o cálculo de multa referente a infrações praticadas por entidades que não são prestadores de serviços de telecomunicações, quanto ao uso não autorizado de radiofrequência decorrente da utilização desses equipamentos.

Por meio do Informe nº 6/2019/SFI (SEI nº 4235746), elaborado nos autos do Pado nº 53542.001512/2016-06, a SFI esclareceu que a metodologia aprovada pela Portaria nº 788/2014, de fato, não vislumbrava punir o uso não autorizado de radiofrequência por meio de repetidores ou reforçadores de sinal por empresas não prestadores de serviço de telecomunicações:

Destaca-se que, à época da elaboração da atual metodologia, não se vislumbrava esse tipo de uso não autorizado de radiofrequência, por isso torna-se necessário de adequar a metodologia para a situação em comento.

Diante desta situação, que o autuado não aufere receitas de telecomunicações, pois não é prestador, entendeu-se não ser razoável utilizar metodologia de cálculo de multa que não se considera adequada à tal situação fática. Assim, firmou-se entendimento de se aplicar o valor mínimo estabelecido no anexo do RASA/2012 para infrações graves cometidas conforme se tratar de pessoa física ou jurídica. 

O Poder Judiciário vem, em alguns casos, deixando de considerar o uso de repetidores/reforçadores de sinal como o crime do art. 183 previsto na LGT. Vide, por exemplo, o processo 53554.003863/2018-76, no qual o proprietário de um equipamento dessa natureza apreendido pela Anatel teve seu processo criminal arquivado. Os magistrados entenderam que não havia crime porque o aparelho não emitia sinal próprio de telecomunicação, mas tão somente amplificava o sinal recebido da ERB mais próxima - ou seja, o seu uso não configuraria crime de exploração clandestina de serviço de telecomunicações. Ou seja, a radiofrequência não foi utilizada em prejuízo da prestadora, por terceiro interessado em auferir lucro indevidamente com a repetição de sinal do SMP. Na verdade, o terceiro que instalou o equipamento ampliou potencialmente a quantidade de pessoas aptas a usar o serviço da prestadora, o que certamente proporcionará à prestadora receita por chamadas de voz cursadas e tráfego de dados. 

da proposta da ouvidoria

A Ouvidoria entende que, à luz do princípio da razoabilidade, é possível atingir um denominador comum que atenda interesses de localidades com menos de 600 habitantes sem impor novas obrigações deveras custosas às prestadoras do SMP ou, ainda, provocar repercussões negativas às redes destas prestadoras.  Adotando instrumentos da regulação responsiva, com procedimento de cadastro similar ao de prestadores de Serviço de Comunicação Multimídia e com uma participação mais efetiva da Anatel, atuando na coordenação de radiofrequências, é viável que os repetidores de baixa potência sejam utilizados como solução provisória, emergencial, até a chegada do serviço definitivo.

Para tanto, sustentamos, em primeiro lugar, que as estações de baixa potência, de até 5W, já isentos de taxas de instalação e funcionamento, sejam simplesmente cadastrados na Anatel, para conhecimento de suas características técnicas e localização para fins de registro e planejamento das redes. Diante dos números acima expostos, depreende-se que a esmagadora maioria deles não provoca interferências prejudiciais, dada a baixa demanda de fiscalização junto à Anatel.

Em segundo lugar, a Ouvidoria acredita ser socialmente inadequado considerar o uso de repetidor de baixa potência devidamente homologado pela Anatel para atendimento de localidades com menos de 600 habitantes por parte de pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, como desenvolvimento clandestino de atividades de telecomunicações sempre que inexistir relação comercial ou propósito de lucro. 

Em terceiro lugar, não parece razoável considerar que a extensão do raio de alcance de uma ERB por uma prefeitura, por exemplo, por meio de uma estação de baixa potência, exija que esta entidade detenha autorização de uso de radiofrequência - assim como não é razoável, por exemplo, exigir que um usuário de telefone móvel detenha esta autorização para utilizá-lo. A autorização de uso da radiofrequência é e sempre será da prestadora, em ambos os casos.

O telefone móvel, aliás, nem sempre é adquirido pelo usuário junto à prestadora. Em muitos casos, o interessado o adquire no varejo, acreditando que o selo de homologação da Anatel é a prova de que se trata de produto com padrão de qualidade - o que certamente motiva também os compradores de equipamentos que ampliam o sinal do SMP, sejam reforçadores, sejam repetidores, nos termos da regulamentação.

Recorde-se ainda que o mercado é dinâmico e tal dinamismo precisa ser acompanhado pelo órgão regulador. No passado, as prestadoras bloqueavam telefones móveis e estabeleciam planos de fidelização para garantir a manutenção de sua base de assinantes. E mais: havia o efeito clube, em que chamadas off net eram muito mais caras que chamadas on net, o que forçava as pessoas a ter vários aparelhos (um para cada operadora) ou celulares multichip. No caso das estações de baixa potência, parece estar ocorrendo algo semelhante ao passado: a prestadora quer impedir usuários de utilizar equipamentos próprios, muitas vezes mais baratos, e que solucionam problemas de acesso ao SMP a contento, ainda que restrito a regiões bem específicas. Com o agravante de que, em muitos casos, há recusa da prestadora em fornecer o equipamento. 

Não se trata, obviamente, de defender a livre utilização do espectro, de forma desordenada, mas sim limitar o uso de estações de baixa potência àquelas localidades com menos de 600 habitantes onde não existe obrigação editalícia de cobertura do SMP, nas quais a prestadora, após 30 (trinta) dias de demanda de usuário, mantenha-se silente e, portanto, a localidade continue sem cobertura do SMP.  Quando instada, a Anatel deve colaborar na coordenação de radiofrequência para que não ocorra interferência dos equipamentos de baixa potência homologados nas redes das prestadoras do SMP. 

O procedimento proposto é o seguinte:

- Nas localidades com menos de 600 habitantes não incluídas em compromissos de cobertura, será permitido o uso de estações de baixa potência, sem caráter de exploração comercial, por parte de pessoa física e jurídica, de direito público ou privado, mediante prévia consulta à prestadora detentora da ERB de interesse.

- Em seu pedido, o interessado deve  realizar cadastro na Anatel, com todos os elementos que permitam a apreciação da solicitação pela prestadora do SMP, como características do aparelho que se pretende instalar e área de cobertura planejada.

- A prestadora  deve responder o pedido ao interessado em 30 dias, informando-lhe se considera ou não adequada a instalação do repetidor, em sistema próprio da Anatel.

- Caso a resposta da prestadora seja afirmativa, a instalação segue o seu curso previsto, cabendo ao interessado cadastrar gratuitamente a estação de baixa potência em banco de dados informatizado da Anatel, dando informação precisa da data de sua ativação. Decorrido 30 dias sem resposta da prestadora, entender-se-á como afirmativa a resposta.

- Caso a resposta da prestadora seja negativa, a prestadora requisitada deve adotar providências para cobertura da área descrita no pedido ou ofertar equipamento para aquisição do interessado que permitirá a cobertura da área descrita no pedido a preço compatível com o ofertado no mercado.

Ou seja, é importante que a prestadora do SMP possa ofertar equipamentos para que o interessado possa arcar com o investimento inicial.  Nas área de interesse específico dos usuários do SMP, mas que não têm obrigação de cobertura editalícia, nem viabilidade econômica para a prestadora do SMP, pode ser que com o compartilhamento dos custos a cobertura seja viabilizada pela própria prestadora.  Portanto, a regulamentação deve oportunizar essa alternativa. 

Deve-se deixar claro a todos os usuários do serviço estendido que a prestadora não é responsável por falhas decorrentes do funcionamento das estações de baixa potência instalados por terceiros, assim como ela não é responsável pelos problemas que ocorrem em celulares comprados por consumidores no varejo, fora de suas lojas. Nem tampouco a prestadora de SMP requisitada tornar-se-á responsável pela manutenção ou continuidade da cobertura realizado por equipamento de terceiros.

Também deve ficar explícito que o serviço estendido não deve ser considerado para fins de metas de qualidade e que a chegada de equipamentos para a prestação do serviço pela operadora implica, necessariamente, no desligamento da estação de baixa potência do interessado, não cabendo-lhe exigir qualquer tipo de reparação ou indenização.

Também não cabe reparação ou indenização por parte da prestadora requisitada no caso da estação de baixa potência se tornar obsoleto ou danoso à rede da prestadora.

demais encaminhamentos

Com base no exposto acima, apresentamos as seguintes sugestões em relação as estações de baixa potência (os equipamentos considerados acessórios pela regulamentação com potência inferior a 2 W):

- Identificação da regulamentação pertinente para sua alteração em face da Lei 13.097/2015 para eliminar a necessidade de licenciar ERBs/Repertidores com menos de 5W

- Alteração da Resolução nº 477/2007, de forma a deixar claro que estações de baixa potência não devem ser caracterizados como equipamentos acessórios da Estação Rádio Base, mas sua utilização ocorre por conta e risco do usuário, que admite a possibilidade de ter seu equipamento desativado caso prejudique de alguma forma a prestação do SMP;

- Permitir a certificação somente de reforçadores seletivos em subfaixas de frequências específicas do SMP, deixando de certificar aqueles que amplificam todas as subfaixas do SMP, com o intuito de diminuir a probabilidade de interferências nocivas;

- Exigência para que os laboratórios testem a blindagem dos equipamentos, pois, conforme estudo conduzido pela Anatel, muitas interferências ocorrem por má blindagem, que não inibem o processo de auto-oscilação produzida pelos reforçadores;

- Discussão sobre rearranjo de frequências de bandas do SMP a ser conduzido pela Anatel, em conjunto com as operadoras, para reposicionamento dos canais de Up e Down das bandas “A” e “B”, de modo a proporcionarem um uso mais eficiente do espectro.

- Simplificação do processo de uso de radiofrequência em caráter secundário, viável para grandes agentes econômicos que detêm recursos para, por conta própria, instalar ERBs e outros equipamentos de telecomunicações para uso próprio.

- Coleta periódica de equipamentos disponíveis em mercado para submissão a novos testes de laboratório, cuja reprovação implicaria automaticamente na cassação da homologação e obrigação de a empresa produtora, importadora, comercializadora recolher estoque em loja e mercadoria comercializadas para fins de destruição, com a devida indenização e reparação aos consumidores.

referências

Lei nº 9.742, de 16 de julho de 1997 (Lei Geral de Telecomunicações - LGT);

Lei nº 13.097, de 19 de janeiro de 2015;

Regimento Interno da Agência, aprovado pela Resolução nº 612, de 29 de abril de 2013;

Regulamento para Certificação e Homologação de Produtos para Telecomunicações, aprovado pela Resolução nº 242, de 30 de novembro de 2000;

Regulamento do Serviço Móvel Pessoal (SMP), aprovado pela Resolução nº 477, de 7 de agosto de 2007;

Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas, aprovado pela Resolução nº 589, de 7 de maio de 2012;

Regulamento de Fiscalização, aprovado pela Resolução nº 596, de 6 de agosto de 2012;

Regulamento de Uso do Espectro de Radiofrequências (RUE), aprovado pela Resolução nº 671, de 3 de novembro de 2016;

Regulamento sobre Equipamentos de Radiocomunicação de Radiação Restrita, aprovado pela Resolução nº 680, de 27 de junho de 2017;

Regulamento de Avaliação da Conformidade e de Homologação de Produtos para Telecomunicações, aprovado pela Resolução nº 715, de 23 de outubro de 2019;

Instrução de Fiscalização sobre Preparação, Execução e Conclusão de Ações de Fiscalização, aprovada pela Portaria nº 1.290, de 19 de setembro de 2017;

Instrução de Fiscalização sobre o Referendo acerca da Adoção das Medidas de Lacração, Apreensão e/ou Interrupção Cautelar, aprovada pela Portaria nº 1.754, de 21 de dezembro de 2016;

Parecer nº 01420/2015/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI nº 4517835);

Plano de Ação para controlar o uso clandestino ou irregular de reforçadores de sinais do Serviço Móvel Pessoal, aprovado pelo Conselho Diretor pela Portaria nº 785, de 8 de junho de 2017;

Plano Estrutural de Redes de Telecomunicações - PERT; 

Portaria MCTIC nº 418, de 31 de janeiro de 2020;

Procedimento para Tratamento de Conflitos na Coordenação de Uso de Radiofrequências, aprovado pela Portaria nº 415, de 9 de março de 2018;

Procedimento de Fiscalização de Radiointerferência, aprovado pela Portaria nº 1.525, de 16 de Agosto de 2019;

Glossário de Termos da ANATEL, disponível em: http://www.anatel.gov.br/legislacao/glossario-anatel.

Apresentação Abranet, disponível em http://www.abranet.org.br/doc/1a-conferencia/neger_abranet.pdf?UserActiveTemplate=site;


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Documento assinado eletronicamente por Thiago Cardoso Henriques Botelho, Ouvidor, em 22/05/2020, às 15:48, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 23, inciso II, da Portaria nº 912/2017 da Anatel.


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Documento assinado eletronicamente por Lauro Leandro Rutkowski, Especialista em Regulação, em 22/05/2020, às 15:54, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 23, inciso II, da Portaria nº 912/2017 da Anatel.


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Referência: Processo nº 53500.004983/2020-31 SEI nº 5518049