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Informe nº 45/2023/PRRE/SPR

PROCESSO Nº 53500.043082/2023-15

INTERESSADO: CONSELHO DIRETOR DA ANATEL - CD

ASSUNTO

Projeto de ambiente regulatório experimental (sandbox) sobre uso de repetidores e reforçadores de sinais do SMP por prefeituras para a expansão da cobertura daquele serviço.

REFERÊNCIAS

Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997 - Lei Geral de Telecomunicações (LGT);

Processo 53500.210250/2015-76 - Plano de Ação para controlar o uso clandestino de reforçadores de sinais do SMP;

Processo 53528.001387/2021-71 - Estudos da SFI sobre interferência de Reforçadores de Sinais do SMP;

Processo 53500.012923/2018-77 - Atualização dos Requisitos de Certificação do Reforçador de Sinais Interno para o SMP;

Ato nº 2.271, de 09 de fevereiro de 2022, que aprova os requisitos técnicos relativos à avaliação de conformidade técnica do produto "reforçador de sinais interno" (SEI nº 8026289);

Ato nº 944, de 08 de fevereiro de 2018, que aprova os requisitos técnicos para avaliação da conformidade de transmissores e transceptores de estações rádio base e de estações repetidoras (SEI nº 2400004); 

Regulamento de Uso do Espectro de Radiofrequências, aprovado pela Resolução nº 671, de 3 de novembro de 2016;

Regulamento do Serviço Limitado Privado, aprovado pela Resoluçãonº 617, de 19 de junho de 2013;

Projeto de Revisão do Regulamento de Uso do Espectro (RUE) - Processo nº 53500.012178/2019-47.

ANÁLISE

Escopo

Trata-se de proposta de projeto de ambiente regulatório experimental (sandbox) com o objetivo de atender às recorrentes demandas de prefeituras no sentido de prover cobertura do Serviço Móvel Pessoal - SMP em localidades ainda não cobertas pelas prestadoras que detêm as autorizações de uso de radiofrequências destinadas a este serviço.

 

Contexto

É notório que o Serviço Móvel Pessoal (SMP) vem assumindo um papel cada vez mais protagonista na vida do cidadão brasileiro. Com a massificação dos portáteis conectados e a evolução das redes móveis, hoje, é possível usufruir de uma extensa gama de serviços e de aplicações diretamente de um smartphone. Isso contribui para a evidente migração dos serviços de telefonia fixa para a telefonia móvel, tornando cada vez mais importante a existência de uma rede capaz de prover toda a capacidade e cobertura para atender a essa demanda.

Um dos fatores que evidencia a importância do serviço é o constante envio de pedidos de prefeituras e cidadãos para que seja ampliada a cobertura do serviço em localidades com deficiência ou ausência de sinal do serviço. O SMP, por se tratar de um serviço prestado em regime privado, não possui obrigações de universalização, tendo a prestadora, via de regra, liberdade para direcionar sua oferta de acordo com seu modelo de negócios. Tendo em vista a já mencionada importância do serviço para a sociedade, a Anatel se utiliza de ferramentas de execução de políticas públicas para que o serviço também seja prestado em localidades com menor atratividade econômica, entre elas, os compromissos de cobertura previstos nos Editais de Licitação para autorização de uso das radiofrequências necessárias à prestação do SMP e de outros serviços de telecomunicações por meios não confinados. Trata-se de grande desafio, visto ser o Brasil um país de dimensões continentais com uma população de mais 200 milhões e, a despeito dos esforços empreendidos pela Agência no cumprimento dessas políticas, ainda há uma grande demanda pela ampliação da cobertura do serviço.

Exemplo mais recente desta estratégia é o Edital de Licitação nº 1/2021-SOR/SPR/CD-Anatel (conhecido como "Edital 5G"), realizado pela Anatel no final de 2021 para autorização de uso de radiofrequências nas faixas de 700 MHz, 2,3 GHz, 3,5 GHz e 26 GHz para uso associado à prestação do SMP. O referido Edital estabeleceu obrigações de investimentos na ordem de dezenas de bilhões de Reais, seguindo a política pública estabelecida. A seguir resume-se as obrigações estabelecidas naquele certame, a título de exemplo das iniciativas recentes da Agência em prol da ampliação da cobertura das redes móveis de novas gerações.

Por outro lado, ainda que as obrigações estabelecidas nos supracitado Edital de Licitação tenham sido direcionadas, há uma vasta quantidade de localidades ainda sem cobertura pelo SMP e é fato que ainda existirão localidades com necessidade de atuação regulatória pela Agência mesmo após o cumprimento destas obrigações. Ainda, em virtude da necessidade de racionalização dos investimentos e do emprego dos recursos necessários, tais obrigações possuem um cronograma de execução que se estende até cerca de oito anos após a realização daquele certame. Isto também torna necessária a discussão de alternativas ao atendimento das demandas da sociedade de maneira mais célere, mesmo que haja obrigação de cobertura daquelas localidades no médio prazo.

Nesse contexto, o uso de equipamentos do tipo "Repetidor de Radiofrequências" e "Reforçador de Sinais Interno" tornou-se cada vez mais comum, especialmente o último por se tratar de equipamento de custo reduzido e encontrado com certa facilidade no mercado brasileiro, o que gerou um aumento nos casos de interferências causadas por este tipo de equipamento. Esta situação levou a Anatel a estabelecer um Plano de Ação para controlar o uso clandestino de reforçadores de sinais do SMP (detalhes e histórico das medidas podem ser encontrados no Processo nº 53500.210250/2015-76), que incluiu a revisão dos requisitos de certificação do Reforçador de Sinais Interno para o SMP (Processo 53500.012923/2018-77), de forma a torná-lo um equipamento mais robusto e com menor potencial de interferência nas redes.

O uso clandestino destes equipamentos ocorre por se tratarem de equipamentos cuja instalação e operação carecem de autorização de uso de radiofrequências vinculada à uma outorga de serviço de telecomunicações. A LGT estabelece apenas duas hipóteses para a dispensa de outorga de uso de radiofrequência: o uso de radiofrequência por meio de equipamentos de radiação restrita e o uso, pelas Forças Armadas, de radiofrequências nas faixas destinadas a fins exclusivamente militares (art. 163, §2º). Como atualmente tais equipamentos não são classificados como "de radiação restrita", o seu uso e instalação são prerrogativas exclusivas das prestadoras de serviços de telecomunicações. No caso das autorizações de uso de radiofrequências associadas ao SMP, estas são conferidas em caráter primário, por meio de licitações promovidas pela Agência, por meio das quais são estabelecidos os valores e compromissos como contrapartidas. Naturalmente, tais valores e compromissos são incompatíveis com interessados em apenas sanar um pequeno problema de cobertura em determinada localidade, sendo inviável que sejam autorizados em caráter primário por meio de procedimento licitatório.

O cenário fático que se pretende estabelecer é uma solução regulatória para o que segue:

Uma determinada localidade não tem cobertura do SMP;

Uma entidade tem disponibilidade financeira e técnica para arcar com os custos associados à instalação da infraestrutura necessária à prestação do SMP;

 Mesmo após solicitações, uma ou mais prestadoras do SMP não estão dispostas a instalar infraestrutura necessária para a prestação do serviço.

Hoje, a resposta regulatória é que não é possível que esta entidade estenda a rede da(s) prestadora(s) de SMP para a localidade não coberta sem acordo entre as partes.

Superado o obstáculo do acordo e após a instalação, os clientes da prestadora de SMP se conectariam ao equipamento e, consequentemente, à rede da prestadora. Esta prestação de SMP aos clientes que não tinham cobertura do serviço ocorre de forma transparente para o usuário, sem a identificação da entidade que interveio com a infraestrutura física e, portanto, por meio de uma intervenção de um terceiro, o serviço de telecomunicações é prestado para o usuário final.

Como forma alternativa de atender à esta demanda, o Regulamento de Uso do Espectro de Radiofrequências (RUE) prevê que, antes do início da utilização efetiva das radiofrequências autorizadas em caráter primário, poderá ser autorizado o uso de radiofrequências, faixa ou canal de radiofrequências em caráter secundário, a título oneroso:

Art. 19. Antes do início da utilização efetiva das radiofrequências autorizadas em caráter primário, poderá ser autorizado o uso de radiofrequências, faixa ou canal de radiofrequências em caráter secundário, a título oneroso, salvo quando houver vedação prevista no regulamento de condições de uso da faixa de radiofrequências ou no instrumento licitatório, observadas as condições estabelecidas nos parágrafos seguintes.

§ 1º A autorização prevista no caput deste artigo é condicionada ao pagamento do preço público pelo direito de uso de radiofrequências, conforme estabelecido no Capítulo IV deste Título III.

§ 2º Nas áreas onde houver titular de autorização de radiofrequências em caráter primário com compromissos de cobertura, somente será autorizado o uso de radiofrequência em caráter secundário aos interessados mediante prévio acordo do titular da autorização em caráter primário.

§ 3º Nas áreas onde houver titular de autorização de radiofrequências em caráter primário sem compromissos de cobertura, poderá ser autorizado o uso de radiofrequência em caráter secundário aos interessados mediante prévia notificação de suas intenções ao titular de autorização em caráter primário.

§ 4º Transcorridos 90 (noventa) dias da notificação referida no § 3º e não havendo resposta do titular de autorização em caráter primário ou a resposta não contiver prazo específico para início da utilização efetiva das radiofrequências, pode ser autorizado o uso de radiofrequências em caráter secundário pelo prazo máximo definido neste Regulamento.

§ 5º Havendo resposta do titular de autorização em caráter primário no prazo de 90 (noventa) dias da notificação referida no § 3º, especificando a data de início da utilização efetiva das radiofrequências, fica este obrigado a informar à Anatel e atender, na data prevista, a área objeto da solicitação nas faixas de radiofrequências em questão.

§ 6º Na hipótese prevista no § 5º, o uso de radiofrequência em caráter secundário pode ser autorizado até a data de início da utilização efetiva das radiofrequências informada, ou pelo prazo máximo definido neste Regulamento quando verificado que não há limitação técnica para utilização da radiofrequência por ambos.

§ 7º Na hipótese a que se refere o § 4º, o titular da autorização em caráter primário que decida utilizar radiofrequência já utilizada por autorizado em caráter secundário na mesma área deve negociar as condições de uso compartilhado das radiofrequências antes do uso da respectiva radiofrequência, nas condições estabelecidas no art.14.

§ 8º Na hipótese das negociações a que se refere o § 7º não resultarem em acordo, o titular da autorização de uso de radiofrequências em caráter primário informará à Anatel o prazo, não inferior a 6 (seis) meses, para o início da utilização em caráter primário, sem prejuízo do disposto no art. 45, ficando o titular da autorização de uso de radiofrequências em caráter primário obrigado a, nesse mesmo prazo, atender a área objeto da negativa de acordo nas faixas de radiofrequências em questão.

§ 9º É assegurado ao titular de autorização em caráter secundário o direito de usar as radiofrequências até o início da efetiva utilização pelo titular da autorização em caráter primário.

§ 10. Nas hipóteses previstas nos §§ 5º e 8º, fica a titular da autorização em caráter primário obrigada a encaminhar à Anatel, até o dia 31 de janeiro de cada ano, documentação que comprove as entradas em operação realizadas no ano anterior, contendo, no mínimo, indicação das radiofrequências utilizadas, localidade, Estação(ões) Rádio Base utilizada(s), conforme licenciamento junto à Agência, e relatório de tráfego da(s) mesma(s).

Conforme expresso acima, o Regulamento permite que seja feito o uso em caráter secundário por terceiros, nas localidades onde a autorizada em primário ainda não faz uso das radiofrequências, devendo haver acordo prévio entre a interessada e a autorizada em primário, nas localidades com compromissos de cobertura e notificação prévia nas localidades sem compromissos. No entanto, cumpre destacar que, apesar de as autorizações em caráter secundário possuírem um custo bem inferior para sua obtenção, a carga regulatória associada à prestação do SMP e a necessidade de acordo prévio talvez tenham pesado para que houvesse interessados na adoção deste modelo. 

O que de fato ocorre é que as demandas persistem e, em um esforço de solucionar a questão, iniciou-se a reflexão de formas de revisar a regulamentação com o intuito de viabilizar o uso destes equipamentos de maneira coerente com as diretrizes legais. A forma mais simples de sanar parte do problema seria, em uma primeira análise, a classificação do reforçador de sinais interno como equipamento de radiação restrita, tendo em vista que ele é de uso interno e que passou por recente revisão de seus requisitos tornando-o um equipamento com menor potencial de gerar interferências, o que acaba por gerar um cenário favorável para a análise quanto à sua elegibilidade para ser classificado como equipamento de radiação restrita. Vale ressaltar que esta análise deve ser criteriosa, uma vez que quando um equipamento é classificado como de radiação restrita, seu uso poderá ser feito pela população em geral e, por se tratarem de faixas associadas ao SMP, há de se avaliar o risco que esse novo cenário traria no que se refere à incidência de casos de interferência em um serviço da importância do SMP. De qualquer forma, esta solução não atenderia por completo as demandas, posto que, em várias, delas necessita-se do uso externo do equipamento para prover a cobertura de uma localidade maior. Neste caso, seria preciso utilizar o Repetidor de Radiofrequências, cujo uso é permitido para ambientes externos, embora apresente maior potencial de interferências quando operado de forma inapropriada, sendo um equipamento que pode operar em potências maiores, de forma similar a uma Estação Rádio Base (ERB) tradicional.

Diante disso, aventou-se a possibilidade de, experimentalmente, flexibilizar a regulamentação para viabilizar o atendimento às demandas apresentadas pelas prefeituras que, por se tratarem das entidades administrativas locais, conhecem com maior detalhe os anseios da população e as principais deficiências do serviço na localidade. Isso poderia ser feito impondo menos condicionamentos para a obtenção da autorização de uso de radiofrequências em caráter secundário, associada a um serviço com baixa carga regulatória.

A proposta alinha-se bastante ao que tem se chamado no cenário regulatório de sandbox. O sandbox nada mais é do que um ambiente regulatório experimental onde o regulador permite, de maneira controlada, a isenção do cumprimento de determinadas obrigações regulatórias em prol de que se teste modelos de negócio inovadores.

Na Anatel o ambiente regulatório experimental (sandbox) está sendo estruturado na iniciativa nº 2 da Agenda Regulatória 2023-2024, aprovada pela Resolução Interna nº 182, de 30 de dezembro de 2022, sobre a simplificação dos serviços de telecomunicações e de sua regulamentação. Nos autos do processo nº 53500.059638/2017-39 estudou-se esta questão em um dos temas do Relatório de AIR SEI nº 6703169. O subtema 2.11 tratou especificamente sobre o sandbox regulatório, estabelecendo como problema o fato de que, "no cenário regulatório atual uma empresa que deseje testar um modelo de negócio que não se encaixe totalmente na regulação dos serviços coletivos não possui alternativas que possibilitem uma oferta inicial desses modelos de negócio em condições comerciais próximas à realidade". Como alternativa sugerida optou-se por "estabelecer o sandbox em ato do Conselho Diretor e realizar sua operacionalização por meio de quaisquer serviços já existentes, com dispensa de condições regulamentares específicas" (alternativa F). Tal alternativa foi refletida nas minutas regulamentares submetidas à Consulta Pública nº 41, de 6 de junho de 2022, cujas contribuições foram analisadas pela área técnica e atualmente aguardam parecer da Procuradoria Federal Especializada junto à Agência.

Ocorre que tal proposta normativa visa institucionalizar o sandbox regulatório na regulamentação e consequentemente na cultura da regulação do setor de telecomunicações. Entretanto, é possível que projetos de sandbox sejam aprovados pelo Conselho Diretor mesmo antes da aprovação final daquele projeto, uma vez que as ações necessárias para sua implementação encontram-se nas competências do Conselho Diretor da Agência (como, por exemplo, a isenção do cumprimento de determinadas obrigações normativas da Agência em contexto bem delimitados).

A esse respeito, cabe destacar o art. 133 do Regimento Interno da Anatel, aprovado pela Resolução nº 612, de 29 de abril de 2023. O mencionado artigo estabelece as competências do Conselho Diretor da Agência e, entre essas competências, pode-se ressaltar aquelas prescritas nos incisos V e XXXIII, transcritos abaixo:

“Art. 133. São competências do Conselho Diretor, sem prejuízo de outras previstas na Lei nº 9.472/1997, no Regulamento da Agência e na legislação aplicável:

(...)

V – exercer o poder normativo da Agência relativamente às telecomunicações, nos termos do art. 17 do Regulamento da Agência;

(...)

XXXIII – decidir, em último grau, sobre as matérias da Agência;”

Conforme observado nos incisos previamente destacados, no que tange às questões relativas à regulamentação das telecomunicações no Brasil, em última instância, compete ao Conselho Diretor decidir.

Somam-se às competências estabelecidos no Regimento Interno da Anatel aquelas estabelecidas no Regulamento da Agência Nacional de Telecomunicações, aprovado pelo Decreto nº 2.338, de 7 de outubro de 1997. Entre as competências do Conselho Diretor descritas no Regulamento da Agência, merecem destaque aquelas previstas no art. 17, incisos XIV, XVIII, XXIV e XXXVI, abaixo transcritos:

Art. 17. No exercício de seu poder normativo relativamente às telecomunicações, caberá à Agência disciplinar, entre outros aspectos, a outorga, prestação, a comercialização e o uso dos serviços, a implantação e o funcionamento das redes, a utilização dos recursos de órbita e espectro de radiofrequências, bem como:

(...)

XIV - expedir regras quanto à prestação dos serviços no regime privado, incluindo a definição dos condicionamentos a que estão sujeitos os prestadores em geral e em especial os de serviço de interesse coletivo;

(...)

XVIII - regulamentar os compromissos exigíveis dos interessados na obtenção de autorização de serviço, em proveito da coletividade;

(...)

XXIV - determinar os casos e condições em que as redes destinadas à prestação de serviço em regime privado serão dispensadas das normas gerais sobre implantação e funcionamento de redes de telecomunicações;

(...)

XXXVI - regulamentar a autorização para uso de radiofrequência, com a determinação dos casos em que será dispensável;

Os mencionados incisos estabelecem que compete ao Conselho Diretor estabelecer os condicionamentos referentes a casos especiais, em que as diretrizes regulatórias de âmbito geral podem ser excetuadas.

Assim, ao conferir ao órgão máximo da Agência a competência para estabelecer condicionamentos que diferem das normas gerais, a fim de atender casos especiais, o Regulamento da Agência deixa claro o reconhecimento da necessidade de uma abordagem flexível e adaptativa diante de situações singulares e excepcionais que possam surgir no setor de telecomunicações.

A flexibilidade dessa abordagem se torna imprescindível no mercado de telecomunicações, uma vez que é impraticável antecipar, por meio da regulamentação, todas as possibilidades e modelos de negócio que podem emergir em um ambiente tão dinâmico.

Nesse sentido, o presente projeto piloto de ambiente regulatório experimental prevê a flexibilização de normas de caráter geral, a fim de possibilitar que sejam testados modelos de negócio inovadores, que não estão totalmente aderentes à regulamentação em vigor, dentro de um ambiente controlado e com regras próprias definidas pelo Conselho Diretor da Agência. Os resultados dos testes podem subsidiar eventuais modificações regulatórias com o intuito de atualizar o arcabouço regulatório das telecomunicações no Brasil.

Assim, entendeu esta área técnica que a questão do uso de equipamentos do tipo "Repetidor de Radiofrequências" e "Reforçador de Sinais Interno" enquadrar-se-ia nos conceitos afetos ao sandbox regulatório, sendo inclusive interessante como piloto a fim de testar o modelo apresentado naquela proposta normativa.

Dito isso, há que se discutir os dois aspectos regulamentares citados anteriormente que são importantes para a viabilização do uso de tais equipamentos pelos agentes citados (prefeituras): (i) a autorização de uso das radiofrequências associadas em caráter secundário; e (ii) o serviço de telecomunicações associado.

Quanto ao aspecto (i), é importante se ater ao que prevê o RUE, especificamente nos §§ 2º e 3º de seu artigo 19. Há basicamente duas situações ali previstas: (a) quando há autorização em caráter primário com compromissos de cobertura, somente será autorizado o uso de radiofrequência em caráter secundário aos interessados mediante prévio acordo do titular da autorização em caráter primário; ou (b) quando há autorização em caráter primário sem compromissos de cobertura, poderá ser autorizado o uso de radiofrequência em caráter secundário aos interessados mediante prévia notificação de suas intenções ao titular de autorização em caráter primário.

No caso específico da presente proposta, considerando que os equipamentos citados podem operar em diversas faixas de frequência associadas ao SMP e também que seu uso poderá ocorrer em localidades em situações diversas, é importante dispensar o referido acordo com os titulares das autorizações em caráter primário das respectivas faixas de radiofrequências, para que a Agência possa emitir sua autorização de uso a estes novos agentes em caráter secundário. Tal dispensa é importante, pois o referido acordo pode se tornar uma barreira regulatória ao uso desses equipamentos que se pretende realizar no presente projeto regulatório experimental. Por outro lado, não se vislumbra riscos substanciais de interferência no serviço de interesse coletivo (o SMP) uma vez que essas autorizações acontecerão de maneira controlada e limitada geograficamente, como se desenhará mais adiante na proposta em tela. Ainda, a notificação prevista no § 3º do artigo 19 do RUE deverá ser substituída pela notificação pela Anatel à prestadora autorizada em caráter primário, em todos as situações autorizadas, permitindo que os agentes envolvidos, incluindo a Anatel, atuem de maneira célere e eficiente em eventuais interferências que possam vir a acontecer (ainda que, como já dito, vislumbre-se um baixíssimo risco de ocorrência destes eventos).

Quanto ao aspecto (ii), o serviço que mais se adequa à finalidade pretendida é o Serviço Limitado Privado, que é caracterizado por ser um "serviço de telecomunicações, de interesse restrito, explorado em âmbito nacional e internacional, no regime privado, destinado ao uso do próprio executante ou prestado a determinados grupos de usuários, selecionados pela prestadora mediante critérios por ela estabelecidos, e que abrange múltiplas aplicações, dentre elas comunicação de dados, de sinais de vídeo e áudio, de voz e de texto, bem como captação e transmissão de Dados Científicos relacionados à Exploração da Terra por Satélite, Auxílio à Meteorologia, Meteorologia por Satélite, Operação Espacial e Pesquisa Espacial".

Trata-se de prestação de um serviço com uma finalidade bem específica de complementar uma ausência de cobertura pela prestadora do SMP. Neste caso, a atividade de telecomunicações autorizada seria a de prover e operar a infraestrutura adequada para ampliar a cobertura do sinal do SMP. Ou seja, a prefeitura coopera na ampliação da cobertura e não na prestação do SMP em si. Frisa-se, que o referido arranjo não caracteriza interconexão, por se tratar de mera extensão da rede da prestadora SMP, viabilizada por infraestrutura de terceiro.

Cabe destacar, ainda, que as estações móveis já estão licenciadas sob a outorga do SMP, conferida ao titular da autorização de uso de radiofrequências em caráter primário, não havendo motivo técnico para justificar um novo licenciamento destas estações.

Em suma, em um novo cenário regulatório experimental, a prefeitura municipal estaria apta a obter uma autorização de uso de radiofrequências em caráter secundário associada a uma outorga do Serviço Limitado Privado (SLP) em localidade específica onde haja deficiência de cobertura. Neste contexto, a prefeitura seria a responsável por licenciar as estações, assim como se responsabilizar pela operação do equipamento. Julga-se adequado que as localidades sejam aquelas fora do distrito-sede de cada município, no qual as prestadoras já têm maior compromisso de cobertura. Isso porque, dado o caráter experimental da medida, considera-se que a Agência deve proceder com cautela, sendo priorizadas localidades com menor potencial de interferência, visto que a operação e responsabilização pelas estações não será das prestadoras tradicionais do SMP, apesar de que, para o usuário final, é transparente a prestação do SMP concomitante com a existência de um SLP de um terceiro na mesma faixa de frequências. Em que pese o interesse da prefeitura na cobertura do SMP, em nenhum momento o usuário final percebe a sua atuação no atendimento do usuário do SMP.

Uma vez que não é possível identificar a intervenção da prefeitura para o usuário do SMP e a prestação de infraestrutura ocorre em favor do prestador de SMP, a prefeitura não poderá exigir da prestadora do SMP os valores gastos pela instalação da infraestrutura. Isto não impede, posteriormente, de a prestadora adquirir da prefeitura os equipamentos para incorporar a sua rede.

Vale destacar que à prestadora do SMP envolvida não poderão ser atribuídos eventuais impactos nos parâmetros de qualidade do serviço prestado. Como é sabido, do ponto de vista da engenharia, a utilização de destes equipamentos não é a mais recomendada para preservar elevados índices de qualidade. Isso porque a rede do SMP é projetada para uma determinada quantidade de usuários e o uso deste tipo de equipamento possui potencial para sobreutilizar a ERB à qual o reforçador ou repetidor estará associado.

Por fim, em linha com as premissas apresentadas acima para os itens (i) e (ii), é importante delimitar também os agentes elegíveis para o uso de tais equipamentos, bem como as áreas geográficas possíveis e o prazo do referido experimento, além das obrigações associadas.

Proposta

 Por todo o exposto, propõe-se que, especificamente para demandas de complementação de cobertura apresentadas por prefeituras municipais:

seja admitida a exploração do SLP como a atividade de telecomunicações destinada a ampliar a cobertura do SMP;

o SLP seja associado à autorização de uso das respectivas radiofrequências em caráter secundário;

em substituição ao que estabelece o art. 19 do RUE, seja aplicado o procedimento a seguir:

quando da solicitação de autorização de uso de radiofrequência em caráter secundário, a Anatel notificará a prestadora do SMP responsável pela rede à qual os Repetidores e reforçadores internos estarão associados;

na hipótese de a prestadora do SMP decidir licenciar estação própria para cobertura da área atendida pelo equipamento da Prefeitura, a prestadora deve informar a Prefeitura com pelo menos 15 dias de antecedência, para que desative a estação;

os parâmetros de qualidade impactados pela instalação dos equipamentos previstos neste Ambiente Regulatório Experimental não sejam considerados para o cálculo dos indicadores de qualidade da prestadora afetada.

os equipamentos Reforçadores de Sinais Internos utilizados nos moldes deste Ambiente Regulatório Experimental estejam sujeitos aos Requisitos técnicos para certificação e homologação de Reforçador de Sinais Interno para o SMP, aprovados pelo Ato nº 2.271, de 09 de fevereiro de 2022;

as prefeituras prestem à Anatel as informações referentes ao uso de tais equipamentos previamente ao início de seu uso;

a prestadora do SMP possa se manifestar quanto aos aspectos técnicos associados à instalação e operação de Repetidores e Reforçadores Internos, e que tal manifestação poderá ser utilizada pela Agência para impor condicionamentos à operação destes equipamentos ou, até mesmo, determinar a interrupção de sua operação;

na ocorrência de qualquer evidência de interferência provocada pelos equipamentos utilizados, a Anatel possa solicitar adequações ou determinar o imediato desligamento destes;

em substituição aos arts. 46 e 47 do RUE, seja estabelecido prazo máximo de 5 anos para a autorização de uso de radiofrequências, admitida sua prorrogação, desde que solicitada com antecedência mínima de 3 meses;

após este prazo a Agência possa avaliar os resultados do experimento e propor a solução regulatória definitiva para a questão.

A forma de operacionalizar a medida se daria por meio de aprovação, pelo Conselho Diretor da Anatel, de Ato que aprova o projeto piloto de Ambiente Regulatório Experimental (sandbox regulatório), nos termos do documento SEI nº 10698752.

DOCUMENTOS RELACIONADOS/ANEXOS

Minuta de Ato -  Projeto piloto de Ambiente Regulatório Experimental - Uso De Repetidor De Radiofrequências E Reforçador De Sinais Interno Por Prefeituras Municipais  (SEI nº 10698752

CONCLUSÃO

Encaminha-se a presente proposta ao Conselho Diretor da Anatel para análise e deliberação.


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Documento assinado eletronicamente por Nilo Pasquali, Superintendente de Planejamento e Regulamentação, em 16/08/2023, às 16:49, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 23, inciso II, da Portaria nº 912/2017 da Anatel.


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Documento assinado eletronicamente por Vinicius Oliveira Caram Guimarães, Superintendente de Outorga e Recursos à Prestação, em 17/08/2023, às 13:05, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 23, inciso II, da Portaria nº 912/2017 da Anatel.


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Documento assinado eletronicamente por Eduardo Marques da Costa Jacomassi, Gerente de Universalização e Ampliação do Acesso, em 18/08/2023, às 08:55, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 23, inciso II, da Portaria nº 912/2017 da Anatel.


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Documento assinado eletronicamente por Hermano Barros Tercius, Superintendente de Fiscalização, em 18/08/2023, às 15:32, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 23, inciso II, da Portaria nº 912/2017 da Anatel.


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Documento assinado eletronicamente por Felipe Roberto de Lima, Gerente de Regulamentação, em 21/08/2023, às 14:35, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 23, inciso II, da Portaria nº 912/2017 da Anatel.


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A autenticidade deste documento pode ser conferida em http://www.anatel.gov.br/autenticidade, informando o código verificador 10298034 e o código CRC B122937E.




Referência: Processo nº 53500.043082/2023-15 SEI nº 10298034