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Voto nº 127/2018/SEI/PR

Processo nº 53500.205186/2015-10

Interessado: Agência Nacional de Telecomunicações

CONSELHEIRO

LEONARDO EULER DE MORAIS

ASSUNTO

Proposta de Consulta Pública do Regulamento de Fiscalização Regulatória, referente à reavaliação dos procedimentos de acompanhamento e controle de obrigações, previstos no art. 79 do Regimento Interno da Anatel, aprovado pela Resolução nº 612/2013.

EMENTA

SUPERINTENDÊNCIA DE PLANEJAMENTO E REGULAMENTAÇÃO (SPR). PROPOSTA DE CONSULTA PÚBLICA. REGULAMENTO DE FISCALIZAÇÃO REGULATÓRIA. REAVALIAÇÃO DOS PROCEDIMENTOS DE ACOMPANHAMENTO E CONTROLE DE OBRIGAÇÕES. alterações rasa 2012. metodologia de gestão de riscos. obrigação de fazer vinculada ao pert. termo de conformidade. projetos pilotos. Modelo de Projeto Prioritário de Enforcement da ANAC. correspondência sinditelebrasil.

A proposta apresentada apenas se dirigirá à realização de alterações no RASA/2012 na medida em que sejam elas diretamente associadas aos objetivos da Fiscalização Regulatória.

Os objetivos e os princípios da Fiscalização Regulatória, dentre os quais se destaca o da responsividade, devem permear a regulamentação da Agência como um todo. Isso pode se dar com a formulação de metas e obrigações que efetivamente disponham de mecanismos mais inteligentes, que ultrapassem o simples binômio “cumprimento/ausência de sanção e descumprimento/sanção.

A metodologia de gestão de riscos a ser elaborada para aplicação no processo de Fiscalização Regulatória deve necessariamente observar a de gestão de riscos institucional, em fase de elaboração pelo Comitê de Gestão de Riscos.

Indicação expressa no RASA quanto ao privilégio a ser dado aos projetos que atendam as necessidades estruturantes previstas no Plano Estrutural de Redes de Telecomunicações – PERT, uma vez que se opte pela imposição de sanção de obrigação de fazer. 

Além das melhorias na parte processual do processo punitivo, é inevitável que a Agência empreenda esforços na alteração da sua própria regulamentação. Afinal, embora os problemas da regulação sejam potencializados pelo enforcement punitivo (e vice-versa), toda a teoria regulatória apresentada demonstra que as normas devem ter na origem um viés de atendimento de conformidade. Dentro dessa premissa,  mostra-se necessário alterar  pontualmente alguns dispositivos do RASA/12.

O Termo de Conformidade seria um instrumento pelo qual o administrado apresente voluntariamente à Agência, a qualquer tempo, compromisso de demonstrar em prazo determinado o cumprimento de obrigações, na qual aponte de forma clara o objetivo final de conformidade a ser aferido (arts. 47 e 48 do RFR constante da Minuta anexa ao presente Voto).

Dentre os projetos pilotos em curso nas áreas técnicas da Agência, destaca-se aquele conduzido pela SRC que, por seus resultados, deve constituir relevante fonte de insumos para a reflexão sobre a proposta de RFR.

A  identificação de que uma determinada proposta regulatória se alinha com outras práticas bem sucedidas tem grande relevo para a própria admissibilidade da sugestão de alteração da prática vigente. Traçados bons paralelos pode se reconhecer um sólido modelo para o desenvolvimento de uma nova etapa de regulação, motivo pelo qual se apresenta o Modelo de Projeto Prioritário de Enforcement da ANAC, o qual busca meios para o exercício de sua atividade de fiscalização e penalização.

Quanto à correspondência SEI 3587940, na qual o Sinditelebrasil apresenta sugestões de aprimoramento à proposta em discussão, entende-se adequado, por sua abrangência e expressividade de conteúdo, que se determine à SPR que a examine no bojo da Consulta Pública a ser realizada.

REFERÊNCIA

Análise nº 97/2018/SEI/AD (SEI 2659033).

RELATÓRIO

DOS FATOS

Por meio da Matéria para Apreciação do Conselho Diretor (MACD) nº 523/2016 (SEI 0925934), veio à apreciação deste Colegiado proposta de Consulta Pública de Regulamento de Fiscalização Regulatória. Sua relatoria se deu nos termos da Análise nº 97/2018/SEI/AD (SEI 2659033), no âmbito da 851ª Reunião do Conselho Diretor (RCD), realizada em 17/5/2018, ocasião em que solicitei vista dos autos.

Cuida o presente Voto da Matéria para Apreciação do Conselho Diretor (MACD) nº 523/2016 (SEI 0925934), de 31/10/2016, pela qual se encaminhou proposta de Consulta Pública de Regulamento de Fiscalização Regulatória (RFR) a este Colegiado.

A proposta foi objeto de relatoria apresentada pelo Conselheiro Anibal Diniz, nos termos da Análise nº 97/2018/SEI/AD (SEI 2659033) e seus anexos, na 851ª Reunião do Conselho Diretor (RCD), realizada em 17/5/2018, ocasião em que solicitei vista dos autos.

A partir de então foram realizadas pelo Gabinete diversas reuniões com representantes das Superintendências de Planejamento e Regulamentação (SPR), Outorga e Recursos à Prestação (SOR), de Fiscalização (SFI), de Controle de Obrigações (SCO) e de Relações com Consumidores (SRC). Além disso, o tema foi tratado em reuniões com a Procuradoria Federal Especializada da Agência (PFE-Anatel), representantes de prestadoras e interlocutores do meio acadêmico.

Sobreveio, em 06/06/2018, a aprovação, pela Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) da Res. nº 472/2018, que estabelece providências administrativas decorrentes do exercício das atividades de fiscalização. Esse instrumento regulatório de fôlego, por tratar de temática regulatória similar àquela tratada nos presentes autos, mereceu igualmente exame e foi objeto de encontros com representantes da referida Agência.

As reflexões que foram suscitadas a partir de todas essas reuniões, encontros e estudos, bem como a construção interna da convicção a respeito da proposta, apontaram para a necessidade de instrução adicional acerca de determinados aspectos indispensáveis para a formação de manifestação final.

Por tal razão, nos termos do Voto nº 19/2018/SEI/LM (SEI 3400520), foi apresentada proposta de conversão da deliberação em diligência à SPR, em conjunto com as demais Superintendências. A aprovação da referida proposta ocorreu na 860ª RCD, realizada em 25/10/2018. A diligência foi atendida nos termos do Informe nº 131/2018/SEI/PRRE/SPR (SEI 3441224). Em 16/11/2018, os autos foram reencaminhados para apreciação.

Na sequência, em 7/12/2018, o Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (Sinditelebrasil), apresentou correspondência nos autos (SEI 3587940), na qual apresenta sugestões de aprimoramento à proposta do Conselheiro Relator.

Ao encerrar o relato, e antes que se passe à apresentação de Voto próprio na deliberação, cumpre reconhecer a qualidade e a relevância da Análise apresentada pelo Conselheiro Relator Anibal Diniz. As considerações tecidas em sede de relatoria, além de aprofundarem as razões pelas quais esta Agência deve alterar sua atuação, incorporam fundamentos teóricos e endereçam propostas que constituem avanço em relação à visão e ao texto originalmente construídos pela área técnica.

Nesse contexto, concorda-se com a motivação contida na Análise nº 97/2018/SEI/AD (SEI 2659033). A divergência oferecida volta-se, portanto, ao texto regulamentar proposto.

No mais, cumpre registrar a relevante contribuição apresentada pelo Gabinete do Conselheiro Emmanoel Campelo no que tange à disciplina da sanção correspondente à obrigação de fazer. As ponderações, acolhidas no presente Voto, endereçam contribuem significativamente para melhoria da qualidade das respostas regulatórias a descumprimentos.

Dito isso, a exposição da presente proposta segue inicialmente pelas (i) premissas que orientaram sua formulação e que a motivam; em seguida são comentados (ii) pilares do RFR e (iii) alterações mais significativas em relação às propostas apresentadas até o presente momento; e (iv) insumos analisados como base para as aludidas alterações.

Primeira premissa: afastamento de temas afeitos exclusivamente à revisão do RASA/2012 e previsões procedimentais regimentais

Consta da Agenda Regulatória da Anatel, aprovada pela Portaria nº 1, de 2/1/2018, a previsão de reavaliação da regulamentação sobre aplicação de sanções administrativas (Item 34 do Anexo) com conclusão de Relatório de Análise de Impacto Regulatório (AIR) no segundo semestre de 2018. A mesma Agenda previa a aprovação final deste RFR para o segundo semestre de 2017.

A existência de previsões distintas, em uma determinada sequência temporal, não constituiu mera coincidência.

Há que se vislumbrar que as questões que motivaram o presente Projeto são, em sua maioria, distintas daquelas relacionadas exclusivamente à revisão da pura regulamentação das sanções administrativas.

A problemática deste projeto, desde sua AIR, girou em torno de dois eixos: a) efetividade das atividades de monitoramento, acompanhamento, inspeção e controle; e b) a necessidade de integração dessas atividades. A revisão de aspectos puramente sancionatórios, por outro lado, não foi, até então, explorada em seu âmbito.

A separação de conteúdo entre o Projeto Fiscalização Regulatória e a revisão do Regulamento de Aplicação de Sanções Administrativas (RASA), aprovado pela Res. nº 589/2012, impede que o tratamento de determinados temas possa transitar livremente entre os dois processos.

É ilustrativo resgatar que esse entendimento se fez presente em decisão deste Colegiado, em sua 831ª RCD, realizada em 14/8/2017. Naquela ocasião, em debate acerca de Recurso Administrativo interposto no Pado nº 53528.000040/2006-72, foi suscitada pelo Conselheiro Aníbal Diniz que havia contradição entre os artigos 39, §3º, e 41 do RASA, e para solucionar esse problema, sugeriu a inclusão de proposta de alteração do item 34 da Agenda Regulatória 2017/2018, a fim de que seja priorizada a reavaliação do RASA. Os dispositivos citados versam sobre as metodologias que devem orientar o cálculo do valor base das multas; a possibilidade de afastamento de metodologias à luz dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, e aplicação das disposições do RASA/2012 no tempo. Nos termos da Ata da referida RCD, quanto à proposta do Conselheiro Anibal Diniz relativa à reavaliação do RASA, o Conselho decidiu, por maioria de três votos, pautar o assunto em Reunião Técnica.

Vale observar que à época, o Projeto Fiscalização Regulatória já se encontrava no Conselho Diretor para deliberação. A despeito disso, nem a proposta formulada, nem a decisão do Colegiado, cogitaram no tratamento da temática no bojo do Projeto Fiscalização Regulatória. Já ali havia o reconhecimento de uma fronteira existente entre a revisão do RASA prevista na Agenda Regulatória e este Projeto.

A existência dessa divisão de conteúdos constitui diretriz do presente Voto. Logo, a proposta apresentada apenas se dirigirá à realização de alterações no RASA/2012 na medida em que sejam elas diretamente associadas aos objetivos da Fiscalização Regulatória. Dentre eles citam-se aqueles acima mencionados, já levantados em AIR; bem como outros, voltados à operacionalização de uma atuação mais responsiva por parte da Agência. Restam excluídos, portanto, aspectos puramente sancionatórios ou de criação de novas figuras processuais. Essas últimas encontram um foro de discussão mais adequado no procedimento de revisão do Regimento Interno da Anatel (RIA), aprovado pela Res. nº 612/2013, atualmente em curso.

Segunda premissa: endereçamento da concretização da atuação responsiva

As discussões em torno da alteração de paradigmas que a Fiscalização Regulatória pode trazer para a atuação da Anatel passaram, até o presente momento, por reflexões acerca do espaço de discricionariedade de que dispõe o órgão para instaurar procedimento sancionatório a partir da verificação de indícios de infração.

As principais variáveis levantadas são os (i) custos administrativos na condução de determinados procedimentos sancionatórios que apuram (ii) violações de baixo impacto na prestação dos serviços, com (iii) escassos resultados em sua melhoria; seja porque a falta já se encontre corrigida, seja por se tratar de descumprimento meramente formal, por exemplo.

A inquietação se faz presente tanto do lado da Administração Pública, que dispõe de recursos limitados para conduzir um número expressivo de persecuções sancionatórias, quanto do lado dos administrados, que arcam com os custos de responder a diversos procedimentos por condutas de pouco relevo para a prestação dos serviços. Em acréscimo, as sanções deles resultantes têm reflexos diretos nos procedimentos sancionatórios subsequentes, sob a forma de agravantes, nos termos previstos no RASA/12. Nota-se que o pano de fundo vem a ser o da efetividade da atuação sancionatória da Anatel, em sua capacidade de constituir um direcionador atuação dos agentes do setor.

Sob outro prisma, também se trata de ponderação acerca da aplicação dos princípios constitucionais da eficiência, e do confronto entre a economicidade do esforço administrativo e o resultado obtido à luz do interesse público; e também da proporcionalidade.

De plano, vislumbra-se que o objetivo final de uma desejada alteração de paradigma não pode ser simplificado em termos de um número maior ou menor de instaurações de Procedimentos para Apuração de Descumprimento de Obrigações (Pados), ou de um aumento ou queda nas sanções aplicadas (seja em cômputo de valores de multa ou de descumprimentos apenados). Afinal tais parâmetros podem flutuar em virtude de uma série de fatores como decisões procedimentais sobre instauração, conjunta ou não, de Pados por diferentes infrações e de metodologias de multas, por exemplo.

A Fiscalização Regulatória deve ter como objeto último a melhoria dos serviços prestados, que se pressupõe aferível por meio da aderência à regulamentação vigente, em uma primeira dimensão. Em um aspecto mais amplo ainda, a própria obediência à regulamentação vigente pode ser insuficiente para incentivar a melhoria dos serviços.

Isso significa que os objetivos e os princípios da Fiscalização Regulatória, dentre os quais se destaca o da responsividade, devem permear a regulamentação da Agência como um todo. Isso pode se dar com a formulação de metas e obrigações que efetivamente disponham de mecanismos mais inteligentes, que ultrapassem o simples binômio “cumprimento/ausência de sanção e descumprimento/sanção”. Esse tipo de atuação se encontra refletida, por exemplo, na proposta de novo Regulamento de Qualidade dos Serviços de Telecomunicações – RQUAL (autos nº 53500.006207/2015-16), já submetida a Consulta Pública e sobre qual serão feitas considerações em tópico próprio adiante.

A mudança de reação do Regulador diante de diferentes condutas de um determinado Regulado ao longo do tempo por si só não corresponde a uma atuação responsiva. Tal variação é comum e já se verifica inclusive no RASA/2012, pelo qual a intensidade no sancionamento de reincidentes ou detentores de antecedentes deve ser agravada, por exemplo. Por outro lado, a criação de uma modelagem responsiva demanda alterações estruturais mais profundas em grande parte do arcabouço regulatório, vez que ela pressupõe a existência de regimes jurídicos distintos voltados para comportamentos distintos dos Administrados, o que vai além das reações de controle individualizadas por condutas.

Assim, tendo em vista as possibilidades que se abriram com a discussão do tema nesta proposta de Regulamento, passa-se a um breve exercício acerca dos impactos de diferentes cenários relativos à construção de espaços de flexibilidade para respostas atuações dos administrados que se mostrem desconformes com a regulamentação ou, sob um aspecto ainda mais amplo, contrários às premissas de melhoria dos serviços.

A primeira possibilidade (A) corresponderia à criação, no âmbito do RFR, de norma geral, genérica, que estabelecesse fase prévia de tolerância para qualquer obrigação prevista na regulamentação. Com isso, a caracterização da infração ou a instauração de Pado poderiam ser afastadas caso, dentro de um prazo previsto, o Administrado cessasse a conduta infratora e porventura cumprisse outros requisitos. Ou seja, a solução estaria associada alternativa ou cumulativamente a um determinado rito processual; ao mero decurso de prazo e adoção de medidas; à apresentação de plano de ação; a um juízo de risco da área técnica etc.

Os pontos positivos dessa possibilidade estariam em constituir uma solução abrangente em curto prazo, com uma ruptura na lógica de instauração automática de Pados. Por outro lado, a construção de um critério geral que se mostre razoável e constitua um denominador comum para milhares de obrigações distintas em natureza e relevância é significativa. A redução linear do enforcement levaria a uma baixa flexibilidade para adoção de respostas específicas, mais adequadas e proporcionais a cada conduta e à postura de cada Administrado. Essa fragilidade, ao final, se aproximaria dos problemas detectados no cenário atual, de respostas idênticas para padrões de atuação muito distintos.

A segunda possibilidade (B) corresponderia à criação, no âmbito do RFR, de norma genérica que fixe, como atribuição dos Superintendentes, o estabelecimento de rol de respostas regulatórias aos descumprimentos das obrigações priorizadas para cada ciclo de fiscalização. Essas respostas poderiam variar, por exemplo, entre a instauração imediata de Pado, a expedição de determinação para apresentação de plano de ação corretivo, e a simples notificação para cessação da conduta.

As vantagens dessa possibilidade podem ser sintetizadas na medida em que ela corresponde a uma solução de escopo ajustado aos temas priorizados pela Agência, por ser passível de adoção em médio prazo e, ainda, como a possibilidade A, por romper a lógica de instauração automática de Pados. De outra mão, a remissão do leque de respostas abstratas ao juízo dos Superintendentes, sem respaldo regulamentar específico, elevaria o risco de questionamento das medidas aplicadas nos casos concretos, sobretudo por diminuir a previsibilidade para os administrados.

Por fim, a terceira possibilidade (C) equivaleria à constituição do RFR como uma “plataforma” que possibilitaria o estabelecimento de normas específicas, na regulamentação expedida pela Agência, que estabeleçam regimes proporcionais às posturas dos administrados e aos riscos identificados para os usuários e os serviços. Com isso, por exemplo, seria possível o estabelecimento de fases prévias de tolerância para determinadas obrigações em que tal margem se mostre cabível para adoção de ações de correção ou de compensação aos usuários.

Entende-se que tal possibilidade, a despeito de não apresentar solução de curto prazo, oferece maior segurança jurídico-regulatória e efetividade, na medida em que os regimes de resposta deverão ser construídos no âmbito de cada regulação temática. Ou seja, a revisão e a criação de novas obrigações regulatórias deverão necessariamente refletir a instrumentalização dos incentivos para seu cumprimento e as respostas para seu descumprimento.

Pelas razões expostas, vislumbra-se como melhor opção a possibilidade C que, além de romper com o enforcement linear, permite, com segurança jurídica, a previsão de regimes regulatórios específicos e estruturados.

Frisa-se que a premissa de atuação regulatória responsiva estruturada já foi expressamente endossada por este Colegiado nos autos nº 53500.006207/2015-16 (novo Regulamento de Qualidade - RQUAL). Daquela feita, a razoabilidade e as vantagens de tal atuação foram reconhecidas no que tange à gestão da qualidade dos serviços.

A presente deliberação, contudo, amplia tal reconhecimento. Conforme se depreende tanto da manifestação do Relator, na Análise nº 97/2018/SEI/AD (SEI 2659033), quanto das razões do presente Voto, há elementos que apontam para a necessidade de que a atuação do Regulador leve em consideração a responsividade em relação às obrigações das mais variadas temáticas. O que se está a dizer é que a atuação responsiva não deve funcionar apenas como camada superposta às exigências regulamentares. Com efeito, ela deve integrar sua construção – tal como se deu na elaboração da proposta de novo RQUAL.

Com isso, ao se elaborar ou rever um determinado normativo, faz-se importante que se sopese quais os mecanismos de responsividade poderão ser oportunos para que se atinjam suas finalidades (que podem variar em matérias desde um melhor atendimento aos consumidores à adesão de padrões técnicos de referência).

Essa modalidade de atuação dispensa a aprovação do Regulamento de Fiscalização Regulatória. Desde já as áreas técnicas da Agência, sob coordenação da SPR, dadas suas competências regimentais, devem realizar uma “análise de responsividade” em suas futuras construções ou revisões normativas. Frise-se que isto não constituirá nova etapa no rito normativo, uma exigência incontornável ou sequer um novo tipo de documento autônomo nos autos.

Esse tipo de análise se faz relevante, sobretudo, na revisão da regulamentação sobre direitos dos consumidores, tema no qual a atuação das prestadoras deve se dar em horizonte dinâmico de constante aprimoramento.

Assim, a proposta de determinação contida na conclusão deste Voto destina-se a fazer com que o juízo de revisão ou elaboração de normativos pelas áreas técnicas, e especialmente pela SPR, passe a contemplar necessariamente a instrumentalização da atuação regulatória responsiva.

Da priorização no âmbito da Fiscalização Regulatória

Em consonância com os achados e alternativa escolhida no Relatório de Análise de Impacto Regulatório (AIR), bem como com os termos da Análise do Relator, entende-se ponto fundamental para a efetividade das atividades de Fiscalização Regulatória a priorização das ações que tragam maior benefício para os consumidores, para os entes regulados e para a sociedade em geral.

É fato que a otimização do arcabouço regulatório deve ser constantemente perseguida pela Anatel. Todavia, também é inconteste que, independentemente do quantitativo de obrigações legais a serem fiscalizadas, entre elas sempre existirá, dentro de determinado recorte temporal e espacial, níveis de hierarquia, consideradas a criticidade e as consequências de seus descumprimentos para os atores envolvidos.

Para tanto a proposta da área técnica, corroborada pelo Relator, sugere a aprovação pelo Conselho Diretor de Portaria que disciplina a Metodologia de Priorização da Fiscalização Regulatória. Referida metodologia encontra é lastreada nos princípios de gerenciamento de riscos.

Importante ressaltar que nos últimos anos, intensificou-se o foco e a preocupação com o gerenciamento de riscos, tornando-se cada vez mais clara a necessidade de uma estratégia sólida, capaz de identificar, avaliar e administrar riscos nas atividades desenvolvidas pela Administração Pública.

Nesse sentido, sendo uma das etapas mais relevantes da Fiscalização Regulatória - a de identificação do que fiscalizar, acompanhar e controlar - entende-se relevante que seja baseada em metodologia de gestão de riscos, a qual deve se nortear nas premissas trazidas na proposta de Regulamento (art. 12 do RFR constante da Minuta anexa ao presente Voto):

I - a correlação com as diretrizes e metas do planejamento institucional da Agência;

II - a prevalência dos serviços de interesse coletivo sobre os de interesse restrito;

III - a prevalência de direitos e interesses difusos e coletivos sobre os direitos e interesses individuais;

IV - o impacto direto para os usuários;

V - as ameaças à adequada prestação do serviço;

VI - a conformidade do Administrado com as obrigações do setor;

VII - as características e particularidades regionais na prestação dos serviços; e

VIII - a prevalência da competência originária da Agência em relação àquelas atribuídas à Anatel mediante a celebração de instrumento específico.

 

Tal iniciativa encontra-se alinhada com recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU) à Anatel para a adoção de medidas para o gerenciamento dos riscos institucionais, por meio do desenvolvimento de uma política de gestão de riscos (Item 9.1.2, TC-031031.996/2013-2, Acórdão n.º 240/2015-TCU-Plenário, DOU de 04.03.2015, S.1, p.63), bem como ao estabelecido na Instrução Normativa Conjunta n.º 1 (MPOG/CGU), de 10/05/2016, que dispõe sobre controles internos, gestão de riscos e governança no âmbito do Poder Executivo Federal.

Inclusive, no âmbito da Anatel já foi editada a Portaria nº 1176, de 30 de agosto de 2017, que instituiu a Política de Gestão de Riscos da Anatel e o Comitê de Gestão de Riscos. Nos dizeres do Voto nº 39/2017/SEI/PR (SEI nº 1780014), no qual se fundamentou a aprovação da supracitada portaria:

4.13. O Tribunal de Contas da União - TCU indica como benefícios do desenvolvimento de uma política de gestão de risco, o aumento da eficiência das ações das agências, o melhor atingimento dos objetivos institucionais e maior transparência e controle das atividades pela sociedade.

4.14. A proposta de instituição da Política de Gestão de Riscos, portanto, vem ao encontro da recomendação expedida pela Corte de Contas , por meio do Acórdão nº 240/2015 - Plenário, no sentido de promover a implementação de medidas de gerenciamento de riscos institucionais nas Agências Reguladoras:

Acórdão

VISTOS, relatados e discutidos estes autos que tratam de relatório de auditoria operacional que teve por objetivo avaliar a governança da regulação nos setores de energia, comunicações e transportes, por meio das agências reguladoras de infraestrutura. Acordam os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo Relator, em:

9.1. recomendar à Agência Nacional de Transportes Terrestres, Agência Nacional de Transportes Aquaviários, Agência Nacional de Aviação Civil, Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, Agência Nacional de Telecomunicações e Agência Nacional de Energia Elétrica, com fulcro no art. 250, inciso III, do Regimento Interno TCU, que adotem:

(...)

9.1.2. medidas com vistas a gerenciar seus riscos institucionais, por meio do desenvolvimento de uma política de gestão de risco;

4.15. Esta proposta atende, ainda, a Instrução Normativa Conjunta n.º 1, de 10 de maio de 2016, emitida pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão -MPOG e pela Controladoria Geral da União – CGU, que determinou a implementação, no prazo de 12 meses, de uma política de gestão de riscos institucional a todos os órgãos e entidades do Poder Executivo Federal.

Destarte, vislumbram-se vários benefícios inclusive apontados pelo Órgão de Controle para a atuação da Agência, in casu, no exercício de seu poder fiscalizatório e de controle, com a adoção de gestão de riscos no processo de Fiscalização Regulatória.

O Comitê de Gestão de Riscos, órgão deliberativo acerca de temas afetos à gestão de riscos institucional, tais como a aprovação da Metodologia da Gestão de Riscos, a aprovação do método de priorização de temas e processos para gerenciamento de riscos, aprovação e revisão do Plano de Gestão de Riscos, designação dos gestores de risco, dentre outros, têm como foco o risco institucional.

Importante salientar que, inobstante a abrangência diferenciada das análises, a metodologia de gestão de riscos a ser elaborada para aplicação no processo de Fiscalização Regulatória deve necessariamente observar a de gestão de riscos institucional, em fase de elaboração pelo Comitê de Gestão de Riscos.

Assim, de acordo com o texto do art. 12 da proposta de Portaria (SEI 2725089), quando aprovada a metodologia de gestão de riscos da Agência deve ser verificada a necessidade de revisão da metodologia de priorização da Fiscalização Regulatória.

Dessa forma, a partir do estabelecimento de ações prioritárias da Agência, os esforços fiscalizatórios estarão direcionados para questões de extrema relevância e urgência focadas em resultados efetivos para a sociedade, instrumentalizando formalmente a Anatel a racionalizar sua força de trabalho, trazendo maior eficiência para a sua atuação.

Da alteração nas atuais previsões relativas à sanção de obrigação de fazer

Conforme acima adiantado, a presente proposta volta-se a modificar o RASA/2012 exclusivamente em pontos críticos para uma atuação mais responsiva por parte da Agência. Entende-se como destacado entre eles, a necessidade de melhor tratamento da hipótese de obrigação de fazer como forma de sanção, prevista em seu art. 3º, IV.

Tal modalidade de sanção, também preconizada no art. 68 da Lei nº 9.784/1999 (Lei de Processo Administrativo – LPA), foi definida no RASA/2012 como a sanção mandamental que resulta de ordem emanada pela autoridade administrativa pela qual o infrator é compelido a praticar uma conduta lícita, diversa das obrigações já previstas em lei e regulamento, em benefício do serviço de telecomunicações ou do usuário desse serviço, suficiente para desestimular o cometimento de nova infração (art. 2º, inciso XI).

Cuidou ainda o RASA de trazer disciplina específica dessa modalidade de sanção, conjunta com a prevista para a modalidade correspondente à obrigação de não fazer. Transcreve-se:

 

Art. 15. As sanções de obrigação de fazer e de não fazer poderão ser aplicadas nas infrações classificadas como leves, médias e graves, cumulativamente ou não com a sanção de multa, quando a autoridade competente, valendo-se da oportunidade e conveniência, verificar que a imposição de prática ou abstenção de conduta à sancionada será mais razoável e adequada para o atingimento do interesse público, devendo a escolha ser devidamente motivada, observados os princípios da legalidade, razoabilidade, proporcionalidade e economicidade.

Art. 16. As sanções de obrigação de fazer e de não fazer devem observar os seguintes parâmetros:

I - não podem se restringir ao mero cumprimento das obrigações já impostas ao infrator pelo arcabouço regulatório e pelos contratos ou termos celebrados;

II - devem estar estritamente relacionadas com a infração cometida, sendo vedada a determinação da prática ou abstenção de ato que não tenha qualquer relação com a conduta irregular apenada;

III - devem buscar melhorias para o serviço atingido, de preferência na área afetada, de modo a beneficiar os seus usuários.

§ 1º O ônus da prova do cumprimento da ordem mandamental imposta pela autoridade competente recairá sobre a sancionada, que, dentro do prazo fixado na decisão condenatória, deverá comprovar o cumprimento da obrigação.

§ 2º O não atendimento da ordem emanada pela autoridade administrativa implicará a conversão da sanção de obrigação de fazer ou de não fazer em multa, independentemente de responsabilização civil ou criminal, que levará em consideração o grau de cumprimento da obrigação imposta e a gravidade da infração originalmente cometida.

§ 3º As sanções de obrigação de fazer e não fazer não se confundem com a determinação para reparação dos usuários prejudicados, nem com as medidas cautelares.

Registra-se que os limites e as possibilidades regulatórias que tal medida pode representar foram exploradas pela Procuradoria Federal Especializada (PFE) da Anatel já no bojo do processo nº 53500.020772/2005, que resultou na expedição do RASA/2012. Do Parecer nº 1413/2011/DFT/ICL/IGP/LFF/MGN/PFS/PGF/PFE-Anatel, destacam-se as seguintes passagens:

197. A aplicação desse tipo de sanção deverá ocorrer quando for verificado que a imposição de prática de conduta à sancionada será mais adequada e útil para o atingimento do interesse público do que a aplicação das outras sanções. Assim, em todos os casos, o administrador poderá ponderar, valendo-se de sua discricionariedade, sobre a conveniência da aplicação da sanção de obrigação de fazer e de não fazer. A escolha, no entanto, deverá está devidamente fundamentada.

198. Dessa forma, ao final da primeira instância administrativa, o agente administrativo poderá, por exemplo, impor à sancionada a obrigação de imediata melhoria da infraestrutura de rede em determinada localidade; ou a obrigação de troca de equipamentos obsoletos por outros de última geração; ou a obrigação de instalação de equipamentos ou de postos de serviço em número superior ao definido pela legislação; ou a obrigação de fazer investimentos urgentes em determinado campo, em montante superior ao fixado na lei e/ou em tempo reduzido.

(...)

200. Como se observa, a aplicação deste tipo de sanção permite que o administrador escolha uma dentre as muitas alternativas possíveis, desde que observe a legalidade, a razoabilidade, a proporcionalidade, a economicidade, o interesse público e, especialmente, os parâmetros aqui delineados para sua aplicação.

201. Daí decorre, como já dito, a importância da utilização desse instrumento pela Agência, como forma de incrementar a qualidade dos serviços prestados, por meio, por exemplo, de imposição de melhorias significativas nas redes e nos equipamentos das prestadoras. Na aplicação das sanções de obrigações de fazer, vale ressaltar, a atuação da Anatel não se restringe a ações pontuais. A depender do caso, é possível, inclusive, por exemplo, que a Agência determine à prestadora infratora a apresentação e execução de plano de melhoria abrangente com efeitos de médio ou até mesmo longo prazo.

202. A sanção de obrigação de fazer, então, pode se configurar, se bem utilizada, como uma ferramenta bastante interessante para o setor, com benefício direto para os consumidores, tornando-se, em determinados casos, uma alternativa saudável à mera aplicação da sanção de multa.

203. Obrigações desse jaez, enfim, podem melhorar a qualidade da prestação do serviço, beneficiar os consumidores e, com isso, prevenir o cometimento de novas infrações.

204. Trata-se da concessão de um poder geral de efetivação ao administrador, mediante a ampliação do leque das possíveis medidas de que se pode utilizar em benefício do serviço de telecomunicações e para a concretização do interesse público.

205. A fixação dessa espécie de sanção deverá, ainda, estar estreitamente relacionada com a infração cometida, de forma que não é possível a determinação da prática de ato que não tenha qualquer relação com a conduta irregular apurada nos autos.

206. Na medida do possível, a obrigação de fazer ou não fazer deve buscar melhorias na área afetada pela infração praticada. Assim, por exemplo, uma infração praticada numa localidade não pode, em princípio, acarretar uma sanção de obrigação de fazer em outra localidade. Devem ser privilegiadas as áreas geográficas atingidas pela conduta infratora, de modo a melhorar a prestação do serviço naquela área específica. Cumpre destacar que o não atendimento da ordem emanada pela autoridade administrativa implicará a conversão da sanção de obrigação de fazer, ou de não fazer, em multa, podendo, ainda, o ato constituir crime ou render ensejo à responsabilidade civil. (destaques inexistentes no original).

Contudo, decorrida quase uma década da expedição do RASA/2012, verifica-se que a apreciação da possibilidade de aplicação da mencionada “saudável alternativa” infelizmente vem sendo pouco explorada pelas áreas técnicas da Agência responsáveis pelo sancionamento das prestadoras infratoras. Via de regra, na maior parte dos casos, o juízo sancionatório oscila entre as modalidades mais tradicionais de advertência ou, principalmente, de multa.

Ora, não se pode olvidar que objetivo principal de qualquer política regulatória é assegurar a prestação do serviço público de acordo com as regras e expectativas subscritas na regulação. Cabe ao Estado coibir transgressões a esse regime e, desse modo, preservar as orientações regulatórias.

Os mecanismos disponíveis para sua atuação não concorrem entre si e cabe ao regulador/julgador optar pela alternativa que permita potencializar o bem estar social. A escolha entre as opções de sanção disponíveis depende de circunstâncias afetas a cada caso. Assim, não se pode com antecedência indicar qual mecanismo é o mais eficiente sem conhecer a dimensão da população afetada, as condições da região onde ocorreu a infração ou a capacidade do Estado para assegurar a correção da conduta. O que se sabe é que opções menos eficientes induzem perdas de peso morto e seus efeitos, naturalmente, implicam redução da utilidade pública.

Não se pode ignorar que o ingresso de recursos através de sanções financeiras exerce um papel relevante no padrão de vida da população. Basta observar que os efeitos dos impostos diretos e indiretos, fonte regular de financiamento do Estado, são assuntos de destaque na literatura sobre economia pública.

Todavia, deve-se reconhecer que tal fluxo incorre em reconhecida ineficiência, com ocasional baixo retorno relativo à sociedade. Essa percepção não é uma peculiaridade do Brasil. Mesmo entre as nações mais desenvolvidas esse fluxo padece de críticas, razão pela qual se desenvolveu todo um acervo acadêmico que, inclusive, tem justificado a delegação à iniciativa privada de projetos de investimento.

Para assegurar maior eficiência à decisão do regulador, na qualidade de juiz de processos de descumprimento de obrigações, foi disponibilizado um conjunto de mecanismos de punição, dentre eles a comentada obrigação de fazer.

Ciente dessas opções caberia ao regulador optar pela alternativa cujos benefícios propiciem máxima eficiência relativa. Essa conjuntura ocorre quando, e somente quando, a opção escolhida resultar no máximo benefício para um indivíduo, ou conjunto de indivíduos, sem que outro indivíduo, ou conjunto de indivíduos, tenha seu bem estar agravado.

Essa concepção clássica da racionalidade econômica deve, sem prejuízo às premissas exploradas neste texto, amparar o tomador de decisão público comprometido com a eficiência de sua decisão e com as normas de direito vigente.

Por óbvio, a eficiência econômica não deve se sobrepor à observância do arcabouço legal e normativo. A neutralidade da decisão, nessas circunstâncias, é lograda quando se atinge a eficiência econômica sem, contudo, desatender as normas vigentes.

Ao optar por sanções do tipo ‘obrigação de fazer’ o regulador compartilha o compromisso de eficiência com o ente privado e, assim, eleva a expectativa de utilidade relativa àquela obtida pelos fluxos usais de sanções pecuniárias. 

Nessas circunstâncias, quando se fala em obrigação de fazer, prevalece o entendimento de que se trata de uma opção pelo investimento produtivo, cujos benefícios não se limitam à sua própria iniciativa, mas para apoiar vários tipos de atividade econômica e redução de desigualdades.

Na linguagem da economia os referidos efeitos excedentes são denominados externalidades. Conceitualmente, uma externalidade é uma consequência de uma dada atividade econômica com efeitos sobre terceiros.

Externalidades positivas são os benefícios para a sociedade originados de uma atividade privada que não tem preço para o bem ou serviço em si. O efeito de uma melhoria no nível de educação em função da disponibilização de infraestruturas de telecomunicações é um exemplo de externalidade positiva.

Os chamados bens públicos, categoria à qual estão vinculadas educação e saúde, por exemplo, são particularmente associados ao conceito de externalidade positiva. Os benefícios que uma infraestrutura disponibiliza para a sociedade e a economia, além dos retornos privados que vêm de sua propriedade, também as credenciam como um tipo de bem público.

A relevância do bem público se justifica por duas características a eles inatas: são não excludentes e não rivais. São não excludentes pelo fato de não ser possível excluir pessoas de usar um bem ou serviço, mesmo que não paguem. Por sua vez, a não rivalidade significa que o uso do bem por uma pessoa não diminui quando outras pessoas a usam.

Assim, uma vez que a sanção seja materializada na forma de uma obrigação de fazer deve-se assegurar que a obrigação seja direcionada para investimentos que possibilitem benefícios significativos aos usuários e que sejam sujeitos a um controle tempestivo da por parte do regulador.

Nessa toada, o atingimento do interesse público requer da Administração cada vez mais criatividade nas soluções buscadas. Dentre outras, obrigações como aquelas mencionadas pela PFE (”melhoria da infraestrutura de rede”; “troca de equipamentos obsoletos por outros de última geração”; “instalação de equipamentos ou de postos de serviço”; ou ainda de “fazer investimentos urgentes”) podem efetivamente constituir alternativas mais vantajosas para os usuários dos serviços do que a simples imposição de multa e recolhimento de valores aos cofres públicos.

Considerado o aspecto temático, seria desejável que as obrigações em tela passíveis de serem fixadas guardassem coerência com a atual proposta de Plano Estrutural das Redes de Telecomunicações (PERT) - previsto no inciso IX do art. 22 da Lei nº 9.472/1997 - Lei Geral de Telecomunicações (LGT). Isto porque tal instrumento deve resultar de uma organização das informações disponíveis à Agência a respeito da infraestrutura nacional de telecomunicações, com a pretensão de tornar mais compreensíveis e acessíveis à sociedade os projetos capazes de suprir as deficiências diagnosticadas nas redes e, assim, atender ao objetivo da política setorial de ampliar o acesso à internet em banda larga.

Passada a fase de proposta – que se encontra submetida à apreciação deste Colegiado – mais forte ainda a necessidade de que tais obrigações se alinhem ao futuro PERT, de modo a garantir maior racionalização nos esforços públicos para a promoção dos serviços de telecomunicações.

Assim, a presente proposta prevê a indicação expressa no RASA quanto ao privilégio a ser dado aos projetos que atendam as necessidades estruturantes previstas no Plano Estrutural de Redes de Telecomunicações – PERT, uma vez que se opte pela imposição de sanção de obrigação de fazer.

Para que se permita tal direcionamento das obrigações às melhorias do serviço e sobretudo à solução de lacunas históricas de infraestrutura, ajuste também deve ser feito para a retirada da limitação até aqui existente quanto à correlação geográfica e temática entre essa forma de sanção e a infração que a motivou (arts. 3º e 4º da Resolução constante da Minuta anexa ao presente Voto).

Por fim, faz-se necessário esclarecer que a fixação de sanção de obrigação de fazer é expressivamente distinta da celebração de Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC). Ainda que não se entre em maiores detalhes, e limitando-se as referências ao Regulamento de Celebração e Acompanhamento de Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (RTAC), aprovado pela Res. nº 629/2013, tem-se que esse último instrumento decorre de decisão bilateral, resultante de negociação entre a Agência e o administrado. A sanção, por sua vez, é unilateral e decorre de imposição, não havendo espaço para aceitação ou não pelo particular, a quem cabe apenas cumprir-lhe. O TAC pressupõe solução de implementação gradativa; premissa dispensável quando se trata da obrigação de fazer. Em linhas gerais o TAC endereça solução de substituição da sanção; enquanto a obrigação vem a ser a própria punição.

Das alterações pontuais ao rasa/12

Historicamente, as normas que disciplinam a execução das atividades de fiscalização da Anatel são baseadas em mecanismos punitivos. Existe uma lógica por trás disso: quando se estabelece um dispositivo e se cria uma punição para o seu não cumprimento, espera-se que os regulados busquem cumpri-lo de forma a evitar tal punição. Trata-se de abordagem bastante tradicional da teoria regulatória, conhecida como "estratégia do Comando e Controle".

Ocorre que o caráter exclusivamente punitivo da atual Regulamentação da Anatel acaba pressionando negativamente o processo e a eficácia dos instrumentos de fiscalização.

Portanto, para além das melhorias na parte processual do processo punitivo, é inevitável que a Agência empreenda esforços na alteração da sua própria regulamentação. Afinal, embora os problemas da regulação sejam potencializados pelo enforcement punitivo (e vice-versa), toda a teoria regulatória apresentada demonstra que as normas devem ter na origem um viés de atendimento de conformidade e de melhoria dos serviços, conforme já se expôs.

Dentro dessa premissa,  mostra-se necessário alterar pontualmente alguns dispositivos do RASA/12, sem prejuízo da eventual revisão  do instrumento normativo, como um todo, futuramente.

O primeiro ponto a ser analisado refere-se ao fato de que na atual sistemática a gravidade da sanção está diretamente atrelada ao seu tema. Ocorre que a definição meramente temática quanto à infração cometida limita uma análise mais apurada quanto ao grau de reprovabilidade da sanção.

Para melhor dissertar sobre a questão, vale trazer aqui um exemplo. Nos termos do RASA/12, qualquer infração que atinja um número significativo  de usuários, deve ser classificada como grave. Todavia, no caso de um infração relativa à veiculação de uma mensagem no site da prestadora, independente do seu conteúdo ou importância, poderá atingir um número significativo de usuários e, consequentemente, poderá ser tida como grave. 

Dessa forma, propõe-se uma alteração mais racional da classificação das infrações, prevista no art. 9º do RASA/12, para que o sancionamento não fique atrelado ao condicionamento temático. 

Tal alteração vai possibilitar, também, a aplicação da sanção de advertência para casos de infrações de baixa reprovabilidade, e em decorrência disso, inclusive uma tramitação mais célere dos processos punitivos, haja vista que (a) grande parte das horas de trabalho dos servidores da Agência que atuam em PADOs são dedicadas a questões afetas a metodologias de cálculo de multa e (b) é natural que haja menos litigiosidade administrativa (defesa e recurso administrativo) nos PADOs que se destinam a aplicar sanções de advertência.

Outra hipótese que merece atenção quanto a seu alcance, vem a ser a de aplicação de sanção de advertência, limitada pelo RASA/12, desde que não haja reincidência específica e que a infração possa ser caracterizada como leve (art. 12).

Tendo em vista que a dinâmica do setor de telecomunicações envolve empresas que prestam serviços a milhões de usuários, ao afastar a sanção de advertência dos casos em que há reincidência, a regulamentação, na prática, impede que médias e grandes empresa sejam sancionadas com advertência, por mais que a baixa reprovabilidade justificasse a aplicação desse tipo de sanção. Empresas que prestam serviços a milhões de usuários tendem a ser naturalmente reincidentes, sem que necessariamente as faltas repetidas afetem de maneira profunda a prestação do serviço ou seus usuários. 

De outro lado, o os incisos I, II e III do art. 20 do RASA/12 tratam de situações em que o autuado, após o cometimento da infração, toma medidas para cessar total ou parcialmente a prática infrativa.

O inciso I tem um âmbito de incidência bastante restrito (exatamente por isso atenua a multa em 90%) e o inciso III apresenta um redução quase insignificante do valor da multa e se aplica tanto aos casos em que (a) a infração foi cessada, porém não foi cessada na forma dos incisos I e II, e quanto às situações em que (b) a infração não foi cessada, mas o autuado tomou medidas para minimizar seus efeitos.

Em relação ao inciso II, observou-se na prática que a expressão imediatamente ou em prazo consignado pela Anatel, após a ação da Agência consubstanciou um grande limitador à aplicação do inciso II e, por conseguinte, um limitador ao estímulo à cessação da conduta infratora constatada após a ação da Agência, que representa a grande maioria dos casos.

Explica-se. Há infrações que apresentam condições materiais de serem cessadas imediatamente e outras que, naturalmente, precisariam de um prazo para serem cessadas. Em relação à Anatel, não se observou, na praxe da maior parte das autuações, a designação de prazo para que o autuado, mediante a cessação da conduta infratora, fizesse jus à atenuante de 50% do valor da multa, o que restringiu muito aplicação do atenuante e o estímulo à cessação da conduta infratora, objetivo último da Anatel. Na perspectiva da fiscalização, há dificuldades de o fiscal definir por seus próprios critérios qual prazo designar em relação a cada infração.

O fator de redução previsto no §5º do art. 33, por exemplo, é tido como uma medida que alcançou seus objetivos, reduzindo a litigiosidade administrativa (recursos administrativos), por meio de um desconto de 25%. Na prática, a aplicação desse desconto foi muito mais efetiva do que a aplicação do inciso II do art. 20, haja vista que havia clareza e objetividade acerca dos casos nos quais seria aplicado o desconto de 25%.

Dessa forma, ante toda a explanação acima, entendeu-se por uma revisão ao art. 20, de forma a melhorar sua eficiência, estimular a conformidade das empresas, bem como para diminuir a litigiosidade administrativa.

Ademais, propõe-se, ainda, alteração no procedimento sumário previsto no art. 25, do RASA/12. A sistemática atual prevê a edição de uma Portaria do Conselho Diretor para estabelecer as infrações de simples apurações, para as quais seria aplicável a decisão sumária de arquivamento. No entanto, mesmo após 6 (seis) anos da edição da Resolução, tal Portaria não foi editada em razão da dificuldade da Agência em definir individualmente cada uma das infrações a serem elencadas. 

Ao se analisar mais detidamente o referido instrumento, que poderá melhorar sobremaneira a litigância administrativa, verificou-se que, dados os requisitos exigidos para sua aplicação, poderia ser ampliada a sua abrangência para todos os tipos de infração.  De fato, o art. 27 prevê que para que o processo seja decidido sumariamente, deverão ser observadas as seguintes condições: 

reconhecimento da materialidade e confissão da autoria da infração;

apresentação de prova inequívoca de que cessou a infração e, quando cabível, de que reparou totalmente o dano ao usuário; e

renunciar expressamente ao direito de litigar administrativamente em relação à infração.

Portanto, uma vez que o infrator terá que confessar, corrigir e renunciar ao direito de recorrer, entende-se que tal prerrogativa pode ser estendida a todas as infrações, desde que observados tais requisitos. 

Do Termo de Conformidade

A proposta veiculada no presente Voto apresenta um mecanismo de compliance parcialmente distinto do Plano de Ação discutido até o presente momento. Trata-se do Termo de Conformidade.

Esse Termo seria um instrumento pelo qual o administrado apresente voluntariamente à Agência, a qualquer tempo, compromisso de demonstrar em prazo determinado o cumprimento de obrigações, na qual aponte de forma clara o objetivo final de conformidade a ser aferido (arts. 47 e 48 do RFR constante da Minuta anexa ao presente Voto).

Dentre os temas elegíveis, estão excluídos aqueles apontados pela metodologia de priorização com urgência que demande ações imediatas ou classificadas como extremamente graves. Isto porque um dos efeitos do aceite da proposta de tal Termo ser justamente o da suspensão de tramitação de procedimento de acompanhamento ou de controle em curso pelo prazo de até 180 (cento e oitenta) dias (art. 49 do RFR constante da Minuta anexa ao presente Voto), com ressalva para situações de risco prescricional ou de repetição de pedido de Termo desatendido anteriormente.

Havendo expressa concordância da Agência, no âmbito das Superintendências, quanto à efetividade das medidas apresentadas, ao final do prazo proposto o regulado deverá apresentar todos os resultados, de forma a comprovar de forma válida e eficaz que as medidas sugeridas foram efetivamente concluídas.

Caso a Agência entenda que, de fato, as medidas adotadas foram satisfatórias aos fins propostos, há dois efeitos positivos: a) a consideração dos resultados para efeitos de atenuantes previstas no RASA; e b) a não inclusão do tema endereçado nos dois Ciclos de Fiscalização Regulatória subsequentes para o administrado.

Assim, percebe-se que a figura (i) reforça os incentivos existentes no RASA sob a forma de atenuantes (que podem chegar a 90% do valor de multa, por exemplo) e, ao mesmo tempo (ii) garante um lapso temporal fora dos Ciclos de Fiscalização Regulatória, como um “prêmio” pela excelência na prática.

Do projeto piloto realizado pela Superintendência de Relações com Consumidores (SRC)

Conforme mencionado pelo Relator e pela SPR no Informe nº 131/2018/SEI/PRRE/SPR (SEI 3441224), já há projetos em curso nas áreas técnicas da Agência a respeito da aplicabilidade prática de novo modelo de atuação. Os registros das atuações e dos resultados constam dos autos nº 53500.046278/2017-13.

Dentre tais pilotos, cumpre destacar aquele conduzido pela SRC que, por seus resultados, deve constituir relevante fonte de insumos para a reflexão sobre a proposta de RFR.

Como regulador brasileiro de telecomunicações, a Anatel tem a tarefa de observar não apenas os aspectos técnicos, de espectro e econômicos do setor de telecomunicações, mas também os aspectos relacionados à proteção do consumidor.

Nesse sentido, embora a Anatel não trate de forma individualizada as questões surgidas do relacionamento entre consumidores e prestadores de serviços, os consumidores têm o direito de registrar suas reclamações junto aos canais disponibilizados pelo Órgão. Com base no monitoramento dessas reclamações, a Anatel identifica as principais causas de conflito entre consumidores e operadores e elabora um relatório de diagnóstico que orienta sua ação preventiva ou repressiva.

No curso desse processo de monitoramento, a SRC identificou, em meados de 2016, um aumento anormal de reclamações sobre os serviços de valor agregado (SVA): jogos, serviços de streaming, serviços em nuvem etc. Esse aumento coincidiu com as estratégias "digitais" de algumas empresas, o que ampliou significativamente o portfólio de serviços oferecidos a seus consumidores.

Devido a esse aumento anormal mencionado nas queixas sobre SVA, a SRC emitiu alertas para as principais operadoras de telefonia móvel junto a recomendações de que deveriam ser avaliadas as causas do aumento das reclamações e resolvê-las.

Apesar dos alertas da SRC e das medidas que os operadores informaram ter tomado, a quantidade de reclamações continuou a crescer. No final de 2016, a SRC conclui um estudo de caso minucioso das reclamações da SVA e identificou que, em quase 95% (noventa e cinco por cento) dos casos, os consumidores reclamavam que não tinham solicitado ou autorizado o SVA que os operadores lhes estavam cobrando. Esse diagnóstico foi o primeiro e um dos passos mais importantes para a ação adotada.

Após a sua conclusão, o estudo de caso foi encaminhado aos operadores para que eles pudessem avaliar as constatações e identificar as causas de tal crescimento de queixas, ou reconhecer os achados do estudo de caso como corretos e apresentar as medidas que tomariam para abordar o problema.

Inicialmente, todas as operadoras responderam que não viam o problema da mesma forma que a SRC. Para os operadores, inicialmente, em quase todas as situações, o consumidor não teria prestado atenção suficiente (a ponto de assinar acordos sem se dar conta); não entendia que os serviços eram pagos ou que os operadores não eram responsáveis pela assinatura de acordos com terceiros provedores.

Nos dois meses seguintes, a Anatel não apenas demonstrou que se tratava de um problema na prática das operadoras de telecomunicações, mas também as trouxe para o diálogo. O ponto principal em que a SRC se concentrou foi sobre as medidas que as operadoras poderiam adotar para resolver o problema do faturamento de serviços indesejados, já que a conta de serviços de telecomunicações estava completamente sob seu alcance operacional.

Esse foi o segundo passo, a mudança de foco de atuação, que a partir da construção de confiança entre o Órgão Regulador e os administrados, passou a centrar-se na solução da questão que afetava os consumidores.

Enquanto isso, além do estudo de caso, a Anatel também entrevistou fornecedores de conteúdo SVA para adquirir um entendimento mais preciso do ecossistema SVA, sua cadeia produtiva e a distribuição de responsabilidades e fragilidades.

Uma vez que todas essas etapas foram definidas, a SRC solicitou que as operadoras apresentassem um Plano de Ações com um cronograma.

Após mais um longo período de negociações, até março de 2018, a SRC aprovou todos os Planos de Ações das operadoras.

No momento, a SRC verifica se os operadores realmente adotaram e implementaram todas as medidas contidas em seu Plano de Ações.

Ainda há, no entanto, algumas notas que importam destacar nesse histórico:

A partir do momento em que a SRC anunciou o faturamento de SVA como assunto a ser tratado por meio da nova abordagem e que precisava de resultados tangíveis reais a ser observados, observou-se uma mudança no número de reclamações, inclinando-se para sua redução.

Embora algumas operadoras tenham apresentado resultados mais rápidos do que outras, o cenário geral apresentou queda de aproximadamente 62% (sessenta e dois por cento) no número de reclamações (de jan/2017 a jun/2018). Nos primeiros quatro meses, por exemplo, observa-se uma queda de 25% (vinte e cinco por cento) nas reclamações, de 7.940 (jan/2017) para 5.900 (abr/2017). Tal tendência persistiu nos meses seguintes.

Hoje, apesar do crescimento do mercado de SVA, é possível dizer que o número bruto de reclamações de SVA é ainda menor do que antes (marcador verde) da crise SVA 2016 (marcador vermelho) e a “virada digital” das operadoras.

Reporta-se que alguns provedores de conteúdo SVA estão até buscando a “certificação” de seus processos para adicionar confiabilidade a seus produtos. A SRC observou que algumas operadoras começaram a responder melhor depois que foram compartilhados dados do desempenho de todas elas. Em síntese, a nova abordagem alcançou resultados melhores e mais rápidos do que o caminho tradicional.

Isto posto, é possível comprovar que o modelo centrado na busca por solução teve sua higidez comprovada. Frisa-se que a experiência se reflete no ponto da proposta correspondente ao Termo de Conformidade, que privilegia o atendimento às obrigações a partir de iniciativas voluntárias das prestadoras (arts. 47 a 50 do RFR constante da Minuta anexa ao presente Voto).

Do alinhamento de atuação com outros órgãos regulatórios - ANAC

A reflexão sobre a atuação da Anatel à luz de experiências exitosas de outras Agências igualmente compôs o trabalho de relatoria, o qual apresenta tópico relativo às reformas feitas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) em seu processo de fiscalização (“Fiscalização Preventiva e Orientativa”). Logo, em sede vista, pretendeu-se verificar se haveria ainda outras atuações a se observar.

Importante esclarecer que a experiência da ANAC foi escolhida para exame uma vez que sua atuação recente também passa pela publicação de um Regulamento, aprovado pela Res. nº 472/2018, voltado para a adoção de uma regulamentação mais responsiva, assemelhando-se, portanto, ao presente caso.

Em certa medida, a identificação de que uma determinada proposta regulatória se alinha com outras práticas bem sucedidas tem grande relevo para a própria admissibilidade da sugestão de alteração da prática vigente. Traçados bons paralelos pode se reconhecer um sólido modelo para o desenvolvimento de uma nova etapa de regulação, motivo pelo qual se apresentará, a seguir, o Modelo de Projeto Prioritário de Enforcement da ANAC, o qual busca meios para o exercício de sua atividade de fiscalização e penalização.

Ressalte-se que o paradigma destacado guarda profunda relação com a típica atividade de regulação responsiva, sob a perspectiva de smart regulation, sobretudo na fiscalização de serviços do consumidor, não mais orientados exclusivamente pela técnica de comando e controle, mas sim por instrumentos de incentivos e ameaças para garantir compliance dos agentes regulados.

O Projeto Prioritário Enforcement foi criado para atender aos objetivos estratégicos “promover um ambiente favorável ao cumprimento consciente dos requisitos regulamentares” e “criar mecanismos efetivos de correção da conduta dos entes que colocarem em risco a segurança e a qualidade do transporte aéreo”. Desde então, o projeto concentrou suas ações na revisão de todo o marco regulatório da fiscalização da ANAC e na aplicação prática de novos instrumentos a serem instituídos.

Quando da elaboração da proposta, verificou-se que o modelo de fiscalização então vigente naquela Agência – baseado no princípio mais tradicional do “comando e controle” (punição por qualquer descumprimento de requisitos normativos) – não atendia às boas práticas da teoria da regulação e aos princípios de gestão da segurança operacional, ao impossibilitar a cooperação mútua entre regulador e regulado e estimular um ambiente litigioso.

Assim, a nova Resolução disciplina os diversos tipos de medidas (providências administrativas) que a ANAC pode adotar como decorrência de suas atividades de fiscalização: as preventivas (mais brandas), as sancionatórias (mais rígidas) e as acautelatórias (mais imediatas).

Nesse contexto, foram estabelecidas medidas preventivas mais brandas no âmbito do conceito de Pirâmide de Enforcement previstas na Resolução nº 472/2018 dividindo-se em Aviso de Condição Irregular (ACI) e em Solicitação de Reparação de Condição Irregular (SRCI).

Embora as providências preventivas não possuam caráter punitivo, elas funcionam como uma ameaça crível da ANAC perante os regulados. Para tanto, a norma prevê que a Agência mantenha o histórico das medidas adotadas, para fins de avaliação do desempenho do regulado e de eventual aplicação de outras providências administrativas mais rígidas que se mostrarem necessárias.

Uma vez que as providências preventivas se mostrem não suficientes para garantir o cumprimento da norma pelo regulado, a ANAC pode lançar mão de instrumentos de caráter punitivo, caracterizados por maior rigor e litígio junto ao regulado, com vistas à desincentivar a prática de irregularidades e sinalizar aos demais regulados as consequências adversas do descumprimento das normas da Agência. São três os tipos de providências sancionatórias previstas na nova resolução: multa, suspensão punitiva e cassação.

Em situações que apresentem risco iminente à segurança, a fiscalização contará com medidas acautelatórias que, embora respaldadas legalmente (Lei nº 9.784/1999), ainda careciam de regulamentação adequada no arcabouço regulatório da ANAC, pois até então eram confundidas com medidas de caráter punitivo.

Assim, com vistas a evitar risco iminente à segurança de voo, à integridade física de pessoas, à coletividade, à ordem pública, à continuidade dos serviços prestados ou ao interesse público, a fiscalização da ANAC poderá lançar mão de providências administrativas acautelatórias tais como detenção, interdição ou apreensão de aeronave e de produtos aeronáuticos de uso civil, de bens e material transportado; apreensão de licenças, certificados, autorizações e registros e suspensão cautelar, parcial ou total, de quaisquer certificados, licenças, concessões, autorizações, operações ou habilitações.

O exame da regulamentação da ANAC revela que, tal qual a atuação descrita pelo Relator para a ANEEL, uma atuação baseada na regulação responsiva vem sendo cada vez mais julgada como adequada pelos diversos órgãos reguladores.

A quebra do enforcement linear para obrigações diversas, levada a cabo pela ANAC, é premissa que igualmente compõe a presente proposta conforme acima apresentado. Tal modalidade de atuação, como visto, deverá presidir inclusive os juízos de revisão e criação normativa da Anatel. No mais, a consideração do “risco” como variável de relevo para a atuação regulatória coincide com a estrutura de priorização prevista no RFR.

Logo, a despeito das peculiaridades de seus setores, de seus arcabouços normativos e formas de atuação, percebe-se um esforço parelho das diferentes Agências no sentido de tornar mais eficientes suas atuações de acompanhamento e de controle. Mais do que isso, percebe-se que esse esforço parte de premissas com alto grau de afinidade.

Do tratamento da correspondência SEI 3587940 - Sinditelebrasil

Quanto à correspondência SEI 3587940, na qual o Sinditelebrasil apresenta sugestões de aprimoramento à proposta em discussão, entende-se adequado, por sua abrangência e expressividade de conteúdo, que se determine à SPR que a examine no bojo da Consulta Pública a ser realizada.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, voto:

aprovação da Metodologia de Priorização da Fiscalização Regulatória, a ser realizada por meio de Portaria do Conselho Diretor da Anatel, nos termos da minuta anexa (SEI 2725089), em adesão à proposta contida na alínea “a” do item 5.1 da Análise nº 97/2018/SEI/AD (SEI 2659033);

submissão a Consulta Pública, pelo prazo de 90 (noventa) dias, da proposta de Resolução e de Regulamento de Fiscalização Regulatória (RFR), na forma do texto consolidado na minuta anexa (SEI 3647195);

na realização de, pelo menos, 5 (cinco) audiências públicas, em adesão à proposta contida na alínea “c” do item 5.1 da Análise nº 97/2018/SEI/AD (SEI 2659033);

determinar à Superintendência de Planejamento e Regulamentação (SPR) que:

avalie, nos procedimentos normativos em curso, e especialmente na revisão da regulamentação sobre direitos dos consumidores, a possibilidade de aplicação de instrumentos de regulação responsiva; e

avalie as contribuições constantes da correspondência SEI 3587940, apresentada pelo Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (Sinditelebrasil), no bojo da Consulta Pública a ser realizada.


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Documento assinado eletronicamente por Leonardo Euler de Morais, Presidente do Conselho, em 21/12/2018, às 19:04, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 23, inciso II, da Portaria nº 912/2017 da Anatel.


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Referência: Processo nº 53500.205186/2015-10 SEI nº 3631816