Boletim de Serviço Eletrônico em 01/08/2019
Timbre

Voto nº 67/2019/PR

Processo nº 53500.013661/2011-91

Interessado: Telefônica Brasil S.A.

CONSELHEIRO

LEONARDO EULER DE MORAIS

ASSUNTO

Recurso Administrativo interposto em face do Despacho n.º 6.176/2015/COUN/SCO, de 27 de agosto de 2015, do Superintendente de Controle de Obrigações (SCO).

EMENTA

RECURSO ADMINISTRATIVO. SUPERINTENDÊNCIA DE CONTROLE DE OBRIGAÇÕES (SCO). BENS REVERSÍVEIS. ANUÊNCIA PRÉVIA. SOLICITAÇÃO DE DESVINCULAÇÃO E POSTERIOR ALIENAÇÃO. DISPENSABILIDADE DE BEM IMÓVEL. RATIFICAÇÃO DA DISPENSABILIDADE DO BEM IMÓVEL PARA A PRESTAÇÃO DO STFC. INDÍCIOS DE DESCUMPRIMENTO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTO PROVIDO.

Recurso Administrativo interposto em face de decisão que indeferiu as solicitações de anuência prévia apresentadas pela Telefônica para desvinculação de diversos imóveis.

Conhecer o recurso administrativo, para no mérito, dar a ele provimento parcial.

REFERÊNCIAS

Parecer nº 479/2019/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI 4322865);

Memorando nº 24/2019/PR (SEI 4273984);

Análise nº 124/2019/AD (SEI 4106831);

Informe nº 28/2019/COUN1/COUN/SCO ( SEI 3910103);

Análise nº 48/2018/SEI/AD (SEI 2479404);

Matéria para Apreciação do Conselho Diretor (MACD) nº 204/2016 (SEI 0562677);

Processo nº 53500.013661/2011-91.

RELATÓRIO

DOS FATOS

O feito foi relatado com proposta para deliberação de mérito pelo Conselho Diretor pelo Conselheiro Aníbal Diniz na Reunião nº 870, realizada em 23 de maio de 2019, ocasião na qual foi apresentada a Análise nº 124/2019/AD (SEI 4106831) e solicitada vista da matéria por este Gabinete. O prazo de vista teve sua prorrogação aprovada pelo Colegiado na Reunião nº 871, realizada em 13 de junho de 2019, por 120 (cento e vinte) dias.

Na sequência, e com vistas a obter subsídios para manifestação também no presente feito, consultou-se a Procuradoria Federal Especializada da Anatel (PFE-Anatel) acerca da aplicação do disposto no art. 17 e em seu Parágrafo único do Regulamento de Controle de Bens Reversíveis (RCBR), aprovado pela Res. nº 447/2006, nos termos do Memorando nº 24/2019/PR (SEI 4273984), de 17 de junho de 2019. Em resposta veio a lume o Parecer nº 479/2019/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI 4322865), de 27 de junho de 2019.

DA ANÁLISE

Trata o presente Voto de apresentar manifestação complementar àquela de relatoria, consubstanciada na Análise nº 124/2019/AD (SEI 4106831), tendo em vista, inclusive, a manifestação da PFE-Anatel nos termos do Parecer nº 479/2019/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI 4322865).

Ressalto que meu posicionamento acerca do fundamento jurídico do instituto da reversibilidade nas concessões do Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC), das ponderações de cunho econômico que o envolvem e de sua extensão, já foi apresentado a este Colegiado em deliberações pretéritas, cabendo citar a Análise nº 3/2018/SEI/LM (SEI 2274830) e o Voto nº 124/2018/SEI/PR (SEI 3600096), condutores na deliberação dos autos nº 53500.009630/2013-06 (Acórdão nº 737, de 26 de dezembro de 2018, SEI 3653530).

Nesse sentido, julgo oportuno, de início, reiterar tal entendimento, que harmoniza-se com a proposta do Relator do presente feito.

I - Do fundamento jurídico da reversão nas concessões do STFC, das ponderações de cunho econômico, da extensão da reversibilidade

O setor de telecomunicações brasileiro se assenta em bases jurídicas sólidas. Nessa perspectiva, é relevante repisar que o ordenamento setorial contempla a figura da reversão, mas não estabelece previamente sua incidência sobre todo o acervo de ativos das concessionárias, nem ao menos a impõe como medida a ser necessariamente adotada. A opção pela reversão e seu escopo foram delegados ao regulador. Nos termos da Exposição de Motivos nº 231, de 10/12/1996, do Ministério das Comunicações:

Em se tratando de serviço de interesse coletivo, cuja existência e continuidade a própria União se comprometa a assegurar, os bens que a ele estejam aplicados poderão (e não deverão) ser revertidos ao Poder concedente, para permitir a continuidade do serviço público. Mas nem sempre o princípio da continuidade do serviço público supõe a reversão dos bens que lhe estejam afetados. Quando os bens do concessionário não forem essenciais à sua prestação, quer por obsolescência tecnológica, quer pelo esgotamento de sua própria vida útil, a reversão não deverá ocorrer, não precisando, os bens, ser reintegrados ao patrimônio do poder concedente, ao término da concessão. A não ser, é claro, que por motivos devidamente justificados, reclame o interesse público tal reversão. Daí a facultatividade do instituto, que o Projeto agasalhou, ao deixar que o contrato defina quais são esses bens, visando evitar ônus financeiro desnecessário para o concedente (destaque nosso).

Com efeito, é evidente que ao instituto da reversibilidade foi atribuído pelo legislador democrático caráter de facultatividade. Nesse passo, a conformação da cláusula de reversão nos Contratos de Concessão do STFC é escolha do regulador, pautada por considerações de conveniência e oportunidade a serem fundamentadas em aspectos de natureza tecnológica e econômica. Nesse contexto, devem-se avaliar as vantagens da reversão como instituto voltado ao atendimento do princípio da continuidade em contraste com seus efeitos adversos, sendo esse o sentido da redação do art. 93, IX, da Lei nº 9.472/1997 (Lei Geral de Telecomunicações - LGT), que determina que o Contrato de Concessão deve indicar os bens reversíveis, se houver. Assim, repito em adesão à manifestação da SCO que a figura da reversão somente se justifica se estiver alinhada com o objetivo de continuidade da prestação do serviço, que constitui seu fundamento jurídico.

Não há espaço para erigir a valorização patrimonial da concessão como objetivo a ser buscado dentro do modelo regulatório do setor de telecomunicações por meio do instituto da reversão. O vínculo precípuo que se estabelece com a reversão é o da continuidade do serviço, não o de uma finalidade hipotética de maximização do acervo patrimonial a ser revertido à União ao término da concessão.

É preciso lembrar que jurídica e historicamente, a outorga de concessão para a exploração do STFC e a privatização das empresas componentes do Sistema TELEBRÁS foram eventos distintos. O contrato original de concessão (Res. nº 26/1998) foi celebrado a partir da previsão constante do art. 207 da LGT. No momento de assinatura do ajuste, as prestadoras de STFC então existentes concordaram em afetar à prestação do serviço em regime público, parcela de seu patrimônio preexistente - e bem assim de seus investimentos futuros - sujeitando-se à reversão desse capital. No caso específico das empresas do Sistema TELEBRÁS, tem-se um patrimônio inicial formado pelos recursos indicados no art. 5º da Lei nº 5.792/1972. Em conformidade com a situação descrita na Exposição de Motivos nº 231/1996, pouco mais de 20% do capital total da TELEBRÁS era detido pela União. Foi essa parcela do capital social da TELEBRÁS o objeto de alienação no processo de privatização dessas entidades (Edital nº 1/1998-MC/BNDES). Assim temos, concessão - outorgada mediante a assinatura do Contrato - e privatização - que ocorreu posteriormente e teve como objeto tão somente a parcela do Capital Social da TELEBRÁS detida pela União. Logo, não é cabível qualquer argumento que vincule a reversão a uma recuperação de patrimônio público alienado em 1998.

É no Contrato de Concessão que se deve buscar a disciplina a ser aplicada à reversão dos bens das concessionárias do STFC. Foi no momento de celebração desse ajuste que as então prestadoras do STFC manifestaram sua aquiescência ao regime jurídico ali estabelecido e concordaram em submeter à reversão parcela de seu patrimônio e de seus investimentos futuros, nos termos estabelecidos no Contrato. Perceba-se que as redações das Cláusulas 22.1 do Contrato de Concessão do STFC, aprovado pela Res. nº 552/2010, e 20.1 do Contrato aprovado pela Res. nº 678/2017 mostram-se de acordo com o adiantado entendimento a respeito de um critério de reversibilidade decorrente da indispensabilidade do bem para a prestação do serviço, pois limitam expressamente dessa forma sua incidência. 

A questão foi objeto de extenso debate nos autos nº 53500.025781/2011-31 (o conhecido "Caso Martiniano"1), no qual foi proferido o Despacho nº 2.262/2012-CD - com fundamento na posição defendida na Análise nº 131/2012-GCRZ, de 9/3/2012. O entendimento ali adotado acrescentava - ao requisito funcional - a importância econômica dos bens da concessionária para a sustentabilidade da concessão após seu termobem como para a preservação da modicidade tarifária.

Tal visão, rotulada "patrimonialista", aponta a incidência da reversibilidade não somente sobre os bens aplicados diretamente na exploração do serviço concedido, mas também sobre aqueles destinados à geração de outras receitas alternativas, inclusive as decorrentes da exploração de outros serviços pela concessionária, em regime privado. De qualquer forma, no que tange à "taxonomia", registro que classificar visões como "patrimonialistas" ou "funcionais" não parece ajudar na compreensão do tema. Ao contrário, na maioria das vezes é uma simplificação esquemática para que se possa, apressadamente, tomar partido sem a devida reflexão.

Vale notar que este Colegiado, em sua 842ª Reunião, realizada em 18/1/2018, deliberou pela revogação, de ofício das alíneas do referido Despacho que, respectivamente reconheciam a reversibilidade de bens imóveis administrativos e aprovavam diretrizes para  para a anuência de operações envolvendo a desvinculação, alienação ou substituição de bem integrante da Relação de Bens Reversíveis ou o emprego de bens de terceiros diretamente na prestação do serviço concedido nos termos da citada Análise nº 131/2012-GCRZ.

O tema da reversibilidade já foi intensamente debatido tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência dos Tribunais Superiores, em discussões que contribuem para o entendimento da questão. Nesse sentido, faz-se referência à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário nº 32.865, no qual - embora não se tratando diretamente do setor de telecomunicações, mas de transportes - se reconheceu que o patrimônio da concessionária nunca está totalmente abrangido pela reversão (ainda que eventualmente haja disposição expressa). Isto porque, por sua própria natureza, o instituto buscar assegurar ao Poder Concedente tão somente a transferência da propriedade dos bens efetivamente aplicados na fruição do serviço. Ou seja, demais ativos de propriedade, empregados em outras atividades, não podem ser objeto de reversão.

Tal entendimento aplica-se ao âmbito setorial também, e sobretudo, por força da legislação própria: a opção pela reversibilidade pressupõe a identificação dos bens indispensáveis à fruição do STFC, não se aplicando àqueles que não se revestem desse caráter de imprescindibilidade. Essa consideração é importante diante da constatação de que, pelo disposto nos arts. 86 e 207, §3º, da LGT, é facultada às concessionárias do STFC a exploração de outros serviços de telecomunicações. Logo, os ativos utilizados na exploração desses outros serviços - que não se revelem também indispensáveis à fruição do STFC - constituem patrimônio privado excluído da reversão e livremente disponível, por exemplo. Tal raciocínio mostra igualmente evidente para bens que sequer vêm sendo explorados, como o imóvel sob exame.

A decisão do STF no Recurso Extraordinário nº 65.646 também conforma outro precedente judicial digno de nota. Na oportunidade, foi albergada premissa de que os bens das concessionárias que não são utilizados na prestação do serviço concedido, ainda que gerem rendas para a concessionárianão são atingidos pela reversão, e somente podem ser transferidos ao domínio do Estado mediante a utilização da desapropriação ou mecanismo equivalente.

Cabe aqui igualmente fazer referência à decisão adotada por este Colegiado nos autos nº 53500.004493/2009-29, em sua 777ª RCD, realizada em 11/6/2015, tendo sido expedido o Acórdão nº 215/2015-CD, de 15/6/2015. Ali deliberou-se, por unanimidade, que o acompanhamento dos Contratos de Concessão do STFC se faça nos termos apresentados no Voto nº 85/2015-GCIF, de 5/6/2015. No âmbito do aludido Voto foram feitas as seguintes considerações que, a despeito de sua extensão, vale sua reprodução para melhor compreensão do tema:

4.2.155. Não se confunde, portanto, a tarifa módica com a tarifa razoável, que é aquela que não só cobre os custos do serviço como ainda propicia ao concessionário uma remuneração adequada de seu investimento. O autor esclarece ainda que modicidade e razoabilidade de tarifas podem ser objetivos conflitantes em determinados casos:

Fala-se em tarifa razoável para referir tarifas cujo valor pressuponha, no contexto da remuneração do concessionário, margens de retorno razoáveis, adequadas ao funcionamento do serviço público. Razoáveis serão as tarifas que importem não em margens de retorno excessivas ou irrisórias, mas fixadas em medida compatível com a realidade econômico-financeira do ajuste concessório, de acordo com parâmetros de economicidade e eficiência abstratamente concebidos.

Percebe-se então que a noção de razoabilidade da tarifa está voltada para dentro da concessão, sendo um conceito-referência para, na integração dos elementos implicados no sistema remuneratório da concessão, aferir-se a adequação da margem de retorno do concessionário, ao passo que modicidade da tarifa será aferida e calibrada relativamente ao usuário, sendo um aspecto que toca diretamente aos usuários do serviço. Assim, uma concessão pode pressupor margens de retorno adequadas a partir de tarifas que não atendam à modicidade, do mesmo modo que garantir tarifas módicas não assegura em todos os casos margens de retorno razoáveis. Caso a prática de tarifas módicas e razoáveis importe em retirar do projeto de concessão a condição de autossustentabilidade, devem-se buscar, como dito atrás, meios de subsidiar a prestação deficitária do serviço público.

4.2.156. É nesse ponto que ganham destaque as receitas alternativas, complementares e acessórias da concessão, que podem contribuir para a sustentabilidade econômica de um projeto que, privado dessas fontes adicionais de rendimentos, ou não seria sustentável ou redundaria em tarifas inacessíveis para a população. Essa interligação entre modicidade tarifária e receitas complementares é defendida expressamente por Vernalha Guimarães nos seguintes termos:

A complementação da receita remuneratória do concessionário por fontes alternativas tem o propósito de assegurar a modicidade tarifária, absorvendo em favor da redução no preço das tarifas todas as oportunidades lucrativas vinculadas à exploração do serviço público na concessão. Essas atividades lucrativas associadas à prestação de serviços públicos concedidos, embora não se confundam com o objeto propriamente da delegação (porquanto se configuram atividades econômicas destituídas das características do serviço público, não atraindo daí o seu regime específico), serão desempenhadas pelo concessionário (paralelamente à realização do serviço público e segundo outro regime de prestação) como um meio a ampliar suas receitas e subsidiar (mesmo que parcialmente) o custeio do serviço público concedido, alcançando-se a redução das tarifas cobradas dos usuários. A prescrição deve ser compreendida a partir do princípio da modicidade tarifária aplicável às concessões.

Em muitos casos, o lucro auferido por conta do desempenho desses negócios associados ao projeto da concessão configurará solução à execução autossustentável (sem o recurso a aportes do poder público) do serviço público. Assim, um projeto que envolva custos operacionais que ultrapassem a perspectiva de retorno financeiro oriundo da cobrança de tarifas módicas dependerá da complementação da receita do concessionário por fontes alternativas. Nesses casos, a adição de outras fontes de remuneração é condição de viabilidade econômico-financeira da concessão.

4.2.157. As receitas alternativas, portanto, permitiriam não só a cobrança de tarifas módicas, ainda que abaixo do respectivo custo, como também a própria supressão da tarifa, vez que, conforme admite Maria Sylvia Zanella Di Pietro, pode haver concessão remunerada tão somente por receitas decorrentes da exploração comercial do serviço, ainda que não provenientes diretamente do pagamento efetuado pelo usuário.

4.2.158. Hipótese de tal natureza, no entanto, somente será verificada caso haja uma escolha deliberada do Poder Concedente, a partir de considerações sobre a essencialidade do serviço e das políticas públicas que regem sua prestação. Como alerta Carlos Ari Sundfeld a partir da leitura do art. 175, parágrafo único, inciso III, da Constituição Federal, a política tarifária de cada serviço deve ser deduzida a partir das respectivas leis de regência, bem como dos contratos de concessão e demais regulamentos setoriais. É por essa razão que se torna imperioso o conhecimento da política tarifária estabelecida em lei para os serviços de telecomunicações, bem como o papel que o princípio da modicidade tarifária desempenha nesse subsistema normativo. Nesse processo, é preciso ter cautela na transposição de conceitos e doutrinas formulados para a concessão comum para o ordenamento setorial das telecomunicações.

4.2.159. A discussão acerca da incompatibilidade entre razoabilidade e modicidade de tarifas não é estranha à estruturação do modelo regulatório das telecomunicações. Conforme se verifica no seguinte excerto da Exposição de Motivos nº 231, de 10/12/1996, do Ministério das Comunicações, o enfrentamento do tema foi necessário no momento em que se buscou idealizar uma solução para a universalização do acesso aos serviços de telecomunicações:

A ideia de universalização do acesso contempla duas situações genéricas:

• serviços de telecomunicações individuais, com níveis de qualidade aceitáveis, devem ser fornecidos, a tarifas comercialmente razoáveis, dentro de um prazo razoável, a qualquer pessoa ou organização que os requisitar [sem grifos no original];

• outras formas de acesso a serviços de telecomunicações devem ser fornecidas, em localizações geográficas convenientes, a tarifas acessíveis, àquelas pessoas que não tiverem condições econômicas de pagar tarifas comercialmente razoáveis por serviços individuais [sem grifos no original].

Na primeira dessas situações, as tarifas cobrem os custos operacionais e proporcionam retorno comercialmente atrativo ao capital investido, de modo que os provedores de serviço buscarão, normalmente, satisfazer a esses clientes como parte de sua estratégia de negócios. Ou seja, a competição na exploração dos serviços fará com que os consumidores economicamente atrativos sejam atendidos satisfatoriamente, tendo acesso a serviços que supram de forma adequada suas necessidades de telecomunicações.

Já a segunda situação diz respeito àqueles casos em que o custo de prover o acesso físico seja elevado (por exemplo, em localidades remotas do interior do País, nas áreas rurais, nas periferias das grandes cidades, em regiões escassamente povoadas) ou em que os clientes potenciais disponham de renda inferior à que seria necessária para criar uma oportunidade de investimento atrativa para algum provedor de serviço. Nesse caso, o acesso a serviços de telecomunicações poderá requerer algum tipo de subsídio, que deverá ser idealizado e distribuído de modo a não criar vantagens nem desvantagens para nenhum dos operadores e, ao mesmo tempo, possibilitar o atendimento a esse objetivo social ao menor custo.

Atender a essa segunda situação é o que comumente se chama de obrigação de serviço universal, e financiar essa obrigação é o terceiro ponto fundamental da regulação tratada nesse item [grifos no original].

4.2.160. O princípio da modicidade tarifária no setor de telecomunicações, portanto, coloca-se com especial evidência diante do objetivo de universalização do acesso aos serviços. No entanto, os esforços de concretização desse princípio devem respeitar outro pilar fundamental da reforma institucional do setor, qual seja, a competição. Nesse sentido, o financiamento das obrigações de universalização deve ser neutro do ponto de vista competitivo, ou, em outros termos, não deve criar vantagens nem desvantagens para nenhum dos operadores e, ao mesmo tempo, possibilitar o atendimento a esse objetivo social ao menor custo.

4.2.161. A própria Exposição de Motivos nº 231, de 10/12/1996, do Ministério das Comunicações, trata de identificar possíveis fontes de financiamento dos planos de universalização compatíveis com as demais premissas do modelo, especialmente a competição. Nesse esforço, os subsídios governamentais diretos e a criação de um fundo específico de financiamento da universalização são caracterizados como fontes viáveis e harmônicas com os pressupostos do modelo. Por sua vez, a prática de subsídios cruzados internos à concessionária é considerada incompatível com a competição. No entanto, é contemplada no projeto como solução temporária, consoante a seguinte argumentação:

Portanto, muito embora o princípio da livre concorrência seja incompatível com a prática de subsídio entre serviços de telecomunicação ou entre segmentos de usuários (por exemplo, rurais e urbanos), tal prática poderá ser autorizada pela regulamentação, desde que necessária à viabilização do cumprimento dos deveres de universalização e seja instituída por ato motivado, em que se explicitem sua natureza, os recursos envolvidos, e os serviços ou segmentos onerados e beneficiados.

4.2.162. A redação da LGT expressa os fundamentos da reforma institucional consignados na Exposição de Motivos nº 231, de 10/12/1996, do Ministério das Comunicações. Primeiramente, cabe destacar o art. 6º da Lei, que afirma que os serviços de telecomunicações serão organizados com base no princípio da livre, ampla e justa competição entre todas as prestadoras, devendo o Poder Público atuar para propiciá-la, bem como para corrigir os efeitos da competição imperfeita e reprimir as infrações da ordem econômica. Em decorrência desse princípio, são vedadas as condutas de prática de subsídios para redução artificial de preços e tarifas, bem como o subsídio entre modalidades de serviços, nos termos dos arts. 70, inciso I, e, 103, § 2º, da LGT. Verifica-se, em um primeiro momento, portanto, que a utilização de fontes alternativas de receitas para propiciar a prática de tarifas não autossustentáveis – vale dizer, subsidiadas – encontra obstáculo na própria lei de regência do setor, que veda a utilização de subsídios cruzados entre serviços ou entre segmentos de usuários para a redução artificial das tarifas por consistir prática contrária ao princípio da livre, ampla e justa competição.

4.2.163. É justamente por essa razão – a necessidade de construção e manutenção de um ambiente competitivo – que, como salienta Carlos Ari Sundfeld, a LGT faz menção a preços e tarifas razoáveis (arts. 2º, inciso I, e 89, inciso I) e não a tarifas módicas. A lógica concebida sob a égide da Lei nº 8.987, de 13/2/1995, que admite a prestação do serviço público parcial ou totalmente subsidiada por outras receitas, é compatível com a exploração em regime de exclusividade. No entanto, tarifas artificialmente baixas, insuficientes para a cobertura dos respectivos custos e remuneração do capital, são incompatíveis com um ambiente competitivo.

4.2.164. Isso não quer dizer que o modelo de regulação do setor de telecomunicações tenha sido omisso em relação à garantia do acesso aos serviços àquelas populações que, em função de sua localização geográfica ou condição socioeconômica, não tenham como arcar com tarifas comercialmente razoáveis. Com efeito, a LGT não deixou de prover uma solução para o conflito entre razoabilidade e modicidade de tarifas, que será equacionado no âmbito das obrigações de universalização. Essa solução, no entanto, há de ser necessariamente neutra em termos concorrenciais, consoante expresso no art. 80, § 1º, da citada Lei. Por essa razão, os mecanismos de financiamento dessas obrigações foram previstos na própria LGT, que contemplou tão somente de forma excepcional e temporária, a prática de subsídios entre modalidades de serviços, consoante a redação de seu art. 81, parágrafo único, inciso I.

4.2.165. Essa discussão revela, em primeiro lugar, que os esforços para garantir amplo acesso da sociedade aos serviços de telecomunicações devem ser compatibilizados com a criação e manutenção de um ambiente de livre, ampla e justa competição. Nesse contexto, sobressai a necessidade de preservar tarifas comercialmente razoáveis, que não sejam prejudiciais à entrada de novos concorrentes. A tarifa módica, portanto, deve ser admitida enquanto for compatível com um mercado competitivo. E a solução construída pelo legislador, aplicável apenas ao serviço prestado em regime público, ao qual se imputam obrigações de universalização, foi a instituição de um fundo – no caso, o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST) – para cobrir tão somente a parcela de custo que não puder ser recuperada com a exploração eficiente do serviço, nos termos do art. 81. Tal foi o mecanismo neutro à competição concebido e autorizado pela LGT.

4.2.166. Portanto, o princípio da modicidade tarifária, no subsistema normativo do setor de telecomunicações, deve ser ponderado com outros princípios igualmente relevantes, especialmente o da livre, ampla e justa competição. Essa ponderação é feita por meio das obrigações de universalização, que buscam igualmente garantir o acesso da população aos serviços de telecomunicações, mediante o uso de fonte de financiamento neutra do ponto de vista competitivo.

4.2.167. Por conseguinte, é vedada a utilização de receitas decorrentes da exploração de outros serviços de telecomunicações pela concessionária para promover a modicidade das tarifas do STFC. As tarifas do serviço concedido devem ser compatíveis com o regime de livre, ampla e justa competição, razão pela qual não podem ser subsidiadas, ainda que parcialmente, com receitas oriundas da exploração de outros serviços. Contabilizar as receitas de varejo auferidas pela concessionária com a oferta do SRTT/SCM no âmbito do equilíbrio econômico-financeiro do contrato significaria atribuir-lhes encargos equivalentes, na forma de reduções tarifárias do serviço concedido ou de obrigações adicionais que não poderiam ser integralmente suportadas pelas tarifas do STFC. Em qualquer hipótese, tais encargos não seriam sustentáveis em um regime puramente concorrencial, vez que dependentes de subsídio cruzado entre modalidades de serviço. Este mecanismo, que seria aceitável na exploração de um serviço público em regime de exclusividade, é incompatível com as premissas do modelo de regulação do setor de telecomunicações. A ampliação do acesso a serviços essenciais de telecomunicações ocorre, nos termos da LGT, por meio da imposição de obrigações de universalização, que possuem mecanismos próprios de financiamento, previstos em lei.

4.2.168. As receitas decorrentes da exploração de outros serviços de telecomunicações, portanto, não integram o conjunto de remunerações que a concessionária aufere em razão do contrato e, por conseguinte, não devem integrar o escopo da equação do equilíbrio econômico-financeiro. (destaques nossos)

Nesse sentido, a maximização do estoque de bens reversíveis não implica viabilidade econômica da concessionária, nem tampouco a modicidade tarifária.

As ponderações de cunho econômico da Análise nº 131/2012-GCRZ também devem ser reanalisadas porque a correlação entre estoque de ativos e modicidade tarifária é oposta àquela ali descrita. A variação líquida do capital imobilizado da concessionária, contabilizada a partir do balanço entre variações das contas de ativo total e alugueis, tem implicação direta sobre a modicidade tarifária do STFC, na medida em que são importantes insumos no cômputo do Fator X. O custo de capital é composto a partir do ativo total da concessionária e inclui todo seu acervo patrimonial. E as despesas operacionais incluem, obviamente, as rubricas de alugueis. Assim, ao contrário do exposto naquela Análise, a redução do capital empregado na concessão, em função da alienação de ativos, que não seja compensada pelo aumento dos alugueis – situação esperada quando uma concessionária decide alienar um bem próprio e substituí-lo por bens de terceiros – resulta em ganhos de produtividade. Mantido o nível de produção, o resultado esperado, por definição, favorece (e não atenta contra) a modicidade tarifária, devido ao compartilhamento de maiores ganhos de produtividade capturados pelo Fator X. O próprio modelo de price cap produz tal incentivo. Em regra, toda concessionária procurará um ponto ótimo – e não um mínimo – para seu ativo imobilizado, pois os ganhos de produtividade obtidos a partir dos fatores de produção disponíveis, ainda que compartilhados com os usuários, não deixam de por ela serem percebidos. Isto é dizer que impor diretrizes que visem à maximização do estoque de bens reversíveis representa um entrave à produtividade da prestadora com efeito nocivo sobre as tarifas. Tais afirmações podem ser verificadas em simulações de cenários contidas na Análise nº 5/2015-GCIF, apresentada nos autos do referido processo nº 53500.025781/2011-31.

No mais, a proposição por manter artificialmente elevado o estoque de bens reversíveis não prejudica apenas o usuário, mas pode impor perdas desnecessárias à União, tendo em vista eventuais pedidos de indenização contra o Estado, que provavelmente seriam levados à apreciação do Judiciário caso a interpretação sobre a reversibilidade resulte em expropriação de bem privado sem a justa e devida remuneração.

Percebe-se então ser incoerente a submissão à reversibilidade de bens cujas características transcendem as necessidades fundamentais da operação e atualização da prestação do STFC em regime público. Sobre essa relação, reforço que a manutenção desses ativos no acervo de bens reversíveis impõe um ônus extraordinário à concessionária, com efeitos indesejáveis sobre as tarifas, e um risco à União, que poderia, eventualmente, ser condenada a indenizá-la. 

Com isso, o desfecho que melhor associa as diretrizes legais e as expectativas de modernização, competição e modicidade das tarifas dos serviços prestados em regime público pode ser estabelecida por procedimentos baseados em critérios que considerem tanto a vigilância do Estado sobre o acervo crítico para continuidade do serviço concedido quanto a liberdade assegurada ao ente privado para alocar seus ativos de modo a preservar suas condições de competição num mercado em constante transformação.

Não há tampouco razão para se vincular a reversão a uma suposta continuidade tarifária de longo prazo, após o término das atuais concessões. Na remota hipótese de que venham a ser assinados futuros contratos de concessão com o mesmo objeto, se esses vierem a ser celebrados com terceiros beneficiários da reversibilidade, não estarão vinculados às condições atuais. O atual patamar de tarifas do STFC decorre dos valores iniciais e das regras de reajuste e revisão estabelecidas no contexto de quase vinte anos atrás. A base tecnológica, os custos de produção e o nível de demanda são totalmente diferentes hoje e serão ainda mais a partir de 2025, de forma que não faz sentido defender a manutenção da relação de equilíbrio econômico-financeiro existente nos ajustes firmados em 1998. A equação financeira estabelecida em um contrato não se estende ao que lhe suceder, vez que depende das condições mercadológicas e tecnológicas do momento do ajuste e, ao menos em parte, da capacidade e do interesse da futura concessionária em agregar sinergias com outras atividades. 

Um novo contrato supõe uma nova equação econômico-financeira, que será gerada a partir das condições de execução do serviço. Essas, por sua vez, serão definidas em função da evolução da demanda e das políticas de universalização a serem estabelecidas. Não se pode pressupor que, em um setor de rápida evolução tecnológica, o cenário da prestação do STFC nos vinte anos seguintes a 2025, especialmente no que tange a custos e tecnologias disponíveis para a prestação do serviço, seja o mesmo vigente no atual período. Portanto, nada impede – ao contrário, recomenda-se – que ao se desenhar, ainda que em imaginação, os novos contratos, sejam atualizados patamares tarifários em função de uma nova avaliação dos custos da prestação do serviço ou ainda que se busquem tarifas inferiores às atuais por meio do próprio procedimento licitatório a ser realizado, nos termos do art. 89, III, da LGT.

Aquilo que se deve gerir permanentemente é o conjunto ótimo de ativos que, empregados diretamente na fruição do serviço, mostrem-se efetivamente críticos à sua continuidade. Nesse contexto, é inevitável reconhecer que, diante do caráter dinâmico da exploração de serviços de telecomunicações e da acelerada evolução tecnológica que marca o setor, determinados bens venham a se mostrar desnecessários à prestação do serviço. Não se trata aqui apenas de esgotamento de vida útil. Cuida-se de bens que, seja pela adoção de arranjos mais eficientes de alocação, seja pela introdução de novas tecnologias, não necessitam mais ser aplicados à prestação do STFC no âmbito da concessionária, ainda que possam ser aproveitados em outras atividades, seja pela prestadora ou por terceiros. Em tais casos, manter a reversibilidade sobre esses bens mostra-se medida prejudicial à eficiência empresarial e à própria modicidade tarifária, pois faz recair sobre a tarifa o custo de amortização de um bem que não mais é necessário à prestação do serviço. Mais prejudicial seria a manutenção da regra de reversibilidade sobre bens que jamais estiveram associados à prestação do serviço.

Todo esse arrazoado demonstra que, em se tratando sobretudo de imóveis, o critério de incidência da reversibilidade não pode prescindir de um exame caso a caso; não havendo justificativa para a aplicação de forma automática do instituto. Entendo que lógica harmoniza-se com o preceito insculpido no art. 3º, IV, do RCBR, no qual justamente se propôs a Agência a dar um conceito a bens reversíveis:

Art. 3º Para efeitos deste Regulamento, são adotadas as seguintes definições:

(...)

IV - Bens Reversíveis: equipamentos, infra-estrutura, logiciários ou qualquer outro bem, móvel ou imóvel, inclusive Bens de Massa, ou direito integrantes do patrimônio da Prestadora, de sua controladora, controlada ou coligada, indispensáveis à continuidade e atualidade da prestação do serviço no regime público; (destaque nosso)

Por força da redação regulamentar qualquer bem imóvel, indispensável à continuidade e atualidade da prestação do serviço deve ser tido como reversível. Por exclusão óbvia, imóveis desassociados dessa finalidade - como aquele examinado no presente procedimento - não o são.

Nos autos do Processo TC 024.646/2014-8, instaurado a partir de Relatório de Auditoria que avaliou a atuação da Anatel, nos anos de 1998 a 2014, no exercício das atividades de regulamentação, fiscalização, acompanhamento e controle de bens reversíveis foi expedido o Acórdão nº 3311/2015–TCU–Plenário, no bojo do qual fixaram-se diversas determinações e recomendações a respeito da matéria. Em um primeiro momento, a Agência opôs Embargos de Declaração, por meio do Ofício nº 154/2015/PR-Anatel de 29/12/2015, visando sanear aparentes contradições, omissões e obscuridades contidas no decisum. Resultante dessa medida, foi expedido o Acórdão nº 1809/2016–TCU–Plenário, pelo qual os Embargos foram parcialmente acolhidos. Ali, diante da alegação da Agência quanto a obscuridade no Acórdão embargado no que concerne à extensão do conceito de bens reversíveis, foram feitas as seguintes ponderações pelo Min. Relator Benjamin Zymler:

Inicialmente, ressalto que o conceito de bens reversíveis tem gerado inúmeras discussões. Diante disso e considerando que esse conceito é fundamental para o deslinde das questões analisadas neste processo, dediquei uma parte do meu voto anterior à conceituação jurídica dos bens reversíveis no âmbito da concessão de STFC.

Naquela oportunidade, destaquei que os bens reversíveis são aqueles afetados à prestação do serviço, que serão revertidos ao poder público ao término da concessão, independentemente de terem sido transferidos ao concessionário no momento da concessão ou de terem sido incorporados pelo concessionário ao serviço durante a execução do contrato.

Saliento que a referida afetação decorre do caráter essencial desses bens para a adequada prestação do serviço público concedido, como se observa na cláusula 21.1 dos contratos de concessão celebrados em 1998, a seguir transcrita:

"Cláusula 21.1.- Integram o acervo da presente concessão, sendo a ela vinculados, todos os bens pertencentes ao patrimônio da Concessionária e que sejam indispensáveis à prestação do serviço ora concedido, especialmente aqueles qualificados como tal no Anexo 1 - Qualificação dos Bens Reversíveis da Prestação do Serviço Telefônico Fixo Comutado Local. "

Ao tratar dessa questão, a cláusula 21.1 dos contratos de concessão celebrados em 2006 reiterou serem esses bens imprescindíveis, como se observa abaixo:

"Cláusula 22.1. - Integram o acervo da presente concessão, sendo a ela vinculados, todos os bens pertencentes ao patrimônio da Concessionária, bem como de sua controladora, controlada, coligada ou de terceiros, e que sejam indispensáveis à prestação do serviço ora concedido. especialmente aqueles qualificados como tal no Anexo 1 - Qualificação dos Bens Reversíveis da Prestação do Serviço Telefônico Fixo Comutado Local. "

Em consonância com esse entendimento, a própria Anatel editou o Regulamento de Controle de Bens Reversíveis (RCBR), cujo art. 3°, IV, assim define tais bens:

"IV- Bens Reversíveis: equipamentos, infra-estrutura, logiciários ou qualquer outro bem, móvel ou imóvel, inclusive Bens de Massa, ou direito integrantes do patrimônio da Prestadora, de sua controladora, controlada ou coligada, indispensáveis à continuidade e atualidade da prestação do serviço no regime público. "

Essa definição é consentânea com o conceito utilizado no meu voto que fundamentou o acórdão ora embargado, logo, entendo que ela pode ser adotada no âmbito deste processo, o que afastará a suposta ambiguidade apontada pela embargante.

Assim sendo, julgo que deve ser comunicado à Anatel que a definição sob comento foi considerada adequada pelo TCU.

Na parte dispositiva da decisão foi acordado esclarecer à Anatel que a definição de bens reversíveis constante do art. 3°, IV, do Regulamento de Controle de Bens Reversíveis (RCBR), editado por essa agência reguladora, foi considerada adequada pelo TCU (item 9.2.1). Pontua-se-se que, conquanto se encontre atualmente pendente de deliberação o Pedido de Reexame apresentado pela Agência, tal definição não foi objeto do inconformismo recursal. 

Das ponderações transcritas percebe-se que o Tribunal encareceu a observância da letra das regras contratuais e regulamentares, o que de forma alguma contraria o entendimento apresentado quanto à não reversibilidade do imóvel avaliado.

Nesse contexto, cumpre igualmente ponderar que a corrente discussão no âmbito do Congresso Nacional acerca da revisão do modelo de concessões no setor de telecomunicações, gira em torno de Projeto de Lei (PL nº 3.543/2015, da Câmara dos Deputados, protocolado no Senado Federal sob o PLC nº 79/2016) cuja justificação já contempla premissa semelhante àquela acima apresentada. Do documento em questão, ressalto os seguintes trechos:

Um ponto importante a ser destacado nesta discussão acerca da concessão como instrumento de política pública é que no cerne dessa outorga está a questão da reversibilidade dos bens devidos pela necessidade da continuidade do serviço prestado em regime público. A reversão está, assim, vinculada à necessidade de assegurar a continuidade da prestação do serviço concedido. A esse respeito, é pertinente a leitura dos fundamentos da reforma institucional do setor, constantes da Exposição de Motivos nº 231, de 10/12/1996, do Ministério das Comunicações:

(...)

A disciplina da reversão não deriva diretamente da LGT, já que, conforme art. 93, inciso XI, desse diploma legal, o Contrato de Concessão deve indicar os bens reversíveis, se houver. A reversibilidade pressupõe a identificação dos bens efetivamente indispensáveis à fruição do STFC. Sem embargo, tal tarefa, qual seja, a indicação dos ativos que integram o rol de bens reversíveis é bastante complexa, já que uma mesma infraestrutura de rede pode suportar a prestação de diversos serviços de telecomunicações. Tal fenômeno é usualmente descrito como ‘convergência tecnológica’.

Como resultado desse processo de convergência de redes, bens que outrora eram dedicados unicamente à prestação do STFC em regime público passaram a ser empregados, concomitantemente, para o provimento de outros serviços cujo regime jurídico de exploração não impõe obrigações de continuidade.

Dessa forma, reconhece-se a complexidade associada à definição dos limites da reversibilidade sobre o patrimônio da Concessionária. Contudo, é importante ressaltar que o objetivo do instituto da reversibilidade é preservar a continuidade do serviço, e não disputar a titularidade dos direitos de propriedade das redes. Assim, a continuidade dos serviços não requer que a propriedade das redes esteja nas mãos do poder público. Além disso, a tarefa regulatória associada ao controle e ao acompanhamento da evolução de todos os elementos de rede das Concessionárias parece demasiadamente custosa, senão inviável.

De outra forma, o zelo do princípio da continuidade em telecomunicações por meio de uma abordagem patrimonial é ineficiente, por ser essa tarefa extremamente complexa e custosa, e possivelmente ineficaz, na medida em que implica considerável risco de litígio judicial acerca dos bens. A gestão de direitos e de obrigações – dita como uma abordagem funcional - parece mais eficiente que a imposição de controle patrimonial.

 

II  - Da caracterização da reversibilidade dos imóveis sob exame; da aplicação do art. 17 do RCBR

Conforme apontado em sede de Relatoria, nos termos da Análise nº 124/2019/AD (SEI 4106831), parte do acervo de imóveis objeto da solicitação que foi indeferida pelo Despacho recorrido, consta de manifestação da Recorrente de desinteresse no prosseguimento da discussão administrativa, vez que instaurada lide judicial, conforme Carta CT.0830-2018LLLAD#A (SEI 2885894), de 26 de junho de 2018.

Ora, uma vez que expresso pela parte o desinteresse no provimento recursal administrativo de seu pleito originário para esses imóveis, e não havendo interesse público que exija o prosseguimento de sua tramitação, alinho-me ao entendimento do Conselheiro Relator no sentido de extinguir o trâmite dos pedidos a eles relativos, conforme preceituam o art. 51 da Lei nº 9.784/1999 e o art. 44, §2º, do Regimento Interno da Anatel (RIA), aprovado pela Res. nº 612/2013.

O histórico e a atual situação do imóvel situado na Rua Almirante Brasil nº 200 - São Paulo/SP (Matrícula nº 61.287) encontra-se exposta em detalhes em sede de relatoria. De acordo com os elementos constantes dos autos, carreados em grande parte pela própria fiscalização da Agência, e nos próprios termos do Informe nº 28/2019/COUN1/COUN/SCO ( SEI 3910103), o imóvel atualmente é ocupado por uma concessionária de veículos e também por uma estação do Serviço SMP, a despeito de no passado ter abrigado atividades de suporte à operação do STFC. Em síntese, não há, no presente, característica de reversibilidade.

Igualmente a respeito do imóvel situado na Avenida Brasil, nº 294 - Itupeva/SP, há elementos suficientes nos autos que o apresentam como Clínica Especializada de Odontologia Municipal, de acordo com fiscalização mais recente, consubstanciada no Relatório de Fiscalização nº 1183/2018/GR01 (SEI 3380490). Em linha com as razões do Relator, é importante reconhecer que não há elementos robustos sequer no sentido de que tal imóvel tenha servido à prestação do STFC em qualquer período pós-desestatização.

Cumpre fazer referência às informações acerca do imóvel situado na Rua Agostinho Gomes, nº 1.550 - São Paulo/SP constantes da Análise de relatoria. O que se restou demonstrado foi que o imóvel, que anteriormente abrigou atividades de suporte à prestação do serviço concedido, e que atualmente abriga um edifício residencial, já fora alienado pela Recorrente antes de qualquer anuência de desvinculação pela Agência. Dessa forma, descaberia anuir - neste momento - com uma desvinculação que já ocorreu  e cujos desdobramentos deverão ser objeto de apuração de caráter sancionatório.

Quanto ao imóvel situado na Avenida Brasil, s/nº - Alto Alegre/SP (atual Av. Roberto Pedro Pereira) restou demonstrado tratar-se de um terreno vazio, que nunca abrigou atividades relacionadas ao STFC e que sua pretérita inclusão em RBR foi indevida.

Assim, os indícios de descumprimentos regulamentares pretéritos verificados durante a tramitação deste feito deverão ser objeto de tratamento em Procedimento de Apuração de Descumprimento de Obrigações (Pado), mas não são razão para que se imponha o ônus da reversibilidade sobre os bens de forma indefinida. 

Por fim, mostra-se adequada a proposta da relatoria pelo deferimento do pedido de desvinculação desses imóveis. No mais, em linha com a manifestação da PFE-Anatel no Parecer nº 479/2019/PFE-ANATEL/PGF/AGU (SEI 4322865), o resultado de eventual ulterior alienação dos bens não está submetido à destinação firmada no art. 17 do RCBR. Isto porque tais deveres de depósito em conta vinculada e reaplicação na concessão, apenas se podem aplicar à hipótese de alienação de bens da concessionária que forem considerados reversíveis no momento da operação, o que não vem a ser mais o caso desses imóveis.

Registra-se que o entendimento apresentado, que coincide com aquele trazido pelo Relator da matéria, está em linha com precedente recentíssimo deste Colegiado, a saber a decisão adotada nos autos nº 53500.026108/2012-08, na 872ª Reunião, realizada em 11 de julho de 2019, conforme registro no Acórdão nº 353, de 16 de julho de 2019 (SEI 4393286).

CONCLUSÃO

Diante do exposto, acompanho a proposta do Relator contida na Análise nº 124/2019/AD (SEI 4106831).

Notas de rodapé

1 A discussão nos referidos autos girou em torno, sobretudo, dos efeitos da reversibilidade sobre bens imóveis administrativos e das diretrizes a serem observadas, paralelamente ao disposto no RCBR, em operações que envolvam bens reversíveis e que dependam de anuência da Anatel. A deliberação adotada pelo Conselho Diretor, em sua 842ª Reunião, foi a de revogar, por razões de conveniência e oportunidade, as diretrizes de ambos os temas com fundamento no Voto nº 3/2018/SEI/PR (SEI 2327238). Em síntese, prevaleceu o entendimento de que o estabelecimento de diretrizes deverá se dar no âmbito da revisão do RCBR, e não em caso concreto.

 


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Documento assinado eletronicamente por Leonardo Euler de Morais, Presidente, em 01/08/2019, às 15:39, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 23, inciso II, da Portaria nº 912/2017 da Anatel.


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Referência: Processo nº 53500.013661/2011-91 SEI nº 4448069