Timbre

Informe nº 4/2016/SEI/SCP

PROCESSO Nº 53500.020772/2016-69

INTERESSADO: CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA (CADE)

ASSUNTO

Solicitação de manifestação efetuada pelo CADE por meio do Ofício n.º 4090/2016/CADE, para instruir o Inquérito Administrativo n° 08700.004314/2016-71.

REFERÊNCIAS

Constituição da República Federativa do Brasil;

Lei n.º 9.472, de 16 de julho de 1997, Lei Geral de Telecomunicações;

Lei n.º 12.529, de 30 de novembro de 2011, Lei que estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência;

Regimento Interno da Anatel, aprovado pela Resolução n.º 612, de 29 de abril de 2013;

Decreto n.º 8.771, de 11 de maio de 2016, Marco Civil da Internet;

Representação por Infração à Ordem Econômica, apresentada pelo Ministério Público Federal, junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE, datada de 03 de junho de 2016, SEI nº 0757300;

Ofício nº 4090/2016/CADE, de 22 de agosto de 2016, SEI nº 0757253.

ANÁLISE

DOS FATOS

Em 22 de agosto de 2016, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) expediu o Ofício nº 4090/2016/CADE, por meio do qual foi solicitada manifestação desta Agência acerca da representação do Ministério Público Federal junto ao CADE, sobre supostas condutas com efeito anticompetitivo de falseamento ou prejuízo à livre concorrência à jusante, com suposto tratamento discriminatório entre os diversos conteúdos trafegados e aplicativos acessados por meio das redes das prestadoras CLARO S.A., TIM Celular S.A., OI Móvel S.A e TELEFONICA BRASIL S.A., visando a instrução dos autos do Inquérito Administrativo n° 08700.004314/2016-71.

Em razão do trâmite estipulado regimentalmente e da complexidade do tema, observou-se que o prazo estipulado para resposta da solicitação, 12 de setembro de 2016, seria insuficiente para o trâmite interno.

Dessa forma, foi expedido o Oficio nº 387/2016/SEI/CPOE/SCP-ANATEL, em 23 de agosto de 2016, solicitando a dilação do prazo para resposta, por 30 (trinta) dias, contados a partir do encerramento do prazo original.

A representação do Ministério Público Federal (MPF), constante do Anexo Representação MPF (SEI nº 0757300), solicita que sejam apuradas possíveis infrações à ordem econômica, em razão de comportamentos discriminatórios das prestadoras da banda larga móvel.

O MPF inicia sua Representação descrevendo as Representadas, que, segundo sua afirmação e, baseada em dados levantados por esta Agência para o mês de janeiro de 2016, detêm, em conjunto, quase a totalidade do mercado nacional de telefonia móvel.

De acordo com a Representação, a CLARO S.A. (Claro), TIM Celular S.A. (Tim), OI Móvel S.A. (OI) e TELEFONICA BRASIL S.A. (Vivo), ao ofertar a seus usuários planos conhecidos como zero rating, que proporcionam acesso privilegiado a determinadas aplicações, estariam adotando práticas anticoncorrenciais.

Em complemento, foi noticiado pelo MPF em sua Representação que os dois aplicativos beneficiados pela suposta conduta praticada pelas prestadoras móveis seriam o Facebook e o Whatsapp, pertencentes ao mesmo grupo econômico.

Inclusive, o MPF destaca a possibilidade de ampliação no pólo passivo da Representação, considerando que durante a instrução restará clara se a conduta é unilateral ou praticada por meio de acordos.

O MPF entende que as Representadas, de acordo com o seu interesse, estariam adotando práticas discriminatórias ao oferecer planos de acesso à Internet com condições privilegiadas, por meio dos planos de zero rating (ou tarifa zero), nos quais, também supostamente, os usuários não pagam ao utilizarem as redes das operadoras para acessar certos conteúdos ou aplicações.

A título exemplificativo, a Representação colaciona os planos praticados pelas operadoras móveis, quais sejam: A Claro possui o plano "Acesso Facebook, Twitter e WhatsApp", que oferta internet ilimitada para esses aplicativos. A Tim possui o plano "Controle WhatsApp", com internet ilimitada para o aplicativo. A Oi oferta o plano "Facebook e Twitter Grátis", com condições privilegiadas para acesso de tais aplicativos. A Vivo possui dois pacotes, sendo Pacote Vivo Internet Redes Sociais 400MB e Pacote Vivo Internet Redes Sociais 800MB, que são utilizados exclusivamente para acesso ao Facebook, pagando, para tanto, valor menor do que aquele contratado para acesso de outro tipo de conteúdo.

O MPF entende que ao privilegiar alguns serviços de internet em detrimento de outros, gera efeitos falseadores da concorrência e dominação artificial do mercado por parte de certos agentes econômicos, além de desvirtuar a natureza aberta da internet.

Inclusive, complementa o MPF, sob a ótica dos consumidores, a conduta distorce a concorrência, na medida em que sendo o consumidor o beneficiário, o mesmo fica tolhido do seu direito de escolha e é enganado em relação à isonomia no acesso às aplicações, atuais e futuras.

Em síntese, se a prática adotada persistir, em pouco tempo teremos uma internet seletiva e economicamente inacessível da maneira aberta como era originalmente.

A Representação delineou o enquadramento da conduta anticoncorrencial imputada às prestadoras móveis à luz da Lei nº 12.529/2011, discorrendo sobre suposta afronta ao Marco Civil da Internet e ao princípio da neutralidade de rede, gerando efeitos flagrantemente falseadores da concorrência e dominação artificial do mercado por parte de certos agentes econômicos, além de nítido desvirtuamento da natureza aberta da internet.

Inclusive, ao favorecer o acesso a alguns deles (os aplicativos), estabelecidos no mercado, em detrimento de outros, atuais e futuros, gera imensas preocupações com a manutenção da abertura da Interna à inovação, novos produtos, desenvolvimento tecnológico e liberdade real dos usuários de escolha dentre os melhores serviços.

Em consonância com o entendimento do MPF, o incentivo implementado pela prática é suficiente para condicionar e distorcer a escolha dos usuários, e, assim, desestimular economicamente seu acesso a outros aplicativos, principalmente em um país com as características socioeconômicas e geográficas do Brasil, em que as classes de menor poder aquisitivo têm seu acesso à internet já restringido pelo seu elevado custo, (...)

Desta forma, reitera o MPF que independentemente da conduta estar sendo financiada pelas prestadoras móveis Representadas ou pelos aplicativos beneficiados, há prejuízo à livre concorrência, na medida em que ao privilegiar aplicativos pertencentes a grandes grupos econômicos, gera barreiras à entrada e reduz os incentivos à inovação, o que é completamente contrário as objetivos do direito antitruste.

Ademais, o MPF discorre sobre a racionalidade econômica dos planos ofertados pelas Representadas, na medida em que a gratuidade dos planos destacados por aquele parquet não traz retorno financeiro às mesmas, pelo contrário, não parece fazer sentido frente à perda de receita que ele mesmo provoca às operadoras, pela redução da utilização do recurso de mensagens de texto SMS, importante fonte de receita.

Tal prática distorce a concorrência, no (s) mercado (s) de aplicativos, a prática objeto da Representação gera incentivos perversos para que as operadoras aumentem significativamente os preços de seu planos de dados móveis e para a compra de dados excedentes, obrigando os usuários a gastarem somas maiores a fim de conseguirem acesso a conteúdos que estão fora daquele espectro de aplicativos escolhidos pela operadora ou daqueles com poder econômico para patrocinar sua inclusão nos planos de acesso privilegiado.

Em consonância com a interpretação do MPF, a conduta das operadoras móveis Representadas importa em entrave à competitividade no setor de aplicativos, uma vez que garantem o status quo dos atuais líderes de mercado, impedindo que outros agentes contestem as posições dominantes atuais, tanto sob o prisma dos desenvolvedores de aplicativos quanto das operadoras.

Para corroborar sua tese a Representação cita jurisprudência do CADE, SDE, SEAE e, ainda da ANATEL.

Por fim, discorrendo sobre a disseminação da conduta imputada às Representadas, o MPF concluiu que tal prática já representa reflexos em empresas que oferecem seus serviços por meio de aplicativos.

É o relatório.

 

DO CONTEXTO REGULATÓRIO

Prefacialmente aos aspectos regulatórios formais, rendemos aqui a devida homenagem à postura adotada por essa Autarquia, consubstanciada por esse pedido de manifestação. Enaltecemos ainda o proveitoso relacionamento que vem sendo construído entre CADE e Anatel, com muitos frutos às atividades sinérgicas de ambas as Autarquias. Assim, nos sentimos honrados em contribuir com o presente processo investigativo e nos colocamos à inteira disposição desse Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE para prestar os esclarecimentos necessários, não apenas fortalecendo os laços institucionais existentes, mas também contribuindo com o aprimoramento da regulação da competição e da advocacia da concorrência, principalmente em um setor tão crítico para o desenvolvimento nacional, como é o caso da indústria de telecomunicações. 

Com o intuito de facilitar a interpretação do leitor, antes de adentrarmos na suposta conduta anticoncorrencial apontada pelo Ministério Público, compete-nos explorar um pouco os conceitos associados à prática denominada zero rating, bem como suas inter-relações com o Marco Civil da Internet e os princípios da defesa da concorrência.

zero rating é uma prática realizada por prestadoras de serviços de telecomunicações que consiste em aplicar um preço zero para o  tráfego de dados móveis associado a uma aplicação ou classe de aplicações em particular, implicando na não contagem desse tráfego para efeitos de uma franquia de dados (data cap) eventualmente aplicada ao acesso à internet contratado..

 O zero rating pode ser compreendido como uma gama de estratégias comerciais, as quais comportam várias espécies as quais, assim exemplificamos:

No caso em tela, pelas informações dos autos, tem-se que a modalidade adotada pelas prestadoras de acesso de banda larga móvel recaiu sobre a modalidade “tarifação zero por escolha própria da operadora”. Assim, até onde é possível saber, inexistem contratos firmados entre as prestadoras de telecomunicações e os fornecedores de aplicativos abarcados pela estratégia comercial adotada.

Devido à relevância do tema, entraremos, agora, na relação entre a oferta de planos zero rating e o disposto no Marco Civil da Internet, aprovado pela Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014, o qual estabelece, in verbis:

“Art. 2º A disciplina do uso da internet no Brasil tem como fundamentos:

...

VI – a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor;

...

Art. 9º O responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicação.

§ 1º A discriminação ou degradação do tráfego será regulamentada nos termos das atribuições privativas do Presidente da República previstas no inciso IV do art. 84 da Constituição Federal, para a fiel execução desta Lei, ouvidos o Comitê Gestor da Internet e a Agência Nacional de Telecomunicações, e somente poderá decorrer de:

I - requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada dos serviços e aplicações; e

II - priorização de serviços de emergência.

§ 2º Na hipótese de discriminação ou degradação do tráfego prevista no § 1º, o responsável mencionado no caput deve:

I - abster-se de causar dano aos usuários, na forma do art. 927 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil;

II - agir com proporcionalidade, transparência e isonomia;

III - informar previamente de modo transparente, claro e suficientemente descritivo aos seus usuários sobre as práticas de gerenciamento e mitigação de tráfego adotadas, inclusive as relacionadas à segurança da rede; e

IV - oferecer serviços em condições comerciais não discriminatórias e abster-se de praticar condutas anticoncorrenciais.

§ 3º Na provisão de conexão à internet, onerosa ou gratuita, bem como na transmissão, comutação ou roteamento, é vedado bloquear, monitorar, filtrar ou analisar o conteúdo dos pacotes de dados, respeitado o disposto neste artigo.

[Grifamos].

Sobre esse aspecto deve-se considerar a análise apresentada no Texto de Referência Acerca do Marco Civil da Internet para o “Fique Por Dentro”, da lavra da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados[1], que faz a seguinte análise sobre o tema “Neutralidade de Redes”:

1) Neutralidade de redes

Nesse quesito, os Substitutivos apresentados pelo relator ao longo da tramitação da matéria foram alterando o conceito de neutralidade. As versões anteriores só permitiam a interferência no tráfego para resolver problemas técnicos e priorizar tráfego de serviços de emergência. Essa neutralidade quase absoluta, que poderia dar maior transparência para o usuário, poderia transformar-se em aumento de custos, pois, para se manter a mesma velocidade para todos os serviços (por exemplo, email e vídeos), seria necessária maior infraestrutura. Para as operadoras de telecomunicações, esse conceito de neutralidade dificultaria a otimização da rede e a geração de novos negócios (por exemplo, priorização de determinados parceiros). Assim, a neutralidade absoluta seria benéfica para provedores de conteúdo de menor poder econômico (que não teriam que pagar possíveis adicionais aos provedores de conexão para garantir seu bom tráfego), serviços concorrentes àqueles oferecidos pelos provedores de conexão (por exemplo, Skype ou Netflix) e usuários intensivos (heavy users, também chamados assinantes premium), que geram muito tráfego.

A atual redação suaviza o conceito de neutralidade, pois indica que a “degradação do tráfego” poderá ser feita para dar suporte a serviços de emergência e para atender “requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada dos serviços”. A versão em análise evoluiu também ao prever que o gerenciamento da neutralidade deverá ser realizado com “proporcionalidade, transparência e isonomia”, deverá “informar previamente ... as práticas de gerenciamento” e “abster-se de praticar condutas anticoncorrenciais”. Dessa maneira, a versão não permitiria que provedores de acesso degradem serviços concorrenciais como estratégia comercial (por exemplo, empresas de telefonia restringirem o tráfego de outras que oferecem telefonia pela internet). A relativização do conceito da neutralidade poderia possibilitar a oferta de pacotes diferenciados, por exemplo, planos de acesso ilimitado a redes sociais ou a determinados conteúdos audiovisuais ou, ainda, para telas pequenas (que geram menor volume de dados).

...

Ainda sob o aspecto financeiro e de gerenciamento da infraestrutura ... a neutralidade absoluta implica que aqueles usuários que demandam pouco tráfego (aqueles que usam a internet somente para checar redes sociais e notícias e mandar e-mails) subsidiem os heavy users, que geram muito tráfego e subscrevem serviços premium (como canais de filmes pela internet).

Igualmente, neutralidade absoluta e uma quantidade infinita de dados por mês é de pouca utilidade para aqueles que acessam a internet a partir de uma telinha de duas polegadas de um telefone celular. Sob o ponto de vista do preço para os usuários, se todos os pacotes são iguais, a neutralidade absoluta implica em que não poderão existir planos com tarifas mais baratas: todos os assinantes de uma certa velocidade terão que pagar o mesmo valor, independentemente de sua necessidade, do seu meio de acesso e de seus recursos financeiros.

[Grifamos].

Além disso, esta Agência, nos autos do Processo SEI nº 53500.001836/2015-41, relativo à manifestação da Anatel sobre a regulamentação da neutralidade de rede prevista na Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014, denominada Marco Civil Internet – MCI, analisou a questão envolvendo a oferta de diferentes planos de negócios e ofertas comerciais disponibilizadas por prestadoras de acesso à internet por meio de banda larga móvel em relação ao conceito de neutralidade de rede introduzido pela citada Lei, consubstanciada na ANÁLISE Nº 20/2016/SEI/AD (SEI nº 0469360), de 5 de maio de 2016, abaixo transcrita (partes selecionadas):

4.1. Trata-se de matéria encaminhada pela Superintendência de Competição, Superintendência de Planejamento e Regulamentação e Superintendência de Relações com Consumidores, acerca de manifestação sobre a regulamentação da neutralidade de rede prevista no Marco Civil da Internet.

4.2. Esta ação está prevista na Agenda Regulatória da Anatel para o segundo semestre de 2015 e o ano de 2016, aprovada por meio da Portaria nº 1.003, de 11 de dezembro de 2015. A referida Agenda traz como meta, até 30 de junho de 2016, a aprovação final do “posicionamento da Anatel para subsidiar Decreto de regulamentação da neutralidade de rede prevista no MCI”.

4.3. Considerando a complexidade do tema, foi instituído Grupo de Trabalho por meio da Portaria nº 87, de 28 de janeiro de 2015, para, em até trinta dias, “subsidiar a elaboração de Consulta Pública com o objetivo de colher da sociedade elementos para a participação da Anatel na regulamentação do art. 9º, §1º, da Lei nº 12.965. de 23 de abril de 2014”.

...

4.6. A Consulta Pública complementou o amplo debate com a sociedade sobre o tema que ocorreu também em outras consultas promovidas pelo Ministério da Justiça – MJ e pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil – CGI.br , todas em linha com a diretriz de ampliar e aperfeiçoar a participação social no processo regulatório.

...

4.12. Desse modo, foram submetidos à sociedade alguns questionamentos a fim de auxiliar na formulação do posicionamento da Anatel acerca da regulamentação prevista no MCI. Estas questões foram segmentadas nos seguintes seis temas:

Tema 1: Prestação adequada de serviços e aplicações

Tema 2: Relações entre os agentes envolvidos

Tema 3: Modelos de negócio

Tema 4: Comunicações de emergência

Tema 5: Bloqueio de conteúdo a pedido do usuário

Tema 6: Outras considerações

...

CONSIDERAÇÕES DO RELATOR

...

TEMA 1: PRESTAÇÃO ADEQUADA DE SERVIÇOS E APLICAÇÕES

Este tema posto em discussão visava delimitar as exceções à neutralidade de rede baseadas em requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada dos serviços e aplicações, previstas no inciso I do artigo 9º do Marco Civil da Internet. Em resumo, a discussão aqui reside em quais seriam tais requisitos e, principalmente, se esta lista de exceções deveria ser exaustiva ou trazer tão somente princípios e diretrizes gerais.

Ao ver da Anatel, a regulamentação do referido inciso não deve buscar ser exaustiva e detalhada demais, sob pena de se tornar obsoleta rapidamente frente  a dinâmica evolução das tecnologias de telecomunicações. Assim, os requisitos técnicos suficientes para garantir a qualidade e a prestação adequada dos serviços e aplicações devem ser previstos como critérios e princípios gerais, sem, contudo, serem abstratos por demais de maneira a possibilitar exceções além das previstas no Marco Civil da Internet.

...

Dito isto, coloca-se algumas premissas segundo as quais deve ser analisada a prestação adequada de serviços e aplicações. A primeira premissa, basilar, refere-se ao fato de que o usuário deve, ao se conectar à Internet, poder acessar qualquer serviço, aplicação e/ou conteúdo nela disponíveis, localizado em qualquer parte do mundo, com níveis de qualidade adequados e sem degradação artificial.

...

TEMA 2: RELAÇÕES ENTRE OS AGENTES ENVOLVIDOS e TEMA 3: MODELOS DE NEGÓCIO

Nestes temas, o objetivo da Agência era colher subsídios sobre a melhor maneira de analisar, à luz da neutralidade de rede estabelecida no Marco Civil da Internet, os novos e dinâmicos modelos de negócio que surgem na Internet. Deveria algum modelo de negócios ser proibido a priori? Ou tal análise deveria ser deixada para os casos concretos à luz de princípios e diretrizes gerais? Tais questões se estendem também ao relacionamento entre os diversos agentes atuantes na cadeia de valor do ecossistema da Internet, tendo em vista que é destes relacionamentos que surgem as bases para os diversos modelos de negócio.

A diversidade dos modelos de negócio permitida pela Internet possibilitou a inovação e o surgimento de novos serviços e aplicações, com novas formas de atendimento às demandas dos usuários em diversos aspectos da economia (telecomunicações propriamente dita – voz, vídeo e mensageria, troca/venda/compartilhamento de recursos, transporte, hospedagem e hotelaria, entre outros).

...

Sendo assim, a citada regulamentação não deve bloquear ou permitir, formalmente e de forma antecipada, quaisquer destes modelos de negócio, sob pena de inibir o surgimento de novos modelos que podem contribuir, por exemplo, para o desenvolvimento e a ampliação do acesso à Internet. Pelo contrário, os agentes atuantes no ecossistema da Internet devem ter flexibilidade para criar seus modelos de negócio dentro dos limites legalmente estabelecidos. Por outro lado, os diversos órgãos governamentais, dentro de sua esfera de competências, devem acompanhar os efeitos destes modelos de negócio, atuando caso verifiquem quaisquer irregularidades, especialmente quanto à premissa de manutenção de uma Internet única e aberta, ou quando verifiquem que os prejuízos aos agentes envolvidos superam os potenciais benefícios.

...

Ainda, é preciso se ter em mente que estes modelos de negócio derivam de relações comerciais e privadas entre os agentes da cadeia de valor do ecossistema da Internet. Estas relações também não devem ser enrijecidas, mas monitoradas pela ANATEL e demais órgãos do Sistema Nacional de Defesa da Concorrência e do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor à luz das ferramentas tradicionais de tratamento de questões concorrenciais e consumeristas.

De fato, a LGT já estabelece que “os serviços de telecomunicações serão organizados com base no princípio da livre, ampla e justa competição entre todas as prestadoras, devendo o Poder Público atuar para propiciá-la, bem como para corrigir os efeitos da competição imperfeita e reprimir as infrações da ordem econômica” (artigo 6º). O artigo 7º da LGT estabelece ainda que “as normas gerais de proteção à ordem econômica são aplicáveis ao setor de telecomunicações, quando não conflitarem com o disposto nesta Lei”.

À titulo de exemplo das ferramentas passíveis de utilização, cita-se o Plano Geral de Metas de Competição – PGMC, editado pela ANATEL por meio da Resolução nº 600, de 8 de novembro de 2012, à luz de sua competência trazida pela LGT, que “dispõe sobre o incentivo e a promoção da competição livre, ampla e justa no setor de telecomunicações prevista na Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, nas hipóteses em que a probabilidade de exercício de poder de mercado por parte de Grupo com Poder de Mercado Significativo em determinado mercado relevante exige a adoção de medidas regulatórias assimétricas”.

...

Comentários do Relator:

Análise nº 20/2016/SEI/AD

Sem dúvida alguma, a diversidade dos modelos de negócio permitida pela Internet possibilitou a inovação e o surgimento de novos serviços e aplicações, com novas formas de atendimento às demandas dos usuários em diversos aspectos da economia.

Cada um destes modelos tem suas características e precisa ser analisado como um todo, sempre considerando os benefícios e prejuízos aos agentes envolvidos. A análise destes modelos de negócios deve ser feita a partir do caso concreto, que reflita as questões consumeristas e os aspectos concorrenciais.

A regulamentação a ser editada não deve bloquear ou permitir, formalmente e de forma antecipada, quaisquer destes modelos de negócio, sob pena de inibir o surgimento de novos modelos que podem contribuir, para o desenvolvimento e a ampliação do acesso à Internet. Pelo contrário, os agentes atuantes no ecossistema da Internet devem ter flexibilidade para criar seus modelos de negócio dentro dos limites legalmente estabelecidos. Por outro lado, os diversos órgãos governamentais, dentro de sua esfera de competências, devem acompanhar os efeitos destes modelos de negócio, atuando caso verifiquem quaisquer irregularidades, especialmente quanto à premissa de manutenção de uma Internet única e aberta, ou quando verifiquem que os prejuízos aos agentes envolvidos superam os potenciais benefícios[7].

Cabe acrescentar nesse tema o debate atual sobre a utilização da franquia nos modelos de negócio de serviços de acesso à banda larga fixa. Vemos que esse tema não foi tratado no âmbito das consultas públicas realizadas pela Anatel e pelo Ministério da Justiça. Nesse interim o tema da franquia cresceu, demonstrando claramente a dinâmica de mudanças no ambiente da Internet e reforçando a necessidade de análise dedicada ao tema envolvendo todas as visões e atores, a partir dos critérios e premissas gerais estabelecidas no ordenamento regulatório vigente.

Como bem pontuado no Relatório elaborado pela área técnica, modelos de negócio derivam de relações comerciais e privadas entre os agentes da cadeia de valor do ecossistema da Internet. Estas relações também não devem ser enrijecidas, cabendo à ANATEL e demais órgãos do Sistema Nacional de Defesa da Concorrência e do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor monitorá-las, considerando as ferramentas tradicionais de tratamento de questões concorrenciais e consumeristas.

Neste ponto, entendemos adequada a minuta de Decreto colocada em debate pelo Ministério da Justiça, que traz critérios e premissas gerais para balizar a análise destes modelos de negócio, além dos já estabelecidos no Marco Civil da Internet, sem, contudo, proibir de maneira antecipada e sem análise mais aprofundada qualquer um deles. Destaco ainda a sugestão correta da área técnica, de incluir o usuário no rol de atores mencionados no art. 15 proposta de Decreto, considerando o que prevê o inciso XVIII do art 19 da LGT.

___________________

[7] À medida que os países fazem a transição para níveis mais elevados de uso da internet, eles necessitam de  regulamentação eficaz sobre a concorrência e seu cumprimento – inclusive a facilidade de entrada e saída das empresas; um maior foco nas habilidades cognitivas e socioemocionais avançadas que são ampliadas pela tecnologia; e sistemas eficazes de fornecimento de governo eletrônico para a gestão de fornecedores e a participação dos cidadãos. Banco Mundial. 2016. “Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial de 2016: Dividendos Digitais”

[Grifamos].

A análise acima apresentada embasou a edição do Acórdão nº 174, de 5 de maio de 2016 (SEI nº 0470167), que acolhendo os seus termos aprovou o relatório analítico, considerado então a posição oficial da Agência acerca do tema, in verbis:

ACÓRDÃO Nº 174, DE 05 DE MAIO DE 2016

Processo nº 53500.001836/2015-41

...

EMENTA

SUPERINTENDÊNCIA DE PLANEJAMENTO E REGULAMENTAÇÃO. SUPERINTENDÊNCIA DE COMPETIÇÃO. SUPERINTENDÊNCIA DE RELAÇÕES COM CONSUMIDORES. MARCO CIVIL DA INTERNET. REGULAMENTAÇÃO DA NEUTRALIDADE DE REDE. CONSULTA PÚBLICA Nº 8/2015. CONTRIBUIÇÕES ANALISADAS. PELA APROVAÇÃO DO POSICIONAMENTO DA ANATEL PARA SUBSIDIAR DECRETO DE REGULAMENTAÇÃO DA NEUTRALIDADE DE REDE PREVISTA NO MARCO CIVIL DA INTERNET.

...

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os membros do Conselho Diretor da Anatel, por unanimidade, nos termos da Análise nº 20/2016/SEI/AD (SEI nº 0469360), integrante deste acórdão, aprovar e publicar Relatório, nos termos do anexo à (SEI nº 0469906 referida análise, contendo manifestação da Anatel sobre a regulamentação da neutralidade de rede prevista no Marco Civil da Internet.

Ante o exposto, verifica-se que o posicionamento desta Agência reforça o entendimento que a oferta de acesso à Internet por meio de banda larga móvel por parte de prestadoras de telecomunicações com diferentes características ...derivam de relações comerciais e privadas entre os agentes da cadeia de valor do ecossistema da Internet. Estas relações também não devem ser enrijecidas, cabendo à ANATEL e demais órgãos do Sistema Nacional de Defesa da Concorrência e do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor monitorá-las, considerando as ferramentas tradicionais de tratamento de questões concorrenciais e consumeristas[2].

Desta forma, considerando o entendimento já exarado por este órgão regulador, no âmbito do Marco Civil da Internet, não é possível amarrar conceitos referentes a modelos de negócios, pois, caso contrário, as relações comerciais seriam inibidas no seu desenvolvimento. Por outro lado, caso seja identificada qualquer hipótese de conduta anticoncorrencial, cabe ao Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência atuar para corrigir eventuais efeitos negativos.

Nesse mesmo sentido, a Presidência da República, no exercício da competência atribuída pelo Legislador para disciplinar eventuais situações de discriminação de tráfego (§1º do art. 9º do MCI), editou o Decreto nº 8.771/ 2016 assim prevendo:

Art. 4º A discriminação ou a degradação de tráfego são medidas excepcionais, na medida em que somente poderão decorrer de requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada de serviços e aplicações ou da priorização de serviços de emergência, sendo necessário o cumprimento de todos os requisitos dispostos no art. 9º, § 2º, da Lei nº 12.965, de 2014.

Art. 5º Os requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada de serviços e aplicações devem ser observados pelo responsável de atividades de transmissão, de comutação ou de roteamento, no âmbito de sua respectiva rede, e têm como objetivo manter sua estabilidade, segurança, integridade e funcionalidade.

§ 1º Os requisitos técnicos indispensáveis apontados no caput são aqueles decorrentes de:

I - tratamento de questões de segurança de redes, tais como restrição ao envio de mensagens em massa (spam) e controle de ataques de negação de serviço; e

II - tratamento de situações excepcionais de congestionamento de redes, tais como rotas alternativas em casos de interrupções da rota principal e em situações de emergência.

§ 2º A Agência Nacional de Telecomunicações - Anatel atuará na fiscalização e na apuração de infrações quanto aos requisitos técnicos elencados neste artigo, consideradas as diretrizes estabelecidas pelo Comitê Gestor da Internet - CGIbr.

Art. 6º Para a adequada prestação de serviços e aplicações na internet, é permitido o gerenciamento de redes com o objetivo de preservar sua estabilidade, segurança e funcionalidade, utilizando-se apenas de medidas técnicas compatíveis com os padrões internacionais, desenvolvidos para o bom funcionamento da internet, e observados os parâmetros regulatórios expedidos pela Anatel e consideradas as diretrizes estabelecidas pelo CGIbr. [grifamos]

Oportuno ressaltar que, naturalmente, o papel institucional da Anatel no tratamento da questão emana da própria Lei que disciplinou a organização do setor de telecomunicações (Lei nº 9.472/97), atribuindo ao Regulador as competências normativas para disciplinar os ditames relativos ao funcionamento, implantação e acesso às redes, inclusive a dinâmica da relação entre os prestadores de serviços de valor adicionado e serviços de telecomunicações, inclusive em sede de eventuais conflitos:

Art. 145. A implantação e o funcionamento de redes de telecomunicações destinadas a dar suporte à prestação de serviços de interesse coletivo, no regime público ou privado, observarão o disposto neste Título.

Parágrafo único. As redes de telecomunicações destinadas à prestação de serviço em regime privado poderão ser dispensadas do disposto no caput, no todo ou em parte, na forma da regulamentação expedida pela Agência.

Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações.

§ 1º Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição.

§ 2° É assegurado aos interessados o uso das redes de serviços de telecomunicações para prestação de serviços de valor adicionado, cabendo à Agência, para assegurar esse direito, regular os condicionamentos, assim como o relacionamento entre aqueles e as prestadoras de serviço de telecomunicações. [grifamos]

A tal competência do órgão regulador, acresce a competência dos órgãos que compõe o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência – SBDC, pois caso seja identificada qualquer hipótese de conduta anticoncorrencial, cabe a ele atuar para corrigir eventuais efeitos negativos.

Com a presente exposição, fundamentada nos distintos atos que se sucederam no tratamento da questão neutralidade, observadas as competências institucionais dos órgãos envolvidos, é possível atestar antecipadamente que: i) qualquer visão estrita e fundamentalista do princípio neutralidade de redes resta completamente afastada no arranjo brasileiro e ii) dispõe o país do aparato regulatório-institucional necessário, adequado e suficiente para enfrentamento de eventuais questões associadas à matéria, por complexas que sejam. 

No presente caso, pela análise dos fatos constantes da Representação do MPF, não foram observados efeitos deletérios para a concorrência. A análise isolada do conceito zero rating não nos permite aferir que a prática importa em prática anticoncorrencial, cabendo, a exemplo da análise de todas as condutas anticoncorrenciais, conforme preceituado no direito antitruste, a avaliação do caso concreto, com todas as suas nuances, conforme será desenvolvido adiante.

Tendo esgotada a questão regulatória-institucional, antes de evoluirmos para análise propriamente dita da suposta prática anticoncorrencial, nos permitimos neste ponto uma breve digressão internacional, não com fins meramente retóricos, mas sim focada nas valiosas lições extraídas de experiências do exterior e de forma complementar às evidências empíricas e teóricas colecionadas pelo Ministério Público Federal.

 

DO ZERO RATING EM CONTEXTO INTERNACIONAL 

Em sua Representação, o eminente Procurador destaca alguns casos de banimento do zero rating, buscando pintar um quadro de crescente compreensão dos países quanto aos efeitos deletérios da prática. Com a devida vênia, a questão está longe de ser algo pacífico ou de convergir a um único posicionamento. Com efeito, extensa produção acadêmica sobre o tema aponta para diferentes matizes de compreensão do problema. Há os que resumem o zero rating a uma estratégia de discriminação competitiva de preços, ou precificação diferencial eficiente[3], em franca oposição aos que sustentam o banimento da prática por nítida afronta ao princípio da neutralidade.

Não por acaso, as abordagens são distintas entre reguladores e autoridades da concorrência ao redor do mundo e muitas autoridades, a exemplo dos Estados Unidos e do Reino Unido, têm adotado postura mais cautelosa ao lidar com o clamor de práticas anticoncorrenciais [4], dadas a dinâmica competitiva e o intenso ritmo de inovações tecnológicas próprios dos mercados de tecnologia da informação. De fato, modelos de negócios, regimes e oportunidades comerciais ainda estão sendo testados no mercado, alguns chegar sequer à maturação, quiçá a uma prática limitadora da livre concorrência.

Nesse sentido, a Representação, apesar de citar alguns casos interessantes, não aprofundou quanto aos efeitos observados em mercados onde as Autoridades optaram pela via mais fundamentalista do princípio da neutralidade e encaminharam pelo banimento do zero rating. Na verdade, esse foi o objetivo de pesquisadoras da Universidade Aalborg (Dinamarca) e London School of Economics (Reino Unido) ao promover investigação no Chile, Holanda e Eslovênia [5]. A publicação, também citada na Reclamação, sustenta em seu desenvolvimento:

Entretanto, as decisões são falhas, de acordo com defensores da neutralidade da rede. As proibições não são uniformes em todas as ofertas e ofertantes. Muitos agentes se queixam de que os esforços feitos para dar mais clareza acabam criando mais confusão. Além disso, reguladores acabam se encontrando em situações embaraçosas de ter que voltar atrás em suas decisões, corrigir declarações anteriores e mediar decisões sobre o porquê o zero rating é OK para o Wikipedia, mas não para o WhatsApp. [tradução livre]

O estudo prossegue e assim conclui (partes selecionadas):

Quanto à afirmação de que os usuários não vão além do conteúdo zero rating, não conseguimos encontrar evidências para essa afirmação em qualquer um dos três países. Quanto à afirmação de que as operadoras que aplicam zero rating ao seu próprio conteúdo fecham outros conteúdos, também não conseguimos encontrar qualquer evidência para isso. O único país com conteúdo proprietário foi Eslovênia. [...] Em qualquer ocorrência, seu ranking é tão baixo que ele não "ameaça" outros conteúdos.

[...] os estudos de caso destacam a falta de análise, evidência e investigação na política de neutralidade de rede, mostrando que cada país é altamente idiossincrático na sua regulamentação.

Através de uma variedade de técnicas quantitativas e qualitativas, tentamos encontrar evidências dos danos que zero rating supostamente cria para os consumidores e a concorrência. Em suma, não podemos encontrar evidência que demonstre que o zero rating cria dano. Nós achamos que o zero rating tem um impacto pequeno, mas não negativo no mercado.

Zero rating é uma de uma série de técnicas de marketing que as operadoras móveis precisam empregar em mercados competitivos. Para alguns operadores do estudo, os resultados são o oposto do previsto pela crítica. Alguns operadores que implantaram zero rating na verdade perderam participação de mercado, e as suas aplicações zero rating foram insignificantes em termos de ranque. Nós não acreditamos que isto é resultado do zero rating, mas sim que o zero rating é o resultado da situação concorrencial do operador.

Para repetir Baumol, os operadores não implantam zero rating porque eles podem, mas porque eles precisam. [tradução livre]

O caso do Chile, trazido inclusive de forma enfática pelo MPF, é revelador. O país realmente assumiu uma posição pioneira ao editar uma lei sobre neutralidade de rede ainda em 2010. Mas desde que proibiu[6], sem maiores investigações, as ofertas de acesso zero rating a redes sociais praticadas pelas operadoras móveis, a Administração tem tido dificuldades em sustentar a consistência de sua decisão. Assim foi o caso do Wikipedia Zero.

A Fundação Wikimedia é a entidade sem fins lucrativos que suporta a enciclopédia coloborativa Wikipedia. Ao ter ciência da decisão e considerando que dispões de uma iniciativa própria de zero rating para acesso a conteúdos educacionais (Wikipedia Zero), a Fundação questionou formalmente o governo quanto à abrangência da proibição.

Segundo a própria Wikimedia [7], a Subsecretaria de Telecomunicações do Chile sustentou que há clara distinção entre a iniciativa Wikipedia Zero e as práticas de acesso a redes sociais que foram proibidas. Ainda afirmou que o desentendimento se devia a uma cobertura equivocada da mídia sobre o assunto, pois o Ofício Circular visava à proibição de práticas específicas e que o governo estaria compromissado em oferecer oportunidades iguais de educação pública a toda juventude chilena.

A experiência do Chile é, sem sombra de dúvidas, paradigmática. Ilustra bem o grau de contradição e vulnerabilidade a que estão sujeitos reguladores e/ou autoridades da concorrência que venham a assumir visões tão estritas na interpretação do conceito neutralidade de redes. Esse caminho fundamentalista é muitas vezes encorajado por certo ativismo digital, mas pode conduzir os tomadores de decisões a situações de extrema arbitrariedade no juízo, quanto à admissão ou não de uma prática, a depender da natureza do conteúdo.

Reconhecendo as dificuldades atinentes à matéria, pesquisador da Universidade de Sussex (Reino Unido), suportado por estudo de caso de oito países, fornece uma espécie de diretrizes básicas tratamento da questão (partes selecionadas):

 A questão do zero rating é altamente controversa [...]. Sugiro duas ações regulatórias para incentivar o uso correto do zero rating:

1. tratar o zero rating como uma exceção de curto prazo à neutralidade da rede, e

2. assegurar que qualquer exceção de curto prazo seja não exclusiva, submetendo tais contratos a condições justas, razoáveis e não discriminatórias.

[...]

Exceções de curto prazo para a neutralidade de rede são prováveis, dada a natureza post hoc de regulação: os reguladores emitem regras básica que respondem a queixas relativas a práticas infrativas. Casos marginais difíceis podem requerer extensa investigação.

[...]

Defendo que condições justas, razoáveis, não discriminatórias e a não exclusividade devem ser sempre aplicadas a ofertas de zero rating, em curto ou longo prazo. [tradução livre]

Aparentemente tem sido essa a linha majoritária na Europa. A regulação de neutralidade da Comunidade Europeia (EU 2015/2120) foi aprovada em novembro de 2015. A norma definiu que o Organismo de Reguladores Europeus das Comunicações Eletrônicas (acrônimo no original BEREC) deveria empreender consulta pública e emitir guia com orientações para implementação pelos organismos nacionais da regulamentação europeia de ‘acesso à internet aberta’, contemplando inclusive a neutralidade de redes.

De forma sucinta, apesar de não ter supervisão hierárquica sobre as autoridades nacionais de regulação da Europa, o BEREC é grupo técnico assessor da Comissão Europeia. Ele reúne os melhores especialistas de regulação do continente para produzir o material de orientação e interpretação a ser levado em máxima conta pelos reguladores nacionais na implantação do quadro europeu.

Feliz e oportunamente, o BEREC recém publicou (30/8/2016) suas diretrizes para implementação da regulação de neutralidade, das quais podem ser extrair valiosas lições e/ou inspirações, tendo em vista o quão similares são as regulações de neutralidade no Brasil e na Europa, vide quadro comparativo a seguir.

 

REGULAMENTO (UE) 2015/2120 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO [versão original em Português]

Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014

3. Os prestadores de serviços de acesso à Internet tratam equitativamente todo o tráfego, ao prestarem serviços de acesso à Internet, sem discriminações, restrições ou interferências, e independentemente do emissor e do recetor, do conteúdo acedido ou distribuído, das aplicações ou serviços utilizados ou prestados, ou do equipamento terminal utilizado.

O primeiro parágrafo não obsta a que os prestadores de serviços de acesso à Internet apliquem medidas razoáveis de gestão do tráfego. Para que possam ser consideradas razoáveis, essas medidas devem ser transparentes, não discriminatórias e proporcionadas, e não podem basear-se em questões de ordem comercial, mas sim na qualidade técnica objetivamente diferente dos requisitos de serviço de categorias específicas de tráfego. Essas medidas não podem ter por objeto o controlo de conteúdos específicos, nem podem ser mantidas por mais tempo do que o necessário.

Os prestadores de serviços de acesso à Internet não podem estabelecer medidas de gestão do tráfego mais gravosas do que as medidas previstas no segundo parágrafo, e, em particular, não podem bloquear, abrandar, alterar, restringir, ou degradar conteúdos, aplicações ou serviços específicos, ou categorias específicas dos mesmos, nem estabelecer discriminações entre eles ou neles interferir, exceto na medida do necessário, e apenas durante o tempo necessário, para:

a) Dar cumprimento aos atos legislativos da União ou à legislação nacional conforme com o direito da União a que o prestador de serviços de acesso à Internet está sujeito, ou às medidas conformes com o direito da União que dão execução a esses atos legislativos da União ou a essa legislação nacional, incluindo decisões dos tribunais ou de autoridades públicas investidas de poderes relevantes;

b) Preservar a integridade e a segurança da rede, dos serviços prestados através dela e dos equipamentos terminais dos utilizadores finais;

c) Prevenir congestionamentos iminentes da rede e atenuar os efeitos de congestionamentos excecionais ou temporários da rede, desde que categorias equivalentes de tráfego sejam tratadas equitativamente.

Art. 9º O responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicação.

§ 1º A discriminação ou degradação do tráfego será regulamentada nos termos das atribuições privativas do Presidente da República previstas no inciso IV do art. 84 da Constituição Federal, para a fiel execução desta Lei, ouvidos o Comitê Gestor da Internet e a Agência Nacional de Telecomunicações, e somente poderá decorrer de:

I - requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada dos serviços e aplicações; e

II - priorização de serviços de emergência.

§ 2º Na hipótese de discriminação ou degradação do tráfego prevista no § 1o, o responsável mencionado no caput deve:

I - abster-se de causar dano aos usuários, na forma do art. 927 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil;

II - agir com proporcionalidade, transparência e isonomia;

III - informar previamente de modo transparente, claro e suficientemente descritivo aos seus usuários sobre as práticas de gerenciamento e mitigação de tráfego adotadas, inclusive as relacionadas à segurança da rede; e

IV - oferecer serviços em condições comerciais não discriminatórias e abster-se de praticar condutas anticoncorrenciais.

§ 3º Na provisão de conexão à internet, onerosa ou gratuita, bem como na transmissão, comutação ou roteamento, é vedado bloquear, monitorar, filtrar ou analisar o conteúdo dos pacotes de dados, respeitado o disposto neste artigo.

 

Considerando a publicação do BEREC [8] e todas as discussões associadas, além das publicações já referenciadas acima, resta clara a ausência de evidências empíricas e/ou teóricas que sustentem o banimento do zero rating a priori e que a prática não pode ser considerada um problema per se. Ela levanta sim preocupações, mas tendo em vista o espectro amplo de possibilidades e modelos de negócios envolvidos, há que se ponderar que algumas abordagens poderão ofender frontalmente a neutralidade, mas muitas outras (provavelmente a maioria) não serão tão definitivas e terão de ser analisadas caso a caso, ponderando os incentivos, o racional econômico e os eventuais efeitos concorrenciais da conduta.

Nesse sentido, o BEREC confirma o empoderamento das autoridades nacionais de regulação no tratamento da questão em nível doméstico e estabelece um conjunto de critérios a serem considerados nas análises dos mercados nacionais, a saber:

Alguns trechos da orientação merecem transcrição direta:

39. Entretanto, algumas condições ou práticas comerciais, principalmente aquelas que envolvem a diferenciação de preços aplicada a categorias de aplicações, são mais propensas a influenciar o exercício de direitos dos usuários finais previstos no artigo 3(1), sem necessariamente limitá-los.

40. Há uma prática comercial específica chamada zero rating. Isto é, onde um provedor de serviço internet aplica um preço zero ao tráfego de dados associado a um aplicativo específico ou categoria de aplicativos (e os dados não entram na conta da franquia de dados em vigor no serviço de acesso à internet). Existem diferentes tipos de práticas de zero rating que podem ter diferentes efeitos sobre os usuários finais e a Internet aberta e, portanto, sobre os direitos dos usuários finais protegidos pela regulamentação.

41. Uma oferta de zero rating onde todas as aplicações são bloqueadas (ou têm a velocidade reduzida) uma vez que a franquia de dados é alcançada, exceto para o(s) aplicativo(s) zero rating, isso violaria o artigo 3(3), primeiro (e terceiro) subparágrafos (ver parágrafo 55 ).

42. O provedor de serviço internet poderia aplicar ou ofertar zero rating a toda uma categoria de aplicativos (por exemplo, todos os aplicativos de streaming de vídeo ou música) ou apenas para certas aplicações dos mesmos (por exemplo, os seus próprios serviços, uma aplicativo específico de mídia social, os aplicativos de vídeo ou música mais populares). Neste último caso, um usuário final não está impedido de usar outros aplicativos de música. No entanto, o preço zero aplicado ao tráfego de dados do aplicativo de música zero rating (e o fato de que o tráfego de dados do aplicativo de música zero rating não conta para a franquia de dados do acesso internet) cria um incentivo econômico para usar esse aplicativo de música em vez de os concorrentes. Os efeitos de tal prática aplicada a um aplicativo específico são mais propensos a "minar a essência dos direitos dos usuários finais" ou levar a circunstâncias onde os “usuários finais escolha é materialmente reduzidas na prática" (Considerando 7) do que quando está aplicada a toda uma categoria de aplicações.

Considerando 7

Para exercer os seus direitos de acessar e distribuir informação e conteúdo e de usar e fornecer aplicações e serviços de sua escolha, os usuários finais devem ser livres para acordar com prestadores de serviços de acesso à Internet as condições de tarifa de volumes de dados específicos e velocidades do acesso internet. Tais acordos, bem como quaisquer prátical comercial dos prestadores de serviços de acesso à internet, não devem limitar o exercício desses direitos e assim contornar as disposições desta regulamentação, salvaguardando o acesso à Internet aberta. Os reguladores nacionais e outras autoridades competentes devem ter os poderes para intervir contra acordos ou práticas comerciais que, em razão da sua escala, conduzam a situações onde a escolha dos usuários finais é materialmente reduzida na prática. Para este fim, a avaliação de acordos e práticas comerciais deve, entre outros, levar em conta as respectivas posições de mercado de tais prestadores de serviços de acesso à internet, e dos fornecedores de conteúdos, aplicações e serviços, que estão envolvidos.  Os reguladores nacionais e outras autoridades competentes devem ser requeridos, como parte de suas funções de monitoramento e fiscalização, a intervir quando os acordos ou práticas comerciais resultem no enfraquecimento da essência dos direitos dos usuários finais. [grifamos] [tradução livre]

Pois bem, finalizando essa dimensão internacional da presente, é evidente que as diferentes condutas e publicações aqui elencadas não têm qualquer caráter minimamente vinculativo, sendo eminentemente desnecessário qualquer desenvolvimento a respeito de soberania nacional e independência. Entretanto, não se pode desconhecer que são experiências muito valiosas e ricas em conteúdo que, se forem adequadamente percebidas e capturadas, podem auxiliar os tomadores de decisão do Brasil a conduzir o país numa rota virtuosa de implementação de seu quadro legal de neutralidade.

Desta forma, segue-se então à discussão do caso concreto trazido à investigação.

 

DA APLICABILIDADE DA LEI Nº 12.529/2011 AO CASO EM ANÁLISE

A Lei nº 12.529/2011, tem por finalidade a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica, conforme os ditames constitucionais da livre iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico (art. 1º).

Sob o ponto de vista do direito material, referida norma traz critérios de determinação da ilicitude das práticas empresariais, além de (i) reestruturar o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, diminuindo as funções da Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda e incorporando a Secretaria de Direito Econômico ao CADE, que passou a ser composto por dois órgãos principais, o Tribunal Administrativo e a Superintendência-Geral; (ii) impor o dever de apresentação prévia dos atos de concentração; (iii) modificar a forma de cálculo das multas por infração à ordem econômica e (iv) estabelecer cargos de especialistas em políticas públicas e gestão governamental para exercício prioritário no CADE.

Consoante o ordenamento antitruste brasileiro, uma determinada prática será considerada contrária à ordem econômica quando tenha por objeto ou produza pelo menos um dentre os efeitos previstos no art. 36, a saber: (i) limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa; (ii) dominar mercado relevante de bens ou serviços; (iii) aumentar arbitrariamente os lucros; (iv) exercer de forma abusiva posição dominante.

Logo, segundo a sistemática brasileira, as práticas tipificadas e exemplificativas no § 3º, do art. 36, da Lei nº 12.529/2011, somente serão consideradas contrárias à ordem econômica desde que impliquem a incidência de seus efeitos abusivos ou anticompetitivos, conforme exigido pelo art. 36, caput, da mesma lei.

Outro ponto fundamental ao exame das práticas anticompetitivas diz respeito à delimitação do mercado relevante, sob dois aspectos complementares e indissociáveis, i.e., o mercado relevante geográfico e o mercado do produto ou mercado relevante material. Isso porque uma prática só pode ser considerada como anticompetitiva após a análise do contexto econômico em que está inserida, a fim de que se possa examinar, se tal conduta teve por objeto ou efeito prejudicar as relações concorrenciais travadas naquele mercado. Vale transcrever os ensinamentos de doutrina:

O mercado relevante é aquele em que se travam as relações de concorrência ou atua o agente econômico cujo comportamento está sendo analisado. Sem sua delimitação é impossível determinar a incidência de qualquer das hipóteses contidas nos incisos do art. 36, caput, da Lei 12.529. A partir do momento em que o texto normativo faz menção à restrição da “concorrência”, para a caracterização do ilícito devemos determinar de qual concorrência estamos tratando (com o escopo de verificar se a prática analisada teve por objeto ou por efeito restringi-la).[9]

Destarte, não basta apenas alegar a existência de prática prejudicial à concorrência, é indispensável à aplicação de uma norma antitruste que se estabeleça a área onde se trava a concorrência relacionada à prática que está sendo considerada como restritiva [10] (mercado geográfico) e o mercado no qual o agente econômico enfrenta a concorrência, considerado o bem ou serviço que oferece.[11] (mercado do produto ou mercado relevante material).

Assim, para fins de determinação da incidência ou não da Lei nº 12.529/2011 sobre o caso concreto, se faz necessária a indicação da concorrência que se cogita.

No caso em questão o Ministério Público Federal representou em desfavor da Oi , Claro, Tim e Vivo alegando, em suma, que as prestadoras do SMP estariam oferecendo seus serviços diferenciando as condições de acesso a aplicações de determinada rede social, in casu, Facebook e/ou Whatsapp, com base em planos de serviço de zero rating, nos quais os usuários não têm descontados dos seus planos, os dados por utilizarem as redes das operadoras para acessar tais aplicativos.

Explica, em sua peça inicial, que a prática supra-referida configura quebra ao princípio da neutralidade de rede instituído pelo Marco Civil da Internet, bem como gera severos impactos à concorrência no mercado de aplicações ao desestimular o acesso a outras aplicações que não são abrangidas pelas mesmas condições vantajosas.

Contudo, s.m.j., falta à representação um pressuposto indispensável para a análise antitruste, qual seja: a delimitação de mercado relevante fundada nos critérios jurídico-econômicos da Lei nº 12.529/2011, sem a qual não se poderia admitir a incidência do art. 36 desse diploma legal, uma vez que a avaliação dos prejuízos à concorrência deve levar em conta o mercado no qual as relações de concorrência se inserem.

Desse modo, esta Agência, instada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica, não se furtará do dever legal de apresentar sua análise técnica devidamente motivada acerca da análise das supostas práticas anticoncorrenciais denunciadas pelo Ministério Público Federal, iniciando pela re-definição do mercado relevante.

Assim, necessário se faz compreender a dinâmica do mercado de banda larga móvel e sua relação com o mercado de provimento de conteúdo e aplicativos. Tais relações estão configuradas num mercado de múltiplos lados[12] e a literatura econômica o define como uma estrutura de mercado em que uma plataforma cria valor atraindo e facilitando a interação entre dois ou mais agentes distintos. Esse tipo de arranjo se desenvolve economicamente distribuindo seus custos (ou gerando receita) em diversos grupos de participantes, no qual uma figura central consegue se remunerar.

Em geral, o mercado de múltiplos lados tem um arranjo que vincula necessariamente todas as pontas, em algum momento, como demandantes e ofertantes simultâneos, o que os diferencia de um mercado tradicional. Só há valor para um lado do mercado se o outro também cresce e se expande. Um é espelho do outro. O arranjo é sempre pensado para o desenvolvimento conjunto dos dois lados [13]. Isso ocorre porque as plataformas de múltiplos lados resolvem problemas de custos de transação que tornam difícil ou impossível para agentes em diferentes grupos se encontrarem. Em muitos casos, o maior envolvimento dos agentes aumenta o valor da plataforma para os outros agentes. Tais efeitos de rede indiretos funcionam à semelhança de economias de escala do lado da demanda e elevam o valor econômico que os agentes percebem da plataforma. A percepção de incremento de valor depende da forma como os agentes se encontram. A plataforma de múltiplos lados cria valor por meio da coordenação de múltiplos grupos de agentes, garantindo que há um número razoável de agentes de cada tipo que torna a participação vantajosa para todos.

Nota-se, portanto, um importante papel das externalidades em um arranjo de múltiplos lados. No arcabouço tradicional de análise industrial, é comum analisar a existência de externalidades entre agentes econômicos. Quando se analisa estruturas de mercado de múltiplos lados, outro tipo de externalidade é observada, a “intergrupos”. Conforme exposto acima, a percepção de valor está relacionada como os grupos se interagem[14]. Um exemplo recorrente é o mercado de vídeo games. Um fabricante de console (Playstation/Sony, por exemplo) precisa criar um ambiente propício para maximizar, de um lado, o número de jogadores; de outro, deve-se atrair um número significativo de desenvolvedores de jogos para a plataforma. Um número razoável de desenvolvedores torna a plataforma atrativa aos usuários (percebem maior valor) e, ao mesmo tempo, uma quantidade elevada de jogadores também torna a plataforma atrativa para os desenvolvedores de jogos. Esse fenômeno cria um efeito feedback loop, potencializando o crescimento da plataforma, dada a interdependência das demandas dos diversos agentes presentes na plataforma. Cabe, portanto, à plataforma (fabricante do console) gerir e incrementar as externalidade entre os grupos envolvidos para maximizar seu valor.

Transladando esse conceito para a economia da internet, aplicado ao caso, verifica-se, de fato, estar diante de um mercado de múltiplos lados, no qual se tem os provedores de acesso a internet (prestadora de serviços de telecomunicações – mercado de banda larga móvel) – detentores da última milha – , como plataformas que, de um lado, contratam diretamente com usuários finais e, do outro lado,  negociam com os provedores de conteúdo e aplicativos, a contratação de seus produtos. Ressalte-se que os provedores de conteúdo e aplicações usualmente também têm modelos de negócios estruturados como plataformas de múltiplos lados. Em função disso, de acordo com Evans e Schmalensee (2016)[15], os provedores de internet, como as operadoras de banda larga móvel, representam exemplos de plataformas que proveem serviços para outras plataformas e as conectam com usuários finais. Em função disso, as provedoras de internet podem ser chamadas de “plataformas fundamentais”

Destarte, verifica-se neste mercado que a estrutura da rede é propiciada pelos provedores de acesso a internet e cria a conexão entre usuários, de um lado, e provedores de conteúdo e aplicativos, de outro. Em termos gráficos, caracteriza-se o mercado de dois lados no segmento sob investigação da seguinte forma:

Fonte: elaboração dos autores.

 

Observação: Por simplificação expositiva, a Figura não demonstra a interação entre prestadoras (Plataformas Fundamentais). Contudo, esse tipo de interação geralmente pode ser feita por meio de relacionamentos de interconexão nos pontos de troca de tráfego (ITX)

Com base no caso em específico, de um lado o usuário, ao contratar determinado provedor de acesso a internet, toma a sua decisão considerando o conteúdo transmitido e os aplicativos processados por essa rede e do outro lado, os provedores de conteúdo e aplicativos, ao negociarem com o provedor de acesso a internet, levam em consideração o número de usuários finais contratantes dessa rede, com vistas a estimar a amplitude de alcance de seus produtos.

Isso se verifica porque a utilidade da rede para os usuários finais depende do lado oposto da cadeia – os provedores de conteúdo e aplicativos e vice versa. Assim, é característica do mercado de dois lados o consumo de agentes diferentes em lados opostos, porém compatíveis.

Portanto, a percepção de valor em relação ao provedor de acesso à internet será determinada por sua capacidade de maximizar as externalidades da interação dos agentes presentes, o que gera um incentivo para maximizar o tamanho de todos os lados da sua plataforma[16].

Outra importante implicação é o incentivo para alavancar poder de mercado de um lado da plataforma para outro. Em função das externalidades intergrupos, o exercício de poder de mercado (seja aumentando preços ou reduzindo qualidade) é contestado pelo risco de perda vendas em uma das pontas de sua plataforma. Em função disso, não faria sentido para uma prestadora de banda larga móvel limitar a quantidade de conteúdos e aplicações, uma vez que isso reduz a qualidade do seu serviço. Dessa forma, o valor percebido de seu provimento de banda larga pelos usuários finais seria minimizado. Esse mecanismo é amplificado em uma estrutura de mercado competitivo, ou seja, quando os usuários finais têm opções de acesso à banda larga móvel (neste ponto, não se pode descartar também a possibilidade de substituibilidade entre banda larga móvel e fixa).

Dessa forma, a delimitação do mercado relevante de um mercado de dois lados, passa necessariamente por análises segregadas. 

O primeiro lado: provimento de acesso à internet em banda larga móvel a usuários finais.

Relativamente ao mercado de acesso à internet em banda larga móvel, tem-se que até meados de 2009 o mercado de Serviço Móvel Pessoal - SMP no Brasil era praticamente todo composto de acessos 2G (segunda geração). Apenas a partir do final de 2009, constata-se uma evolução de acessos de 3G (terceira geração). Esse crescimento da base de acesso 3G é constante até o fim de 2012 e coincide com a diminuição da base de acessos 2G.

Evolução do número de acessos por tecnologia, Brasil, SMP, 2012 a 2016.

Fonte: Anatel.

 

No tocante ao 4G, constata-se uma acentuada evolução dos acessos baseados nesse padrão. No ano de 2013 o crescimento foi de cerca de 150 a 200 mil novos acessos por mês. No segundo trimestre de 2014 esse número sobe para próximo a 3,75 milhões. O número de acessos continuou a avançar substancialmente ao longo de 2015, fechando o ano em 25,5 milhões de acessos, e alcançando a marca de 39,7 milhões em junho de 2016,  demonstrando a forte procura, por parte dos usuários, de acesso que possibilitem uma maior velocidade de conexão.

Número de acessos, 4G, 2013-2016.

Fonte: Anatel.

Constata-se, assim, que o crescimento do SMP tem sido, em muito alicerçado na expansão e utilização de tecnologia de banda larga. Segundo previsões do Statista, até 2018, mais de 75% dos usuários de terminais móveis acessarão a internet utilizando-se de tecnologia de banda larga móvel.

% de usuários de banda larga móvel no Brasil, 2011 a 2018.

Fonte: Statista

Observa-se ainda, no gráfico abaixo, o aumento acentuado de tráfego de dados, em função de maior número de acessos 3G e 4G. Isso decorre, em muito, na multiplicidade de aplicações e conteúdo disponíveis no mercado, os quais dependem umbilicalmente de redes de acesso de alta velocidade para uma performance adequada. A título de exemplo, pode-se mencionar que desde o final de 2013, ocorre uma acentuada redução da quantidade de SMS enviados, muito em função das aplicações “over the top” (OTTs) que se mostraram substitutos quase perfeitos, estando o tráfego de SMS, atualmente, mais restrito a contatos profissionais e sinalizações de controle da rede.

Comparação de Tráfego de dados e SMS, consolidado Brasil, 2012 a 2014

Fonte: Anatel.

Percebe-se, ainda, uma inversão da ordem de tráfego, com dados saindo de 35 milhões de megabytes em 2012 para 120 milhões de megabytes no terceiro trimestre de 2014. Um crescimento de 241% em relação ao primeiro trimestre de 2012, com um substancial crescimento médio de 13% por trimestre e acelerando conforme gráfico. Já a demanda por SMS apresentou uma redução de 57% desde 2012, demonstrando a substituição do serviço de SMS pelo serviço de Web Messaging.

Ilustrativamente, ao final de 2014, mais de 56% dos celulares com internet móvel pertenciam a usuários ativos do Whatsapp, sendo que, em alguns países, essa taxa de penetração chega até 78%.

Do ponto de vista geográfico, a oferta de SMP em banda larga móvel está pautada em uma abrangência nacional. Hoje, observa-se tratar de um mercado competitivo, com a presença de quatro grandes players - Claro, Vivo, TIM e Oi, na seguinte conformação:

Fonte: Anatel

Comparativamente a outros países, o mercado de SMP do Brasil apresenta uma estrutura industrial menos concentrada.   No benchmark abaixo, o Brasil possui o menor HHI. Apesar das especificidades regionais, o HHI nacional é amplamente utilizado como indicador de competição para benchmarking internacional nesse mercado. Além de corroborar o fato do mercado de banda larga móvel brasileiro ser competitivo, o levantamento mostra que o Brasil está entre os países com maior quantidade de prestadoras móveis (no gráfico, foram considerados apenas operadoras com participação significativa de mercado).

Fonte: Anatel. Bank of America/Merrill Lynch. Informações referentes a 2015.

O segundo lado: provimento de conteúdo e aplicativos .

Aqui, a definição de mercado relevante é bem distinta daquela definida no outro lado do mercado.

Do ponto de vista do produto, o provimento de conteúdo e aplicativos é muito abrangente, com inúmeros aplicativos substitutos entre si, independentemente de onde estejam sendo produzidos. A dimensão geográfica encontra limites mais fluidos. E, por este motivo, sob o ponto de vista geográfico, a abrangência pode ser nacional ou até mesmo internacional.

Outra característica das relações presentes nesse mercado específico é a facilidade de acesso aos provedores de conteúdo ou de SVA providos por aplicativos – “APPs”. Com efeito, apesar do mercado de conteúdo e de APPs possuir agentes detentores de participação relevante, a entrada de novos provedores nas lojas virtuais de aplicativos não apresenta quaisquer barreiras.

De forma a ilustrar o nível de contestabilidade desse mercado, apresentamos a seguir algumas manchetes da repercussão nacional e internacional da adesão de usuários brasileiros a aplicativos concorrentes do Whatsapp, em diferentes episódios de proibição judicial do funcionamento do aplicativo no país, os motivos, a argumentação e a decisão em si fogem ao escopo da presente.

Tem-se evidência robusta da mobilidade fluída e desembaraçada da base de usuários para aplicativos concorrentes. Somem-se a essas ofertas da camada de aplicações os serviços tradicionais de mensagens curtas, no acrônimo original, SMS. O monitoramento de informações e estudos internos empreendidos por esta Agência apontam substancial elevação na quantidade de SMS durante esses períodos de banimento, apontando uma eventual situação e substitutibilidade  perfeita.

Além disso, cabe destacar alto grau de rivalidade e intensa disputa por posições nesse mercado, com surgimento de diferentes e novas aplicações. Vide publicação a seguir da consultoria App Annie, focada na geração de informações e inteligência sobre a economia dos aplicativos. O artigo aponta a emergência de um novo aplicativo de mensagens.

Não se verificam, assim, quaisquer gargalos estruturais nesse mercado.

Desta forma, não há que se falar em distorção ao direito de escolha do usuário, justamente porque o mesmo continua tendo acesso irrestrito aos demais aplicativos nas lojas virtuais.

Tal possibilidade concedida ao usuário reflete a natureza aberta da internet, na medida em que tal conceito não se limita exclusivamente ao mercado de aplicativos, mas a todo conteúdo que é possível acessar pela rede.

Assim, deve-se considerar que apesar da prática comercial de oferta de acesso a conteúdo com zero rating ser originada no lado do mercado de acesso em banda larga (serviços de telecomunicações), seus efeitos concretos ocorrem no segmento de SVA, mais especificamente, no mercado de aplicativos (APPs).

A conduta analisada não importa em prática que possa gerar prejuízos ao ambiente concorrencial de telecomunicações, na medida em não há demonstração inequívoca dos requisitos necessários para tal conclusão, pois, não foi demonstrado que a prática supostamente perpetrada pela Oi, Claro, Tim e Vivo, consubstanciada no zero rating, teve como objetivo ou resultado, prejudicar a concorrência no mercado regulado.

Reforçando a escala ampla do mercado de APPs, o infográfico abaixo, com base em dados do ano de 2013, demonstra a efetiva abertura do mercado global de aplicativos, distribuído pelos principais sistemas operacionais para smartphones[17]:

Dessa forma, pode-se inferir que a escolha de determinado aplicativo por parte do conjunto dos usuários é livre, influenciada, tão somente, pelas funções-utilidades dos mesmos. Nesse contexto, quanto maior o número de usuários de cada aplicativo para comunicação pessoal ou de redes sociais, maior será, também o incentivo a novos usuários aderirem a tais aplicativos, ou seja, configura-se uma dinâmica comportamental típica de economia dos clubes inclusivos.

O gráfico abaixo apresenta as atividades mais populares no Brasil que são realizadas por meio da internet móvel, percebendo-se a crescente utilização dos aplicativos de vídeo e mídia social:

Atividades mais populares no Brasil realizadas por meio da banda larga móvel, Brasil, 2014.

Fonte: Statista

Além disso, pode se verificar a existência de diversos aplicativos de comunicações em uso no Brasil, corroborando o entendimento da ausência de barreiras à entrada, bem como a existência de diversas alternativas para os usuários.

Destarte, observa-se que o mercado de provimento de conteúdo e aplicativos se mostra bastante desconcentrado e com ausência de barreiras à entrada, o que ilustra clara facilidade de acesso, sem gargalos estruturais, fato que demonstra, inequivocamente, que o MPF, com a devida vênia, equivocou-se em suas assertivas acerca da existência de supostas barreiras à entrada.

 

DA SUPOSTA CONDUTA DE DISCRIMINAÇÃO DE CONTEÚDO E APLICATIVOS POR DETENTORES DE REDE

É consabido que as práticas discriminatórias por parte de agentes econômicos estão intimamente relacionadas às estruturas verticais, seja do ponto de vista da existência de restrições verticais, tais como os contratos de exclusividade, seja pela existência de estruturas societárias verticalizadas entre empresas nos mercados upstream (provimento de acesso à internet) e downstream (conteúdo e aplicativos) .  A isso acresce a necessidade de se ponderar se a conduta ou a configuração estrutural é capaz de gerar qualquer um dos efeitos anticompetitivos previstos no art. 36, da Lei nº 12.529/2011, conforme sistemática da lei antitruste brasileira.

Acrescente-se, ainda, que duas condições devem ser consideradas para que algum tipo de integração vertical ou restrição contratual vertical possa ser considerada prejudicial à concorrência. A primeira delas é que a empresa envolvida detenha posição dominante no mercado primário (in casu, no mercado de provimento de acesso à internet), pois, caso contrário, compradores podem simplesmente adquirir o mesmo produto de outro concorrente com vistas a driblar a tentativa de exclusão vertical.

A segunda é que o mercado secundário (In casu, o mercado de aplicativos), sobre o qual recairá a conduta vertical excludente, também seja concentrado e com a presença de barreiras à entrada, posto que, sem isso, qualquer elevação de preços nesse mercado levaria os competidores a expandir a sua produção ou criaria incentivos para a entrada de novos players no mercado.

Na verdade, no  caso em exame, a condição de mercado de múltiplos lados reduz os incentivos para alavancar poder de mercado no segmento de provimento de acesso à internet, mesmo apesar da elevada concentração existente. Isso ocorre porque o provedor de acesso à internet não tem interesse de degradar a qualidade do seu serviço ao limitar o acesso a determinado aplicativo ou conteúdo. É de se esperar que a competição existente no segmento de provimento de acesso à internet contestaria a possibilidade de restrição vertical. Ademais, no caso concreto sob avaliação, o que se verifica é que há inúmeros provedores de conteúdo e aplicativos e a opção pela oferta de planos de serviço de banda larga móvel com zero rating para os aplicativos Whatsapp, Twitter e Facebook, em nenhum momento bloqueou ou restringiu o acesso dos usuários a qualquer outro conteúdo ou aplicativo.

Importa ainda considerar a possibilidade de que a prática do zero rating fomente o acesso a outras fontes de informação, gerando incentivos ao consumo de outros conteúdos e aplicativos. Num cenário onde a maioria dos usuários utiliza planos pré-pagos e acessam massivamente redes sociais, pode-se inferir que os megabytes adquiridos por eles seriam, em sua maioria ou até na sua totalidade, destinados ao consumo das mídias sociais e aplicativos de comunicações. No entanto, ao aderirem a um plano zero rating, que possibilita suprir suas necessidades, sem descontar de sua franquia de dados, o usuário terá condições de acessar outros aplicativos e conteúdos.

Parece lógico supor que um usuário que tenha uma franquia, de por exemplo 300 MB, que seria destinada a consumir conteúdo de redes sociais e aplicativos de comunicação, ao não ter mais custo com tal consumo, acabe por destinar esse "excedente" para diversificar os aplicativos que utiliza. Assim, no limite, tais ofertas têm potencial para propiciar um aumento do bem estar dos usuários, por meio do aumento do volume de dados acessados, considerando que o acesso à redes sociais e aplicativos de comunicação instantânea não fariam parte do pacote de dados contratados. 

Até mesmo o consumo de aplicativos com uso semelhante aos constantes da politica de zero rating pode acabar sendo favorecido, dado que, geralmente, os usuários já acessam mais de um aplicativo para o mesmo uso.

Prova desta assertiva é o fato demonstrado nos recentes episódios ocorridos no Brasil de bloqueio judicial do Whatsapp, ocasião em que outros aplicativos semelhantes foram utilizados massivamente para substituí-lo.

Em suma, não é possível inferir que o usuário está sendo tolhido do seu direito de escolha e é enganado em relação à isonomia no acesso às aplicações atuais e futuras, como entendeu o MPF junto ao CADE, pois, no caso concreto parece ser este mesmo usuário o maior beneficiário de tal prática, na medida em que não possui ônus pela utilização dos seus aplicativos preferidos e, outrossim, pode utilizar seu pacote de dados livremente com outro conteúdo.

A estratégia de fixação de preços e volumes contendo o elemento zero rating para aplicativos selecionados, desde que não pertencentes ao mesmo grupo da prestadora (tema esse que será desenvolvido abaixo), propicia, no limite, um maior volume de conteúdo acessado e, portanto, um aumento do bem estar verificado pelo usuário. 

No caso concreto sob análise, os planos do tipo zero rating ofertados pelas principais prestadoras de acesso em banda larga móvel encontram-se, portanto, cobertos pelo conceito das relações comerciais e privadas entre os agentes da cadeia de valor da Internet.

Reforçando a ideia das estratégias comerciais de zero rating por parte das prestadoras de serviços de telecomunicações, Demi Getschko, diretor-presidente do Núcleo de Informação e Coordenação do NIC-BR, em texto publicado no jornal O Estado de São Paulo[18] afirmou que o modelo de acesso à internet por meio de conexão em banda larga móvel associado a uma franquia máxima mensal, apresenta características tais que legitimariam o zero rating em face da neutralidade de rede, já que não haveria limitação de acesso a nenhum conteúdo, de modo que o volume de dados (franquia) efetivamente percebido pelo usuário seria maior do que o contratado, in verbis:

O que se busca com a neutralidade, então? A meu ver, queremos que a experiência total de rede esteja disponível a todos. Que se possa provar de tudo, como num imenso bufê, porque é dessa exposição que deriva o crescimento da rede, o surgimento de novos aplicativos, o ativismo da comunidade.

A forma com que se chega à rede é um dos complicadores dessa discussão e afeta nossa experiência.  Ligados de forma perene, em casa ou no trabalho, teremos disponível  uma  “capacidade”,  uma  bitola  de  cano  que  nos  liga  ao  manancial  da internet. Mas se a estivermos usando de forma móvel, via telefone, o que temos não é “bitola de cano”, mas “tamanho de balde”: a franquia.

De qualquer forma, seja no acesso fixo, seja no móvel, a neutralidade defende que  nenhum  destino  nos  seja  vedado,  nenhuma  aplicação  restringida  ou  tecnicamente  privilegiada. A rede é rica e nela há serviços pagos e serviços grátis, mas esse não  pode ser critério que privilegie ou obste tecnicamente um serviço.  Se eu contrato uma franquia de “x” gigabytes, devo poder usá-la como quiser, até o último byte. Pode ser que alguns serviços, devido a acordos comerciais, não gastem minha franquia, e isso pode ter efeitos em áreas como a de competição ou a econômica, mas, em meu entendimento, se o meu livre arbítrio em usar o que contratei estiver preservado, e se os “pacotes de dados” não forem priorizados, não perco neutralidade com isso. Penso, assim, que a discussão sobre bytes que gastam a franquia e outros que não gastam, cabe dentro de uma rede que não restringe o arbítrio do usuário, tecnicamente neutra. Poderia isso deformar o cenário competitivo e econômico? Pode ser.

[Grifamos].

O quadro abaixo apresenta os principais acordos de zero rating ofertados pelas prestadoras de acesso à internet em banda larga móvel. A primeira (e fundamental) inferência é que não participam da oferta quaisquer aplicativos produzidos pelos próprios grupos econômicos.

Dessa forma, não se verifica qualquer favorecimento a seus aplicativos próprios, entrando estes no conteúdo não abarcado pelo zero rating.

Assim, in casu, não se constatou abuso de poder de mercado decorrente de eventuais práticas de integração vertical na oferta de serviços diversos, por parte das prestadoras de acesso à internet em banda larga móvel, descaracterizando eventuais condutas infrativas por parte da Oi, Claro, Tim e Vivo.

Reafirma-se, também, o entendimento de que se trata de uma estratégia comercial para garantir a manutenção da sua base de clientes ofertando vantagens para o acesso aos aplicativos mais utilizados pela população brasileira, dado que com a queda de suas receitas com a prestação de serviços de telecomunicações, devida a expansão do uso das OTTs, a adoção de novos modelos de negócio se mostra primordial, principalmente em um mercado competitivo como o brasileiro. 

Esse racional foi observado no texto "Os acordos de zero rating e seus impactos concorrenciais: os limites da regulação da neutralidade de rede", retirado da Revista do Cade, Vol.4, nº1, Maio 2016, pg. 42/43, in verbis

No caso do acesso gratuito, a operadora que toma a decisão de garantir o acesso gratuito (e, portanto, internaliza o custo desse acesso) pode fazê-lo, por exemplo, como meio de aumentar sua base de clientes. Ao oferecer para seus clientes o acesso a certos aplicativos ou conteúdos a custo de dados zero, a operadora pode estar oferecendo ao mercado significativo diferencial competitivo. O interesse dos clientes em acessar certas aplicações faz com que o zero-rating de acesso gratuito seja um atrativo em favor das operadoras que o oferecemTal análise poderia explicar, por exemplo, a ausência de políticas de zero-rating por parte da líder de mercado Vivo, que  detém a liderança do mercado há pelo menos cinco anos, com atuais 29,24% de participação do mercado60. Já as operadoras TIM e Claro – respectivamente segunda e terceira colocadas no mercado, com 26,49% e 25,20% – poderiam adotar estratégias de zero-rating mais agressivas para tentar alavancar sua posição no mercado. (grifamos)

Tal entendimento é reforçado, como visto, pela visão do disposto pelo Marco Civil e Neutralidade de Rede de que não se deve, a priori, haver bloqueio ou desincentivo aos modelos de negócios das empresas, que se dão no âmbito de relações comerciais e privadas entre os agentes da cadeia de valor da internet. Pelo contrário, o pluralidade de modelos tende a contribuir com o desenvolvimento do acesso à Internet.  O que não afasta a necessidade dos órgãos competentes em acompanhar os efeitos gerados por tais modelos no mercado, e atuar, caso se verifique desrespeito aos princípios estabelecidos por tal marco legal, corrigindo eventuais efeitos indesejáveis.

Não é possível concluir que a conduta ora analisada afronta o Marco Civil da Internet ou a Neutralidade de Rede, pois, tais conceitos, conforme defendido reiteradamente no presente expediente,  não buscam delimitar os modelos de negócios utilizados pelas prestadoras e nem tão pouco interferir em suas relações privadas, mas, somente, coibir condutas danosas na utilização da rede, o que não restou demonstrado na representação daquele douto Parquet.

Sobre o zero rating, o próprio governo federal lançou em março de 2016 um aplicativo que busca combater o mosquito aedes aegypti, transmissor do zika vírus. O aplicativo se presta a reuniões informações de saúde pública sobre a doença, além de permitir acesso à geolocalização dos serviços oferecidos na área de saúde pública.

A ideia do app partiu de uma parceria entre o Ministério das Comunicações e da Saúde, juntamente com a Qualcomm. E, para acessá-lo, as operadoras Vivo, Claro, Tim e Oi permitiram o acesso para download e dados do 0800 de forma gratuita para seus usuários, ou seja, a utilização da ferramenta não é descontada da franquia de dados. [19]

Desta forma, o próprio governo federal ao se valer do zero rating para facilitar o acesso da população para a prevenção do zika vírus, implementou uma prática inclusiva e aprimorou o combate à doença.

No tocante à afirmação feita na Representação do MPF de que poderia ser constatado que a conduta estaria sendo praticada por meio de acordos, indicando conduta cartelizada, entende-se que não se observa, no caso concreto, nenhum indício da ocorrência de tal prática. Pelo contrário, como visto na tabela acima, constante do item 3.4.15, os planos disponibilizados, embora tratem do mesmo produto, constituem ofertas distintas, diferindo, por exemplo na data de entrada em vigor e nas aplicações ofertadas.

Inclusive, em sua própria Representação o MPF coloca que "seguindo o comportamento das demais representadas, precursoras do acesso discriminatório a aplicativos, a operadora VIVO lançou recentemente os planos (...)", reforçando a ideia de que se trata de estratégia de negócio da empresa, como descreveu o texto citado acima no item 3.4.19, em clara contradição ao que fora alegado pelo próprio Parquet.

Segundo a melhor doutrina, as avenças entre empresas concorrentes (que atuam, pois, no mesmo mercado relevante geográfico e material) e que visam a neutralizar a concorrência existente entre elas são denominadas cartéis.[20]

Corroborando o que o próprio MPF trouxe na sua representação, entende-se que não há indícios de que, Oi, Claro, Tim e Vivo, tenham acordado para neutralizar a concorrência, pois os planos de serviços ofertados pelas operadoras se apresentam de forma heterogênea, não havendo assim indícios de suposta cartelização. 

Em relação a isso, vale dizer que a prestadora Oi[21] não comercializa planos de serviços ou ofertas, os quais se adequem no modelo de zero rating, o que só ratifica a inexistência de qualquer cartel entre tais empresas. Aliás , entendimento contrário descola-se por completo da realidade diária do setor de telecomunicações, especialmente no que diz respeito ao SMP, haja vista a rivalidade existente entre os players nesse mercado específico. Demonstração disso é o elevado número de Resoluções de Conflitos ingressadas na Anatel por tais empresas rivais, as quais, algumas vezes, pelo acirramento da disputa existente são inclusive submetidos ao Judiciário.

Outra afirmação do MPF é que as prestadoras envolvidas na Representação poderiam estar priorizando alguns serviços em detrimento de outros, estabelecendo, por exemplo, modelos diferenciados e mais vantajosos de remuneração pelo uso de suas redes tal qual relatado acima, a prática adotada por algumas prestadoras, além de configurar quebra evidente do princípio da neutralidade de rede instituído pelo Marco Civil da Internet, ainda gera impactos anticoncorrenciais severos, ao desestimular o acesso a aplicações não abrangidas pelas mesmas condições vantajosas.

Ocorre que, por se tratar de mercado dinâmico e cuja informação encontra-se facilmente disponível na rede, os demais players do mercado de provimento de conteúdo e aplicativos, caso detectassem  essa prática, poderiam denunciá-la, o que importaria em imediata adoção de providências deste Órgão Regulador, com o intuito de intervir em eventual prática contrária ao ordenamento jurídico/regulatório no âmbito das relações entre a prestadora de serviços de telecomunicações e o provedor de conteúdo e aplicativo.

No entanto, cabe informar que até a presenta data não houve registro nesta Agência de nenhuma reclamação dos provedores de conteúdo e aplicativos por tratamento discriminatório e não isonômico por parte dos detentores de rede

Por todo o exposto, esta Superintendência de Competição entende que não foram demonstrados indícios suficientes de conduta contrária à ordem econômica que impacte o mercado de provimento de acesso a internet, bem como o mercado de provimento de conteúdo e aplicativos  a ensejar a necessidade de abertura de processo administrativo por parte da Superintendência Geral do CADE, nos termos do art. 48, III, da Lei nº 12.529, de 2011.

________________________________

[1]http://www2.camara.leg.br/documentos-e-pesquisa/fiquePorDentro/temas/marco-civil/texto-base-da-consultoria-legislativa-pdf.

[2]Análise nº 20/2016/SEI/AD (SEI nº 0469360), de 5 de maio de 2016.

[3]EISENACH, J. A. The economics of zero rating. Nera Consulting, 2015. Disponível em: . Acesso em: 29 ago. 2016.

[4]MARSDEN, C. T. Comparative case studies in implementing net neutrality: a critical analysis. Disponível em: . Acesso em: 29 ago. 2016.

[5]LAYTON, R. ; CALDERWOOD, S. E. Zero rating: do hard rules protect or harm consumers and competition? Evidence from Chile, Netherlands and Slovenia. Disponível em: . Acesso em: 29 ago. 2016.

[6]Ofício Circular nº 40/DAP 13221/F-51. Disponível em: . Acesso em: 29 ago. 2016.

[7]Ente regulador chileno le da la bienvenida a Wikipedia Zero. Wikipedia: 2014.   Disponível em: . Acesso em: 29 ago. 2016.

[8]Presentation at the Net Neutrality Guidelines press conference. Disponível em: . Acesso em: 1º set. 2016.

[9] Forgioni, Paula A., Os Fundamentos do Antitruste, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 212.

[10]Forgioni, Paula A., Op. Cit. p. 214.

[11]Forgioni, Paula A., Op. Cit. p. 219.

[12]É necessário ressaltar que, inicialmente, as primeiras abordagens acadêmicas sobre mercados de múltiplos lados, tais como Armstrong (Armstrong, M., 2006. Competition in two-sided markets. RAND Journal of Economics 37, 668–691), Cailland e Jullien (Caillaud, B., Jullien, B., 2003. Chicken & egg: competition among intermedia), Parker e Van Alstyne (Parker, G. and M. W. Van Alstyne (2005) “Two-Sided Network Effects: A Theory of Information Product Design,” Management Science, 51, 1494–1504),  Rochet e Tirole (Rochet, J. C., & Tirole, J. (2006). Two‐sided markets: a progress report. The RAND journal of economics, 37(3), 645-667), dentre outros, utilizavam o termo mercado de dois lados. Conforme se depreende de Rochet e Tirole (2006), o uso do termo “mercado de dois lados” é opção didática para explorar e expor as especificidades dessas estruturas de mercados. Em outras palavras, é mera simplificação expositiva. Contudo, como os próprios autores apontam, diversas estruturas ou plataformas possuem múltiplos lados. Não por acaso, nos últimos anos, a temática tem sido abordada como “mercados de múltiplos lados”, como observado em: Hagiu e Wright (Hagiu, A., & Wright, J. (2015). Multi-sided platforms. International Journal of Industrial Organization, 43, 162-174), Evans (Evans, D. S., & Schmalensee, R. (2013). The Antitrust Analysis of Multi-Sided Platform Businesses. NBER Working Paper, (w18783)), Weyl (Weyl, E. G. (2010). A price theory of multi-sided platforms. The American Economic Review, 100(4), 1642-1672), Evans et al (Evans, D. S., Schmalensee, R., Noel, M. D., Chang, H. H., & Garcia-Swartz, D. D. (2011). Platform economics: Essays on multi-sided businesses.PLATFORM ECONOMICS: ESSAYS ON MULTI-SIDED BUSINESSES, David S. Evans, ed., Competition Policy International). Essas estruturas de mercados são comuns em indústrias economicamente significativas tais como telecomunicações, trocas financeiras, mídia suportada por publicidade e diversas indústrias da Internet (Evans e Schmalensee, 2013).

[13]SILVA, L.N.,LEURQUIN, P.,BELFORT, A; Os acordos de zero-rating e seus impactos concorrenciais: os limites da regulação da neutralidade de rede; 2016. 

[14]Em geral, como destacado por Rochet e Tirole (2006), a externalidade aparece quando dois agentes precisam atuar juntos para usar a plataforma e criar valor. As plataformas ajudam a gerar externalidades ao facilitar a interação entre dois agentes econômicos distintos. Além disso, as plataformas também aumentam o valor das externalidades à medida que aumenta a qualidade dos matches. É possível que as externalidades sejam positivas para um tipo de agente e negativo para outro tipo. Porém, se o valor líquido dessa externalidade é positiva, há um benefício em facilitar a interação que a plataforma é capaz de capturar. Algumas mídias suportadas por propaganda são exemplos disso. Um anunciante pode se beneficiar da comunicação com o usuário, mas este pode encarar  como negativo a visualização de propagadas. A plataforma potencializa uma interação de valor por meio de subsídios ao usuário na forma de conteúdos com propaganda.

[15]Evans, D. S., & Schmalensee, R. (2016). The New Economics of Multisided Platforms: A Guide to the VocabularyAvailable at SSRN.

[16]Em alguns casos de mercados de múltiplos lados, a intensidade da competição leva a plataforma a estimular um dos lados (subsidiando ou realizando  preço zero) para atrair um grupo específico de agentes. Nota-se que a forma de precificação em uma plataforma de múltiplos lados é mais complexa. Em razão disso, a literatura especializada aponta que qualquer análise competitiva em mercados de múltiplos lados deve considerar as interdependências das demandas dos agentes envolvidos, sob pena de conclusões equivocadas, principalmente em relação às estratégias de precificação que poderiam ser classificadas com espúrias quando se utiliza o mesmo olhar dispensado aos mercados de um lado. 

[17]Fonte: Techmundo, 2013; in http://www.tecmundo.com.br/sistema-operacional/60596-ios-android-windows-phone-numeros-gigantes-comparados-infografico.htm.

[18]GETSCHKO, Demi. Blog Por Dentro da Rede – Estadão, 08 fev. 2015. O Marco Civil não é a cura de todos os males.

[19]http://www.telesintese.com.br/para-combater-zika-virus-governo-lanca-app-com-acesso-zero-rating/

[20]Forgioni, Paula A., Op. 340.

[21]A Vivo comercializa oferta em que o usuário paga determinada quantia, a qual corresponde um volume de dados a ser utilizado exclusivamente em redes sociais. Tal modelo difere bastante do utilizado pelas demais prestadoras, as quais possuem ofertas em que o usuário não arca com qualquer contrapartida pelo uso de certos aplicativos.

 

DOCUMENTOS RELACIONADOS/ANEXOS

(SEI nº 0757300);

(SEI nº 0757253); 

(SEI nº 0470167);

(SEI nº 0469360).

CONCLUSÃO

Ante o exposto, propõe-se a submissão da presente análise técnica acerca dos subsídios solicitados pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) por meio do Ofício nº 4090/2016/CADE, à aprovação do Conselho Diretor, nos termos do art. 133, XLVII c/c art. 214, VI, do Regimento Interno da Anatel, aprovado pela Resolução nº 612, de 29 de abril de 2013.

Antes, contudo, os autos devem ser encaminhados à Procuradoria desta Agência, nos termos regimentais.


logotipo

Documento assinado eletronicamente por Juliana de Carvalho Guimarães, Especialista em Regulação, em 06/09/2016, às 11:44, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 30, II, da Portaria nº 1.476/2014 da Anatel.


logotipo

Documento assinado eletronicamente por Elaine Valente Aragão Maia, Gerente de Acompanhamento Societário e da Ordem Econômica, Substituto(a), em 06/09/2016, às 11:45, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 30, II, da Portaria nº 1.476/2014 da Anatel.


logotipo

Documento assinado eletronicamente por Luis Claudio Santana Santoro, Especialista em Regulação, em 06/09/2016, às 11:45, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 30, II, da Portaria nº 1.476/2014 da Anatel.


logotipo

Documento assinado eletronicamente por Fábio Casotti, Especialista em Regulação, em 06/09/2016, às 12:56, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 30, II, da Portaria nº 1.476/2014 da Anatel.


logotipo

Documento assinado eletronicamente por Abraão Balbino e Silva, Gerente de Monitoramento das Relações entre Prestadoras, em 06/09/2016, às 13:18, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 30, II, da Portaria nº 1.476/2014 da Anatel.


logotipo

Documento assinado eletronicamente por José Borges da Silva Neto, Especialista em Regulação, em 06/09/2016, às 13:43, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 30, II, da Portaria nº 1.476/2014 da Anatel.


logotipo

Documento assinado eletronicamente por Carlos Manuel Baigorri, Superintendente de Competição, em 06/09/2016, às 16:56, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 30, II, da Portaria nº 1.476/2014 da Anatel.


QRCode Assinatura

A autenticidade deste documento pode ser conferida em http://www.anatel.gov.br/autenticidade, informando o código verificador 0792632 e o código CRC B5EFB1F7.




Referência: Processo nº 53500.020772/2016-69 SEI nº 0792632